Lula é aconselhado a admitir que reforma de sítio foi um 'presente'. "O homem está abatido"

Publicado em 05/02/2016 02:07 e atualizado em 05/02/2016 02:45
por MARINA DIAS e DANIELA LIMA, da sucursal DE BRASÍLIA da Folha de S. Paulo + UOL + EL País

 

Atingido pela maior crise desde que deixou a Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva está sendo aconselhado por aliados e integrantes do governo Dilma Rousseff a adotar oficialmente a tese de que "recebeu de presente" a reforma feita no sítio que frequenta em Atibaia (SP).

Essa linha de defesa ainda divide opiniões dentro do próprio PT e no entorno dele. Primeiro, há o temor de que as bases do partido não recebam bem esse discurso, que foge à tese de que a cúpula petista age em favor da legenda, não em benefício próprio.

O segundo empecilho está no fato de a Odebrecht já ter avisado que não assumirá publicamente que custeou a reforma. A decisão foi tomada internamente pela empreiteira e comunicada a pessoas próximas a Lula.

Reportagem da Folha revelou que, segundo testemunhas e depoimentos colhidos pelo Ministério Público, uma espécie de consórcio informal de empresas (Odebrecht, OAS e Usina São Fernando) dirigidas por amigos do ex-presidente bancou as obras.

A ex-dona de uma loja de material de construção em Atibaia disse que a Odebrecht bancou R$ 500 mil em produtos para a obra. Um engenheiro da construtora admitiu ter participado da reforma, em "caráter informal".

O Instituto Lula diz que o ex-presidente frequenta o local, de propriedade de amigos da família, em dias de descanso. Um dos interlocutores do petista ouvido pela reportagem resumiu o estado de ânimo dos personagens envolvidos na aquisição e reforma do sítio: todos estão "em pânico" com o caso.

Ainda assim, pessoas próximas a Lula já começaram a testar a teoria. Como publicou a Folha nesta quinta (4), o ex-ministro Gilberto Carvalho, bastante próximo a ele, disse que seria "a coisa mais normal do mundo" se a Odebrecht tivesse bancado a reforma do sítio.

Nos bastidores, desde que o caso ganhou atenção, petistas de primeiro escalão têm citado que, entre ex-presidentes dos EUA, por exemplo, é comum o recebimento de presentes após o mandato.

No caso de Lula, a reforma começou no fim de 2010, quando ele ainda ocupava o Planalto. Para rebater esse ponto, Carvalho disse que a primeira vez que Lula esteve na chácara foi em 2011.

'VERDADE'

Ex-secretário-geral da Presidência, Carvalho se antecipou ao movimento que estava sendo gestado nos bastidores com sua declaração, e integrantes do PT começam a defender "a divulgação da verdade" sobre o sítio.

"Se isso de fato for confirmado, não há nenhuma irregularidade. Não houve enriquecimento próprio. Lula nunca se preocupou com isso", disse Marco Aurélio Carvalho, coordenador do setorial jurídico do PT.

A série de suspeitas lançadas sobre Lula e sua família nos últimos meses mudaram o modo como o ex-presidente costuma reagir às crises. Pessoas próximas contam que Lula chegou a chorar ao falar das investigações que envolvem seu filho Luis Cláudio, na Operação Zelotes.

Quem esteve com o ex-presidente recentemente diz ter encontrado um homem "abatido" e "estarrecido". O retrato assusta aliados pelo contraste que faz com o Lula "de ontem", que se mostrava disposto ao enfrentamento.

