Desemprego indo a 14% e petistas batem panela exigindo a volta de Dilma. Que ridículo!!!

Publicado em 16/05/2016 18:59
Petistas, em número bem reduzido, vão às janelas fazer a sua percussão; explico por que é ridículo, embora democrático (por REINALDO AZEVEDO) + blogs de veja.com

Olhem aqui: uma das coisas que a todos igualam é o direito de bater panelas. Não gostou de alguma decisão do poder público? Ok! Às panelas! Consta que, em cidades de pelo menos cinco Estados, a percussão voltou a ser ouvida durante a entrevista de Michel Temer a Sônia Bridi no Fantástico. Em meio ao barulho, gritos de “golpista”.

Bem, não é preciso ser bidu para saber a origem. Petistas e esquerdistas estavam se manifestando. É ridículo, mas, reitero, eles têm esse direito. Aliás, algo no fundo da alma dessas pessoas deve lhes provocar um prazer perverso, não? Há muito exibiam vontade de protestar, de botar pra fora seu fel… Estavam à cata de causas.

E por que classifico de ridícula a manifestação de agora, à qual devem ter aderido também os admiradores de Marina Silva? O que distingue esse panelaço daqueles que passaram a perseguir Dilma Rousseff?

Ora, naquele caso, tratava-se de protestar contra o governo mais corrupto de que se tem notícia no mundo. Se a senhora presidente afastada encheu ou não a bolsa de dinheiro, isso é irrelevante. Os cleptocratas estavam no comando. Não só isso! Dilma conduziu o país à ruína econômica e aplicou o maior estelionato eleitoral da história.

Quando os brasileiros iam bater panela contra a agora presidente afastada, eles o faziam, pois, contra a corrupção, contra a desordem, contra o estelionato e, por óbvio, em favor do impeachment. O barulhaço cobrava o cumprimento da lei.

Quem resolveu protestar neste domingo estava se manifestando contra qual medida de Temer, se ainda não há nenhuma? Estava demonstrando seu desagrado com qual decisão do governo, se nada, até agora, foi anunciado porque, afinal, nem houve tempo? Estava se posicionando contra qual mudança de rumo, se mudança ainda não houve? Ou melhor: os dois anúncios feitos pelo presidente são positivos. Refiro-me ao corte de ministérios e à decisão de demitir ao menos 4 mil comissionados. Nesse caso, gente com vergonha na cara aplaude, não vaia.

Para ser mais claro: quem batia panela contra Dilma estava pedindo o cumprimento da lei. Quem bateu panela contra Temer estava se opondo ao cumprimento da lei. Assim, existe um jeito civilizado de se entregar às caçarolas e um jeito brucutu.

Mas viva a vaia. Viva o direito de bater panelas. Até por maus motivos.

Previsão de Meirelles é que desemprego chegue a 14%

Na reunião com líderes sindicais, Henrique Meirelles deixou escapar que, nas projeções do governo, o desemprego deve chegar a 14% nos próximos meses. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e líderes das centrais sindicais UGT, Força Sindical, Nova Central e CSB manifestaram preocupação com o avanço do desemprego na reunião que tiveram nesta segunda-feira com o presidente interino Michel Temer, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, e o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Meirelles sinalizou aos sindicalistas que o desemprego pode chegar a 14% até o fim do ano e pontuou que a reforma da Previdência é uma das medidas para barrar o crescimento da massa de desempregados.

"Cada um defendendo seu pedaço quando o país caminha para a desagregação não dá. Vamos tentar em 30 dias liquidar esse debate sem prejuízo aos trabalhadores. Nós temos que discutir o sistema previdenciário para garantir o pagamento no futuro, isso é fundamental para nós. Organizar tudo na boa fé, com diálogo, para gerar o emprego ​que nós necessitamos", disse Meirelles, conforme anotações do secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna. "O desemprego está em 10% hoje. Daqui a pouco, do jeito que está, vai a 14%. Nós temos urgência em melhorar isso e dar um sinal para o mercado."

