Cenário do mercado nacional e mundial de commodities para 2013

Publicado em 14/03/2013 10:12 e atualizado em 08/03/2020 22:19
Por Lygia Pimentel, médica veterinária, pecuarista e analista de commodities.
É impossível isolar qualquer mercado apenas a seu nicho específico, esquecendo o comportamento da macroeconomia. Por exemplo, é impossível acompanhar o rumo do boi gordo e dos componentes de seu custo de produção olhando apenas para o que ocorre dentro da porteira.

Também podemos afirmar que é difícil acertar na mosca (para não dizer impossível) os valores que serão praticados pelo mercado nas próximas temporadas.

Então, por que analisar o mercado se é tão difícil acompanhar seus movimentos e se, no fim das contas, não podemos mudá-lo? Ou será que conseguimos?

Todo mercado se comporta ciclicamente. Períodos de produção em alta com péssima rentabilidade e períodos de produção em baixa, com preços que remuneram os poucos que conseguiram manter escala de produção suficiente para se beneficiar do movimento. E tudo isso regido por consumo, clima, exportações, Bolsa, economia, políticas sociais e monetárias, etc.

O motivo para analisarmos essas variáveis é tentar manter resultados estáveis ao longo dos anos, reduzir a volatilidade e pensar no resultado de longo-prazo da produção. É tentar acompanhar a mão contrária da roda que gira o mercado e obriga o pecuarista a vender animais forçosamente para não ficar com o caixa negativo e, quando o período de bons preços vem, ele não tem o que negociar. É se programar para os anos vindouros e saber o que fazer no momento ao invés de dançar conforme a música.

E, assim, preparando-se para o que pode aparecer pela frente, tornamo-nos mais competentes para receber a recompensa: uma margem mais estável ao longo dos anos, resultado de planejamento, eficiência e diluição de custos.

Dito isso, vamos ao que interessa. O que esperar de 2013?

Macroeconomia e Brasil

O mundo passou por intensas transformações na última década. Para que possamos aproveitar esta nova realidade e torná-la uma oportunidade, é necessário compreender o que ocorre com o mundo.

A grande novidade é que tornamo-nos o centro das atenções. Há mais de 10 anos os Estados Unidos e a Europa têm chamado cada vez menos atenção em termos de números, crescimento econômico e riqueza. Esse nosso crescimento concomitantemente ao comprometimento financeiro de países considerados desenvolvidos e inabaláveis atrai empresas multinacionais de todo o mundo, que trazem seus negócios para o país e propulsionam nosso crescimento econômico.

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Tem quem diga que o momento que vivemos é obra do governo, mas a verdade é que sabemos que nossos governos têm sido extremamente ineficientes no momento de colocar em uso os recursos públicos em prol dos cidadãos. Sendo assim, a situação explica-se pelo fato de os países em desenvolvimento terem tido enorme benefício da procura por matérias-primas, além da concentração da oferta de capital para financiar investimentos e consumo aqui dentro.

Foi o que precisávamos para fazer com que a média de crescimento do PIB brasileiro dobrasse nos últimos 8 anos (chegou a 4,3% a.a. em relação os 25 anos anteriores, com 2,0% a.a.). Isso tudo ocorreu mesmo contando com a enorme ineficiência de nossa administração, traduzida por baixíssimas condições de educação, saúde, uma carga de impostos entre as mais altas do planeta, baixa infraestrutura, logística precária, corrupção e outros dissabores.

Espera-se que o movimento continue, afinal, a economia trabalha como um grande transatlântico em movimento: leva tempo e energia para acelerar, assim como para parar. Devemos continuar na inércia do movimento atual por duas ou até três décadas, de acordo com alguns economistas.

Entretanto, é importante ressaltar e ter em mente que o mercado não sobe e desce em linha reta, o que significa que não é por uma tendência maior que não teremos anos ruins como ocorreu em 2009, por exemplo, mas que poderão ser compensados por anos bons, como 2010 foi – inclusive para o mercado de boi.

Espera-se que em 2013 o crescimento surpreenda positivamente, com alta para o PIB de 3 e 6%, movimento acelerado pela queda dos juros, redução de alguns impostos e aumento de gastos públicos. Entretanto, a sequência de manobras econômicas mal planejadas pode surpreender esse resultado, principalmente se não conseguirmos mudar o pífio ritmo de crescimento visto no ano passado. De toda forma, nos deparamos – e é muito provável que continuemos nos deparando – com outro grande problema que conhecemos bem: a inflação.

