Lula já está em campanha para voltar, por Ricardo Setti

Publicado em 31/10/2010 08:53
Lula já está nostálgico do poder — e, não se iludam, já em campanha para voltar

Amigos, agora falta pouco para o presidente Lula deixar o poder: dois meses.

Dois meses, e o sonho acabou para Lula: nada mais das pompas inebriantes do poder, nada da piscina do Palácio do Alvorada, suas magníficas instalações, seu cinema particular, nada de helicópteros para lá e para cá.

Não mais o Aerolula de 60 milhões de dólares viajando mundo afora, os batedores à frente do carro blindado, os rapapés de autoridades, os tapetes vermelhos, as tropas formadas em posição de sentido, os olhos e ouvidos do país, diariamente, tomados pela sua figura, pelas arengas em voz roufenha em todas as emissoras de rádio e TV.

O presidente já está mostrando, por seu comportamento, por sua emoção em pequenas e grandes solenidades, a nostalgia que já leva na alma dos 8 longos anos em que se situou no centro das atenções nacionais e de protagonista frequente e ubíquo na cena internacional.

O que fará Lula depois de deixar o poder? Especulações não faltaram.

Houve o sonho, acalentado por amigos do rei, se não por ele próprio, de ser secretário-geral da ONU. Não era impossível. Afinal, um latino-americano de muito menos cacife que Lula, o diplomata peruano Javier Pérez de Cuéllar, já ocupou o importante cargo por dez anos, até o final de 1991. O problema, se outros não houvesse, é que Lula foi queimando pontes com sua amizade calorosa com os irmãos ditadores de Cuba, com o caudilho venezuelano Hugo Chávez, seus compagnons de route da Bolívia, do Equador, da Nicarágua…

Até aí ainda não seria problema de tanta monta, mas Lula, que se acha ungido por Deus, acabou enfiando o dedo numa tomada de altíssima voltagem ao abraçar o pária internacional Mahmoud Ahmadinejad. Com isso, irritou todos os principais líderes da União Européia e, pior, tocou no plexo solar da superpotência americana — os interesses de sua segurança nacional. O Irã, como se sabe, é inimigo acérrimo dos Estados Unidos, apóia grupos terroristas xiitas em vários países, está numa corrida pela bomba atômica, acena com varrer do mapa um dia o principal aliado de Washington no Oriente Médio, Israel, e por aí vai.

Quer dizer, bye-bye ONU, definitivamente. Haveria o consolo da FAO, o organismo da ONU para agricultura e alimentação. A credencial do presidente seria o prestígio internacional que angariou no começo de seu mandato com o Fome Zero, que hoje em dia no Brasil ninguém sabe onde foi parar, diluído que se encontra nos desvãos do programa Bolsa Família, e a rede de contatos e simpatias que formou e consolidou na América Latina, no Oriente Médio, na África e em partes da Ásia.

Parece que Lula não se interessou pela FAO.

E por bons motivos. Quando deixar o poder, todas as energias do presidente estarão concentradas num objetivo: voltar a ele.

Por isso, ao deixar o poder, Lula estará onde sempre esteve, desde os anos 70: em cima de um palanque.

Antes, era o sindicato dos Metalúrgicos. Depois, vieram as campanhas para governador de São Paulo, em 1982, para deputado federal, em 1986, para presidente, em 1989, 1994, 1998, 2002, 2006 e, em nome de Dilma Rousseff, em 2010.

Nos intervalos das campanhas, a partir de 1993, vieram as Caravanas da Cidadania — lembram-se? –, em que Lula percorreu o Brasil “para conhecer de perto a realidade nacional”, mas empre em cima de palanques, até quando navegou pelo Rio São Francisco e pelos rios da Amazônia.

O que vocês acham das declarações do presidente de que vai “correr o Brasil” durante o possível governo Dilma para ver o que ele próprio “deixou de fazer” de forma a que a possível presidente “faça mais e melhor do que eu”?

Ele vai estar como e onde sempre esteve: de campanha, num palanque. Até o instituto que vai criar para armazenar documentação de seu governo e ser um centro de estudos — medida correta e digna de aplausos, mas menosprezada e ridicularizada quando adotada por FHC –, não tenham dúvida, será utilizado no projeto 2014.

O problema vai ser se Dilma, eleita, fizer governo bem avaliado pela opinião pública. A presidente será ela, a caneta de nomeações, nomeações e demissões será dela, o Aerolula estará a seu dispor, o Alvorada será sua residência, a vassalagem e os rapapés estarão voltados para ela. Quererá ceder a vez ao antigo tutor?

Duvido, duvido solenemente, e assino embaixo. Quem viver, verá.

Dilma promete relação "íntima" com Lula (na Folha)

Dilma Rousseff, candidata do PT à Presidência, prometeu ontem manter uma relação "íntima e forte" com o presidente Lula caso seja eleita hoje a primeira mulher presidente do país. Ela encerrou a campanha com carreata em Belo Horizonte (MG).

Em discurso na linha "paz e amor", a petista prometeu que , se eleita, vai governar "para todos", sem discriminar governadores e prefeitos de partidos adversários. Disse não guardar "mágoas" da disputa, marcada pela animosidade no segundo turno.
Dilma aproveitou o último pronunciamento da campanha para reafirmar os laços com Lula, o grande cabo eleitoral de sua postulação.
"Vou governar com a minha coligação, mas para todos os brasileiros, sem discriminação de partidos. Vou me relacionar com governadores e prefeitos, mesmo de outros partidos, de forma republicana", disse a petista.
A candidata disse ainda que promoverá "não só o desenvolvimento material, mas também de valores".
A declaração foi feita após a petista dizer que não guarda mágoas pelo que chamou de "calúnias" da eleição, sem citar as polêmicas sobre aborto e religião. Dilma defendeu a "tolerância e a capacidade de viver em paz".
Questionada sobre o espaço que Lula terá em sua eventual administração, a petista disse que ele não será "uma presença dentro do ministério", mas que será ouvido.
"Sempre que puder conversarei com o presidente. Terei uma relação muito íntima e muito forte. Não há ninguém neste país que vai me separar do presidente Lula", afirmou a candidata.

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Fonte:
Blog Ricardo Setti (Veja.com)

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