Governo estimulou as famílias a se endividar

Publicado em 21/06/2012 07:23
editorial do Estadão

As autoridades imaginaram que, ao aumentar o volume de crédito baixando as taxas de juros, haveria uma redução da inadimplência e uma queda do endividamento, que levariam ao aumento da demanda doméstica no segundo semestre.

Quando se observa que as duas primeiras previsões não aconteceram, temos o direito de duvidar de que a terceira se apresente na segunda parte do ano, uma vez que a maior alta das rendas aconteceu em janeiro, com o reajuste de 14% do salário mínimo.

O que aconteceu é que o índice de inadimplência aumentou 6,2% entre abril e maio, e na cidade de São Paulo o porcentual de famílias endividadas passou de 45,7%, em maio do ano passado, para 53,24%, em maio de 2012. Fato que não devemos estranhar, pois a soma da maior oferta de crédito com a redução do seu custo é a receita ideal para aumentar o endividamento, ainda mais quando, ao mesmo tempo, o salário mínimo é aumentado. Não se pode esquecer ainda de que estamos assistindo a um forte crescimento dos empréstimos habitacionais. Mesmo que as prestações sejam modestas, elevam fortemente o comprometimento das famílias, que, ao dispor da sua unidade de habitação, se veem na obrigação de realizar novos gastos para equipar a nova casa.

O erro, certamente, foi o de oferecer todas essas facilidades ao mesmo tempo, sem levar em conta que as operações de crédito sob todas as formas e no seu conjunto podem acusar uma queda, mas são escandalosamente caras quando se trata de crédito pessoal.

Pode-se dizer que a taxa média de juros ao consumidor é a menor desde 1995. Já a taxa para cartão de crédito, que representa 77,2% da dívida das famílias, é de 10,69% ao mês ou 238,67% ao ano, sendo a operação de menor custo a de financiamento de automóveis, com 24,6% ao ano, o que, aliás, torna preferencial a compra de automóveis.

Admite-se como razoável um endividamento equivalente a 30% da renda mensal, mas em São Paulo chega em média a 42,95%. As famílias com um endividamento desse porte, terão, primeiro, a tentação de recorrer às operações com o custo mais elevado, o que aumentará seu endividamento, e chegarão a um momento em que, com 50% de sua renda mensal comprometida, não terão mais capacidade de compra, ao contrário do que espera o governo com sua previsão de aumento da demanda no segundo semestre. Isso explica a cautela das empresas para aumentar sua capacidade de produção.

Consumo em queda, no Correio Braziliense

O consumo das famílias brasileiras tem livrado o Produto Interno Bruto (PIB) de um cenário ainda pior. Porém, o resultado do Índice de Intenção de Consumo das Famílias (ICF), divulgado pela Confederação Nacional do Comércio (CNC), mostrou que os consumidores iniciaram um processo de redução no ritmo de compra em 0,7% em junho, na comparação com o mês anterior. 

Os dados da pesquisa indicam que a lenta recuperação do mercado e o alto nível da inadimplência ainda são barreiras para o crescimento do consumo. Por outro ângulo, o aumento real da renda e a baixa das taxas de desemprego favoreceram para que os números da economia brasileira não deixasse de crescer, ainda que em patamares baixos. 

Embora menor, o otimismo se manteve não só pelo crescimento real da massa salarial como também pelos estímulos que vem sendo dados para reaquecer a economia. No entanto, o comprometimento da renda com gastos inibe um crescimento mais forte da intenção de consumo, destacou o economista da CNC Bruno Fernandes. 

Na avaliação da entidade, a exclusão de medidas restritivas ao crédito, as isenções fiscais e o corte das taxas de juros praticados pelos bancos tendem a resgatar a confiança do consumidor. As dívidas das famílias comprometem até o lazer. 

O engenheiro Renato Santos Medeiros, 34 anos, está com boa parte da renda comprometida com despesas que vão da prestação do carro novo à alimentação da família, o que o levou a separar as contas eleger prioridades. Quase não sobra nada. Tivemos que diminuir o lazer para não ficar ainda mais endividado, lamenta. 

Medeiros garante que pretende quitar as pendências para, só então, pensar em novas aquisições. Por enquanto, não quero comprar nada. Se não, perco o controle do meu orçamento. 

Juros mais baixos e crédito farto fizeram com a professora universitária Martha Vieira, 50, mergulhar em dívidas. Ao abrir a fatura do cartão de crédito, ela levou um susto. O total chegou perto de R$ 2 mil e Martha precisou recorrer a um empréstimo de R$ 1 mil para complementar o pagamento da dívida. Só com meu salário eu não seria capaz de pagar.

Até 2013, parte dos seus ganhos será separado para pagar as parcelas de R$ 147,50 ao banco. Depois que eu pagar todo o empréstimo é que vou pensar em voltar a consumir novamente. Só que agora com mais controle.

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Tags:
Fonte:
O Estado de S. Paulo/Correio

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

0 comentário