Neste redemoinho de informações, sabe-se que o crescimento está concentrado em países em desenvolvimento, movimento traduzido pelo gráfico 2.

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E as commodities?

Entre a onda de transição de países de 3º mundo para países emergentes, o apetite da Índia e da China – líderes de crescimento - por alimentos e matérias primas brasileiras deverá permanecer e é o grande aliado para a continuação de nosso desenvolvimento. Entretanto, crescimento é sinônimo de aumento de consumo, o que mantém a expectativa de preços altos para nossas commodities preferidas: milho, soja e carnes (bovina, suína e de frango).

Dólar

Antes de entrarmos no mérito das commodities, discorreremos sobre um importantíssimo fragmento dessa equação: o comportamento do Dólar. Tem gente que não dá muita importância a essa moeda tão negociada, se nega a analisá-la e considerar seu efeito sobre os preços, mas a verdade é que é impossível pensar em commodities sem falar dela. Quem faz isso está esquecendo um detalhe fundamental e certamente errará feio suas contas.

O Dólar definitivamente nos ajudou a manter os pés no chão em 2012. A intervenção do Governo manteve a moeda em patamares considerados bons para equilibrar nossas exportações. Para quem não se familiarizou ainda com o comportamento do mercado internacional frente ao valor do Dólar x Real, ocorre o seguinte: quando o Dólar sobe, esta valorização beneficia quem tem a moeda em mãos, ou seja, nossos clientes internacionais. Assim sendo, eles aumentam seu poder de compra e nos tornamos mais competitivos.

O ponto de equilíbrio para que o Dólar nos ajude a escoar nossos produtos mundo afora é entre R$ 1,90 e R$2,10, e hoje estamos bem aí, no ponto de equilíbrio.

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No gráfico 3 podemos enxergar que desde maio de 2012 o Governo tem conseguido manter o Dólar dentro das bandas, ou seja, dentro de um equilíbrio que favoreça as exportações e que não anime demais a inflação.

Entretanto, já discorremos sobre os efeitos do corte da taxa de juros realizado pelo Banco Central. Pois bem, a firmeza do Dólar, como afirmei, é outro fator corroborativo à inflação e corremos um enorme risco de dar de cara com esse dragão, como dizem por aí, novamente. A solução, portanto, seria manter o Dólar no nível de equilíbrio, porém mais próximo da banda de baixo, ou seja, próximo dos R$ 1,90. Então esta é a segunda conclusão à qual conseguimos chegar neste texto: Dólar em torno de R$ 1,90 ou até menos do que isso.

Milho e soja

Mesmo com o crescimento dos emergentes e da constante e fortíssima demanda pelas commodities nos últimos tempos, entendemos que o mercado de milho e soja deve operar sob pressão para a nova safra, para alívio do comprador de grãos. O motivo primário é a expectativa de safras grandiosas tanto nos Estados Unidos como na América do Sul – incluído o Brasil, trazidas por quase três anos de intempéries e quebras de safra que levaram os preços às alturas.

Entretanto, nem tudo é motivo para festa. Tomemos a soja como exemplo: devemos considerar que os estoques norte americanos estão curtos e que a demanda chinesa continua a todo vapor, e que isso poderia sustentar os valores praticados entre US$ 13,00 e US$ 15,00/bushel.

Caso o clima dê uma força e a safra sul americana confirme-se em torno dos 145 milhões de toneladas, nossa expectativa em relação à oleaginosa se confirmará e manterá os preços sustentados, porém longe dos recentes recordes próximos dos US$ 18,00/bushel.

Situação semelhante ocorre com o milho, o que manteria a commodity próxima aos US$ 5,00/bushel lá fora.

Boi gordo

Na onda do consumo em crescimento, dólar firme e custos sustentados, estamos nós, pecuaristas, na corda bamba.

Digo na corda bamba, pois os custos de produção foram parar nas alturas no ano passado e, especialmente, neste início de ano. Grãos, dólar (encarecendo produtos importados), combustíveis, salários, entre outros tantos itens que compõem o custo de nossa arroba não deram espaço para respirarmos.

E enquanto isso, os preços do boi gordo passaram 2012 inteiro, praticamente, abaixo dos valores apregoados em 2011. Custo maior, preço igual. A isso chamamos perda de valor real de nossa produção. E é isso que caracteriza a fase de baixa do ciclo pecuário.

