Na Veja: Lula evita imprensa e escala aliado para falar do mensalão

Publicado em 16/09/2012 22:13
Tática é adotada após publicação de reportagem de VEJA que revelou que Marcos Valério tem dito a interlocutores que 'Lula era chefe' do esquema

Lula evita imprensa e escala aliado para falar do mensalão

Tática é adotada após publicação de reportagem de VEJA que revelou que Marcos Valério tem dito a interlocutores que 'Lula era chefe' do esquema

Thais Arbex
Lula e Mariza no Centro de Tradições Nordestinas

Lula e Mariza no Centro de Tradições Nordestinas (FolhaPress)

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT adotaram uma tática clara para tratar do mensalão neste domingo, um dia depois da publicação da edição de VEJA que revela, em sua reportagem de capa, que o empresário Marcos Valério vem repetindo a interlocutores que "Lula era o chefe" do esquema de desvio de verbas públicas e compra de apoio parlamentar. Valério já foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal por lavagem de dinheiro, corrupção ativa e peculato no julgamento do mensalão.

O ex-presidente evitou a imprensa ao chegar ao Centro de Tradições Nordestinas, na zona norte de São Paulo, para evento de promoção do candidato do PT à Prefeitura paulistana, Fernando Haddad. Protegido pelos seguranças, Lula se encaminhou diretamente ao camarote destinado às autoridades.

Das alas do PT, o governador da Bahia, Jaques Wagner, foi escalado para o papel de defensor do ex-presidente. Wagner disse que Lula jamais esteve com Valério; o empresário condenado, contudo, tem descrito em detalhes o esquema do mensalão dentro do PT. Ele afirma, por exemplo, que passaram pelo esquema criminoso pelo menos 350 milhões de reais, o triplo do valor descoberto pelo Ministério Público.

Wagner tentou ainda demonstrar confiança. Disse que não acredita que o julgamento do mensalão – cujo veredicto já condenou um petista influente, o deputado João Paulo Cunha – vai influenciar o desempenho do PT nas eleições municipais de outubro. "(O julgamento) não provocará um tsunami eleitoral no PT."

Lula esteve com Wagner na sexta-feira, quando chegou à capital baiana para participar de atos da campanha eleitoral. Segundo o relato do governador, foi nesse momento que o ex-presidente soube da reportagem de VEJA.

Eleições – Wagner foi um dos governadores convidados para o almoço que marcou o ingresso do colega pernambucano, Eduardo Campos (PSB), na campanha de Haddad em São Paulo. Mais do que isso: o evento foi organizado para selar a paz entre PT e PSB.

Embora os socialistas tenham sido os primeiros a fazer aliança com o PT em torno de Haddad, a relação entre o ex-presidente Lula e o governador ficou estremecida depois que Campos rompeu a aliança com os petistas e lançou candidato próprio em Recife. De acordo com a última pesquisa Datafolha, divulgada nesta quarta-feira, Geraldo Julio, do PSB, tem 34% das intenções de votos contra 23% de Humberto Costa (PT).

"Isso é normal na política", disse Campos. Ele negou ainda a intenção de se candidatar à sucessão da presidente Dilma Rousseff, em 2014. "No plano nacional, os planos continuam os mesmos."

Insatisfeito com o encontro entre Lula e Campos, Costa também desembarcou em São Paulo para participar do almoço. Onze pontos atrás do candidato de Campos, o petista teme que o adversário use imagens do encontro e depoimentos de Lula nos programas de TV. Não é à toa: o governador pernambucano desembarcou na capital paulista com uma equipe de jornalistas e cinegrafistas.

"Tem muita gente de fora gostando dessa intriga", disse Wagner, sobre as rusgas entre PT e PSB em algumas das principais cidades do Nordeste. "Se o PSB achar que é hora de ter caminho próprio, é direito deles", disse. "Briga nacional entre partidos dura um mês passada a eleição; briga estadual dura três meses e a municipal não acaba nunca."

Um camarote para cerca de 200 pessoas no CTN foi reservado para receber os convidados de Lula e Haddad. O governador Cid Gomes, do Ceará, que também rompeu com o PT e lançou candidatura própria à prefeitura de Fortaleza, e demais governadores do Nordeste que compõem a base do governo Dilma foram convidados. Cid, porém, não compareceu ao evento por estar fora do país.

Mensalão

Marcos Valério envolve Lula no mensalão

Diante da perspectiva de terminar seus dias na cadeia, o publicitário começa a revelar os segredos que guardava - entre eles, o fato de que o ex-presidente sabia do esquema de corrupção armado no coração do seu governo

Rodrigo Rangel
NO INFERNO - O empresário Marcos Valério, na porta da escola do filho, em Belo Horizonte, na última quarta-feira: revelações sobre o escândalo

NO INFERNO - O empresário Marcos Valério, na porta da escola do filho, em Belo Horizonte, na última quarta-feira: revelações sobre o escândalo (Cristiano Mariz)

Dos 37 réus do mensalão, o empresário Marcos Valério é o único que não tem um átimo de dúvida sobre o seu futuro. Na semana passada, o publicitário foi condenado por lavagem de dinheiro, crime que acarreta pena mínima de três anos de prisão. Computadas punições pelos crimes de corrupção ativa e peculato, já decididas, mais evasão de divisas e formação de quadrilha, ainda por julgar a sentença de Marcos Valério pode passar de 100 anos de reclusão. Com todas as atenuantes da lei penal brasileira, não é totalmente improvável que ele termine seus dias na cadeia.

