A diferença entre torcer e analisar, por Flávio França Jr.
Prezados amigos. Como era de se esperar em assunto tão polêmico, houve grande repercussão entre os leitores do Notícias Agrícolas o meu texto escrito na semana passada sob o título “Porque o Agronegócio prefere Aécio”. E a julgar pelas manifestações de apoio, ou mesmo de discordância, o objetivo maior de meu comentário foi atingido, ou seja, elevar o nível do debate e fazer uma discussão civilizada e democrática sobre um tema de relevância para a vida de todos nós. Especialmente considerando que nos próximos dias estaremos definindo o futuro do país nesses próximos anos. Afinal, ao se pronunciar sobre determinado assunto, temos que estar preparados para contrapontos e argumentos contrários, pois é exatamente assim que a nossa sociedade poderá evoluir. Desde, é claro, que eles aconteçam de forma respeitosa, como a que observei nessa última semana em nosso fórum de debates. A esse processo podemos chamar de maturidade. Portanto, ponto para o nosso setor.
Tinha imaginado comentar esta semana sobre um assunto diverso, quando fui convidado por nossos amigos leitores a comentar outro texto escrito neste espaço. Nele, meu colega colunista comentou da necessidade dos preços da soja subirem de novo a US$ 15.00/bushel na Bolsa de Chicago para que a oferta seja elevada e a disponibilidade global seja abundante. Pelo menos foi essa a minha interpretação, uma vez que a forma em que o texto foi escrito pode gerar algumas mais. Evidentemente, que por uma questão ética, não o farei. Não me cabe dizer se um texto foi bem ou mal escrito, se tem ideias claras ou contraditórias, se está bem fundamentado ou se é tendencioso. Se está somando para a discussão ou se está prestando um desserviço ao setor. Esse papel é seu, meu amigo leitor do Notícias Agrícolas, seja produtor ou qualquer outro agente desse nosso imenso segmento.
Vou me ater aqui a dar uma opinião sobre como enxergo o mercado de soja neste momento. Deixando os detalhes técnicos e argumentos numéricos para as análises que você pode encontrar em nosso site, acredito que por mais que tenhamos a nossa preferência, ou torcida, o mercado é sempre soberano.
E esse mercado se movimenta de acordo com uma enorme gama de variáveis, fundamentais, técnicas e psicológicas. Passamos vários anos com os preços na CBOT no alto, bem acima da média. Apesar dos inúmeros momentos de flutuação, e outras variáveis adicionais, se mantiveram predominantemente aquecidos basicamente porque os estoques norte-americanos permaneceram muito apertados nas últimas sete temporadas. Inclusive culminando com a safra 2013/14, que atingiu o mais baixo patamar desde 1973. Esse aperto foi resultado da combinação de firme demanda mundial e sequenciais problemas de oferta (quatro anos seguidos nos EUA e alternados no Brasil e Argentina).
Numa espécie de morte anunciada, as cotações vieram recuando durante este ano, até se aproximarem dos US$ 9.00 recentemente. E entre outros motivos adicionais, essencialmente por conta da supersafra que os norte-americanos vão colhendo e o consequente aumento dos estoques para patamar muito superior à média. Junta-se a isso a expectativa de aumento de área e produção na América do Sul, e temos consolidado o movimento baixista atual para os preços. E que arrisca se estender até 2016 caso as primeiras sinalizações de novo aumento de área e produção nos EUA em 2015 se confirmem.
E contra essa overdose esperada de oferta não há muito o que fazer, pois a expectativa de favorável crescimento da demanda, já turbinada pelo recuo dos preços, não deve impedir o aumento generoso das posições de estoques nos EUA e no mundo.
Inclusive, em cima desse argumento de influência positiva da demanda é que trabalho com cotações mais para o lado dos US$ 10/11.00 no próximo ano, do que os US$ 8/9.00 como sinalizam os analistas da inércia (aqueles que sempre apontam para a direção corrente dos preços: se está caindo, apostam que vai continuar caindo mais; mas se está subindo, acreditam que vai continuar subindo para sempre...). Mas sobreoferta só se resolve de duas maneiras: corte na produção ou aumento da demanda. Ou, é claro, com a combinação de ambos. Como a demanda não se multiplica do dia para a noite, acaba atuando mais no longo prazo dos preços. Por isso para invertermos a curva das cotações de forma significativa no curto e médio prazos, fato novo precisa acontecer para conter essa multiplicação dos estoques. E neste caso, essencialmente pelo lado da oferta. Por isso, em minha humilde opinião, falar hoje de soja na CBOT a US$ 15.00/bushel é torcida, e não análise.
Um “AgroAbraço” a todos!!!
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