A série histórica mais longa que temos de preços da arroba do boi gordo começa em 1954. Os dados são do Instituto de Economia Agrícola, o IEA, em continuação com os dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, o Cepea, e outros coletados pela nossa equipe. A análise dessa série de preços nos ajuda a enxergar que os preços do boi movem-se em ciclos que duram alguns anos e trabalham em fases: alta, estabilidade e baixa.

No Brasil, essas fases também têm uma duração média dentro da qual costumam trabalhar. No país, os ciclos pecuários duram, historicamente, algo em torno de 6 a 9 anos, com 3 a 4 anos de baixa e 3 a 4 anos de alta, intermediados por uma fase de estabilidade, que pode ser de 1 a 3 anos.

Há ciclos que fogem dessa regra.

Para entender por que isso acontece, é importante ter em mente que existem três padrões temporais com os quais temos que trabalhar: sazonalidade, tendência e ciclo.

A sazonalidade diz respeito ao padrão de comportamento dos preços dentro do período de um ano, traduzido pela safra no primeiro semestre e entressafra no segundo semestre. É regida basicamente pelo fator climático.

A tendência é o que ocorre com algo que interfira na oferta ou demanda. O aumento da renda da população é uma tendência que pode durar vários anos e interferir na duração da fase de alta de um ciclo.

O ciclo é um padrão que se repete regularmente dentro de alguns anos. E o que estabelece esse padrão? Simples. A psicologia de mercado atrelada à dinâmica do negócio na pecuária.

Vou traduzir: em anos de preços em alta, a margem do pecuarista melhora e ele tem mais capital para investir na produção e retém fêmeas para a produção de bezerros, além de aplicar novas tecnologias, comprar mais terras, entre outras atitudes motivadas pela necessidade de aumentar a produção.

E a produção, de fato, aumenta. Por isso, depois de alguns anos, a oferta gado e de carne sobe, deixando o mercado saturado. Os preços, então, começam a cair e tem-se o fim da fase de alta e o início da fase de baixa. Entre as duas fases pode ocorrer uma acomodação, o que chamamos de fase de estabilidade.

É aí que o pecuarista reduz o uso de tecnologias, insumos e aquisição de novas áreas. O objetivo é diminuir os custos de produção, e assim ele posterga investimentos. Quando não é mais possível realizar esses cortes, ele acaba refugiando-se na venda das matrizes para manter o caixa no azul, ou seja, é obrigado a liquidar o seu plantel.

Em um primeiro momento, esse abate de fêmeas dá ainda mais força ao movimento de baixa, já que a oferta de animais para abate também aumenta. Mas o efeito disso é sentido nos anos seguintes, quando os bezerros das fêmeas abatidas não são mais produzidos. Naturalmente a redução da oferta de bezerros acaba por pressionar também, negativamente, a oferta dos animais das eras seguintes, até faltar boi para abate.

A primeira indicação de que a produção de animais está reduzida aparece no preço do bezerro. As cotações começam a subir concomitantemente a um boi gordo em baixa/estabilidade. E é aí que o pessoal volta suas atenções ao pequeno e o interesse na produção dele volta a aumentar.

Como ainda faltam animais terminados, dentro de algum tempo o valor da arroba do boi gordo começa a se recuperar pela redução da oferta, dando início à fase de alta e um novo ciclo pecuário.

Onde estamos inseridos hoje? Hoje vivemos o segundo ano da fase de baixa do ciclo atual, infelizmente.

A questão é que os preços não precisam cair, necessariamente, como muitos imaginam. Precisa somente ficar estável enquanto o custo de produção sobe. Em outras palavras, compramos menos com o valor apurado na venda de um mesmo produto em relação ao passado. Observe:

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No gráfico 4 fica claro que estamos próximos dos piores valores reais já vividos na pecuária. Os preços de 2010 estão longe da nossa realidade, principalmente se consideramos os custos de produção, como fizemos na figura.

Outro sinal de que estamos nesta estrada obscura da fase de preços em baixa e perda de margem é o abate de animais e, especialmente, o abate de fêmeas. Para se ter uma ideia, o último trimestre de 2012 contou com 40% de fêmeas abatidas dentro do total de animais, taxa que, considerando o mesmo período, foi registrada apenas no 3º trimestre de 2006, quando o mercado pecuário atingia o fundo do poço. E podemos estar próximos dele novamente, principalmente se considerarmos os valores reais do boi gordo.

Fatores como o custo de oportunidade de manter a vaca no pasto e o clima desfavorável levando a piores condições de pastagem são apontados como culpados de uma taxa tão alta ter aparecido tão cedo. Afinal, o mercado está ruim, mas ainda não é tão desesperador quanto 2006.

