“Esta cultura de paz é a base do fato de que somos um país diferente”, disse Dilma Rousseff no meio do amalucado falatório de encerramento. Pinçada sabe-se lá de que lugar da cabeça, a frase indecifrável — mais uma — contribuiu para escancarar o que os jornalistas federais e os intelectuais domesticados fingem que não enxergam: a adversária que todo candidato pede a Deus é também a primeira debatedora da história que nem precisa de um oponente para perder. Para Dilma Rousseff ser derrotada, basta um monólogo de Dilma Rousseff.
A candidata do PT acha tudo “muito importante”, desconfia de que o concorrente está sempre “tergiversando”, acredita que o Brasil foi fundado em 2003, junta em dois minutos cinco assuntos que desconhece e protagoniza escorregões cada vez mais espetaculares. Ao discorrer sobre tsunamis e marolinhas, por exemplo, surfou na onda errada: “O Brasil foi o primeiro a entrar na crise e o último a sair”, trocou as bolas.
Ao ouvir que o PT votou contra o Plano Real, dedilhou a lira do delírio para reivindicar o direito de resposta: “Ele disse que eu sou a favor da inflação”, viajou. Prometeu, solenemente, “fazer um governo voltado para a pessoa humana”. E não finalizou a fala que deveria ser a fala final. Talvez por acreditar que Dilma não precisa de ajuda para ir à lona, Serra dispensou-se de novo de buscar o nocaute.
Quando lhe coube a iniciativa, tratou de questões administrativas. Permitiu que a adversária, sempre de guarda baixa e exposta a contragolpes devastadores, passasse a maior parte do tempo na ofensiva. Revidou a todos os ataques, é verdade, e até desferiu algumas pancadas severas. Mas nem sequer tentou o contragolpe definitivo. A tática, discorde-se dela ou não, parece ter funcionado: o grupo de 20 eleitores indecisos reunidos pela RedeTV! e pela Folha, organizadoras do debate, declarou Serra vitorioso por boa margem de pontos.
O que teria acontecido se o candidato da oposição passasse ao ataque e desferisse golpes potentes e frontais? Como terminaria o duelo se a sequência de socos verbais castigasse a roubalheira imensa na Casa Civil, a impunidade institucionalizada, a catarata de infâmias e delinquências despejada sobre a família Serra? Como reagiria Dilma se confrontada com a comparação entre a telefonia modernizada e os Correios em decomposição?
Que respostas balbuciaria se instada a explicar o sucesso do Plano de Arrendamento da Coisa Pública aos Altos Companheiros, o até recentemente clandestino PACPAC? Quanto tempo aguentaria nas cordas se fosse obrigada a comentar a produção da fábrica de dossiês e da usina de mentiras? Continuaria a declamar o poema épico “A Petrobras é a Pátria” se convidada a justificar o confisco dos bens da estatal na Bolívia, promovido por Evo Morales e abençoada pelo Beato Lula?
No mundo do boxe, diz-se que tem “queixo de vidro” o lutador que, ao primeiro soco mais vigoroso nessa parte do rosto, perde o rumo, a bússola e, pouco depois, os sentidos. Se Serra topasse a troca de pancadas, a disputa teria terminado há muito tempo. Dilma é toda de vidro. Está implorando para ser nocauteada.
O tiro no pé poderia atingir a testa
Como ocorreu no debate na Band, também neste domingo Dilma Rousseff acertou no próprio pé ao mirar em Fernando Henrique Cardoso. José Serra novamente comparou os ex-presidentes que apoiam cada candidato. Dilma tem a seu lado José Sarney e Fernando Collor, que só não conseguiram acabar com o Brasil porque depois deles vieram Itamar Franco e Fernando Henrique, que estão com Serra.
A bala seria desviada para a testa da adversária se o candidato da oposição sugerisse a Dilma que convença Lula a topar o desafio lançado publicamente por FHC: um debate entre os dois na TV. Enquanto ambos passam a limpo os oito anos de cada um, os candidatos à sucessão tratam do futuro. Serra deixou escapar uma chance preciosa talvez porque ainda veja um problema onde já está claro que existe um trunfo eleitoral.
O candidato deveria parar por uns tempos de ouvir marqueteiros e conversar mais com Aloysio Nunes Ferreira. Único protagonista do horário eleitoral do PSDB a apresentar-se ao lado do presidente que matou a inflação, Aloysio saltou de 4% nas pesquisas para mais de 32% nas urnas. Além de superar o recorde de Aloízio Mercadante, baixar a crista de Marta Suplicy e impedir que os paulistas piorassem a Casa do Espanto com Netinho de Paula, o senador mais votado da história restabeleceu a verdade assassinada: como aprendeu Lula em duas lições inesquecíveis, Fernando Henrique é muito bom de urna.
Mostrou agora que também transfere prestígio: em 3 de outubro, Aloysio Nunes Ferreira teve 11,2 milhões de votos em São Paulo. Quase 2 milhões a mais que Serra.
A candidata que sonha com a telefonia estatizada ainda não chegou ao século 21
Valter Antoniassi Fátima do Sul - MS
Se até o fundador do PT apóia SERRA...Como pode pessoas esclarecidas apoiarem DILMA? Na minha opinião só tem uma explicação:Semelhança de caráter...