Na Folha: PT afirma que pedido de demissão 'engrandece' Palocci

Publicado em 07/06/2011 20:02


O presidente do PT, deputado estadual Rui Falcão, afirmou em nota que a demissão do ex-ministro-chefe da Casa Civil Antonio Palocci o "engrandece".

"O pedido de demissão do ministro Antonio Palocci --mesmo após a manifestação do Procurador-Geral da República, que confirmou a retidão e legalidade de suas atividades profissionais-- reafirma o alto espírito público de sua conduta", diz o presidente do PT.

Segundo o petista, Palocci decidiu sair do cargo ao avaliar que sua permanência iria ser explorada negativamente contra o governo pela oposição.

"Antes, como agora, o ministro tem toda a nossa solidariedade, tanto mais diante do gesto que só o engrandece", diz Falcão.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) vai substituir Palocci na Casa Civil. Mulher do ministro Paulo Bernardo (Comunicações), Hoffmann foi eleita para o Senado pela primeira vez no ano passado.

Na esteira da saída, a presidente Dilma Rousseff também decidiu substituir o ministro Luiz Sérgio (Relações Institucionais).

A crise que levou à saída de Palocci teve início no dia 15 de maio, após a Folha revelar que o ministro multiplicou seu patrimônio por 20 entre 2006 e 2010.

A Projeto, empresa aberta por ele em 2006 --quando o ministro afirmou ter patrimônio de R$ 356 mil-- comprou, em 2009 e 2010, imóveis em região nobre de São Paulo no valor total de R$ 7,5 milhões.

Folha também mostrou que o faturamento da empresa foi de R$ 20 milhões em 2010, quando ele era deputado federal e atuou como principal coordenador da campanha de Dilma à Presidência da República.

Em entrevista exclusiva à Folha, Palocci afirmou que não revelou sua lista de clientes a Dilma, atribuiu as acusações a ele a uma "luta política" e disse que ninguém provou qualquer irregularidade na sua atuação com a consultoria Projeto.

Em nenhum momento o agora ex-ministro revelou a lista de clientes de sua consultoria e alegou "cláusula de confidencialidade" para não divulgar para quem ele trabalhou enquanto exerceu simultaneamente as funções de deputado e consultor.

Instado a se manifestar sobre o caso pela oposição, que apresentou denúncia contra Palocci, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, decidiu arquivar todas as representações que pediam abertura de inquérito relacionadas ao fato de o patrimônio do ministro ter aumentado pelo menos 20 vezes de 2006 para 2010.


Leia trecho de "Sobre Formigas e Cigarras", de Palocci

Leia, abaixo, um trecho extraído de "Sobre Formigas e Cigarras" (Editora Objetiva, 2007), escrito por Antonio Palocci. O livro revela os bastidores do governo, as desavenças na cúpula do poder e a sua relação com Lula, Dilma, José Dirceu, Dulci, Gushiken e Mercadante.

CAPÍTULO 1

Um médico na economia

Foi Luiz Gushiken quem, em outubro de 2002, falou-me pela primeira vez sobre a idéia que passava pela cabeça do então candidato a presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Lula acabara de receber uma votação estrondosa (trinta e nove milhões, quatrocentos e cinqüenta e cinco mil votos, ou 46,4% do total), chegando ao segundo turno das eleições na condição de franco favorito para suceder o presidente Fernando Henrique Cardoso, do PSDB. No meio da tarde, no comitê eleitoral central, em São Paulo, ele veio como quem não quer nada e disparou, sem meias palavras:

Divulgação
Palocci fala da crise que culminou em sua queda na Fazenda
Palocci fala da crise que culminou em sua queda na Fazenda

- Acho que o chefe vai querer você na Fazenda. Ele comentou isso comigo. Mas muito de passagem...

- Que idéia estranha é essa, Chininha?! - foi a minha primeira reação. - Você precisa convencer o homem a esquecer isso - acrescentei, sem conseguir esconder a surpresa. - O país vive uma crise de credibilidade danada e se ele anunciar um médico no Ministério da Fazenda, aí sim é que vai ser um verdadeiro horror.

Raciocinei por alguns instantes e me ocorreu que talvez ele não estivesse falando sério.

- Talvez ele ache que eu esteja querendo o cargo... - pensei em voz alta. - Mas não tenho o menor interesse e nem vou falar com ele sobre isso. Vê se você mesmo consegue acabar com essa história, Chininha.

Mas Gushiken, um dos coordenadores da campanha da Coligação Lula Presidente e que pouco depois se tornaria ministro da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, não parecia disposto a uma trégua.

- Você sabe que ele tem faro bom para essas decisões - reforçou ele. - Desde junho, você tem sido o interlocutor e trabalhado junto aos empresários e aos mercados. Acho que ele falou sério.

Eu estava decidido a colocar um ponto final e não deixar que a história, que me pareceu totalmente inverossímil, progredisse.

- Chininha, não é hora de fazer marola - apelei. - Converse com ele e não deixe isso ir pra frente.