Resistência à CPMF faz Meirelles apostar em aumento da Cide como ‘plano B’

POR PAINEL da folha de s. paulo

Sai CPMF, entra Cide Ainda sem saber ao certo o tamanho do buraco nas contas públicas, o ministro Henrique Meirelles (Fazenda) já trabalha com um plano B caso seja inevitável uma fonte extra de arrecadação. Em vez da controvertida CPMF, já criticada no passado pelo presidente interino Michel Temer, haveria um aumento da alíquota da Cide, contribuição sobre os combustíveis. A medida é mais palatável entre parlamentares e vista pelo próprio Temer como um “remédio menos amargo”.

 

A ocupação dos desocupados (KIM KATAGUIRI)

Sem uma presidente da República para defender e um presidente da Câmara para atacar, setores da esquerda têm se dedicado a aparecer em atos menores e muito mais desastrados. É o caso da invasão da Etec Basilides de Godoy, na zona oeste de São Paulo.

A Etec havia sido invadida no dia 3 de maio, num suposto protesto contra a falta de merenda, sem o apoio da maioria dos estudantes. Na última quinta (12), pais e alunos formaram um cordão humano e retiraram a minoria barulhenta. Apesar da bagunça deixada —que incluiu danos a computadores com informações sobre 30 mil alunos que já passaram pela instituição—, os jovens que queriam voltar a estudar começaram a reorganizar a escola para retomar as aulas.

A maioria dos "manifestantes" que ocuparam a Basilides de Godoy nem estuda lá, como bem afirmou Thiago Carvalho, coordenador de cursos da Etec. É sabido que muitas dessas ocupações são organizadas por grupelhos como a Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) —que abriga estudantes secundaristas de 30 anos— e a UNE (União Nacional dos Estudantes), a mesma que promove "greve de aulas" contra o "golpe".

Outro caso de ocupação foi o Centro Paula Souza, que, após ser retomado, estimou um prejuízo de R$ 80 mil por causa do arrombamento de gavetas e armários, depredação de portas e equipamentos e até furtos de notebooks, telefones, pendrives e dinheiro de funcionários da instituição.

Supondo que, de fato, esses "protestos" sejam contra a falta de merenda, a culpa está longe de ser das Etecs. Ainda que a responsabilidade fosse das escolas, impedir que aqueles que querem estudar entrem nas salas de aula não resolveria o problema. Os únicos prejudicados nessa história são os estudantes, tanto que eles mesmos estão começando a reocupar as escolas tomadas por... desocupados.

"Ah, mas então você é contra os estudantes?" A pergunta revela a vigarice de quem a faz. Passa-se a impressão de que toda crítica aos meios é uma crítica aos supostos fins. É claro que esses estudantes - e faço uma grande concessão ao partir da premissa de que realmente o são - podem protestar. Mas atrapalhar o estudo dos outros não é a única maneira de se manifestar.

Se a população brasileira conseguiu derrubar uma presidente da República em protestos feitos quase sempre aos domingos - sem quebra-quebra, ocupações ou furtos -, por que estudantes não conseguiriam ter suas demandas atendidas se agissem de maneira semelhante?

Eu defendo os estudantes. Estudante é quem estuda. Quem impede os outros de estudar em nome de interesses obscuros de partidos políticos não é estudante, é canalha. (na FOLHA DE S. PAULO)

 

O ministro do Turismo que ficou famoso por causa da mulher vai receber mais de R$ 14 mil por dia de trabalho

BRANCA NUNES

O primeiro ministro do Turismo nomeado por Dilma Rousseff, Pedro Novais, virou notícia por ter transformado um motel em local de trabalho. O último, Alessandro Golombiewski Teixeira, pousou nas primeiras páginas depois de transformar o local de trabalho numa espécie de motel particular.

Pedro Novais durou nove meses. Em setembro de 2011 foi demitido por uma série de irregularidades no uso das verbas oficiais quando exercia o mandato de deputado federal. A imprensa descobrira em dezembro de 2010 que o futuro ministro havia pedido à Câmara o ressarcimento de R$ 2.156 gastos no estabelecimento de alta rotatividade.

Neste 12 de maio, Teixeira deixou o posto menos de três semanas depois de publicada a  nomeação no Diário Oficial da União de 22 de abril, em pleno feriado de Tiradentes. Na segunda-feira, 25, a agenda do primeiro dia de trabalho do ministro camuflou com a anotação “sem compromissos oficiais” um evento sem vínculos visíveis com a pasta.