ATIBAIA, SP, BRASIL, 21-04-2015: Imagem aerea do Sitio Santa Barbara (Estrada do Clube da Montanha, 4.891, bairro Portao), apontado por vizinhos como sendo do ex presidente Luis Inacio Lula da Silva. (Foto Jefferson Coppola/Revista Veja) ***FOTO EMBARGADA, consultar Fotografia, foto com custo alto*** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Sítio frequentado por Lula em Atibaia (SP)

 

DELAÇÃO DA ANDRADE GUTIERREZ – Estão em pânico Dilma, Lula, Lulinha e o PMDB do Rio

Consta também que Marques de Azevedo vai contar que a antiga Telemar, hoje Oi, comprou 30% da Gamecorp, a empresa criada por Lulinha, a pedido de Lula. A operação custou R$ 5 milhões. Três anos depois, o então presidente mudou a lei de telecomunicações com o fito exclusivo de permitir que a Telemar comprasse a Brasil Telecom, de Daniel Dantas

O pânico atinge o pico nas hostes petistas, especialmente na ala dilmista, com a delação premiada fechada por Otavio Marques de Azevedo e Elton negrão, diretores da Andrade Gutierrez. Ali pode estar o caminho mais curto entre Dilma e o fim antecipado do seu mandato. O PMDB do Rio, ou parte dele, parece que não terá, também, motivos para festejar.

A ser verdade o que vaza aqui e ali, a dupla teria informações a oferecer sobre o financiamento da campanha de Dilma em 2014 — e o intermediário da negociação pouco republicana teria sido Edinho Silva, atual ministro da Comunicação Social —, sobre o setor elétrico, sobre a construção dos estádios da Copa do Mundo e sobre obras da Olimpíada, no Rio.

Sempre Edinho
O que se ventila sobre Edinho é muito semelhante ao que denunciou Ricardo Pessoa, dono da UTC. Ele diz ter sido procurado pelo então tesoureiro da campanha de Dilma para lembrar os muitos negócios que a empreiteira mantinha com a Petrobras. Pessoa entendeu o recado e resolveu doar R$ 10 milhões. Foram entregues R$ 7,5 milhões. Os outros R$ 2,5 milhões se frustraram porque Pessoa foi preso.

 

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Com a Andrade Gutierrez, ter-se-ia dado o mesmo, mas de forma mais agressiva. O comando da empresa teria sido lembrado que, embora tivesse grandes negócios com o Estado, apoiava a candidatura do tucano Aécio Neves. Se foi assim, a pressão deu resultado: de agosto a outubro de 2014, a empresa doou R$ 20 milhões à campanha de Dilma. Quando Edinho foi falar com Marques de Azevedo, a empreiteira já teria doado R$ 5 milhões à campanha de Aécio e nada para a petista.

Consta também que Marques de Azevedo vai contar que a antiga Telemar, hoje Oi, comprou 30% da Gamecorp, a empresa criada por Lulinha, a pedido de Lula. A operação custou R$ 5 milhões. Três anos depois, o então presidente mudou a lei de telecomunicações com o fito exclusivo de permitir que a Telemar comprasse a Brasil Telecom, de Daniel Dantas.

Vamos ver. Parece que vem coisa pesada por aí. Por isso, convém que aqueles que acham que Dilma conclui o mandato só em 2018 coloquem as barbas de molho. Por causa do impeachment? Também, mas não só.

Uma das ações que tramitam no TSE pedindo a cassação da chapa Dilma-Temer acusa o PT justamente de uso de dinheiro irregular na campanha. Se foi como se diz por aí, tem-se uma prova testemunhal importante, que deve e vai ser levada em conta no TSE.

 

Carlos Alberto Sardenberg: O fator Lula

Publicado no Globo

Esqueçam o impeachment, ao menos por ora. Há uma questão anterior: quais as chances de a presidente Dilma governar com um mínimo de eficácia? Se ela não conseguir, não apenas volta a ameaça de impeachment, como surgirão articulações para algo como uma renúncia mais ou menos forçada — que ocorre quando o presidente fica inteiramente isolado, sem a menor capacidade de governar.

Pois essa situação pode estar mais perto do que muitos pensam, por dois motivos. O primeiro: o governo é ruim e está muito difícil recuperar eficácia. O segundo é Lula. Se a Lava Jato apanhar o ex-presidente, derrete toda a estrutura construída em torno dele, incluindo Dilma e sua presidência.

