"Porque defendo a vendas de terras para estrangeiros", por Eduardo Lima Porto

Publicado em 26/12/2020 19:32 e atualizado em 28/12/2020 09:40
Em meio à polêmica do projeto de lei aprovado no Senado permitindo a vendas de terras para estrangeiros, o economista diretor da empresa LucrodoAgro publicou artigo onde defende o "legítimo direito do proprietário dar o destino que desejar às suas terras"

Com todo o respeito às opiniões divergentes, quero ressaltar que não estou afrontando aqui as pessoas, mas sim as idéias e, de forma respeitosa,  viso contribuir para a construção de um raciocínio benéfico. 

A minha discordância não pode ser tomada como “oposição generalizada”, mas como uma visão alternativa do processo que busca amplificar a análise dos prós e dos contras dessa proposta de Projeto de Lei que vem gerando tanta polêmica.

Alguém obrigará o Produtor Rural brasileiro, legitimamente constituído, a vender a sua propriedade a um investidor estrangeiro?

Essa pergunta é realmente importante de ser posta sobre a mesa e precisa ser respondida com honestidade.

Se houver qualquer sinal de imposição nesse sentido, estaremos realmente diante de um assunto que possui enorme gravidade e que atentará concretamente contra a soberania, não nacional, mas do direito individual.

Não me parece que seja o caso. Assim sendo, toda a discussão está girando em torno de um temor infundado, quase que infantil, na medida em que ninguém será coagido a fazer o que não quer.

Se fosse um proprietário de terras e estivesse interessado em vender a minha propriedade, avaliaria com muito interesse a possibilidade de vender para um estrangeiro e não para um brasileiro. Particularmente, me inclinaria a vender para o estrangeiro porque a chance de receber à vista de um brasileiro é remota e o risco de um calote numa transação a prazo é muito grande, dada a enorme flexibilização que se formou para permitir as Recuperações Judiciais de Pessoas Físicas no Agro, a qual impede a retomada do imóvel vendido e não pago porque afetará a “função social” do recuperando.

O impedimento de venda de propriedades aos estrangeiros limita brutalmente a capacidade do Produtor profissional de obter crédito no exterior, o que é um verdadeiro atraso e absoluto contra-senso num momento em que o mundo possui excesso de liquidez e taxas beirando o zero. 

Nessa linha, a legislação que veio se conformando nos últimos tempos protege em excesso o DEVEDOR no agro, prejudicando quem trabalha corretamente e não dá passos maiores do que as próprias pernas, pois tornou o processo de concessão de crédito uma verdadeira loteria e aumentou drasticamente a percepção de risco do setor. Não existe crédito sem garantias e sem segurança jurídica.

A questão dos investimentos estrangeiros em terras pode ser resolvida de forma inteligente e pragmática, sem dramalhões e muito menos com a provocação de incidentes diplomáticos desnecessários.

Basta que se estabeleçam vedações claras na legislação visando evitar algumas operações indesejáveis, como:

I - Não será permitido o investimento de estatais estrangeiras;

II - Não será permitido o investimento a partir de sociedades estrangeiras que possuam em sua estrutura de capital a participação de empresas e/ou fundos estatais;

Pelo que escuto das manifestações, o grande temor está centrado na possibilidade de aquisição de grandes áreas por parte de empresas chinesas. Isso se resolve facilmente com a inserção do princípio da reciprocidade na legislação. Países que não permitem o investimento de brasileiros em áreas agrícolas estão automaticamente vedados. Simples questão de acordo bilateral. Se não for assim, estaríamos impedindo o investimento de paraguaios no Brasil e como ficariam os milhares de brasileiros que produzem no Paraguai e Uruguai?

Superadas estas questões que afastariam definitivamente o temor do ingresso massivo de chineses no Brasil, a proibição dos investimentos significa um absoluto retrocesso e um ato que não visa proteger a “soberania”, mas sim a manutenção do atraso e a permissão da intromissão do Estado em questões privadas, tratando-se claramente de uma imposição verdadeiramente típica de países comunistas. O não reconhecimento desse aspecto pode ser decorrente da ignorância que pode ser sanada mediante a ampliação do conhecimento sobre o assunto. O que não pode ser curado é a chaga da desonestidade intelectual e a hipocrisia.