Nessa data, Teixeira e sua mulher, Milena Santos, protagonizarem uma sessão de fotos apimentadas por beijos de lua-de-mel, olhares repletos de promessas, decotes ousados e pernas expostas. Minutos depois de publicado por Milena no Facebook, o ensaio viralizava nas redes sociais.

A repercussão piorou ainda mais a imagem do governo. Em nota oficial, Teixeira repudiou a milena“divulgação da intimidade do casal” pela imprensa. Mas Milena virou celebridade. Descobriu-se que ela foi escolhida em 2013 Miss Bumbum Miami, e que já havia protagonizado um ensaio sensual em Brasília, em frente do Congresso Nacional. Nele, vestia apenas uma imperceptível calcinha branca e uma faixa com as cores do Brasil.

Nos outros 12 dias úteis do meteórico mandato, a agenda do ministro do Turismo encobriu três deles com a anotação “sem compromissos oficiais”. Os nove restantes foram preenchidos por duas reuniões internas, quatro externas e 14 visitas de deputados, senadores, governadores ou presidentes de associações ligadas ao turismo.

Nada que pudesse tornar a rotina estafante. Somados todos os compromissos oficiais, Teixeira trabalhou em média menos de 4 horas por dia. As medidas que tomou no restante do tempo se resumem a nomeações e exonerações de funcionários.

Embora tenha permanecido no cargo pouco mais de duas semanas, Teixeira continuará a receber o salário integral de R$ 30,9 mil pelos próximos seis meses – período em que o Conselho de Ética da Presidência determina que os 31 ministros afastados não exerçam outros empregos por terem “informações estratégicas para o país”. No fim da chamada quarentena, a conta bancária de Teixeira estará pelo menos R$ 185,4 mil mais gorda. Serão mais de R$ 14 mil para cada um dos 13 dias úteis trabalhados.

A generosidade dos cofres públicos é algo que esse gaúcho de 44 anos conhece faz tempo. Amigo de Dilma Rousseff desde os tempos da militância política no Rio Grande do Sul, Teixeira foi assessor especial da Presidência da República em 2013 e coordenador da equipe que elaborou o programa de governo à reeleição em 2014. Antes disso, trabalhou na Secretaria Estadual de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul durante o governo de Olívio Dutra e foi secretário executivo de Fernando Pimentel no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Também presidiu a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), foi secretário-executivo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), e conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

Em fevereiro de 2015, assumiu a presidência da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), órgão vinculado ao MDCI, uma das mais notáveis caixas-pretas do governo federal no quesito transparência. Na Agência, Teixeira embolsava salários de R$ 39,3 mil e tinha a companhia de outros três militantes da campanha de Dilma, com remunerações que variavam de R$ 19,4 mil a R$ 25,9 mil.

Entre as mais notórias ações do amigo da presidente destacou-se o reajuste – mantido em sigilo – do preço das diárias para viagens internacionais dos integrantes da diretoria executiva. No continente americano, o valor saltou de US$ 400 para US$ 700. Fora da América, as diárias passaram de € 320 para € 700. (Dependendo do destino, um ministro de Estado recebe entre 220 e 460 de diária, podendo optar por dólar ou euro).

Três dias depois de a resolução entrar em vigor, segundo o jornal O Globo, Teixeira recebeu € 11,9 mil (R$ 47,5 mil) em diárias por conta de uma viagem a Dubai e a Pequim. Se a ajuda de custo obedecesse à antiga tabela, a missão aos Emirados Árabes e à China teria custado € 5,4 mil (R$ 21,7 mil).

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Milena Santos, no gabinete do ministro do Turismo

Embora tenha ajudado a esconder as atividades que o marido sempre exerceu nas sombras, o impacto do ensaio fotográfico da mulher acabou prejudicando a tia de Milena, Delfina Alzira da Silva Gutierrez. Nomeada por Teixeira para o cargo de secretária da ABDI em novembro de 2015 com um salário de R$ 19.488,60, Delfina foi exonerada pela nova direção do órgão dois dias depois da divulgação das fotos. “Em função da mudança de direção da ABDI, e consequente reestruturação do gabinete da Presidência, informamos que, a senhora Delfina Silva Gutierrez, foi desligada desta Agência”, informou assessoria de imprensa da ABDI em nota publicada no Globo.