É uma especulação, claro, mas… enfim, eis a coisa.

No dia a dia, todo governo funciona no automático. A burocracia mantém os programas existentes, até consegue tocar algumas obras.

Mas não é disso que se trata. Não estamos em um período normal. A presidente e seu pessoal precisam apagar o incêndio e, ao mesmo tempo, desenhar e refazer o edifício. Para a crise imediata, Dilma precisa arranjar dinheiro para fechar as contas deste ano. É como se estivesse no meio da tarde ainda sem o dinheiro da janta.

Para isso, a presidente conta, publicamente, com a CPMF, que precisa ser votada até maio. Fora do Congresso, ela conta também com a venda de prédios e outros ativos, coisa que depende da eficácia do governo e, claro, da disposição do mercado. Na Câmara e no Senado, não existe a maioria de três quintos exigida para a aprovação da CPMF. E não existirá enquanto o governo não der provas de que está vivo, atuante e com perspectivas. O que depende, e muito, do dinheiro da CPMF…

A venda de ativos e leilões de rodovias, aeroportos e outros serviços é uma privatização meio avacalhada, feita em um momento ruim. Aliás, como a privatização patrocinada pela Petrobras. Está torrando patrimônio para tapar o caixa e tudo com base em decisões exclusivas da diretoria. Mas, enfim, quando falta dinheiro, parece que vale tudo.

Precisa de competência, porém.

Está em falta. Na mensagem ao Congresso em 2015, Dilma prometeu leilões de rodovias e a terceira fase do Minha Casa Minha Vida. Está prometendo de novo, igualzinho.

Resumo: não vai conseguir debelar o incêndio, as contas públicas continuarão no buraco.

Acabou?

Ainda não. O país pode estar na pior, o governo meio parado, mas se há um presidente respeitado e que aponte um caminho crível, as expectativas melhoram imediatamente. A Argentina de hoje, por exemplo.

No nosso caso, a presidente Dilma precisa apontar um caminho que leve a três destinos: uma reforma estrutural das contas públicas; o controle da inflação; a retomada do crescimento e do emprego.

É muita coisa ao mesmo tempo. E Dilma só tem proposta para o primeiro destino: a reforma da Previdência. Mesmo assim, trata-se de uma proposta ainda secreta, não especificada. A presidente e seu ministro da Fazenda apontaram alguns temas gerais, que contam com forte, e explícita, oposição dentro do governo, do PT e da base aliada.

Para a inflação, o Banco Central perdeu a autoridade. Para a retomada do crescimento, tudo que o governo conseguiu foi juntar uns R$ 80 bilhões para novos créditos. É pouco dinheiro e, ainda assim, não há tomadores dispostos a pegar os recursos. Aliás, parte daqueles 80 bilhões está parada faz tempo nos cofres do FGTS.

Resumo: continua o ambiente de recessão e inflação alta.

Em cima disso, vem o fator Lula. Todo mundo pergunta: será que ele vai ser preso? Isso, claro, terminaria de enterrar o PT e todos seus aparelhos.

Mas a prisão não é uma condição essencial. Bastaria Lula tornar-se réu na Lava Jato, em Curitiba, em um processo consistente, com provas fortes e de fácil entendimento da população, tipo ganhar um sítio, um apartamento em troca de favores com dinheiro público.

Mesmo sem isso, à medida que as investigações e denúncias aparecem, o ex-presidente fica cada vez mais isolado. Não por acaso, parlamentares do PT e ministros de Dilma saíram em campanha por Lula nos últimos dias. Sabem que aí está uma questão de vida ou morte.

Suponhamos agora que ocorra tudo isso: o governo não sai do buraco, a economia patina e Lula é apanhado. Todo mundo, na política, vai querer se afastar do PT, do ex-presidente e, pois, de Dilma. Aliás, ela também pode querer se afastar, mas para ficar de que lado, com quem?

