"A barra vai pesar", editorial do ESTADÃO

Publicado em 12/10/2014 04:49
NA EDIÇÃO DESTE DOMINGO DE O ESTADO DE S. PAULO

Deu a lógica nos resultados iguais das primeiras pesquisas dos dois maiores institutos brasileiros, Ibope e Datafolha, sobre a intenção de voto para o segundo turno da eleição presidencial: o oposicionista Aécio Neves à frente de Dilma Rousseff, 51% contra 49% dos votos válidos, por enquanto dentro da margem de erro. Deu a lógica porque, afinal, a soma dos votos recebidos pelos dois principais candidatos oposicionistas no primeiro turno - Aécio Neves e Marina Silva -, no total de 57 milhões (56,8%), superou com folga os 43,2 milhões (41,8%) dados a Dilma Rousseff.

Esses números dizem que a considerável maioria dos brasileiros quer mudança. E mudança significa apear o PT do poder. Se alguém tem alguma dúvida sobre o caráter antipetista dos votos dados a Marina Silva no primeiro turno, basta lembrar que a própria campanha de Dilma Rousseff se encarregou, de forma brutal e indigna, de estigmatizar a candidatura do PSB. É difícil de acreditar que o eleitor de Marina deixe de se ater agora à opção que lhe resta: votar em Aécio.

Mas também é óbvio que nem todos os votos que Marina teve em 5 de outubro serão automaticamente transferidos para Aécio. Mas o forte efeito psicológico tanto, por um lado, da tendência de crescimento da candidatura tucana nas últimas três semanas quanto, por outro lado, da frustrante reversão das expectativas petistas, somado ao substancial apoio a Aécio anunciado por antigos adversários e lideranças políticas ao longo da semana que passou - e ainda as recentes más notícias para Dilma Rousseff e o PT a respeito do desempenho da economia e do escândalo da Petrobrás -, tudo isso certamente influenciará a decisão do eleitor.

É preciso levar em conta, contudo, que na defesa de seu projeto de poder o lulopetismo não terá escrúpulos de apelar a qualquer recurso que estiver a seu alcance, como a ominosa falácia de que o PT tem o monopólio da virtude e todos os seus adversários são também inimigos do povo que só pensam em sacrificar os despossuídos em benefício das elites perversas.

É claro que só quem é mal informado acredita em patranhas como a de que qualquer presidente eleito que não seja do PT acabará com todos os projetos sociais dos governos petistas, principalmente o Bolsa Família. E Lula e Dilma decidiram também proclamar agora que a infâmia está em afirmar que há pessoas mal informadas no Brasil, deturpando deliberadamente declaração feita pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

A direção em que os ventos eleitorais estão soprando indica que a tropa de choque petista terá trabalho pesado até o dia 26. Por exemplo, uma vez que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, está cumprindo aviso prévio e anda com a credibilidade em baixa, Dilma designou Aloizio Mercadante, atual ocupante do Gabinete Civil, para não deixar sem resposta qualquer ataque da oposição na área da Economia. Aloizio tem credenciais para a missão: foi, em 1994, o arauto petista do fracasso antecipado do Plano Real.

Na Comunicação, além do notório João Santana, marqueteiro do Brasil dos Sonhos e das Malvadezas, anda assoberbado o jornalista Franklin Martins, aquele que desde que era ministro da Comunicação Social de Lula está obcecado pela ideia de decretar o "controle social" da mídia. No comando do site oficial da campanha de Dilma, Martins tem a responsabilidade de municiar a militância que atua nas redes sociais com toda sorte de informação que não pega bem na boca de quem fala oficialmente em nome do PT e de sua candidata.

À frente do partido permanece vigilante Rui Falcão, com a importante missão, que não lhe tem dado descanso nos últimos dias, de protestar com indignação contra as denúncias de corrupção no governo que a mídia se vê na obrigação de divulgar todos os dias e de prometer que vai processar criminalmente quem quer que seja que se atreva a questionar os elevados padrões morais da companheirada.

É esse o circo de horrores que provavelmente os brasileiros serão obrigados a assistir nas duas próximas semanas, como preço a pagar pela ousadia de cogitar a alternância no poder.