Confira outros destaques de VEJA desta semana

Apontado como responsável pela engenharia financeira que possibilitou ao PT montar o maior esquema de corrupção da história, Valério enfrenta um dilema. Nos últimos dias, ele confidenciou a pessoas próximas detalhes do pacto que havia firmado com o partido. Para proteger os figurões, conta que assumiu a responsabilidade por crimes que não praticou sozinho e manteve em segredo histórias comprometedoras que testemunhou quando era o "predileto" do poder. Em troca do silêncio, recebeu garantias. Primeiro, de impunidade. Depois, quando o esquema teve suas entranhas expostas pela Procuradoria-Geral da República, de penas mais brandas. Valério guarda segredos tão estarrecedores sobre o mensalão que ele não consegue mais guardar só para si - mesmo que agora, desiludido com a falsa promessa de ajuda dos poderosos a quem ajudou, tenha um crescente temor de que eles possam se vingar dele de forma ainda mais cruel.

Feita com base em revelações de parentes, amigos e associados, a reportagem de capa de VEJA desta semana reabre de forma incontornável a questão da participação do ex-presidente Lula no mensalão. "Lula era o chefe", vem repetindo Valério com mais frequência e amargura agora que já foi condenado pelo STF. A reportagem tem cinco capítulos - e o primeiro deles pode ser lido abaixo:


"O caixa do PT foi de 350 milhões de reais"

Leandro Martins/Futura Pres

O CHEFE:  Segredo guardados por Valério põem o ex-presidente Lula no centro do esquema do mensalão

O CHEFE: Segredo guardados por Valério põem o ex-presidente Lula no centro do esquema do mensalão

A acusação do Ministério Público Federal sustenta que o mensalão foi abastecido com 55 milhões de reais tomados por empréstimo por Marcos Valério junto aos bancos Rural e BMG, que se somaram a 74 milhões desviados da Visanet, fundo abastecido com dinheiro público e controlado pelo Banco do Brasil. Segundo Marcos Valério, esse valor é subestimado. Ele conta que o caixa real do mensalão era o triplo do descoberto pela polícia e denunciado pelo MP. Valério diz que pelas arcas do esquema passaram pelo menos 350 milhões de reais. "Da SMP&B vão achar só os 55 milhões, mas o caixa era muito maior. O caixa do PT foi de 350 milhões de reais, com dinheiro de outras empresas que nada tinham a ver com a SMP&B nem com a DNA", afirma o empresário. Esse caixa paralelo, conta ele, era abastecido com dinheiro oriundo de operações tão heterodoxas quanto os empréstimos fictícios tomados por suas empresas para pagar políticos aliados do PT. Havia doações diretas diante da perspectiva de obter facilidades no governo. "Muitas empresas davam via empréstimos, outras não." O fiador dessas operações, garante Valério, era o próprio presidente da República.

Lula teria se empenhado pessoalmente na coleta de dinheiro para a engrenagem clandestina, cujos contribuintes tinham algum interesse no governo federal. Tudo corria por fora, sem registros formais, sem deixar nenhum rastro. Muitos empresários, relata Marcos Valério, se reuniam com o presidente, combinavam a contribuição e em seguida despejavam dinheiro no cofre secreto petista. O controle dessa contabilidade cabia ao então tesoureiro do partido, Delúbio Soares, que é réu no processo do mensalão e começa a ser julgado nos próximos dias pelos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa. O papel de Delúbio era, além de ajudar na administração da captação, definir o nome dos políticos que deveriam receber os pagamentos determinados pela cúpula do PT, com o aval do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, acusado no processo como o chefe da quadrilha do mensalão: "Dirceu era o braço direito do Lula, um braço que comandava". Valério diz que, graças a sua proximidade com a cúpula petista no auge do esquema, em 2003 e 2004, teve acesso à contabilidade real. Ele conta que a entrada e a saída de recursos foram registradas minuciosamente em um livro guardado a sete chaves por Delúbio. Pelo seu relato, o restante do dinheiro desse fundão teve destino semelhante ao dos 55 milhões de reais obtidos por meio dos empréstimos fraudulentos tomados pela DNA e pela SMP&B. Foram usados para remunerar correligionários e aliados. Os valores calculados por Valério delineiam um caixa clandestino sem paralelo na política. Ele fala em valores dez vezes maiores que a arrecadação declarada da campanha de Lula nas eleições presidenciais de 2002.