Nesse momento, volta a ameaça do impeachment e aparece a articulação para se encontrar algum meio de substituir a presidente. Por quem? Aí já estão querendo especular demais — mas que aparece alguém, aparece.

Tudo considerado, o fator Lula é o decisivo. É a peça que falta para fechar um quadro de insustentabilidade do governo Dilma. Para variar, a história está também aqui com a Lava Jato.

 

Tragédia industrial, editorial da FOLHA

A indústria fechou o ano passado com queda de 8,3%, o pior resultado desde 2003. A retração, tanto mais grave, não constitui fato isolado; representa apenas o capítulo mais recente de uma longa história de problemas e erros que derrubaram a produção ao nível do começo deste século. É possível contar essa tragédia em três atos.

O primeiro, grosso modo, vai de 2003 a 2007, quando a manutenção de uma política econômica responsável em um contexto de forte crescimento mundial e custos internos baixos permitiu bom desempenho da indústria.

O setor avançou em média 4% ao ano, impulsionado pelo aumento da demanda doméstica e pela exportação de manufaturados.

O Brasil colhia então os frutos da estabilização econômica, com salários internos competitivos e valorização aceitável do real. Foi possível expandir inclusive a indústria mais sofisticada, como o segmento de máquinas e equipamentos.

O quadro começa a mudar a partir de 2008. Como reação à crise internacional, o governo Lula (PT) acelerou o gasto público, multiplicou o crédito dos bancos oficiais e passou a intervir cada vez mais nos vários campos industriais, no intuito de proteger mercado e forçar a nacionalização de componentes.

Verdade que a indústria se recuperou nos dois anos seguintes, acompanhando o restante do mundo. Mas o êxito momentâneo levou o governo a imaginar que havia descoberto um atalho para o desenvolvimento, por meio do dirigismo estatal e do fechamento da economia ao comércio internacional –nada mais equivocado.

O último ato tem início em 2011, quando a produção estagnou. A principal causa foi a política econômica, que suscitou aumento de salários e custos acima da produtividade, juros altos e valorização extrema do real, tudo para prejuízo da competitividade.

Vendo a indústria brasileira patinar, o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) dobrou a aposta no intervencionismo –perdeu, e não faltaram alertas nesse sentido.

A derrocada foi tamanha que restou demonstrado de forma cabal o equívoco da estratégia adotada. Nisso, aliás, talvez resida o único aspecto positivo dessa história: não há como deixar de procurar uma correção de rumos.

Parece formar-se um consenso, inclusive nos meios empresariais, de que o caminho passa necessariamente pela abertura e pela integração às cadeias globais de produção, sem o que não haverá competitividade possível.

O câmbio já se ajustou; os salários começam a fazê-lo. É preciso trabalhar na agenda da produtividade e celebrar acordos comerciais que abram novos mercados.

 

A goleada dos pessimistas

por RAQUEL LANDIM

Em um pequeno comício na Central Única dos Trabalhadores (CUT) em São Paulo, a candidata à reeeleição Dilma Roussef afirmou em meados de 2014 que "como na Copa, vamos dar de goleada nos pessimistas".

A crítica aos "pessimistas de sempre" sobre a economia brasileira se tornou um mantra da campanha, com a presidente pedindo aos cidadãos que não acreditassem nessas "profecias".

A verdade é que Dilma foi profética, mas não da maneira que pensou. Ao invés de calar seus críticos, como ocorreu na organização da Copa, ela está assistindo o Brasil perder de 7x0 na economia.

Os "pessimistas" acertaram quase todas suas "profecias", mas muitas vezes não imaginavam o tamanho do buraco. Chegaram a ser otimistas. Vejamos os "gols".

- Primeiro gol: os pessimistas disseram que a crise estava "contratada" e que o país entraria em recessão. Só não previram que o PIB cairia 4% em 2015, seguindo em queda em 2016.