 

Mal do começo ao fim

Com a inflação acumulada de 12 meses de 6,75% em setembro, acima do limite de tolerância (de 6,5%) de um regime de metas inflacionárias já excessivamente complacente, e sem sinais de que as pressões sobre os preços arrefecerão de maneira expressiva até dezembro, o governo Dilma Rousseff completará os quatro anos que os eleitores lhe concederam da maneira como começou: muito mal. E deixará as finanças públicas e a economia brasileira em condições bem piores do que encontrou, com o crescimento tendendo a zero, o descumprimento da meta de superávit primário e, de modo cada vez mais evidente, a paralisia do mercado de trabalho. Não adianta culpar "a crise externa" por esse quadro desastroso (ver, abaixo, editorial Nas contas, destaque negativo). Ele foi sistematicamente construído desde 2003. Na economia, o governo Dilma colhe o que o PT plantou.

O que fez a inflação ultrapassar o teto do regime de metas do Banco Central (BC) foi a alta de 0,57% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) - calculado pelo IBGE e que baliza a política de metas do BC. Em setembro, a variação foi bem maior do que a esperada pelos analistas do mercado financeiro. A inflação do mês é a maior desde abril e o acumulado de 12 meses, o maior desde outubro de 2011, primeiro ano do governo Dilma.

Um dos principais responsáveis pela alta de setembro foram os preços dos alimentos, que vinham caindo há meses (redução de 0,11% em junho, 0,15% em julho e novamente 0,15% em agosto), mas no mês passado subiram 0,78%. São preços voláteis, muito suscetíveis às variações do mercado, o que pode resultar em altas expressivas nos próximos meses.

Este não é o único componente preocupante da inflação em setembro. Nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Recife e Curitiba, a alta de 12 meses superou 7% (7,63%, 7,16% e 7,13%, respectivamente). E cresceu o índice de difusão de altas entre os componentes do IPCA, ou seja, mais preços estão subindo. Mas os preços administrados, aqueles sobre os quais há alguma forma de controle - como dos combustíveis - subiram menos. Em algum momento, porém, eles terão de ser corrigidos.

Tanto a variação de setembro como o acumulado de 12 meses são apenas alguns pontos que se aproximam dos extremos de alta de preços desde o início do atual governo. O que o exame dos números da inflação ao longo da gestão Dilma mostra, porém, é que a alta de setembro não é exceção. Tendo herdado do governo anterior - chefiado por Lula, criador da carreira política e inspirador da presidente Dilma Rousseff - uma inflação anual de 5,91%, o atual não conseguiu reduzi-la para a meta de 4,5%. Em 2011, o IPCA acumulou alta de 6,5; em 2012, de 5,84%; e, em 2013, de 5,91%. Embora dentro da margem de tolerância, essas variações estão muito acima da meta. Em 2014, pelos dados já conhecidos, a inflação poderá ficar dentro da larga margem de tolerância, mas muito próxima do teto.

A meta de 4,5% vem sendo mantida desde 2003, primeiro ano do governo Lula, apenas com a redução da tolerância (de 2,5 pontos porcentuais para mais ou para menos em 2003, para 2 pontos nos anos seguintes). Nesse período, a meta só foi cumprida em três exercícios (2006, 2007 e 2009).

Não faz sentido, por isso, a declaração do secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, para quem "estamos num regime de metas e temos que responder às metas" e "estamos entregando há 11 anos". A inflação tem ficado, na maioria desses anos, dentro do largo limite de tolerância, mas acima da meta.

Neste ano, além da aceleração da inflação que já era alta, o governo colhe a forte desaceleração da economia, que deve crescer apenas 0,3% de acordo com a mais recente projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI). O mercado de trabalho, que ainda apresenta sinais positivos, acabará sendo afetado pela desaceleração da atividade econômica e uma de suas consequências, que devem surgir no próximo ano, é a queda da renda real. E o superávit primário bem abaixo do prometido.

Este é o péssimo quadro que ficará para o próximo governo. Para corrigi-lo, não basta mudar só a política econômica.

