Indecisos e volúveis vão escolher o próximo presidente no domingo

Publicado em 24/10/2010 18:57 e atualizado em 25/10/2010 08:05
Segundo o último Datafolha, 6% do eleitorado ainda vai escolher um candidato e 10% dos que declaram voto em algum dos dois candidatos admitem a possibilidade de mudar a escolha. Diferença entre Serra e Dilma é de 10 pontos percentuais

Eleição apertada é assim mesmo: para desespero dos estrategistas, quem decide são os indecisos. E suas variantes: o eleitor volúvel, o ambíguo, o tardio, o falso desencantado, aquele que talvez emende o feriadão. Na pesquisa Datafolha divulgada nesta sexta – que dá 50% dos votos totais a Dilma Rousseff (PT) e 40% a José Serra (PSDB) – 6% dos entrevistados se autodeclaram indecisos e 4% pregam o voto branco ou nulo. Dos que declaram voto, 10% ainda cogitam trocar de candidato. Dos que votaram em Serra ou Dilma no primeiro turno, 4% e 5% trocaram de lado, respectivamente. E 1% diz que pretende viajar e, portanto, não vai comparecer às urnas.

Clique no gráfico e veja o perfil dos indecisos

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Para efeitos sociológicos, indeciso é o eleitor que faz sua opção na reta final da disputa, a menos de 15 dias das eleições. É um fenômeno crescente verificado tanto nas democracias consolidadas como nas recentes, para o qual concorrem a diluição das marcas partidárias e o crescente volume de informações de que dispõem os eleitores para formar sua decisão. "Os indecisos são normalmente moderados, de centro, e não se identificam com nenhum partido", diz Marco Lisi, da Universidade Nova de Lisboa, que estudou o fenômeno na Grécia, Espanha e Portugal. "E há outra característica: a indiferença ou a ambivalência em relação aos principais líderes e temas da campanha."


Clique no gráfico acima para conferir quem pode mudar o voto

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A ambivalência é conhecida das pesquisas. É por isso que se fazem perguntas aparentemente estranhas, como se um autodeclarado eleitor de um candidato, se ele votaria no adversário. Muitos respondem "talvez"; alguns dizem "certamente!". Nada de espantoso nisso. A maioria das pessoas abriga visões antagônicas de mundo e aplica uma ou outra conforme a situação, explica o lingüista George Lakoff, autor de "The Political Mind". Ambivalentes podem ser chamados 'moderados' ou 'centristas', mas, a rigor, podem se comportar de modo bastante extremado, indo de um polo a outro do espectro.

Esta volatilidade reflete um fato conhecido de neurocientistas e marqueteiros: o voto do eleitor não é resultado da fria ponderação de propostas ou retrospectos. Antes, espelha os valores morais, a bagagem emocional do eleitor e os sentimentos despertos pelos candidatos ao longo da campanha. E não há nada de errado com isso. "Em geral, é falso dizer que a emoção atrapalha a razão", diz Lakoff. "Ao contrário, a racionalidade requer emoção."

O prestígio dos aliados – As campanhas do tucano José Serra e da petista Dilma Rousseff estão atentas a este eleitorado volúvel e a dois movimentos de migração de voto: a partilha do eleitorado verde e a transferência de prestígio de aliados locais consagrados no primeiro turno.

Cerca de 6,2 milhões de pessoas elegeram governadores aliados de Serra, mas não votaram em Serra. Do lado governista, cerca de 3,8 milhões de pessoas deixaram de votar em Dilma, mas não no governador eleito da base aliada a ela. Somados os eleitores dos candidatos estaduais que passaram para o segundo turno, o estoque de votos do tucano vai a 7 milhões, e o da petista, a 3,8 milhões. A vantagem também é de Serra quando se estima o potencial de votos que os senadores eleitos podem transferir aos presidenciáveis aliados: 8,7 milhões para ele, contra 5 milhões para Dilma.


Clique no mapa para ver arte completa da transferência de votos

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Quase a metade do potencial de transferência de votos do tucano se concentra em Minas Gerais. Para que esse potencial se concretize, Serra conta com o prestígio da principal força política do estado, Aécio Neves. No primeiro turno, o ex-governador conseguiu eleger como sucessor um técnico até então pouco conhecido, Antonio Anastásia. Além disso, conquistou uma das vagas no Senado para si e garantiu a outra para o ex-presidente Itamar Franco (PPS). A diferença entre os votos obtidos por Anastasia e Serra em Minas Gerais é de 3,3 milhões, quase o dobro da vantagem de Dilma no estado no primeiro turno, que foi de 1,7 milhão. Se realizada, a transferência do voto aecista é mais que suficiente para dar a vitória no estado a Serra. É bem inferior à vantagem nacional da petista no primeiro turno (14,5 milhões), mas, curiosamente, desde 1989, a votação em Minas tem sempre refletido o resultado final das eleições nacionais: quem ganha no estado, leva.