- Segundo gol: os pessimistas disseram que a inflação ultrapassaria o teto da meta de 6,5%. O IPCA ficou acima de 10% e a alta de preços não dá sinais de significativo arrefecimento, apesar da recessão.

- Terceiro gol: os pessimistas diziam que a gastança do governo para subsidiar alguns setores criaria um rombo nas contas públicas. Pois é.

- Quarto gol: os pessimistas apostavam que o Brasil corria o risco de perder o selo de bom pagador das agências internacionais. Mas não sabiam que isso ocorreria ainda em 2015.

- Quinto gol: os economistas diziam que a falta de confiança no país poderia desvalorizar o real, mas nenhum artilheiro acertou o chute. O dólar chegou a R$ 4,00.

- Sexto gol: os analistas alertaram que o congelamento do preço da gasolina comprometeria a Petrobras. Com os danos da Operação Lava Jato só começando, não dava para sonhar que a ação cairia abaixo de R$ 5,00.

- Sétimo gol: os pessimistas diziam que os fundos de pensão estatais estavam sendo utilizados politicamente para
financiar projetos inviáveis.

Apenas um exemplo: a Sete Brasil, que construiria dezenas de plataformas de petróleo, está praticamente quebrada, deixando o prejuízo para os fundos e seus sócios.

Agora vamos dar uma chance ao governo, que marcou um gol. O apagão de energia elétrica previsto pelos pessimistas não aconteceu. Isso porque a economia encolheu tanto que até a precária infraestrutura brasileira está dando conta.

O maior problema é que, ao contrário do 7x1 da Alemanha, o jogo ainda não terminou e ninguém sabe quantos gols os "pessimistas" ainda vão marcar. Haja coração!

 

A primeira derrota

por BERNARDO MELLO FRANCO

Bastou uma votação. No primeiro teste importante do ano, o governo voltou a ser derrotado no plenário da Câmara. Aconteceu na noite de quarta, quando os deputados derrubaram parte da medida provisória que aumenta o Imposto de Renda sobre ganhos de capital.

Hoje o governo cobra uma alíquota fixa de 15% sobre o lucro na venda de bens e direitos. Quem vende uma quitinete pagava o mesmo que o dono de uma mansão. O Planalto queria criar faixas de tributação progressiva. A máxima, para lucros acima de R$ 20 milhões, chegaria a 30%.

Não deu certo. Por 223 votos a 141, a Câmara aprovou uma alteração feita pelo senador Tasso Jereissati, do PSDB, que reduz a maior alíquota para 22,5%. A mudança vai custar caro ao Tesouro. O governo calcula que perderá metade do R$ 1,8 bilhão que planejava arrecadar a mais por ano com a taxação dos milionários.

O fracasso do Planalto não foi uma vitória da oposição. Quem derrotou o governo foi o próprio governo. Ou a chamada base governista, que abocanha nacos da máquina federal.

À exceção das siglas de esquerda, como PT e PDT, o boicote foi maciço. Dos 32 deputados do PSD, que controla o cobiçado Ministério das Cidades, só um votou a favor do texto enviado pela presidente Dilma. "Nós somos da base, mas não apoiamos o aumento de impostos", justificou-se o líder do partido, Rogério Rosso.

O resultado assustou o Planalto. Mais que desidratar uma medida provisória, a Câmara deu um recado de que continua hostil a propostas para aumentar a arrecadação. Isso ocorreu apenas um dia depois de Dilma visitar o Congresso e pedir uma "parceria" para equilibrar o orçamento. "Foi apenas um ensaio do que virá contra a CPMF", comemorou o novo líder do DEM, Pauderney Avelino.

No caso da tributação de ganhos de capital, a festa também é do andar de cima. Como o buraco nas contas terá que ser fechado de algum jeito, a conta deve sobrar, mais uma vez, para a classe média e os trabalhadores.