Com a súbita notoriedade de Milena, a imprensa descobriu outras celebridades que cruzaram o caminho da Miss Bumbum. Em julho de 2013, por exemplo, ela apareceu em uma série de imagens abraçando e beijando Lula. “Esperei quase sete horas para conseguir me aproximar dele”, contou na ocasião. “Estou eufórica até agora, sempre tive um sonho de conhecer o Lula. Ele me deixou sem ar”.

Quando festejou fotograficamente a posse do marido, Milena se nomeou “primeira primeira-dama do Turismo”. No dia da queda do governo, preferiu não comentar nas redes sociais a perda do título, bem menos duradouro que o de Miss Bumbum.

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Sonia Zaghetto: O outro lado (NO BLOG DE AUGUSTO NUNES)

A cerimônia do adeus pelo olhar de uma jornalista que estava lá: `Atrás dela, Lula se mantém alheio, acariciando o bigode com um gesto mecânico e aquela expressão de descrença que todos temos nos velórios dos amados. Lula assiste ao enterro de seu projeto'

Sob o sol inclemente, milhares de pessoas enfrentam uma fila para entrar na área cercada diante do Planalto. Índios, funcionários públicos, velhos militantes de longos cabelos brancos e jornalistas se comprimem contra as grades. Muitos vestidos de vermelho, com camisas da CUT, bandeiras da UNE e uma espécie de avental do MST. Há gente fina, elegante e, creio, sincera, com óculos Ray-Ban e iPhone, mas a maioria traz na roupa e na expressão o selo da pobreza. Cheiro do suor e balões vermelhos, rosas meio murchas nas mãos das mulheres. Celulares registrando cada movimento, como convém a esses tempos.

Palavras de ordem de repente rebentam no meio da multidão. “Dilma, guerreira da pátria brasileira” e “Golpistas não passarão” soam mais modernos, mas “O povo não é bobo: abaixo a rede Globo” parece ressuscitar algum fantasma da década de 70 que deveria estar morto e enterrado, não fossem os interesses da hora. Entre os que estão fechados no espaço gradeado há reclamações sobre crianças e idosos sedentos. Seus pedidos por água são ouvidos com total impassibilidade pelos seguranças do Planalto.

Nem bem encosto na grade e ouço uma moça, com crachá de funcionária de um dos Ministérios, comentar com a amiga: “A luta continua. Eles vão ter que nos matar. Nós, servidores públicos, mulheres, negros e trabalhadores rurais enfrentaremos tempos muito difíceis. Mas nós resistiremos“. A frase me soa surreal. Eles. Quem seriam eles? Temer? As perversas elites? Não me contenho e indago. “Eles, os que sempre mandaram no Brasil e agora não admitem que os pobres estejam no comando. Esses coxinhas, claro!“, é a resposta.

Um silêncio se faz em mim. Coxinhas. Sob esse rótulo – mais um dos que nos separam – vi o rosto de cada um de meus muitos amigos que combatem, com todas as forças, o governo petista. São médicos, garçonetes, taxistas, engenheiros, porteiros e professores. Alguns têm filhos recém-nascidos, outros estão desempregados, há os que estão abatidos com o noticiário interminável sobre corrupção e os que apostaram tudo o que tinham em pequenos negócios. Todos temem a sombra da grande crise que nos engolfa. Além de posts no Facebook e participação em manifestações, são inofensivos como borboletas. E menciono borboletas propositalmente, pois tenho um ridículo medo delas. São incapazes de me fazer qualquer mal, mas, em algum momento de minha vida, aprendi a temê-las e até odiá-las, coitadas.

Exatamente nessa hora recebo uma mensagem da Paula, que me confidencia: “Por que estou constrangida em dar uma leve comemoradinha em público!? Será que é respeito pelos colegas de esquerda, queridos, ou porque não há o que comemorar de verdade? Depois de tanto tempo eu deveria estar mais eufórica, mas não estou”. Paula, coxinha e borboleta, cuja doce sensibilidade até em comemorar traduz bem o instante e o perigo de julgar desconhecidos. Paula e sua mensagem são uma demonstração de que nem todo “coxinha” toma champanhe em copinhos de plástico na Paulista.

