CLÓVIS ROSSI: A opção de Dilma e ELIANE CANTANHÊDE: Enigma

Publicado em 19/09/2010 19:06

A quem ainda tem alguma dúvida sobre como será a política econômica de um eventual -e cada vez mais provável- governo Dilma Rousseff, sugiro que leia a bela reportagem de Ricardo Balthazar, publicada ontem no caderno "Eleições 2010".
Nela, há uma frase que poderia ser tomada como mote da gestão Dilma: "Optamos pelo modelo que dava segurança aos investidores privados", diz Maurício Tolmasquim, braço direito de Dilma no Ministério de Minas e Energia.
A opção se deu entre o projeto petista que reforçava o papel do Estado no setor energético e o tal "modelo que dava segurança aos investidores privados".
Valeu para a energia no atual governo e valerá, como é óbvio, para o conjunto da obra na futura administração se ela for de fato comandada por Dilma.
Basta atentar para o fato de que o avalista de Dilma junto ao setor empresarial é o mesmíssimo Antonio Palocci Filho que desempenhou o papel com absoluto êxito na transição e no início da gestão Lula. Momentos que foram decisivos para a estabilidade da economia e, por isso, a opção se manteve depois que Palocci caiu.
Personagens à parte, a mais elementar lógica aponta para a manutenção do modelo: deu certo.
A opção por dar segurança aos investidores privados não foi inimiga da diminuição da pobreza, ao contrário do que acreditava uma parte significativa do PT antes de chegar ao poder e nele descobrir o nada discreto encanto da burguesia.
Importa pouco para efeitos eleitorais que não tenha havido uma mudança estrutural no país, como aponta, por exemplo, Frei Betto, amigo do rei, desiludido com a opção. Que também não tenha havido redução da desigualdade entre renda do capital e do trabalho importa pouco, desde que diminua a pobreza. E, por fim, há no mercado alguma opção alternativa?

ELIANE CANTANHÊDE

Enigma

BRASÍLIA - Com a eleição caminhando para um desfecho já no primeiro turno, Dilma Rousseff precisa explicitar o que pretende fazer no seu governo e se irá ou não implementar o tal "projeto político" do PT alardeado por José Dirceu.
A campanha de Dilma entregou ao TSE um programa "hard" pela manhã, se arrependeu e trocou por um programa "light" à tarde. Seria um dos dois o projeto a que Dirceu se refere? Não se sabe, como não se sabe quais são as reais intenções de Dilma e até onde ela irá com a ame-aça de "controle social" da mídia.
Numa livre tradução, Dirceu disse que agora, sim, o PT vai mandar, fazer e acontecer. Deixou claro que Lula e sua imensa popularidade foram só um meio para chegar a um fim, como se esses oito anos fossem um aquecimento para a implantação do projeto real. Ok. Mas qual é ele? Por que ninguém pode falar? E por que nós não podemos saber?
Caso Dilma seja eleita, terá os ventos a favor na economia, o Congresso às suas ordens e poderá usar e abusar de seus poderes, baixando o centralismo democrático para (ou contra) a imprensa, a área militar e os costumes. Bem faria se deixasse bem claro quais são os seus planos.
Também não está claro como tratará a questão ética. Ou será que está? Sob Lula, houve quatro escândalos no coração do poder: depois de Waldomiro achacando bicheiro, o primeiro ministro foi parar no STF como "chefe de quadrilha", a segunda patrocinou dossiê contra ex-presidente e a terceira montou um time caseiro de craques em cobrar "taxa de êxito" de empresários.
O passado condena, sem haver compromissos para o futuro. Qual será o padrão ético do novo governo? O que o PT na oposição pregou contra Collor ou o que o PT no poder praticou com suas Erenices?
Após a eleição, bandeiras e programas vão para o lixo. A melhor pista do que vai sobrar é a de Dirceu: vem aí o "projeto político" do PT, seja lá o que isso signifique. Depois ninguém entende por que boa fatia do eleitorado está tão tiririca.

CARLOS HEITOR CONY

Cartão amarelo

RIO DE JANEIRO - Na crônica anterior ("A dúvida e a dívida"), lamentei sinceramente a crise que bagunçou o coreto da Casa Civil, já bagunçada por episódios escandalosos até agora não explicados e punidos. Embora não votando nos candidatos principais à sucessão de Lula, eu achava que o eleitorado estava bem servido com Serra e Dilma, que se equivalem em méritos e em moralidade.
Acontece que, apesar da blindagem que o PT, o governo e o próprio Lula fazem em torno de Dilma, ela acaba de sofrer um tranco com a revelação do escândalo na Casa Civil, que ela dirigia pessoalmente, durante anos, e finalmente por pessoa de sua absoluta confiança.
É bem verdade que até agora nada foi provado contra ela, que continua sua campanha presidencial com sucesso, uma vez que lidera com folga as intenções de voto do eleitorado. Contudo, o episódio de Erenice Guerra, cujo desfecho foi o seu afastamento do cargo que Dilma lhe outorgou, funcionou como uma espécie de cartão amarelo para o futuro de sua carreira política.
Não chegou a ser um cartão vermelho, o da expulsão pura e simples, mas que serve de advertência para todos, inclusive para ela mesma. O ideal seria que ela fosse eleita "in albis", ou seja, imaculada em sua vida pública, ficando as restrições por conta da própria disputa eleitoral.
Agora não: de certa forma, perdeu a inocência. Ela arrastará pelos quatro anos de seu eventual mandato o cartão amarelo que a coloca numa situação desconfortável. Administrando a Casa Civil durante anos, com total carta branca do governo do qual era a segunda pessoa em importância política e administrativa, ela foi parcialmente atingida pelo fogo amigo de sua sucessora e amiga.
Um novo cartão amarelo pode lhe ser letal.

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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