 

MPF reabre o inquérito sobre os caças Gripen, POR JOSIAS DE SOUZA (UOL)

O Minitério Público Federal decidiu reabrir um inquérito que apura suspeitas de corrupção na compra de caças suecos Gripen pela Força Aérea Brasileira. Os aviões foram adquiridos da empresa sueca SAAB, em outubro de 2014, ainda no primeiro mandato de Dilma Rousseff. Custaram R$ 4,748 bilhões. Deve-se a reabertura do caso ao surgimento de novos indícios de irregularidades, no âmbito da Operação Zelotes.

Os caças entraram no radar da Procuradoria da Republica, em Brasilia, por conta de suspeitas de superfaturamento. Em seis meses de investigação, não foram encontrados elementos que justificassem a abertura de ação judicial. Por isso, o processo descera ao arquivo em agosto de 2015. O arquivamento já havia sido inclusive homologado pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, em outubro de 2015.

O desarquivamento do inquérito foi determinado pelo procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes. Em seu despacho, datado de 1 de fevereiro, ele anota que tomou a decisão em virtude da “superveniência de novos indícios que colocam em dúvida a idoneidade da contratação da empresa SAAB”.

O procurador menciona a descoberta, feita pela força-tarefa da Zelotes, de que o contrato firmado com SAAB pode não ter seguido apenas critérios técnicos. Suspeita-se da “influência indevida” exercida sobre autoridades brasileiras pelo lobista Mauro Marcondes e por sua mulher, Cristina Mautoni. Preso desde outubro de 2015, o casal já responde a uma ação penal no caso Zelotes.

Ao reabrir a apuração sobre os caças, o procurador Anselmo Henrique requisitou novas informações ao Ministério da Defesa e ao fabricante sueco. E solicitou à força-tarefa da Zelotes o compartilhamento dos documentos e informações que se referem ao caso. Será atendido. A investigação sobre os aviões militares corre na Divisão de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal.

 

Notas oficiais do Instituto Lula desnudaram Lula, ´pr JOSIAS DE SOUZA (UOL)

 

Há uma originalidade perversa nas notas oficiais do Instituto Lula. Elas transformam Lula numa caricatura burlesca do velho mito. É como se os textos tivessem a missão inconsciente de desnudar Lula. Desvendam a promiscuidade imobiliária do personagem confessando-a em conta-gotas.

As notas do Instituto Lula travam uma relação instável com a verdade. Tratam o noticiário como ficção urdida para difamar o grande líder. Escoram seus desmentidos em meias verdades, realçando exatamente a metade que é mentira. A absoluta verdade, só em caso de última necessidade.

Nas notas do Instituto Lula, a verdade não só é muito mais incrível do que a ficção como é muito mais difícil de inventar. Tamanho é o desejo de criar uma verdade particular para Lula, que os textos mentem mal. Ao tentar remendar a situação, deixam as mais espantosas pistas.

Na primeira versão, Lula não era dono do triplex do Guarujá. Sua mulher Marisa adquirira apenas uma cota-parte da Bancoop. E o advogado da família não tinha a mais remota ideia de que uma empreiteira enrolada na Lava Jato reformara o apartamento que o Ministério Público suspeita pertencer ao clã dos Silva.

Na penúltima versão, as meias verdades anteriores aproximaram-se dos fatos narrados pelas testemunhas inquiridas pelo Ministério Público. Súbito, a cota-parte de Marisa transformou-se no apartamento 141, uma unidade padrão do prédio do Guarujá. Que ela comprara da Bancoop na planta, em 2005.

A mulher de Lula pagara as prestações do imóvel até 2009. Nesse ano, a cooperativa foi à breca. E a OAS assumiu a obra. Sustenta-se que Marisa não quis aderir ao novo contrato com a empreiteira. Ainda assim, preservou o direito de requerer seu dinheiro de volta a qualquer tempo.

Nesse novo enredo, o célebre triplex foi visitado por Lula e Marisa. Ciceroneou-os ninguém menos que Léo Pinheiro, o dono da OAS. O casal avaliou que, como estava, o imóvel não interessava. A empreiteira investiu quase R$ 1 milhão para adaptar o triplex. Instalou-se até elevador privativo.

