Na FOLHA: Crise se agrava e aliados falam em deixar Governo Dilma

Publicado em 05/07/2015 09:34
Oposição e aliados discutem o que fazer no caso de a presidente deixar o cargo ou ser afastada antes da conclusão de seu mandato (na FOLHA DE S. PAULO edição deste domingo)

Crise se agrava e reduz margem de manobra que Dilma tem para reagir

A crise que a presidente Dilma Rousseff enfrenta desde sua reeleição no ano passado se aprofundou nos últimos dias, reduzindo sua margem de manobra e abrindo espaço para as principais forças políticas discutirem o que fazer na hipótese de ela deixar o cargo ou ser afastada sem concluir o mandato.

Revelações do empreiteiro Ricardo Pessoa, que disse ter distribuído propina e feito doações eleitorais em troca de vantagens na Petrobras, lançaram suspeitas sobre o financiamento da campanha de Dilma e animaram a oposição a voltar a falar em impeachment.

O Tribunal Superior Eleitoral, que conduz uma investigação sobre a campanha da reeleição, chamou o empreiteiro para depor. Paralelamente, o Tribunal de Contas da União se prepara para retomar em breve o julgamento das contas do governo Dilma do ano passado --a rejeição do balanço abriria caminho para a presidente ser afastada do cargo e processada.

Controlado pelo PMDB, o Congresso impôs uma derrota humilhante ao Planalto na semana passada, com a aprovação de um reajuste salarial para funcionários do Judiciário que põe em risco as finanças do governo. O vice-presidente Michel Temer ameaçou deixar a articulação política do Planalto no dia seguinte.

O pessimismo sobre os rumos da economia cresceu, e analistas e investidores não vêem perspectiva de recuperação tão cedo. Segundo eles, o ajuste promovido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é insuficiente para restabelecer o equilíbrio do Orçamento.

Maior sigla da oposição, o PSDB programou uma exibição de força para este domingo (5), quando fará uma convenção para reconduzir à presidência do partido o senador Aécio Neves (MG), o rival derrotado por Dilma na eleição do ano passado. Do lado do governo, os petistas buscam com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma estratégia para reagir.

 

Levy na geladeira

Dilma demonstra impaciência e passa a questionar ministro em reuniões internas do governo

por NATUZA NERY, da sucursal da FOLHA DE S. PAULO EM BRASÍLIA

Joaquim Levy tem recebido pouca atenção da presidente. Recentemente, um funcionário notou que nem os incontáveis e-mails diários ela anda respondendo.

Nas reuniões internas de governo, o ministro da Fazenda passou a ser constantemente questionado pelos colegas e pela própria chefe. A discordância aumentou à medida que a crise econômica acelerou a queda na popularidade de Dilma Rousseff.

Auxiliares definem o "climão". Há apenas seis meses no cargo, Levy foi parar na "geladeira". Trata-se de um destino comum para quem convive com a presidente. Quando ela se aborrece com algo, manda o assessor para a "Sibéria", como se brinca no Planalto, até que sua paciência seja restabelecida.

Ministros explicam que tem sido difícil para ela renegar as suas próprias convicções para devolver, com um ajuste fiscal que fatalmente condenaria em tempos normais, a estabilidade econômica. A situação política, dizem, acentua essa ansiedade.

Quem observa as discussões do Executivo afirma que Levy costumava ganhar a maioria das disputas internas. Agora, tem obtido bem menos vitórias.

Recentemente, foi contrário a diversos pontos do plano de exportações. Não ganhou todos e, incomodado, não foi ao evento do anúncio. O comportamento turrão, contam assessores presidenciais, não vem agradando.

Mais e mais, o ministro tem deixado reuniões de governo antes de elas terminarem. Não raro, aparece atrasado. O hábito surpreende aos que perseguem a pontualidade com medo de pitos da chefe.

Cansada de ouvir "não" do auxiliar, e envenenada por queixas de ministros classificando-o de "arrogante" e "solista", por nunca dividir a bola, Dilma começou a transparecer alguma insatisfação.

Nos bastidores, Levy já foi visto se referindo ao PT como "aquela agremiação". Também não esconde, por vezes, o aborrecimento com o partido do governo, contrário a várias medidas do ajuste fiscal.

Em reunião de coordenação, grupo que reúne presidente, ministros e líderes do Congresso, o governo quebrava a cabeça sobre o que fazer com a criação de alternativa ao fator previdenciário, que terá forte impacto futuro sobre os cofres públicos.