Economia e voto, (por CELSO MING)

A presidente Dilma deixou-se arrastar pela cultura de que um chefe não pode admitir que falhou e de que toda crítica tem de ser repelida com veemência, na base do bateu, levou.

 

A Coluna de quinta-feira argumentou que a política econômica do governo Dilma falhou em relação às metas que ela mesma se propôs a entregar. Nesta sexta, avalia certas consequências eleitorais dessa falha.

Não vamos contar aqui os votos de protesto nem o porcentual dos não válidos. O fato é que os dois candidatos da oposição tiveram, somados, 54,8% dos votos e esse é o primeiro indício de que o eleitor está sentindo na pele e no bolso o estrago que vem sendo causado tanto pela inflação quanto pelas novas demandas estimuladas ao longo dos 12 últimos anos, mas não inteiramente cumpridas.

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Há um clamor por mudanças, recado que não foi passado só agora, mas vem lá de trás, das manifestações de junho de 2013, que foram interpretadas, pelo próprio governo, como recado de grande relevância. A presidente Dilma prefere atribuir essa pressão por mudanças ao gostinho que as novas classes médias experimentaram por maior e melhor qualidade de consumo, que nem sempre pode ser satisfeito – e não às consequências das escolhas equivocadas de política econômica. Com isso, tenta realçar como mérito seu ter atuado para a redenção das camadas mais pobres da população, e não reconhecer desvios na condução da política econômica.

Um elemento que pode ter levado a presidente Dilma a esse autoengano é o resultado das pesquisas que vêm apontando para a existência de uma fatia de 39% de brasileiros para os quais o governo é considerado bom e ótimo. É um índice relativamente alto que, no entanto, esconde o principal, que é a notória corrosão dos fundamentos da economia, cujo desfecho a mais longo prazo é a deterioração da qualidade de vida.

Nesse ponto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é mais sincero. Mais de uma vez, chegou a reconhecer que parte desse movimento por mudanças se deveu à erosão do poder aquisitivo provocada pela inflação, cuja origem ele atribuiu depois aos estragos decorrentes das condições climáticas.

Mas a presidente deixou-se arrastar pela cultura de que um chefe não pode admitir que falhou e de que toda crítica tem de ser repelida com veemência, na base do bateu, levou. Repetiu indefinidamente que tudo vai bem com a economia, que as insatisfações partem daqueles que deixaram de tirar proveito das regalias e dos pessimistas de sempre.

O fato é que se acumula uma conta alentada a ser transferida para a população. É o atraso dos reajustes dos preços administrados, principalmente dos combustíveis, da energia elétrica e dos transportes urbanos, mais o represamento do câmbio que comerão mais poder aquisitivo da população. É a deterioração das contas públicas, cujo saneamento vai exigir a redução da distribuição de benefícios ou o aumento de impostos ou ambos. E é o esvaziamento crônico da indústria que, mais cedo do que tarde, enveredará para mais fechamento de postos de trabalho. (Veja oConfira)

O eleitor sente imediatamente quando sua vida e seu bolso sofrem de anemia e, ainda que apenas instintivamente, aproveita o voto para dar seus avisos. Como, no entanto, o governo ouve apenas o que quer, é difícil de saber até que ponto esses avisos chegaram a seu destino.

CONFIRA:

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O gráfico mostra a variação mensal do emprego na indústria nos últimos 24 meses. Calculado pelo IBGE, o índice apresentou recuo de 0,4% em agosto comparativamente a julho, na série livre de influências sazonais. Foi a quinta queda mensal seguida.

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Fonte:
O Estado de S. Paulo

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1 comentário

  • Rodrigo Polo Pires Balneário Camboriú - SC

    Maquiavel dizia que o soberano, o moderno príncipe (o partido), pode ser amado ou temido pelo povo. No Brasil 70% dos eleitores desprezam Dilma Roussef. Nos outros 30% uma parte teme perder a boquinha depois de 12 anos de moleza, e outra parte teme as ameaças de Dilma, que a todo momento afirma que sem ela e o PT as pessoas serão privadas de seus empregos, e o terrorismo infame de que se o PT for derrotado perecerão pelo flagelo da fome. Não è de se esperar muito mais que isso de alguém que fez do terrorismo uma forma de viver.

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