Na Folha: Ruralistas querem R$ 1 bilhão para desocupar áreas em MS

Publicado em 09/06/2013 19:56
por DANIEL CARVALHO, reporter da FOLHA DE SÃO PAULO

 

Índios e fazendeiros de Mato Grosso do Sul concordam num ponto: a paz no Estado tem preço, a ser pago pelos governos federal e estadual.

No Estado onde ao menos 320 índios foram mortos nos últimos dez anos, ruralistas calcularam o valor para deixar as áreas: R$ 1 bilhão por 72 mil hectares em 65 fazendas -área equivalente à metade da cidade de São Paulo.

Não custa metade de um estádio de Copa do Mundo, desses de segunda categoria que ele [o governo federal] está fazendo. Um daqueles resolveria a questão", diz Francisco Maia, líder da Associação dos Criadores de MS e da Frente Nacional da Pecuária.

Só a reforma do Maracanã, no Rio, custou R$ 1,2 bilhão. O valor serviria de indenização pela terra e pelas benfeitorias. Em Sidrolândia, principal área de conflito em MS, um hectare de terra com pastagem já formada custa até R$ 12 mil, segundo a consultoria Informa Economics FNP.

Já um hectare de terra agrícola de alta produtividade no município chega a R$ 19 mil.

Em ofício ao governo em 2010, a Procuradoria em MS dizia que não indenizar produtores titulados seria "absoluta incoerência" e "injustiça". Muitos fazendeiros têm títulos das terras, muitas com registro de produção agrícola desde o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870). Os documentos foram concedidos por governos que queriam povoar a área. "Todas as terras são legais", afirma Maia.

Para o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), braço da Igreja Católica, é preciso um entendimento dos governos para indenizar os produtores. "Os governos federal e estadual podem muito bem encontrar solução para compor as origens desses recursos", diz o secretário-executivo do Cimi, Cleber Buzatto.

O Planalto costuma evocar o artigo 231 da Constituição para se dizer impedido de pagar pelas terras. O texto diz que a União não pode comprar terras de ocupação tradicional de povos indígenas.

Anteontem, o ministro José Eduardo Cardozo disse que irá discutir a possibilidade de comprar terras: "Vamos debater todas as teses que sejam possíveis do ponto de vista jurídico".

 

Fazendeira vira antropóloga e faz laudos contra índios

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FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A CAMPO GRANDE

Roseli Ruiz tem diploma de antropóloga e faz perícias em terras em litígio. Sua filha, Luana, dirige a ONG Recovê -"conviver", em guarani. Mas ambas estão entre os mais ferrenhos defensores dos proprietários rurais de Mato Grosso do Sul na disputa de terras com indígenas.

"Fui invadida em 1998 e, no ano seguinte, fui fazer direito para entender esse desmando. No decorrer do curso detectei que o que estava fundamentando não era a legislação, e sim um relatório antropológico", explica Roseli, que fez uma pós-graduação na Universidade Sagrado Coração, em Bauru (SP).

A propriedade fica em Antônio João (a 280 km ao sul de Campo Grande), na fronteira com o Paraguai, e tem 10 mil hectares. Uma parte minoritária está tomada por famílias guaranis-caiovás.

Com o tempo, conta Roseli, ela passou a fazer relatórios antropológicos em vários Estados, como Mato Grosso e Paraná. Seu próximo trabalho será na área da Raposa Serra do Sol, em Roraima.

  Marlene Bergamo - 7.jun.2013/Folhapress  
A fazendeira Roseli Ruiz durante protesto de produtores
A fazendeira Roseli Ruiz durante protesto de produtores

Ela afirma que, em todos os estudos, não encontrou nenhuma terra indígena. Ela admite que algumas áreas indígenas precisam ser ampliadas, mas via indenização justa, "e não confisco".

"Não é assunto para demarcação quando os índios foram retirados para colonização. Não se pode fundamentar em 1500. Senão, o prédio da Folha tem de ser desapropriado e entregue pra índio", afirmou.

A antropóloga-fazendeira afirma que tem um bom relacionamento com os índios. "Na minha fazenda, do lado do Paraguai, temos uma aldeia. E, desde que nós mudamos, há 32 anos, quem socorre os índios sou eu. Quando ocorria uma picada de cobra, eles vinham na fazenda solicitar que fossemos buscar."

Ao seu lado, a advogada Luana disse que a criação da ONG foi a solução encontrada para "nos legitimar e participar das reuniões e descobrir o que está acontecendo".

A entrevista ocorreu durante uma carreata realizada pelos produtores rurais anteontem. Em certo momento, uma amiga cumprimentou Roseli brincando: "Não vai virar a casaca, hein?".

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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