Qual é o verdadeiro problema de um estrangeiro investir no setor agropecuário brasileiro?

Por se tratarem de montantes significativos, o investimento se daria obrigatoriamente por via de uma empresa constituída no Brasil, cuja integralização de capital passaria 100% pelo crivo do Banco Central, como é de praxe em qualquer outro segmento da economia.

Como Pessoa Jurídica constituída no Brasil, mesmo que  detida por sócios estrangeiros, a empresa precisará seguir as leis brasileiras e as normas contábeis daqui.

Será virtualmente impossível para o investidor fazer as falcatruas tradicionais do setor, como pagar um valor “por dentro” e “outro por fora” na aquisição de uma fazenda, já que a legislação tipifica essa prática como LAVAGEM DE DINHEIRO, não só por aqui como em quase todos os países membros da OCDE.

Bons produtores deveriam aplaudir essa Lei porque a mesma valoriza os seus ativos a partir da ampliação do mercado (aumento da liquidez), além de apontar no médio prazo a perspectiva concreta de redução dos custos dos insumos (duvido que alguém aceite pagar 500% mais caro do que os preços médios internacionais), sem falar na percepção de risco do setor que tanto encarece o crédito, já que as transações se darão com maior transparência em função da obrigatoriedade dos estrangeiros operarem como estruturas empresariais formais.

Do ponto de vista macroeconômico, haverão benefícios importantes também porque estas operações não demandarão do “crédito oficial”, o qual poderá ser direcionado a quem realmente precisa desse suporte do Governo.

Estão igualmente equivocados os que pensam que haverá prejuízo para os “arrendatários” em função de uma suposta concorrência que elevaria os valores dos aluguéis a níveis incompatíveis. 

Uma empresa não irá pagar mais do que a capacidade econômica do cultivo permite, o que é uma verdadeira afronta à racionalidade mais básica. Acho totalmente improvável que um investidor que busca o retorno obtido na atividade principal se sujeitar a pagar 25 scs/ha de soja ou 35% da produção bruta por um arrendamento, como ocorre no RS, salvo se o objetivo principal for o de LAVAR DINHEIRO.

Por fim, quero deixar-lhes o registro da minha impressão pessoal sobre essa questão toda.

Me parece absolutamente improvável que investidores estrangeiros com o mínimo de racionalidade econômica e visão sobre gerenciamento de riscos queiram se expor a esse CABARÉ que chamamos de País, onde não existe segurança jurídica básica. Há que se dizer que no atual patamar de preços das terras, o horizonte de retorno sobre o investimento (payback) é superior a 50 anos.

Se assim não fosse, o que admito apenas para enriquecer a argumentação, a choradeira tradicional das lideranças do Agro de que o “Custo de Produção é maior do que a Receita” não passaria de estelionato. Ou estou errado? 

Por outro lado, há uma tremenda mobilização patrocinada por determinados segmentos profissionais que enriqueceram muito e continuam se beneficiando grotescamente do excesso de judicialização do setor. Claro está que precisam de uma multidão embrutecida de eternos quebrados para continuarem a prosperar, já que as suas atividades não são verdadeiramente "produtivas", mas sim  uma espécie de parasitismo mal parido que se locupleta no sistema caótico vigente. Na mesma esteira, temos a categoria dos políticos “emprenhadores de orelhas” que se elegem a partir do voto de uma legião cativada por frases socialistas, como “garantia de renda”, “preços mínimos”, etc.

A “soberania" que defendo é o sagrado direito de prosperar e de falir sem a interferência do Estado, sem artificialismos e nem subsídios classistas, com respeito verdadeiro à propriedade e aos princípios universais de moralidade.

Fonte: Eduardo Lima Porto

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