Prof. Molion afirma que La Niña já está atuando e vai até 2019

Publicado em 15/09/2016 18:19
Em artigo ao Notícias Agrícolas, climatologista reafirma os efeitos do fenômeno

Segundo os critérios do Climate Prediction Center (CPC), atualmente o Pacífico está neutro, embora, já por 12 semanas consecutivas, sua temperatura apresente anomalias negativas. A previsão de consenso dos pesquisadores do CPC e do International Research Institute for Climate and Society (IRI) é que a chance de um La Niña se estabelecer a partir de agosto-outubro de 2016 é pequena. A previsão de consenso IRI/CPC é haja 55% de probabilidade que o Pacífico volte à neutralidade (Fig.1). Essa “previsão de consenso” é feita por modelos numéricos que sabidamente não representam adequadamente os processos físicos que controlam o clima global e, portanto, suas previsões são altamente limitadas, tendo enormes chances de serem erradas.

Figura 1. Previsão de El Niño-Oscilação Sul (ENSO, em Inglês) para a Região 3.4 do Pacífico até abril-junho de 2017. Barras: azul (La Niña), vermelha (El Niño) e verde (Neutro). Observe que a barra verde fica acima dos 55% (eixo vertical à esquerda) a partir de setembro-novembro de 2016.

Figura 2. “Pluma” das previsões do ENSO Região 3.4. São 17 modelos dinâmicos e 8 modelos estatísticos. O início é julho 2016 (OBS). Note que cada modelo dá resultados diferentes. O do SCRIPPS (linha azul claro com quadrados) prevê um La Niña semelhante ao de 1998-1999.

Veja, na Fig.2, o gráfico das previsões mais recentes. Observe que, a partir da data em que as previsões foram feitas (ponto preto=OBS), cada modelo (listados na lateral direita) resulta em previsão diferente, formando o que é conhecido como  “espaguete”. Se o modelo do SCRIPPS (linha azul claro com quadrados) for o da preferência do leitor dentre os 25 modelos, então a previsão é de um La Niña semelhante ao de 1998-1999, como mostrado na Fig.3, que usa os dados de anomalias de temperatura da Região Niño 3.4 do próprio CPC.

Figura 3. Comparação anomalias de temperatura (ATSM) dos El Niños de 1997-98 com as do 2015-16 para a Região 3.4. O eixo horizontal é o número de semanas desde janeiro de cada período e, o vertical, as ATSM. Observe que as ATSM de 2015-2016 praticamente se superpõem às de 1997-1998. 

Após junho de 1998, as ATSM persistiram negativas até janeiro de 2002 e o autor continua apostando que o La Niña vai ser semelhante ao de 1998-2001 e que pode persistir até 2019. Nos meses de setembro-outubro, as águas do Pacífico tendem a se aquecer e ter anomalias negativas menores, ou até positivas, porque o Sol está em cima dessa região. Porém, as águas sub-superficiais estão frias até cerca de 150 metros de profundidade em praticamente todo o Pacífico Equatorial e a convecção (formação de nuvens e chuva) está começando a se estabelecer na Indonésia no período de outubro-novembro. Essa última situação deve provocar o abaixamento da pressão atmosférica na região da Indonésia durante esse período e acelerar os Ventos de Leste que, por sua vez, vão aumentar a ressurgência de águas frias na costa oeste da América do Sul, dando continuidade, após abril-maio de 2017, ao La Niña que já começou a se estabelecer na terceira semana de julho de 2016.

Portanto, é necessário ter cautela com as afirmações que aparecem na mídia que “não há mais La Niña”. Em adição, a afirmação que aparece nessa notícia que “[A] atmosfera não se prende a rótulos. Seja fenômeno La Niña fraco, com desvio de -0,5°C, ou neutralidade com viés negativo de -0,4°C, -0,3°C, o padrão atmosférico seguirá o mesmo definido há alguns meses”, não encontra respaldo nos dados históricos de anomalias de climáticas. O conhecimento atual sugere que exista um atraso (“lag”) de 3 a 6 meses nas respostas dos outros oceanos ao processo El Niño/La Niña, dependendo de sua localização. A atmosfera é aquecida por baixo, ar em contato com a superfície, que é dominada essencialmente por oceanos (71%) na Terra. Se as TSM mudam em resposta ao processo El Niño/La Niña, o padrão atmosférico e o clima são forçados, pela superfície dos oceanos, a mudar. O Oceano Atlântico é a grande fonte de umidade para as chuvas do Brasil e os dados de agosto mostram que o Atlântico ainda está com anomalias de TSM positivas, o que sugere que o ano hidrológico 2016-2017, particularmente em seu início, será mais chuvoso que anos anteriores, embora os totais possam, ainda, ficar 10% a 20% abaixo da média dos últimos 70 anos em algumas áreas do país. Alerta-se o leitor para tomar cuidados com as notícias baseadas em resultados de modelos previsão pois, sejam eles dinâmicos ou estatísticos, geralmente erram! 

 

Luiz Carlos Baldicero Molion é PhD em Meteorologia e pesquisador aposentado do INPE/MCTI e professor aposentado da UFAL/MEC.

 

 

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