Alertas na FOLHA: Falta de liderança, investimentos só em 2017, e soja sem ganhos com o dólar...

Publicado em 01/09/2015 05:50
Na edição desta 2a.-feira da FOLHA DE S. PAULO

HÉLIO SCHWARTSMAN

Liderança, produto em falta

SÃO PAULO - A essa altura, a ideia mais próxima de um consenso social no Brasil é a de que devemos tomar as medidas necessárias para tornar a recessão tão breve quanto possível. As receitas para fazê-lo evidentemente variam segundo os interesses e as necessidades de cada segmento, mas parece impossível que se possa fugir de alguma combinação de muitos cortes de gastos com algum aumento de impostos.

Obviamente, é melhor tentar chegar a uma fórmula através de negociações políticas do que deixar que as forças de mercado procedam ao ajuste por conta própria, já que elas tendem a fazê-lo de modo mais desorganizado, o que cobraria mais sangue do que o estritamente necessário.

A dificuldade é que, para costurar um pacto, é preciso que existam lideranças políticas e, no momento, este é um produto em falta. O presidente da República, que seria a figura natural a quem recorrer em situações como essa, é Dilma Rousseff, que é a principal responsável pela crise –e isso não lhe confere muita credibilidade para liderar o processo. Para agravar o quadro, sempre que as coisas parecem melhorar um pouquinho para seu lado, ela comete um erro político que volta a alijá-la.

O ministro Joaquim Levy, que chegara a ser apontado como uma espécie de primeiro-ministro de Dilma, talvez por ser muito identificado com o setor financeiro e tendo sofrido algumas sabotagens palacianas, não conseguiu impor-se politicamente.

O vice Michel Temer por um momento também pareceu ser a figura em torno da qual seria possível articular uma saída, mas, justamente por isso, teve suas asinhas cortadas.

É sempre possível aguardar até que a solução política amadureça. O problema é que, quanto mais postergamos as medidas econômicas, mais prolongamos a crise. E o calendário é implacável. Mudanças mais significativas em impostos, por exemplo, precisam ser aprovadas ainda este ano, ou só poderão valer em 2017.

 

VINICIUS TORRES FREIRE

Ponte para lugar algum

Impasse entre empresas e governo atrasa obras de infraestrutura, possível alívio da crise

O ÚLTIMO BAILE do ajuste fiscal é problema econômico bastante para reduzir quase todo o resto ao acessório. Mas a esperança de atenuar a recessão está nestes pequenos suspensórios: melhoras no comércio exterior e investimento adicional em obras de infraestrutura. As concessões de estradas e aeroportos podem emperrar. No caso de portos e, pior ainda, ferrovias, a chance de algo sair do papel é remota.

A disputa entre governo e empresas é a de sempre: preço, financiamento e exigências sobre qualidade e quantidade de obras. Dado o impasse desta vez, o novo programa de concessões de estradas pode ficar para as calendas; o programa lançado sob Dilma 1 vai atrasar ainda mais. Trata-se do Programa de Investimentos em Logística, o PIL 1, lançado em 2012, e o PIL 2, de junho passado.

Ouviram-se queixas de três grupos: dois direta ou indiretamente afetados pela Lava Jato; um que nada tem a ver com o caso. Ocioso dizer que empresas sempre fazem campanha para melhorar as condições do negócio. Mas é fato que:

1) Os financiamentos prometidos estão muito atrasados;

2) O governo quer modificar condições negociadas antes dos leilões de concessão de Dilma 1;

3) Empresas e governo não chegam a acordo nem sobre as preliminares que permitem dar o primeiro passo na maratona que é a elaboração de um edital de concessão. O governo superestimou exigências de prazo curto, quantidade e qualidade demais para preço de menos. Ou o investimento terá de ser reduzido ou o custo vai ser maior, para o consumidor direto (tarifa maior) ou para o público (subsídio maior no financiamento).

No caso do PIL 1, as empresas dizem que o governo e seus bancos se comprometeram, por meio de cartas, a oferecer financiamento dentro de certas condições favoráveis, o que é fato. Segundo as empresas, o BNDES ora exige garantias inviáveis, alegando que as condições de mercado e governo mudaram.

As empresas tomaram empréstimos para financiar o início do negócio ("empréstimos-ponte"), que deveriam bastar para uma espera de três meses, até sair financiamento de longo prazo. Algumas pontes já duram ano e meio, pois o financiamento longo não sai. Se a obra da concessão atrasa, paga-se multa. As empresas pensam que talvez seja o caso, pois a punição custaria menos do que tomar empréstimos no mercado, ao custo de 18% ao ano (o dobro do financiamento subsidiado pelo BNDES, grosso modo).

