Pesquisas já não servem de conforto, por RENATA LO PRETE

Publicado em 28/10/2010 07:06
A atitude petista hoje em nada lembra o excesso de confiança exibido na reta final do primeiro turno
AINDA QUE o antepenúltimo Datafolha da sucessão presidencial de 2010 tenha contribuído para tranquilizar integrantes da campanha de Dilma Rousseff -entre os quais havia, na véspera, quem genuinamente esperasse por uma redução da vantagem sobre José Serra-, a atitude petista hoje em nada lembra o excesso de confiança exibido na reta final do primeiro turno.

Mesmo com o quadro de estabilidade desenhado pela pesquisa, encontra-se, entre as vozes alinhadas com o governismo, até a opinião de que o debate da Rede Globo, amanhã à noite, poderá ser "decisivo".
Sério? Com 12 pontos de diferença pelo critério de votos válidos? Uma combinação de fatores explica esse surto de cautela.
Para começar, a zona de conforto de Dilma, embora razoável se considerado o curto intervalo de três dias daqui até a votação, não se compara à de Lula na mesma altura em 2002 (28 pontos sobre Serra) ou 2006 (22 sobre Geraldo Alckmin).
Existe ainda a necessidade de manter a tropa em estado de alerta.
O triunfalismo, antes adequado ao propósito de "criar um clima" para tentar liquidar a eleição pela via rápida, agora poderia desmobilizar a militância, tantas vezes valiosa para o PT na hora decisiva.
Acrescente-se a desconfiança que paira sobre as pesquisas em consequência dos erros cometidos no primeiro turno. Ela não atinge apenas o eleitor. Introduz um permanente "e se?" também na cabeça dos operadores da política.
Os levantamentos internos da campanha de Serra apontam Dilma à frente, porém bem mais próxima do tucano. A fotografia é semelhante à do GPP, historicamente ligado ao DEM, e diferente da apresentada pelos principais institutos.
É perfeitamente possível que estes últimos estejam certos -ou menos errados-, mas a dúvida sobrevive em razão de uma "verdade inconveniente": computadas tanto pesquisas feitas para divulgação quanto para consumo interno, os números apurados pela campanha de Serra foram os que mais se aproximaram do resultado do primeiro turno; os de Dilma superestimaram por larga margem sua dianteira.
Por fim, há a peculiaridade de uma disputa em que nenhum dos dois finalistas, sem prejuízo dos milhões de votos recebidos e a receber, conseguiu empolgar o eleitor.
Isso se reflete não somente no que ainda resta de indecisos (8%, segundo o Datafolha, contra 6% no mesmo momento de 2002 e 3% quatro anos atrás) mas também em fenômenos menos quantificáveis.
Nas "quális", mediadores se impressionam com a inconsistência da defesa tanto de Dilma quanto de Serra. Não raro, participantes mudam de voto uma ou duas vezes na mesma sessão. A questão, no entender de quem acompanhou eleições anteriores, é a escassez de argumentos à disposição do eleitor.
Chama a atenção que Lula seja, até hoje, "o" atributo conferido a Dilma nos grupos. Quanto a Serra, que buscou ser aceito como "continuador", acabou confinado ao cercado que a força do presidente no eleitorado lhe impôs.
À diferença do que aconteceu nos dias anteriores ao primeiro turno, não há movimentação visível. Mas, num terreno assim pantanoso, não estranha que tenha gente enxergando jacaré embaixo da cama.


RENATA LO PRETE é editora do Painel
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Na reta final, editorial da Folha

Encerra-se amanhã o horário eleitoral gratuito, reiniciado na campanha de segundo turno em 8 de outubro. Também amanhã à noite acontecerá o último debate televisivo reunindo os dois presidenciáveis. A petista Dilma Rousseff e o tucano José Serra se enfrentarão ao vivo pela quarta vez em quatro semanas, desta feita na Rede Globo.

Não se pode dizer que tenham faltado oportunidades para que os candidatos apresentassem suas propostas ao país. A carga de exposição dos dois em campanha, no entanto, resultou, em muitos aspectos, numa experiência mais exaustiva do que esclarecedora.
Há que se destacar, quanto a isso, a saturação das fórmulas adotadas nos debates televisivos. Engessados por regras e interdições que as coordenações das campanhas impõem às emissoras, os encontros acabam por preservar os candidatos de um escrutínio mais franco e revelador.
A vacuidade de propostas -o tucano não apresentou programa de governo e a petista divulgou na última hora apenas uma lista de diretrizes- é preenchida por ataques e subterfúgios que aumentam a animosidade entre militantes, mas diminuem a inteligência da discussão. As conveniências dos postulantes prevalecem sobre os interesses do eleitor.
Para evitar a sensação de que, mais e mais, os períodos eleitorais se consomem numa mera encenação democrática, seria preciso, entre outras coisas, emancipar o jornalismo de sua presença quase decorativa nos debates. É inconcebível que jornalistas não tenham sequer direito a réplicas às respostas a perguntas (em geral, só uma) por eles formuladas.
Mas não se trata apenas disso. Cada campanha tem suas características, seus assuntos, suas surpresas próprias. É incontornável a sensação de que, nesta que agora vai chegando ao final, boa parte do tempo do eleitor foi desperdiçada com discussões supérfluas, postiças ou inconclusivas.
Pouco ou nada se explicitou, por exemplo, sobre o que pretendem fazer Dilma e Serra a respeito das políticas econômicas. Omitem-se as propostas para a área cambial (referente à relação do real com as moedas estrangeiras), fiscal (de administração das receitas e dos gastos públicos), e monetária (de controle dos juros e da inflação). O grande tema, durante dias, foi o aborto. Sem dúvida assunto relevante, mas enfrentado de maneira oportunista ou ardilosa pelos dois candidatos.
O jogo da sucessão, a essa altura, parece definido. Conforme a última pesquisa Datafolha, o quadro está estabilizado há mais de uma semana: Dilma tem 56% dos votos válidos, contra 44% de Serra. Considerando-se os votos totais, há, ainda, 8% de eleitores indecisos, além de 5% que pretendem anular ou votar em branco.
Tanto a audiência da emissora como a proximidade da votação redobram as expectativas em relação ao debate de amanhã. Será a derradeira oportunidade oferecida aos eleitores para dirimir dúvidas e comparar os dois candidatos. É pouco provável no entanto que alguma mudança brusca no cenário possa reverter em apenas três dias o favoritismo da postulante petista.


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Fonte:
Folha de S. Paulo

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