Levy, como de hábito, reagiu às propostas. Dilma retrucou no ato. "Estou aqui tentando encontrar uma solução. O que você quer que eu faça, Levy?", indagou ela ao ministro, conforme contaram três pessoas presentes.

Há meses, o titular da Fazenda repete em conversas reservadas que o governo precisa dar a mensagem de dificuldade, e não de otimismo, pois o cenário é muito difícil.

"Aviso o que dá para ficar de pé e o que não adianta prometer", disse a um interlocutor ouvido pela reportagem.

PESCARIA

Dono de agenda cheia, Levy imprimiu um ritmo grande de trabalho à sua equipe. Outro dia, liberou os secretários do ministério às 4h. Duas horas depois, estava de volta.

Não por acaso, é frequentemente flagrado "pescando" em reuniões. No governo, há quem relacione tal ritmo com a embolia pulmonar identificada na semana retrasada.

A "pescaria", contudo, não é a válvula de escape de Levy. Quando está no Rio, e estressado, costuma desaparecer por uma hora. Para encontrá-lo, basta ir à baía de Guanabara. Lá estará o ministro, feliz, com seu "Fusquinha". Não, Levy não tem um Volks vintage, nem sua nova encarnação modernizada. "Fusquinha" é seu barco a vela.

Outro dia, reagindo a rumores de redução iminente da meta do superavit primário, o dono do "Fusquinha" apressou-se para alertar: "Não pode é deixar o barco bater nas pedras".

 

BLOG DE JOSIAS DE SOUZA: Mandato de Dilma chega ao ocaso em 6 meses (UOL)

 

Um presidente da República é um cotidiano de poses. Faz pose da hora em que escova os dentes ao momento em que se enfia sob o cobertor. Ainda que não controle nem os quatro andares do Palácio do Planalto, precisa passar a ideia de que faz e acontece. Mas é indispensável que exista uma noção qualquer de honra e direção por trás das poses. Com a popularidade no volume morto de um dígito e com a base congressual estilhaçada, Dilma Rousseff já não consegue projetar as aparências mínimas do poder.

O segundo mandato de Dilma acaba de fazer aniversário de seis meses. É um bebe disforme e malcheiroso. Tem cara de pão dormido. E cheira a naftalina. A ficha da presidente ainda não lhe caiu. Quem esteve com Dilma nas últimas horas espantou-se com o grau de alheamento da personagem. Mas a realidade acaba se impondo. Dilma logo perceberá que preside um governo em apuros. E talvez constate que terá de se dar por satisfeita se conseguir alcançar dois objetivos: não cair e continuar passando a impressão de que manda.

A margem de manobra de Dilma estreita-se rapidamente. O vice-presidente Michel Temer manteve-se na articulação política por responsabilidade, não por gosto. Tenta retardar a precipitação de um movimento que o governo parece fraco demais para evitar. Setores do PMDB de Temer conversam com a oposição abaixo da linha d’água. Discute-se a hipótese de construir uma saída política para a crise. Sem arranhões institucionais. E sem Dilma.

O PT já não exibe a capacidade de reação que ostentava em 2005, ano em que Roberto Jefferson jogou o mensalão no ventilador. Isolado, o partido arrasta no Congresso a bola de ferro de 13 anos de perversão. Depois de usufruírem de todas as benesses que o poder compartilhado pode oferecer, alguns aliados tramam desembarcar da parceria com o PT em grande estilo, como navios que abandonam os ratos.

Já não há no governo tantos apologistas de Dilma. Quem consegue manter a cabeça no lugar enquanto todos ao redor perdem as suas, provavelmente está mal informado. Movimentos como os que ocorrem em Brasília evoluem no ritmo dos transatlânticos, não na velocidade dos carros de Fórmula 1. Mas os prazos de Dilma encurtam-se à medida que o governo dela vai penetrando o caos.

No momento, conspira contra a celeridade das embrionárias articulações a falta de unidade. Há, por ora, duas fórmulas na praça. Numa Dilma é substituída por Temer. Noutra, Temer vai de roldão e convocam-se novas eleições. Se as articulações chegarem a algum lugar, Dilma vai mais cedo para casa. Se fracassarem, a presidente viverá um ocaso do tamanho dos 1.275 dias que faltam para ela ir embora.

(por Josias de Souza)

 

Empresários temem ambiguidade do PMDB

Pesos pesados apostam em Michel Temer como contraponto a ações de Eduardo Cunha e Renan Calheiros no Congresso

Investigados pela Lava Jato, presidentes da Câmara e do Senado agem para ampliar o desgaste do governo

Enquanto alguns dos líderes do PMDB trabalham para ampliar o desgaste do Palácio do Planalto, empresários têm procurado o partido para discutir saídas para a crise política e econômica.