Na prática, quais as concessões ora mais viáveis? A "Rodovia do Frango" (no Paraná e em Santa Catarina, que escoaria produção dos frigoríficos), além de obras extras em concessões existentes e aeroportos, as mais bem-sucedidas do PIL 1. Porém, mesmo no caso de aeroportos, de início ocorreriam apenas obras que melhoram o padrão de funcionamento, não aquelas de infraestrutura, como novas pistas.

O resto, na visão das empresas, o pacote de leilões seria viável apenas no final de 2016; obras do PIL 1 estão à beira de ficar para 2016. Uma empresa acredita que o governo pode tentar fazer um leilão de concessão "na raça", no fim do primeiro semestre de 2016 (com grande risco de insucesso). Os investimentos, de qualquer modo, começariam a pingar apenas em 2017.

 

na coluna VAIVÉM DAS COMMODITIES

Soja: Ganho com dólar alto está com os dias contados

por MAURO ZAFALON - [email protected]

O produtor brasileiro de soja ainda não sentiu no bolso os efeitos da crise internacional de preços das commodities. A balança comercial, no entanto, já sente esse efeito.

Em julho do ano passado, a tonelada da oleaginosa era negociada a US$ 529 no porto de Paranaguá. Após contínua queda dos preços na Bolsa de Chicago, principal local de formação de preço da commodity, a tonelada recuou para US$ 395 em julho deste ano no mesmo porto.

Já no mercado interno, a saca, que era negociada a R$ 67 em Maringá (PR) em julho de 2014, aumentou para R$ 69 em igual mês deste ano, conforme dados da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).

A próxima safra, no entanto, pode trazer um cenário diferente para o produtor brasileiro, que paga mais pelos insumos –boa parte deles negociada em dólar.

No próximo ano, as benesses da valorização do dólar sobre os preços de vendas, em reais, deverão desaparecer. Ou, pelo menos, não ter a mesma intensidade do cenário atual.

O produtor norte-americano vive situação contrária à do brasileiro. O preço médio da soja recuou para US$ 9,96 por bushel (27,2quilos) em julho, 24% menos do que recebia em igual período de 2014.

O mesmo ocorre com o milho, cujo valor médio teve queda de 6% no período, recuando para US$ 3,80 por bushel (25,4 quilos).

Outra divergência entre os dois mercados são os custos. Enquanto o dólar vem salgando os preços dos produtos utilizados pelos produtores brasileiros nesta nova safra, a 2015/16, os norte-americanos pagam menos pelos insumos.

Os custos de produção recuaram 4% nos Estados Unidos nos últimos 12 meses terminados em julho.

Os norte-americanos têm alívio nos preços dos combustíveis, que estão 35% mais baratos para os produtores, o que não ocorre no Brasil.

Eles se beneficiam, ainda, da redução internacional dos preços de fertilizantes e de produtos químicos. Desta vez, o dólar funciona do lado deles.

A queda do adubo é de 6% para os norte-americanos, enquanto os produtos químicos caem 3% em 12 meses.

O principal setor a ser beneficiado é o de proteínas. Devido à queda não só desses itens, mas também dos preços dos grãos. Os custos do setor já caíram 5% em um ano.

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Complexo soja As exportações do setor deverão render US$ 25,5 bilhões neste ano, um valor menor do que os US$ 31,4 bilhões do ano passado, mas acima do que se previa inicialmente.

Grãos As receitas com a soja em grãos serão de US$ 19,1 bilhões no ano, segundo a dados divulgados nesta segunda-feira (31) pela Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).

Volume O maior volume a ser exportado –50,3 milhões de toneladas– e uma recuperação dos preços nos últimos meses permitiram um ajuste para cima dessas receitas.

Farelo O esmagamento de 40,1 milhões de toneladas de soja vai permitir ao país exportar 15,2 milhões de farelo de soja, segundo a Abiove. As receitas serão de US$ 5,5 bilhões com o produto, enquanto as com óleo de soja ficam em US$ 936 milhões.

Recuo O valor da arroba de boi gordo caiu para R$ 145 nesta segunda-feira (31) em São Paulo, segundo a Informa Economics FNP.

Suínos A arroba de suíno tomou rumo contrário e subiu 2% no dia. Foi a R$ 70,8 no mercado paulista, aponta pesquisa da Folha.