Dilma acompanhou mais de perto os bons e maus desempenhos dos aliados – afinal, estiveram todos sob a influência de um mesmo cabo eleitoral, o presidente Lula. Por essa razão, o potencial de transferência de votos em seu favor é bem menor. Isso explica porque, em vez de explorar o prestígio de aliados como Eduardo Campos (PSB), eleito com 82% dos votos em Pernambuco, a petista tenha optado por concentrar a campanha bem onde Serra procura ampliar sua fatia: o Sudeste. Quer anular a debandada pró-Serra em estados como São Paulo e Minas Gerais.

De qualquer forma, a conta fria da transferência de votos deve ser vista com reserva. "O eleitor não é propriedade dos políticos", diz o sociólogo Geraldo Tadeu Monteiro, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social. "Os apoios são obviamente importantes, mas não resultam em adesão automática", acrescenta o cientista político Humberto Dantas, conselheiro da ONG Voto Consciente. Dantas lembra a mal sucedida tentativa de Marta Suplicy (PT) de eleger-se no segundo turno da eleição de 2004 para prefeito de São Paulo com votos do rival histórico Paulo Maluf (PP), que lhe declarou apoio contra Serra. Já Monteiro lembra a bem sucedida onda petista no Rio, no segundo turno da corrida presidencial de 2002, quando Anthony Garotinho, derrotado em primeiro turno, conseguiu transferir quase toda sua expressiva votação no estado para Lula, contra o tucano Serra.

A herança verde –  A disputa pela Presidência ficou automaticamente apertada no segundo turno porque o espólio da terceira colocada, Marina Silva (PV), favoreceu o segundo colocado José Serra (PSDB). Faz sentido: o voto em Marina foi, para além da ideologia, um voto no segundo turno e, inicialmente, mesmo que involuntário, um voto anti-Dilma. Segundo o Datafolha, o tucano herdaria 46% dos votos de Marina (era 51% no último levantamento), e Dilma, 31 (era 23% há uma semana). Considerado o comparecimento em primeiro turno, isto significa um aporte de cerca de 9 milhões de votos em favor de Serra e de 6 milhões para Dilma, o que reduziria a vantagem da petista nas urnas de 14,5 milhões para 11,5 milhões de votos.


Clique no gráfico e confira como se dividem os votos dos verdes

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Clique no mapa para ver onde estão os votos do PV

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Mas há ainda um importante contingente do eleitorado que continua indeciso (12%) ou alega a opção pelo voto nulo/branco (11%). É o que impôs a agenda verde às campanhas de Dilma e Serra. Não é por outra razão que a petista lançou esta semana seus compromissos ambientais em encontro com o PV no Acre, do qual participaram lideranças tão díspares quanto o deputado Sarney Filho (PV-MA) e a filha do líder seringueiro Chico Mendes, Angela Mendes. No mesmo dia, Serra caminhava pelo Rio ao lado de Fernando Gabeira, um dos fundadores do PV, derrotado na disputa pelo governo do estado. Sabem que o eleitorado verde, diferentemente de Marina Silva, não poderá declarar "independência". Mais cedo ou mais tarde, ele terá de tomar a sua decisão.

Um milhão de votos por dia

Para perder a eleição, Dilma Rousseff precisa deixar de ter o apoio de 1 milhão de eleitores por dia, de hoje até o próximo domingo. Impossível? Não. Difícil? Muito.

Até o dia 31, Dilma comparecerá ainda a uma série de eventos de rua e comícios. Neles, não corre riscos (exceto, talvez, de uma bolsa de água cair sobre sua cabeça; mas isso não tira votos, ao contrário).

Como é natural, estará sempre protegida pela claque de militantes e pela popularidade de Lula — que deve estrelar todos esses eventos, a começar pela carreata de hoje de manhã no Rio de Janeiro. Também nos programas eleitorais do rádio e da TV navegará em águas tranquilas.

Dilma, no entanto, estará exposta à duas situações potenciais de perda de votos. Uma são os debates — o de amanhã, na Record; e o de quinta-feira, na Globo. Programa ao vivo, tensão de campanha, tudo isso contribui para uma possibilidade de tropeço.

Em favor de Dilma, porém, é preciso reconhecer que, se ela não é boa de debate na TV (é prolixa, artificial, não conclui pensamentos etc.), também nunca teve uma atuação desastrosa nestes confrontos. Até aqui, ela os perdeu por pontos. Se quiser manter as esperanças, José Serra terá que vencer por nocaute os dois debates.

A outra situação de risco que pode lhe roubar votos é a reportagem de capa de VEJA desta semana. A pressão para que um alto funcionário do ministério da Justiça produzisse dossiês contra adversários é uma revelação de teor explosivo. E que reforça uma característica do perfil de Dilma: a da pessoa pública com uma queda especial pela fabricação de dossiês.