Admitiu-se que Marisa e o filho Fábio Luís, o Lulinha, visitaram o triplex durante as obras. Sonegou-se o número de vezes. O Instituto Lula absteve-se também de esclarecer se as obras foram realizadas por encomenda dos Silva. Informou-se apenas que a família desistiu de comprar o triplex, mesmo reformado.

Por quê? Lula e Marisa abespinharam-se com o noticiário infundado, apinhado de boatos e ilações. Em novembro de 2015, solicitaram a devolução do dinheiro investido, com desconto de 10%, nas mesmas condições dos outros cooperados que não aderiram ao contrato com a OAS.

Mesmas condições? Lorota. A nenhum outro cliente foi concedida a prerrogativa de esperar seis anos para pedir a devolução da grana. Os outros tiveram de fazer a opção em 2009. Curiosamente, o distrato que teria sido assinado por Marisa em 2015 consta de um documento de 2009. Coisa da Bancoop. Resta saber como uma cooperativa quebrada ressarcirá a família Silva.

Nenhum outro casal visitou o edifício na companhia do empreiteiro Léo Pinheiro. A OAS não mandou remodelar nenhuma unidade além do triplex 164-A. Empreteiro que derrama quase R$ 1 milhão numa reforma sem exigir o compromisso de compra do imóvel é coisa jamais vista na história desse país.

A pretexto de desmentir as relações promíscuas de Lula com a OAS, a entidade de Lula terminou reforçando-as. Nesse tipo de ligação, a alma do negócio é o segredo. O ziguezague das notas do Instituto Lula avilta a alma do negócio. Especialistas no ramo, como Paulo Maluf, têm a manha da coisa. Lula não. Maluf jamais modifica versões.

Ao fornecer suas verdades em suaves prestações, o Instituto Lula rompe a normalidade de um modelo de transgressões secular. Em menos de duas semanas, Lula foi metido em narrativas imobiliárias que o acomodaram num apartamento à beira mar, ao lado de um empreiteiro tisnado pela corrupção, e o transformaram em visitante contumaz de um sitio em Atibaia reformado por uma construtora cujos executivos suam o dedo na Lava Jato.

Sempre tão loquaz, Lula deveria convocar uma entrevista para assumir sua própria defesa. Só um suicida terceirizaria a tarefa ao didatismo revolucionário dos redatores do Instituto Lula.

 

Reverência brasileira

Por JUAN ÁRIAS, no EL PAÍS

Uma conversa informal com a jovem universitária de São Paulo Mariana Esteves confirmou a tese, defendida por não poucos brasileiros, que ainda existe nessa sociedade uma excessiva reverência ao poder, e que a estudante atribui ao fato de que o Brasil é um país que “foi construído pelas vítimas”.

A tensão política, no amanhecer de 2016, se aprofunda na cúpula e esfria na rua, de acordo com algumas pesquisas de opinião. Os indignados com o Governo começam a encolher, enquanto seus defensores anunciam sua saída às ruas.

Os programas de humor e de sátira política praticamente desapareceram da televisão, embora tenham sido parcialmente recuperados nas redes sociais. A sátira é, no entanto, o sal que impede que a democracia se corrompa.

A gravidade da crise que o Brasil atravessa é manifesta e está sendo apontada pela imprensa internacional; os escândalos de corrupção aumentam em número e gravidade a cada dia, enquanto os indignados diminuem.

Por quê? Cansaço ou desencanto com a imobilidade dos responsáveis por tirar o país do atoleiro? Paralisia da oposição que parece dormir tranquila, alheia ao terremoto em andamento?

Talvez, mas também pelo fato de ainda existir incrustada na sociedade uma exagerada reverência com os poderes políticos, econômicos e até religiosos.