Olha essas flores, vem aqui que eu te dou. Essas duas cercas não podem nos separar!“, grita um rapaz com sotaque gaúcho para uma garota do outro lado da grade. Não ouço a resposta, mas registro no rosto dele, se não o amor, mas a pura atração em tempos de cólera. Ele insiste: “Vem pra cá com a sua câmera. Aqui não tem ladrão nem golpista“. Atrás de mim, uma voz responde: “Há golpistas aqui, também“.

O ruído aumenta, punhos erguidos, mãos fechadas. Os ânimos se acirram, a grade é derrubada, um grito alto se eleva e o povaréu invade a cena.  A jornalista americana está visivelmente tensa, assim como o cinegrafista musculoso, de óculos de sol e coberto de suor. Juntam os equipamentos e correm. Apenas um susto. A segurança intervém e põe a grade de pé novamente.

Olho para o lado e vejo dois militantes de meia idade – Tomás e sua companheira – que carregam cartazes em russo e alemão falando sobre o suposto golpe. Vieram do Ceará e querem alertar o mundo sobre o que acreditam ser um atentado à democracia. Atrás deles, um homem idoso, de longos cabelos totalmente brancos, compra um pacote de amendoim na barraca do ambulante (sempre os há). Veste uma regata branca. Os cabelos empapados de suor grudam na pele clara e no rosto vermelho.

De repente, um burburinho: o ex-presidente Lula chega. Começam a cantar um olê-olê-olê-olá-Lulá-Lulá. Apesar da saudação, Lula mal olha para os apoiadores. Passa direto, sem disfarçar o abatimento.

Pouco depois, Dilma começa a falar. Cada frase transmitida pelo sistema de som desperta reações na plateia. Chama o processo de impeachment de golpe e repete que não cometeu crime de responsabilidade. Quando se diz “vítima de uma grande injustiça” vários manifestantes começam a chorar, principalmente as mulheres. A presidente afastada pede várias vezes para que os seguranças mudem de lugar para que ela enxergue as pessoas do outro lado da grade. “Quero ver o pessoal!”, repete.

Atrás dela, Lula se mantém alheio, acariciando o bigode com um gesto mecânico e aquela expressão de descrença que todos temos nos velórios dos amados. Lula assiste ao enterro de seu projeto. Pergunto a mim mesma no que estará pensando. Lembro do líder carismático, domador de multidões de outrora, e tenho certeza que, naquele instante, ele está enfrentando a si mesmo: as escolhas equivocadas, a voracidade de seu grupo que lhe corroeu a popularidade, os planos de poder destruídos. Parece muito, muito velho. E cansado.

Lula - pronunciamento 2

Volto novamente minha atenção para Dilma, que responsabiliza por sua queda não os erros que cometeu, mas os adversários, “os que não conseguiram chegar ao governo pelo voto direto do povo”, os que perderam as eleições e “tentam agora pela força chegar ao poder”. É aplaudida em delírio.

Em meio ao discurso de Dilma, disperso-me de novo. Noto um rapaz. Muito jovem, negro, vestido com simplicidade. Soluçava abraçado à mãe, que o consola. Eu e outra jornalista os fotografamos (a imagem era irresistível). A mãe nota as câmeras e quase sorri, abraça-o mais, conferindo pelo canto dos olhos se os celulares registram a cena. O rapaz afunda a cabeça no pescoço dela, as lágrimas encharcando a camisa. Balbucia frases sobre futuro incerto, desesperança, portas fechadas e perdas. Sinto uma brutal vontade de chorar. Uma compaixão imensa por aquele rapaz, tão jovem, acreditar que apenas um governo é capaz de erguê-lo.

Penso imediatamente em meu tio-avô, Deoclécio, negro, com seu impecável uniforme branco da Marinha Mercante, muito engomado, desfilando perante a vizinhança, orgulhoso de só dever sua carreira a si mesmo. E sofro, muda, por aquele rapaz estar tão vitimizado e dependente. Minha dor imensa é por terem roubado dele o que temos de mais esplêndido: o espírito independente, altivo. Abatido, ele agora acredita que não é nada. Sem a mão do governo, que seria dele? E isso, penso, é uma coisa inominável.

Isso, sim, é a restauração da escravidão. Uma escravidão que não atinge apenas a uma raça, que não vitima uma epiderme: a escravidão da alma, que é subjugada até não mais acreditar em si mesma, em seu esforço e capacidade. Alguém disse àquele rapaz – quase menino – que só sob a tutela do grande pai governamental ele seria algo na vida. E ele acreditou. Ao microfone, Dilma repete que é um dia muito triste.