Em encontros reservados, pesos pesados da economia têm exposto aos peemedebistas a avaliação de que, se a economia afundar ainda mais, o setor privado irá junto e o país corre o risco de enfrentar graves tensões sociais.

Segundo um empresário ouvido pela Folha, o vice-presidente Michel Temer, que é do PMDB e ameaçou deixar a articulação política do governo na semana passada, virou figura central do processo.

O empresariado não quer nem ouvir falar em sua saída da nova função, porque acham que isso representaria um agravamento da crise, com desfecho imprevisível.

O problema é que Temer hoje rema para um lado, enquanto dois peemedebistas tão ou mais fortes do que ele, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e do Senado, Renan Calheiros (AL), navegam na direção oposta.

A poucos metros da residência oficial de Cunha, quatro senadores têm se reunido há meses para discutir a crise. Além de Renan, participam do grupo Romero Jucá (RR), Eunício Oliveira (CE) e o ex- presidente José Sarney (MA).

O diagnóstico feito reservadamente é que o governo está no chão, sem capacidade de se levantar, e eles não têm condições de ajudar o Palácio do Planalto a superar a crise.

Na última quarta (1º), Renan deu uma demonstração pública do que é tratado nos bastidores: horas após ouvir um apelo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ajudar a presidente Dilma Rousseff no Congresso, o Senado aprovou o reajuste dos salários do Judiciário, que ameaça as contas do governo.

Renan sabia que Dilma vetaria o projeto, mas não quis perder a oportunidade de provocar desgaste do governo. Renan e Eduardo Cunha são chamados no Palácio do Planalto de "maestros do caos". Desde março, jogam ora juntos, ora separados. Mas sempre contra o governo.

Em uma coisa, pelo menos, o Planalto e os dois concordam: a relação se rompeu depois que os peemedebistas foram incluídos na lista de políticos investigados pela Operação Lava Jato sob suspeita de envolvimento com a corrupção na Petrobras. Os dois acreditam que o governo estimulou o procurador-geral Rodrigo Janot a incluí-los na lista, hipótese que o governo e o procurador refutam.

Nas últimas semanas, Temer, Cunha, Jucá e outros peemedebistas passaram a ser procurados por empresários que querem saber a possibilidade de um impeachment. Outros querem discutir saídas para a crise, do parlamentarismo à posse de Michel Temer.

Os peemedebistas dizem que não apoiam o impeachment da presidente. Mas reconhecem que a rejeição ao governo contamina o ambiente político e econômico.

"O governo precisa tomar cuidado para não entrar no cheque especial de popularidade'', ironiza Cunha, que tem poder para dar andamento a qualquer pedido de impeachment que venha a ser levado à Câmara.

As chances de o PT e o PMDB voltarem a trabalhar na mesma frequência são praticamente nulas. A avaliação da cúpula do PMDB é que atender ao pedido de Lula para ajudar Dilma politicamente serviria, no fundo, para que os petistas recuperassem o seu poder. O que figura como último item na lista de prioridades do PMDB.

Tucanos apostam no desgaste de Dilma para voltar ao poder

Crise alimenta ambições presidenciais de Aécio, Alckmin e Serra e estimula conversas com o PMDB

Senador mineiro diz a aliados que duvida de recuperação de Dilma; para Serra, presidente não concluirá mandato

Quando as luzes do painel de votação do Senado se acenderam, Aécio Neves (PSDB-MG) virou-se para o colega de bancada Cassio Cunha Lima (PB). "Pode fazer uma foto", disse cochichando. "Esse é o retrato de um governo que está no fim."

Foi na última terça (30), logo após o Senado aprovar um reajuste salarial de mais de 70% para os servidores do Judiciário, por 62 votos a zero, impondo uma derrota humilhante ao Palácio do Planalto.

O discurso público é mais ameno. "A presidente, a cada dia, vem perdendo as condições de governabilidade", disse Aécio à Folha. "À crise econômica se soma uma crise social, e a cada dia eles vivem o imponderável da Lava Jato."

Segundo pesquisa feita pelo Datafolha em junho, o senador mineiro teria 35% das intenções de voto se uma nova eleição presidencial fosse realizada hoje, e largaria na frente do ex-presidente Lula.