Há dois anos, foi justamente na Casa Civil comandada por Dilma que Erenice Guerra coordenou a confecção de um dossiê com gastos pessoais de FHC e de Ruth Cardoso (a papelada foi reunida com o objetivo de chantagear adversários, num contra-ataque às revelações de gastos de ministros de Lula feitas pela CPI dos Cartões Corporativos.).

O caso Erenice (o mais recente, não aquele do parágrafo acima), tirou parte dos votos que Dilma possuía em algum momento de setembro e ajudou a levar a disputa para o segundo turno. E agora?

Apesar da gravidade da revelação, ainda é cedo para dizer como isso se traduzirá em (perda de) votos. Nos últimos anos, políticos e pesquisadores repetem que notícias de que a confeção de um dossiê não tira votos de ninguém – segundo o chiste corrente, o brasileiro médio entende “docinho” quando ouve “dossiê”.

Ainda que tal confusão seja real, na dinâmica de uma campanha nervosa como a atual por prudência não se deve tentar adivinhar o futuro com base em clichês deste tipo. Assim, o mais correto é aguardar mais alguns dias.

De qualquer forma, permanece o desafio do primeiro parágrafo, que dizia mais ou menos assim: para vencer a eleição, José Serra precisa ganhar o apoio de 1 milhão de eleitores por dia, de hoje até o próximo domingo. Impossível? Não. Difícil? Muito.

Por Lauro Jardim
Voto das mulheres ainda é calcanhar de aquiles de Dilma

Assim como aconteceu com Lula nas cinco eleições presidenciais que disputou, as mulheres são o calcanhar de aquiles de Dilma Rousseff.

De acordo com cálculo do demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, do IBGE, a candidata do PT teria sido eleita no primeiro turno não fosse o "gap" de gênero -a diferença de votos entre homens e mulheres.
Com base em 45 pesquisas eleitorais realizadas neste ano por Datafolha, Ibope, Vox Populi e Sensus, Alves acompanhou a diferença de intenção de voto entre o eleitorado masculino e o feminino ao longo da disputa.
De acordo com ele, a média das quatro últimas pesquisas realizadas antes do primeiro turno davam a Dilma 51% entre os homens e 43% entre as mulheres.
A diferença de oito pontos percentuais, diz o demógrafo, representou cerca de 4,2 milhões de votos.
Como Dilma teve 47,6 milhões de votos e precisava de pelo menos 50,85 milhões para ser eleita (considerando o mesmo universo de 101,6 milhões de votos válidos), "pode-se afirmar que foram as mulheres que jogaram as eleições para o segundo turno", diz Alves.
Apesar dos esforços da campanha, que direcionou ações específicas para seduzir o público feminino, o "gap" de gênero que valeu no primeiro turno permaneceu após o dia 3 de outubro.
Segundo a mais recente pesquisa Datafolha (dia 21), Dilma tem 55% de intenção de voto entre os homens e 45% entre as mulheres.
A diferença, de dez pontos percentuais, é maior -em termos proporcionais e absolutos- que entre os eleitores de José Serra (PSDB). O tucano tem 38% entre as homens e 41% entre as mulheres.

ESTRATÉGIA
Para Alves, tudo leva a crer que, se Dilma ganhar, "será uma vitória liderada pelos homens", e, se Serra vencer, "liderada pelas mulheres". Trata-se de uma "guerra invertida entre os sexos".
O PT conhece de longa data a resistência do eleitorado feminino. Coordenadores da campanha de Dilma ouvidos pela Folhaavaliam que está nas mulheres adultas, principalmente acima de 40 anos, o maior desafio da candidata neste segundo turno.
Segundo eles, essas eleitoras têm uma resistência maior a mudanças.
E, mesmo com o discurso de que Dilma representaria a "continuidade" do governo Lula, o simples fato de ser ela a primeira candidata à Presidência no país representaria um risco.
Por isso, na tentativa de formular um discurso para atrair o voto feminino, desde o início da campanha o partido exaltou características próprias do universo das mulheres, como o fato de Dilma ser "mãe" e, mais recentemente, "avó" -algo que desagradou a feministas (veja texto ao lado).
Ainda focada nessa fatia do eleitorado, a campanha adotou como bordão a tese de que ela cuidará do povo com amor maternal. A estratégia será repetida à exaustão até o fim da campanha.
É que, na avaliação do PT, esse estrato do eleitorado -mulheres acima dos 40 anos que não declaram voto na petista- será o último a decidir por um dos dois candidatos. E são os indecisos o grupo que pode alterar o rumo da eleição.
Para Alves, do IBGE, a estratégia da campanha petista deu certo na pretensão de associar a Lula o voto em Dilma. No entanto, diz ele, o preço foi a perda da autonomia feminina da candidata. A maioria vota nela não porque ela é mulher, mas "porque é a sucessora indicada pelo popular presidente".
Ele considera "simplistas" explicações como as de que mulheres são mais conservadoras ou a de "mulher vota em mulher": "o gênero opera no campo da cultura, e não no terreno da natureza".

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Fonte:
Veja.com/Folha

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