Uma espiada em torno e vejo novamente os tipos clássicos que deveriam estar ali, obrigatoriamente. Alguns com jeito de classe média alta, mas que carregam uma culpa ancestral pela desigualdade social que testemunham. São sonhadores como Lennon e querem mudar o mundo como Cazuza. Dividem o planeta entre capitalistas feios e socialistas bondosos; acreditam que ser de esquerda é um certificado de “ser do bem”. Demoro algum tempo observando a moça que tudo fotografa com um iPhone: corte de cabelo moderno, óculos de sol e um colar de miçangas alaranjadas enrolado no braço direito.

Volto a atenção para Dilma pela terceira vez.  Ela está dizendo que sofreu a dor da tortura, da doença e, agora, a da injustiça e da traição. Um coro se eleva: “Fora Temer!”. Ouço o discurso pensando que ela também foi vítima da própria arrogância. A primeira mulher a presidir o Brasil pecou por falta de humildade, por inabilidade, por não saber ouvir.

A presidente se aproxima de onde estou. Abraça e beija as mulheres que estão ao meu lado. Sorri muito. Noto seus cabelos escovados, a face coberta de pesada maquiagem. Terá dormido? Estará medicada para enfrentar a dureza da hora? Começo a sentir piedade, mas lembro que, poucos minutos antes, ela havia, ainda uma vez, insinuado a toda aquela gente desesperançada que eles perderiam tudo o que tinham conquistado: Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Fies, Prouni, cotas raciais e sociais. E a imagem do rapaz que chorava absorve toda a minha capacidade de sentir compaixão.

A presidente se afasta e começo a retornar. O caminho está impedido por muitos índios que cantam, dançam e gritam pela demarcação das terras indígenas. Penso nos treze anos em que o autointitulado governo das minorias e dos desamparados não resolveu a questão indígena, a mortandade dos Guarani-Kaiowá e a reforma agrária.

Abro caminho entre os índios, os jornalistas que correm e uma parte do povo que se dispersa. De repente eu me apanho rindo e tentando decifrar uma imagem: caminha à minha frente um objeto de chita onde está escrito “Dilma”. Penso comigo: parece algo que faria parte de uma encenação de bumba-meu-boi, mas era apenas um guarda-chuva que tinha uma espécie de sainha costurada nele. A pessoa andava e a sainha ia sacolejando pela Praça dos Três Poderes, com suas letras de tecido colorido costuradas. Tão pueril, tão brasileiro.

E pensei, como Vinicius, poeta e brasileiro como eu:

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos…
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias, pátria minha
Tão pobrinha!

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Blogs de veja.com

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1 comentário

  • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

    PARA ONDE VAMOS ?... QUAL É O DESTINO ??

    Muito se fala do crescimento da esquerda na América Latina nas últimas décadas. Agora estamos vendo um movimento contrário, pois na Argentina com a eleição de Macri e, com a queda de Dilma no Brasil, os dois países com os maiores PIBs do continente estão tomando novos rumos ideológicos e, consequentemente de suas políticas econômicas e políticas exteriores.

    O que me incomoda é o "silencio" dos meios de comunicação da abertura do governo dos irmãos Castro na Ilha de Cuba. Após mais de meio século, os ianques, como são chamados pelos ilhotas, resolveram tirar as sanções sobre o regime de Cuba. Isto vai promover um tsunami na realidade dessa ilha que viveu guardada sob o manto socialista castrista. A população vai beber o mel do capitalismo, qual será as consequências no poder que Cuba promove ideologicamente nos países ditos bolivarianos (Equador, Colômbia, Venezuela, Bolívia). Será a derrocada final dessa onda maligna que assombrou o continente?

    Sr. João Batista, não seria a hora de entrevistar o sociólogo Demétrio Magnoli ? Acho que ele iria nos esclarecer muitos pontos sobre as possíveis mudanças do poder geopolítico na América Latina.

    ESPERO QUE ESTAMOS SENDO LEVADOS A NAVEGAR NUM OCEANO DE ÁGUA AZUL E TRANQUILAS A UM PORTO SEGURO !!!

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