Fardo pesado, por Rogério Arioli

Publicado em 13/03/2013 18:34 e atualizado em 04/03/2020 15:34
Por Rogério Arioli, engenheiro agrônomo e produtor rural.
Ensina a mitologia grega que o titã Atlas foi condenado por Zeus a carregar para sempre nas costas os céus, representados pelo globo terrestre.  Aos produtores rurais tem sido destinada semelhante tarefa carregando sobre seus ombros demandas que nem de longe lhes pertencem.  Vejam o caso do FETHAB, para ficar-se em apenas um exemplo.
Concebido pela lei 7.263 de 27 de março de 2000, durante o governo Dante de Oliveira, o Fundo Estadual para Transporte e Habitação (FETHAB) foi uma contribuição criada objetivando “financiar o planejamento e avaliação de obras e serviços de transporte e habitação no território mato-grossense”.  É inegável que pela precariedade de suas estradas e pelo crescente déficit habitacional não havia como contrapor-se àquela promissora iniciativa, que bem estampou a sensibilidade social dos produtores rurais do estado.  Crescimento econômico com justiça social foi o apelo utilizado à época, conceito abraçado imediatamente pelos cidadãos de bem, cônscios de suas responsabilidades.
Passados mais de doze anos da arrecadação do Fundo, certamente milhares de casas e alguns quilômetros de estradas foram construídos, porém de maneira insuficiente para resolver o hiato existente entre a demanda de investimentos e a capacidade dos governantes em atendê-la.   Dos 27 mil quilômetros de estradas estaduais, pouco mais de 20% encontram-se asfaltados, muitos deles em estado precário sem que recebam a adequada manutenção.  Os milhares de casas construídas auxiliaram muitas famílias no resgate de sua dignidade, promovendo inclusão social e cidadania.
Há, contudo, fatos inquietantes no que se refere ao mau uso dos recursos arrecadados e até mesmo na sua concepção original.  Primeiramente não deveria ter sido acolhido pela classe produtora o ônus de construir casas nas cidades, pois de forma alguma se trata de sua responsabilidade o dever de tal benfazeja prática, embora a mesma seja defensável em todos os aspectos.  Jamais deveria ser debitado àqueles que geram empregos e riquezas no campo assumirem papéis que cabem aos governos.  Grande parte do déficit habitacional origina-se justamente no êxodo rural, pois são cada vez mais excludentes as condições de produção para pequenos e médios produtores, que abandonam suas propriedades localizando-se no entorno das cidades pela inépcia de uma de política agrícola capaz mantê-los no campo.  Governantes preferem colocar o boné do MST em atitudes demagógicas de incentivo a novos produtores do que estender a mão aos que já se encontram no campo, tentando sobreviver do seu trabalho.
Além disso, exigências de adequações em propriedades rurais são cada vez maiores e demandam recursos que muitas vezes inexistem.  Por que então sangrar-se os recursos de produtores para investir na cidade se a demanda por investimentos dentro das propriedades torna-se cada vez maior?  Falta lógica e sobra oportunismo eleitoreiro nesta prática.  Os recursos gerados no campo devem ser investidos lá mesmo, no interior, como forma de oferecer melhores condições de vida àqueles que por lá optaram.  Camponeses demandam muito menos investimentos por parte dos governos do que citadinos.  Não há justeza na prática de tirar recursos do campo para investir em cidades.  Trata-se de atitude incoerente.
Também é preocupante se de fato for verdadeira a informação de que mais de R$ 650 milhões foram desviados do FETHAB para outras finalidades, entre elas a aventura futebolística e os demais investimentos na capital.  Não há como aceitar este tipo de atitude que deveria ser denunciada com veemência, pois é contrária ao argumento primeiro que originou a criação daquela contribuição.  

 Os produtores rurais contribuintes do FETHAB deveriam fazer suas contas e observarem o montante de recursos que cada um recolhe para concluir o quanto de investimentos poderiam ser feitos em suas propriedades e no bem estar de seus colaboradores.  Cada um que faça a sua parte, pois o castigo de levar o mundo nos ombros faz parte da mitologia e não deveria ser atribuição dos produtores rurais que já possuem fardos extremamente pesados para carregar.

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Fonte: Rogério Arioli

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