Em resumo, temos aumentado a participação de fêmeas nas programações dos frigoríficos e o abate está em alta. Mesmo assim, os preços não conseguiram se recuperar em 2012.

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Na outra ponta da oferta, está o consumo.

Estudo do Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês) revela que o comprometimento de renda no Brasil para pagar dívidas cresceu rapidamente nos últimos anos e está no nível mais elevado da história.

Com esse aumento, a parcela mensal dos salários das pessoas físicas e da receita das empresas destinada ao pagamento de empréstimos já é comparável à de países como a Itália.

Segundo o BIS, 19,9% da renda no Brasil vai para as dívidas, nos Estados Unidos, essa fatia é de 19,8%. Para o BIS, o elevado nível de endividamento no Brasil e outras economias emergentes pode ser um problema.

Do patamar de 10,8% registrado no fim de 2005, a escalada foi expressiva ao longo dos anos seguintes: 12% no fim de 2006, 14% em 2007, 16% em 2008, 17,5% em 2010 e quase 20% no dado mais recente, confirmando um salto no último ano.

Isso representa um entrave ao estilingamento da demanda, como ocorreu em 2010, mas ela ainda poderá se manter sustentada devido às medidas governamentais para manter a economia aquecida, tais como redução dos juros e intervenções sobre o Dólar. Novamente, algo que nos faz pensar em inflação.

Se nossa expectativa para o Dólar se confirmar, as exportações de carne poderão ainda mostrar bons resultados pois nos manteremos competitivos internacionalmente. Entretanto, a rentabilidade das empresas exportadoras poderá sofrer um pouco com a moeda norte-americana trabalhando na banda de baixo ou até mesmo abaixo dessa banda que traçamos como ponto de equilíbrio para o câmbio.

Portanto, temos tudo para não deixar o barco afundar, mas a oferta continua entrando e o boi não tem conseguido acompanhar os custos de produção. Péssimo sinal! E pelas nossas contas, o movimento deverá continuar por 1 ou, no máximo, 1 ano e meio. De toda forma, a aceleração prematura do abate de fêmeas e a sustentação por parte da demanda (interna e externa) deverão encurtar a fase de baixa, o que quer dizer que se conseguirmos aguentar as pontas mais um pouco sem liquidar o rebanho de maneira forçosa, poderemos colher os frutos quando a hora chegar.

Aqui temos um parêntesis que pode ser positivo para 2013: o péssimo resultado atual do confinamento traz pessimismo entre os pecuaristas, principalmente quando levamos em conta uma expectativa de custos sustentados pelos baixos estoques mundiais de grãos, pela inflação e pelo aumento dos salários. A questão é pensar nos efeitos disso mais adiante, desde que a aposta de desvalorização dos grãos não seja geral. Se houver grande expectativa de queda para os custos, os confinamentos ficarão lotados novamente e a concentração de vendas no segundo semestre poderá impedir altas fortes para a arroba.

Percebem que a incerteza em 2013 é enorme? Até mesmo a Bolsa reflete isso com preços murchos, dificuldades de oscilar e pouca liquidez.

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Portanto, vale ficar de olho neste texto e acompanhar cada perspectiva traçada nele, pois cada pedacinho desta análise tem sua importância dentro do nosso negócio. É importante também não tomá-lo como verdade absoluta, ou seja, devemos corrigir suas imperfeições e aparar suas arestas para nos aproximarmos o máximo possível do que pode ocorrer com a nossa produção. É muito fácil errar uma análise ou uma perspectiva para períodos vindouros, mas com o acompanhamento diário do mercado para corrigir nossos erros e fortalecer nossos acertos, as chances aumentam.

Desta forma, conseguimos enxergar o iceberg com antecedência e isso aumenta nosso tempo de resposta, ou seja, possibilita manejarmos o navio antes que seja tarde demais!

Um abraço a todos!
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Fonte:
Agrifatto

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2 comentários

  • Lygia Pimentel Bebedouro - SP

    Obrigada, prezado amigo Miguel!

    Pprecisando, estamos à disposição.

    Um grande abraço.

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  • miguel nunes neto Guajará-Mirim - RO

    Parabéns a Dra Lygia Pimentel pela excelente análise da nossa produção agropecuária em 2013. Engenheiro Agrônomo Miguel Nunes Neto - Produtor e Presidente do Sindicato Rural de Guajará Mirim - Rondônia

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