Semente salva, a quem interessa não permitir?, por Glauber Silveira

Publicado em 09/09/2013 17:43 e atualizado em 29/02/2020 18:28
Por Glauber Silveira, presidente da Aprosoja Brasil.

O produtor brasileiro tem assegurado por lei, por enquanto, o direito de salvar sua semente. Ou seja, ao comprar a semente para o plantio, a lei permite que após a colheita ele reserve parte da sua produção como semente para usar na safra seguinte. Porém, a permissão é apenas para uso próprio, sendo ilegal a venda como semente a terceiros, o que chamam de semente pirata.

O direito de salvar semente para o uso próprio é uma conquista dos brasileiros. Assim como na Europa, este é um direito que os produtores não abrem mão, mas em alguns países não é assim. Nos EUA, por exemplo, se um produtor salvar a sua semente ele vai preso, ou seja, lá o norte-americano se obriga, a cada, safra adquirir novas sementes de fornecedores.

Pois bem, existe um Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional, o PL 2.325 de 2007, que altera a Lei 9.456 de abril de 1997, a Lei de Proteção de Cultivares. Recentemente, foi aprovado um substitutivo ao projeto (texto diferente do que foi oferecido pelo relator) na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM). Este substitutivo, como está, é temerário aos produtores e ao Brasil, pois permite que os produtores salvem a sua semente por apenas um ano e para apenas 50% da sua área.

Estivemos discutindo sobre isto e entendemos que não podemos abrir mão de podermos salvar a semente que vamos utilizar em nossa produção. Entendemos, portanto, que precisamos remunerar a pesquisa e sabemos o quanto ela é importante para o avanço da nossa produtividade e, também, para vencermos os desafios, como pragas e doenças. Mas de forma alguma, podemos aceitar que o produtor seja escravizado por qualquer empresa que seja.

Claro que, o fato do produtor brasileiro salvar a própria semente gera conflitos - vem à justificativa que a pesquisa não é remunerada. O que não é uma verdade. Isso porque, os produtores entendem a importância de pagar e qualificar os estudos científicos. Além do mais, o fato de salvar a própria semente não significa que a pesquisa vai deixar de ser recompensada.

Agora, por outro lado vimos também empresas acomodadas, sem lançar novas cultivares. Sabemos que é preciso amadurecer nesta discussão, mas de maneira alguma vamos nos submeter à sermos integrados de qualquer empresa. Em um país como o nosso - agrícola, o governo deveria investir mais na pesquisa, investir na nossa Embrapa. Afinal, os governantes dizem que estão preocupados com as questões sustentáveis brasileiras.

O direito dos produtores salvarem sua semente é uma questão de segurança e equilíbrio do próprio mercado. Basta imaginarmos que duas ou três empresas dominassem o fornecimento de sementes no Brasil, o que não seria difícil, caso o produtor não pudesse salvar sua semente. Essas companhias poderiam colocar um preço muito alto e ainda que o produtor pudesse pagar, estaria tirando toda rentabilidade da atividade, ou seja, poderíamos ficar totalmente a mercê do mercado.

Há outros fatores agravantes nesta relação de sementes. Atualmente, temos o que chamamos de fornecedores de novas cultivares, conhecidos como os obtentores, e ainda há os multiplicadores, que são os sementeiros. Uma das grades preocupações que temos é que ocorra a concentração demasiada do fornecimento de sementes, situação possível de acontecer, caso os obtentores sejam também os sementeiros. O Brasil passa por um momento crucial de muitos interesses comerciais e de grande risco de monopólio, ou seja, a concentração exagerada na produção e distribuição de tecnologia. Assim as instituições representantes dos produtores devem estar atentas e os produtores também.

Imaginem, se os produtores não puderem salvar sua semente, esse mercado vai se concentrar muito, infelizmente essa situação já vem acontecendo. Outro problema que podemos ter é se tivermos novas cultivares sendo lançadas por apenas por duas ou três empresas multinacionais e elas resolverem criar suas próprias empresas multiplicadoras de semente. Vamos ter, desta forma, apenas a semente de duas ou três marcas, ou seja, a produção brasileira estará na mão dessas companhias multinacionais. Será que vamos permitir isto?

Temas como sementes e biotecnologia são muito polêmicos, afinal estamos falando em fatores que influenciam diretamente o futuro da produção e a liberdade dos produtores. Esses dois assuntos a nível mundial têm gerado muita reflexão, afinal as legislações dos países produtores podem, em único artigo dentro da lei, causar total dependência do produtor e acabar assim com a competitividade da distribuição de sementes. E, a pergunta que eu faço é a seguinte: isto seria bom pra quem?

Tags:

Fonte: Aprosoja Brasil

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Safra 2024 de café: hora de colher os resultados positivos do árduo trabalho do cafeicultor, Por Luis Guilherme Bergamin
Uma necessidade urgente, por Afonso Peche Filho e Thiago Pinto Pires
Secretaria da Fazenda de SP prorroga prazo para extinguir e-CredRural, por Douglas Guilherme Filho
Equidade na cana-de-açúcar: o caminho para um pagamento justo e sustentável
Safra 2023/2024 do Centro Sul: Aumento expressivo da moagem de cana foi principal fator na redução de 15,3% do custo do processamento industrial