Armazém do Inácio, por Osvaldo Piccinin

Publicado em 24/09/2014 15:24
Osvaldo Piccinin, engenheiro agrônomo, formado pela USP-Esalq, em 1973. Natural de Ibaté, é empresário e agricultor e mora em Campo Grande/MS.

Osvaldo Piccinin - novoMoleque não pode ficar a toa na vida sem fazer nada, porque cabeça vazia é  convite para a morada do capeta, assim dizia meu velho pai parodiando este conhecido ditado.

Das boas lembranças da minha infância e adolescência, tenho no trabalho as melhores passagens e ensinamentos de vida. Esta lição de que quando  à toa devemos estar carregando pedras, nos foi passada de geração em geração. 

Lembro-me que muitas vezes mesmo adoentados, nós íamos para o batente duro da roça por sentirmos vergonha de ficarmos em casa nos restabelecendo. A impressão que tínhamos é que as pessoas nos julgariam como preguiçosos ou vagabundos.

Depois que minha família mudou-se para a cidade, meu pai me conseguiu um trabalho como aprendiz de balconista, num armazém de secos e molhados do seu amigo Inacio Pessente. Armazém este, bem sortido de mercadorias destinadas às famílias simples do meio rural, principalmente alimentos.

Inácio era um homenzarrão forte, um pouco gago, mas muito trabalhador e astuto comerciante. Em sua juventude foi goleiro do time local, e como comerciante foi meu primeiro professor na arte de  comprar e vender. 

Sua bondade era imensa, e ajudava a quem o procurasse, vendendo fiado; prorrogando dívidas e às vezes ate perdoando-as, desde que sentisse  sinceridade nos clamores dos endividados. 

No pequeno armazém vendíamos e entregávamos, nas casas dos clientes, as compras mensais. Para controle do recebimento  anotávamos em cadernetas de mola espiral guardadas numa lata vazia de bolacha “Maria”, em baixo do balcão. Interessante que, devido à inflação, apenas anotávamos os produtos sem preços, pois estes eram colocados no ato do pagamento ao preço do dia.
Ali também era ponto de encontro para negócios com armas de fogo, relógios e alguns animais de lida, tais como equinos e muares. Nesta época o porte de armas era liberado. Inácio e seu enorme coração, muito emotivo por sinal, não levava desaforos para casa, seu pavio era mais curto que coice de porco. 

Várias foram às vezes que o vi dar sopapos em picaretas e desonestos, nunca dentro do seu estabelecimento. Ele juntava o sujeito pelos fundilhos ou pescoço, arrastando - o  ate a calçada enfrente e desferia um belo chute no trazeiro ou um tremendo tapa no pé do ouvido. Feito isso considerava paga a dívida.

De posse a uma lista de mercadorias, fornecida pelos clientes, aprontávamos a feira do mês, separando e embalando cada produto colocando - os  num saco de estopa ou caixas de papelão vazias  em cada cantinho apertado do armazém. Em determinadas épocas estas eram tantas que havia necessidade e usarmos também a calçada enfrente ate que fossem entregues. 

Eu fazia as entregas à domicílio, dirigindo uma caminhonete C10, com apenas quatorze anos de idade. Ele confiava  em mim, apesar de minhas barbeiragens frequentes, por isso me delegava esta tarefa e eu me sentia muito importante. 

Principalmente quando da entrega em fazendas e usinas de açúcar da região. Lá as meninas me achavam o cara, e isso facilitava muito as minhas paqueras nos finais de semana nos bailinhos ou brincadeiras dançantes, como dizíamos.

Por lá passou também meu irmão mais novo  e muitos amigos indicados por nós. Meu envolvimento e responsabilidade no trabalho era tão forte que ate hoje ainda sonho que tenho de acordar cedo, nos finais de semana, para trabalhar no armazém.

Inácio amava seu trabalho e teve muito sucesso financeiro por conta disso. Com ele aprendi:  “escolha o trabalho que ama e não terá que trabalhar um único dia de sua vida”. 

E VIVA O ARMAZÉM DO INACIO PESSENTE!

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Fonte:
Osvaldo Piccinin

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2 comentários

  • Antonio Carlos Nogueira Fortaleza - CE

    Muito bom Osvaldo continue com suas historias, pois muitas delas nos remete ao nosso passado também.

    Abraço.

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  • Jordano Dal Berto Cruz Alta - RS

    Muito Bom Osvaldo...parabéns...

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