Isso não é dito pelo jornalista. Aparece na consciência de brasileiros de várias classes sociais que confirmam essa dificuldade de criticar a autoridade com a qual preferem compadrar.

Apesar da falta de credibilidade oferecida hoje pelos políticos e seus partidos, o Brasil é um país com uma democracia mais acostumada a queimar incenso aos pés do poder do que exigir satisfações deles.

É tal a dificuldade de confrontar e vigiar as autoridades que até os jornais que exercem sua função cívica e social de ser a consciência crítica do poder são considerados oposição. Os jornalistas existem, no entanto, para serem porta-vozes da sociedade, não do poder. Para trazer à luz o que os poderosos tentam esconder.

Em qualquer democracia desenvolvida, os estudantes universitários costumam ser, por exemplo, uma das vozes mais críticas ao Governo.

Em Brasília se viu, no entanto, como algo normal que a jovem presidenta da União Nacional dos Estudantes, Carmen Vitral, beijasse as mãos da presidentaDilma Rousseff em sinal de homenagem.

Que os jovens, pouco importando suas tendências políticas, saiam às ruas para aplaudir ou defender o Governo costuma geralmente ocorrer apenas em ditaduras.

Se o jovem é conformista com 20 anos, como será aos 60?

Estamos constatando isso com muitos velhos militantes de esquerda que lutaram contra a ditadura na juventude e hoje balançam no conservadorismo e na corrupção.

Se os jovens pecam por algo, deveria ser pelo ardor libertário e irreverente com os poderes, dos quais nunca recebem o que lhes faria justiça.

A universitária paulista que me confirmou a existência desse pecado de reverência exagerada ao poder que, disse, “os brasileiros tem no sangue”, é de uma família humilde que teve de trabalhar duro para conseguir ir para frente. Segundo ela, o Brasil é um país “que foi construído pelas vítimas” e não por pessoas que decidiram vir livremente para construí-lo juntas, como aconteceu em outras partes do mundo.

Os colonizadores europeus, em sua grande maioria, foram enviados à força ou chegavam à procura de pura aventura, vítimas e párias que eram em seus países de origem.

Depois vieram os milhões de africanos que serviram como escravos de mão de obra bruta e servil. Acabaram abandonados à própria sorte.

Todas essas vítimas criaram, segundo ela, uma mentalidade que implica reverenciar o poderoso, para ser menos castigado e humilhado, ou para obter alguma vantagem para as suas vidas difíceis e sem direitos.

“Hoje eu estou consciente de que precisamos nos libertar dessa necessidade de agradar o poder em vez de ser sua consciência crítica, mas não é fácil quando seus antepassados cresceram sob essa cultura do medo dos poderosos ou do ‘jeitinho’ [flexibilidade sem acatar muitas normas ou leis] para arrancar algumas vantagens, lícitas ou não”, explicou a jovem Mariana.

Em sua coluna no jornal O GloboMarcio Tavares D’Amaral escreveu há poucos dias: “Em nosso passado sempre houve quem nos dissesse que horas são”.

Permito-me tomar sua frase feliz para aplicá-la, embora em outro sentido, para indicar por que no Brasil ainda existe tanta reverência com os poderosos. Talvez porque as pessoas se acostumaram desde o início a que fossem eles que decidissem que hora marcava o relógio.

Terá chegado o momento em que o Brasil, em busca da modernidade, decida indicar a hora em que deseja viver uma democracia adulta, sem medo de expressar suas críticas e descontentamentos?

Não se chega a isso se deixamos que os interessados em manter seus privilégios e perpetuidade política continuem dizendo que horas marca o relógio.

Todo poder paternalista está mais perto de uma ditadura, embora velada, que de uma verdadeira democracia.

Se deixarmos o poder sem vigilância, ele continuará a nos impor a hora do seu relógio, mesmo à custa de sequestrar os nossos.

Pelo menos não nos coloquemos tão facilmente aos seus pés.

Seria o suicídio da democracia.

 

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Fonte:
Folha + UOL + El País

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