Safra As lavouras de milho dos EUA tinham 68% de condições boas e excelentes neste final de agosto. Em 2014, eram 74%. Já as condições da soja, neste mesmo critério, atingem 63%, ante 72% em 2014, segundo o Usda (Departamento de Agricultura dos EUA).

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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4 comentários

  • Carlos Massayuki Sekine Ubiratã - PR

    Para a próxima safra para a qual o produtor já adquiriu os seus insumos há alguns meses, o impacto não vai ser tão grande..., porém para a safrinha 2016, seja ela de soja ou de milho, e para a safra 2016/2017 o impacto deverá ser muito maior.... Já pagávamos pelas máquinas, fertilizantes, produtos químicos, óleo diesel e frete mais caros do mundo. Com a alta do dólar e a queda das cotações em Chicago, esses custos se tornarão insuportáveis. Provavelmente a soja ainda vai manter alguma margem, pelos menos em regiões mais próximas aos portos, mas a situação do milho é mais complicada. As já apertadas margens para a produção do grão deverão se reduzir ainda mais ou vão para o negativo. Não é a primeira vez que isso acontece. Na safra 03/04 o preço da soja chegou a R$52,50/sc para o produtor aqui em Ubiratá-PR, embalado pela alta do dólar provocada pela chegada do PT ao poder. Para quem soube aproveitar o bom momento para vender foi um ótimo ano, mas a maioria ficou esperando por preços maiores ainda, que acabaram não acontecendo. Na safra seguinte os custos foram feitos com o dólar ainda em alta e a soja caiu para R$27,00/sc juntamente com a queda da cotação do dólar. Foi um ano difícil para o agricultor que, como muitos devem lembrar, saiu para as rodovias com seus tratores para protestar contra os altos custos e os baixos preços. Já vivi o suficiente para saber que o melhor mesmo é a estabilidade. A instabilidade pode ser boa para os especuladores lucrarem, mas não é o caso da agricultura, que leva um ano para fechar um ciclo. Além disso, o produtor aproveita pouco os picos de preço porque normalmente não vende na alta. Já na baixa ele é obrigado a vender para honrar as contas.

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    • Marcelo Luiz Campina da Lagoa - PR

      Na crise temos que dar nosso pulos. Agricultor vai ficar mais criterioso na hora de comprar insumos e máquinas. Vai perceber que muitas coisas que usa hoje em dia é supérfulo . Vendedores de produtos que chamamos de "perfumaria" terão vida difícil. Adubação terá que ser muito criteriosa. Neste cenário, a figura do agronômo competente vai se firmar. Vamos sofrer sim, mas não troco de lugar com nenhum outro segmento (exceto bacário rsrsrs). A safra brasileira ainda nem foi plantada e a americana nem está salva. Tudo pode mudar em questão de semanas na agricultura.

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    • Carlos Massayuki Sekine Ubiratã - PR

      Realmente Marcelo, tudo pode mudar mas precaução e caldo de galinha nunca fizeram mal a ninguém. É hora de rever os custos e expurgar os supérfluos e as ineficiências.

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  • Rodrigo Polo Pires Balneário Camboriú - SC

    Para quem ainda acredita que desvalorização cambial é boa para o setor produtivo, leia o artigo de Mauro Zafalon.

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  • Rodrigo Polo Pires Balneário Camboriú - SC

    Hélio Schwartsman (comentarista da FOLHA) tenta enrolar dizendo que a receita para o País varia de acordo com os interesses de setores e que deve ser liderada por politicos. Os mesmos politicos que quebraram o Brasil. Com isso quer escamotear o fato de que o Estado deve se manter fora da economia, não deve interferir e ponto. Que cuide da inflação e estabilidade da moeda e já é demais. Nada de levar em conta interesses politicos, nem de setores economicos, o Brasil precisa ser um País com ampla liberdade economica, liberdade individual, sem a interferencia de governos e grupos politicos favorecendo este ou aquele setor. Isso não funciona e já está mais que provado.

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  • Dalzir Vitoria Uberlândia - MG

    Produtores do Brasil... não esperem para reduzir custos.. tomem as decisões rápido para não chorar depois... com safras normais os preços vão continuar de arrasto e o a transformação de dólar em real que foi favoravel nestes últimos 6 meses, mas no médio e longo prazo devem cair e aí o preços em real já era... demitam.. enxuguem... reduzam estoques.. vendam ativos ou equipamentos sem uso..investimentos só os taxa de retorno rápido e seguro o retante deles esqueçam por enquanto.... não façam igual o PT fez com Brasil.. não esperem quebrar para achar saidas.. a hora é agora e pra ONTEM...

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