No Estadão: 

Jaques Wagner: 'Lula nunca esteve com Marcos Valério'

Governador da Bahia diz que o caso do mensalão não afetará as campanhas de rua do PT


O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), disse ao chegar para almoço em apoio à candidatura Fernando Haddad, em São Paulo, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca esteve com Marcos Valério, publicitário acusado de ser o operador do mensalão. Reportagem da revistaVejadesta semana diz que Valério afirmou que Lula sabia do esquema do mensalão. "Até onde eu sei Lula nunca esteve com Marcos Valério", afirma Wagner.

O governador baiano disse que não leu a revista, mas que ficou sabendo da reportagem na sexta-feira, 14, à noite, junto com Lula, após um comício em Salvador. Na manhã seguinte ambos viajaram para Feira de Santana, na Bahia, para compromissos de campanha.

Sobre o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), Wagner foi taxativo: "O que deveria ser um julgamento frio acabou sendo apimentado." Ele, no entanto, disse que o caso não afeta negativamente a campanha de rua do PT. "As condenações não são do PT e sim de pessoas do partido", afirmou. De acordo com ele, o julgamento político do PT ocorreu em 2006, quando o presidente Lula foi reeleito para mais quatro anos de governo. "Eu não sinto na campanha de rua influência do mensalão", declarou.

Há pouco chegou ao evento o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Lula e demais políticos estão em um camarote, longe da imprensa.

PT minimiza reportagem e oposição cogita ir ao MP

O PSDB cogita pedir investigação ao Ministério Público para apurar suposta participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no esquema do mensalão, depois das revelações atribuídas ao empresário Marcos Valério de que Lula era o chefe do mensalão, conforme reportagem da revista Veja. Petistas saíram em defesa do ex-presidente e creditaram as declarações que Valério teria feito a "desespero" de quem vai ser preso.

Na oposição, há a expectativa de que novas revelações do esquema virão à tona por outros réus que esperavam proteção, mas estão sendo condenados no julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal.

"A perspectiva de prisão vai soltar a língua de muita gente", disse o líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR). "Isso é explosivo. É a primeira vez que as suspeitas se confirmam pelo depoimento da figura central que é Marcos Valério", afirmou o presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN). Para o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), os fatos devem ser esclarecidos. "Denúncia contra qualquer pessoa deve ser apurada sem qualquer prejulgamento. É importante que tudo fique claro o mais breve possível, inclusive o que envolva o ex-presidente Lula."

Eleição. O comando da campanha de Fernando Haddad avalia que a tentativa de Valério de carimbar Lula como "chefe do mensalão" não se sustenta e tem caráter nitidamente eleitoral. Mesmo assim, a reportagem preocupou o comando da campanha, que antecipou reuniões, marcadas para este fim de semana.

As denúncias reforçaram a percepção de petistas de que é hora de atacar o candidato tucano José Serra, que vem tentando vincular o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares - réus do mensalão - à candidatura de Haddad. "Temos de politizar esse debate e mostrar que Serra já fez isso na campanha presidencial", afirmou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

O líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP), também reagiu. "Vão quebrar a cara aqueles que querem tentar envolver o presidente Lula nesse processo. O povo brasileiro sabe quem é Lula e o que ele fez de bom", disse.

Após carreata na zona leste, Haddad disse não ter lido a reportagem, mas afirmou que as denúncias "refletem um comportamento normal dessas pessoas que sofrem processos dessa natureza". "(Valério) É uma pessoa que está num momento difícil e que, evidentemente, a essa altura, a cada momento vai dizer uma coisa a respeito (do caso), até para se justificar perante a família."

NA FOLHA: 

Oposição quer a abertura de investigação contra Lula


A oposição fará uma reunião na próxima terça-feira (18) para decidir se ingressa em conjunto ou separadamente com pedido de investigação sobre a suposta participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no mensalão.

A ação terá como base reportagem da "Veja" na qual é atribuído a Marcos Valério, operador do mensalão, a revelação de que Lula era o "chefe" do esquema que teria desviado, segundo a revista, R$ 350 milhões.

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Como o ex-presidente Lula não tem mais foro privilegiado, se aberta, a investigação deve ocorrer na primeira instância do Ministério Público Federal.

A iniciativa também pode partir dos próprios procuradores, sem a necessidade de serem provocados pela oposição.

"É dever do Ministério Público, diante de uma denúncia crime, que é o caso da reportagem, abrir processo", afirma o presidente nacional do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP).

Durante a CPI (2005-2006) que investigou o mensalão, a oposição não incluiu o então presidente Lula entre os alvos.

Quando o publicitário Duda Mendonça disse ter recebido R$ 25 milhões pela campanha do petista em conta no exterior se cogitou investigar Lula, o que poderia redundar num processo de impeachment se a participação dele no esquema fosse comprovada.

"Essa investigação chega com sete anos de atraso. Na época da CPI eu apresentei um voto em separado pedindo o impeachment de Lula, mas nem a oposição me apoiou", afirmou o líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR).

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Fonte:
veja.com.br/Estadão/Folha

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