Aécio não é o único tucano que vê Dilma numa situação limite. Numa conversa recente com aliados, o senador José Serra (SP) disse não acreditar numa recuperação do governo e apostou que Dilma não concluirá seu mandato.

"Há uma combinação rara de crises que se auto-alimentam", afirmou. "Na política, a tempestade não se dá apenas no Congresso, mas dentro do PT. É o governo mais fraco de que tenho memória. Perto dele, a gestão Jango parece ter tido uma solidez de granito", concluiu.

Serra tem conversado sobre a situação com o PMDB, o partido do vice-presidente Michel Temer, seu amigo. Líderes peemedebistas também tratam do assunto com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que exerce papel moderador dentro de seu partido. FHC esteve recentemente com o senador Romero Jucá (PMDB-RR).

PARALISIA

Um desfecho repentino para a crise, com a renúncia ou o afastamento de Dilma, frustraria as ambições do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que se apresenta ao partido como uma alternativa para a eleição de 2018.

O paulista vem travando com Aécio uma disputa por protagonismo na legenda e sabe que, se o governo Dilma afundar antes do fim de seu mandato, as chances de ser o próximo candidato dos tucanos à Presidência da República no lugar de Aécio seriam praticamente inexistentes.

Alckmin tem conversado com parlamentares, governadores e prefeitos de outras legendas. Os relatos sobre a paralisia do setor público que tem ouvido lhe parecem alarmantes. Ele está preocupado com os efeitos da crise econômica em São Paulo, que ameaça reduzir a arrecadação do Estado em mais de R$ 500 milhões.

Alckmin defende a tese de que seu partido não deve apostar na estratégia de desgastar Dilma e o PT a qualquer custo. A posição mais moderada tem a ver com o cálculo que ele faz sobre seu futuro político. "Se ela cair, o Planalto cai no colo do Aécio", diz um integrante do primeiro escalão do governo estadual.

Depois da derrota de Aécio no ano passado, os tucanos moveram uma ação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para pedir a cassação de Dilma e Temer por abuso de poder econômico e político durante a campanha eleitoral.

O processo pode criar uma situação delicada. Se Dilma for cassada, o TSE poderá convocar novas eleições ou dar posse a Aécio, o segundo colocado na última eleição. O senador se recusa a falar sobre esse cenário publicamente, mas, a aliados, rechaçou a segunda hipótese. Disse que apenas uma nova eleição daria a um novo governo a legitimidade necessária.

 

BERNARDO MELLO FRANCO

Adeus às ilusões

PARATY - Para o escritor Frei Betto, o modelo de crescimento da era Lula ajuda a explicar a rejeição galopante ao PT e à Dilma. Enquanto sobrava dinheiro, diz ele, o governo apostou na inclusão social pelo consumo e não investiu o que devia nos serviços públicos, como saúde, transporte e educação. Agora que a festa acabou, quem pensava ter melhorado de vida percebeu que boa parte do bem-estar era ilusória.

"Essa inclusão não tinha lastro econômico e criou uma nação consumista", afirma o dominicano. "As pessoas estão chateadas porque não podem mais viajar de avião, ir ao restaurante, fazer a mesma compra na feira. A raiva vem daí. Tiraram o sorvete da boca da criança."

Na Flip para lançar seu 62º livro, "Paraíso Perdido" (Rocco), Frei Betto também está desiludido com o partido que apoiou em tantas eleições. "O PT trocou um projeto de Brasil por um projeto de poder. Agora paga pelos erros que cometeu", critica. Ele diz que o petismo está imobilizado pela coalizão que montou para governar. "O PT construiu uma base fisiológica, não ideológica. Depois do mensalão e do petrolão, alimentar esse sistema ficou mais difícil."

Ex-assessor de Lula no Planalto, o escritor lamenta que o partido tenha se afastado dos movimentos sociais. "O PT resolveu se apoiar nos inimigos. Antes, criticava o mercado e o Congresso dos 300 picaretas. Agora é refém dos dois e não sabe como sair do impasse."

Em Paraty, ele trocou ideias com o romancista Leonardo Padura e comparou o que vem pela frente ao chamado período especial de Cuba, após o fim da União Soviética. "Guardemos o pessimismo para dias melhores", brinca. A sério, Frei Betto diz que a situação é "muito crítica". "Não vejo uma luz no fim do túnel."

O ajuste fiscal, avisa o escritor, só vai agravar a insatisfação dos mais pobres e a rejeição ao governo e ao PT. "A Dilma só tem uma saída: povo na rua. Mas agora quem vai para a rua defendê-la?", questiona.

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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