Era a primeira vez que o assunto surgia por iniciativa do próprio Lula, que, a poucos dias da votação em segundo turno, marcada para o dia 27 de outubro de 2002, mantinha uma liderança folgada nas pesquisas eleitorais e estava cada dia mais próximo do Palácio do Planalto. Antes disso, no entanto, em pelo menos duas ocasiões diferentes essa mesma conversa já surgira - mas, nesse caso, originada bem longe da coordenação da campanha eleitoral e do próprio PT. Não dei muita bola e segui adiante. Na reta final da campanha - em que eu era responsável pela coordenação do programa de governo -, a agenda sobrecarregada com tarefas e compromissos que se multiplicavam de hora em hora com velocidade espantosa se incumbiu de esfriar qualquer especulação nesse sentido. Não precisei sequer fazer força para isso.

No auge da campanha para o primeiro turno, diante da crise que se avolumava, com a subida do risco-país e do dólar e das expectativas de inflação, já se percebia uma forte pressão dos mercados, reproduzida pela imprensa, para que Lula anunciasse rapidamente os nomes do ministro da Fazenda e do presidente do Banco Central mesmo antes das eleições. Quando passou para o segundo turno, esse clamor ganhou fôlego novo. No comitê de campanha, as opiniões entre os colaboradores mais próximos do candidato estavam divididas. Eu, José Dirceu - que era o comandante político da campanha - e Luiz Dulci éramos contra. Já Gushiken e Aloizio Mercadante namoravam a idéia, embora jamais tivessem defendido publicamente essa via.

Durante uma visita de Lula, como candidato, a um jornal paulista, Mercadante defendeu a idéia com entusiasmo. Em tom de brincadeira, o jornalista Ricardo Kotscho, assessor de imprensa de Lula e um grande gozador, daqueles que perdem o amigo, mas não a piada, não perdeu a chance de fazer troça:

- Lula - provocou, com malícia -, acho bom você anunciar logo quem vai ser o ministro da Fazenda. Assim você acalma o mercado e Mercadante...

A tese da antecipação dos nomes para a área econômica foi discutida pelo comando da campanha como uma das saídas para enfrentar a crise que se anunciava. Resolvi telefonar para lideranças nacionais de diversos setores com quem já vinha dialogando para testar as reações do mercado e até fazer, se fosse o caso, alguns ajustes no programa de governo. Era preciso compreender melhor o cenário e nada melhor do que conhecer as opiniões sobre o assunto e os humores de quem estava de fora da campanha. Conversei com sindicalistas, empresários e outras figuras nacionais. Numa mesma semana, dois empresários de setores diferentes da economia vieram com aquela mesma história.

- Vocês deveriam anunciar logo quem será o ministro da Fazenda se ganharem a eleição, pois isso fará bem para a campanha e para o próprio país se o nome for bom - disse um deles.

De repente, ele parou, tomou fôlego e pediu que eu transmitisse seu recado ao candidato do PT à presidência.

- Você queria saber a minha opinião e ela está dada - acrescentou, esperando o momento certo para indicar o seu preferido. - Mas também gostaria que você transmitisse ao Lula a minha idéia de nome para o cargo.

- E quem é? - arrisquei.

- Você! - devolveu, direto, me deixando ligeiramente desconcertado.

- Mas eu sou é médico - respondi. - Não entendo o suficiente de uma área tão delicada como esta para ser o ministro da Fazenda - acrescentei, com sinceridade.

- Não precisa entender tanto assim do assunto, pois é para isso que existem os assessores - replicou ele. - Precisa é ter bom senso e credibilidade no mercado e isso você já demonstrou que tem.

- Vocês perderam o juízo - brinquei, procurando mudar de assunto.

Expliquei a ele que Lula não estava pensando em nomes e que o comitê de campanha estava apenas fazendo algumas consultas para saber o que o empresariado pensava a respeito de uma possível antecipação de nomes. Temendo ser prejudicial para a campanha, caso aquela história voltasse a ser repetida por outras lideranças empresariais e se tornasse pública, suspendi as consultas. Além de discordar da antecipação dos nomes para o Ministério da Fazenda e o Banco Central, eu era ainda mais contra o envolvimento do meu nome nesse tipo de especulação. Nem achava que aquilo fosse para valer e, por isso, sequer relatei o teor das sondagens para Lula ou outras pessoas do comitê. Só mais tarde, em casa, teria coragem de comentar o episódio com Margareth, minha mulher. Sua reação, por sinal, foi bem parecida com a minha:

- De fato é uma idéia meio sem pé nem cabeça - concordou.

Por algum tempo o assunto me pareceu enterrado de vez.

Mas, encerradas as apurações, que confirmaram a vitória histórica do Partido dos Trabalhadores e de seus aliados sobre o PSDB de José Serra, algumas notas começaram a pipocar nos jornais. Um artigo assinado por Vinícius Torres Freire na Folha de S. Paulo informava, por exemplo, que eu estaria, naquele momento, mais credenciado para assumir o ministério do que os interlocutores tradicionais do PT para assuntos econômicos. Fui de novo bater na porta do Gushiken:

- Chininha, foi você quem soprou isso para a Folha?

- Eu, não! - ele jurou. - Mas a matéria é boa...

O bom senso me dizia que não fazia o menor sentido embarcar desnecessariamente em uma disputa dessa natureza e tendo provavelmente como oponente justamente Aloizio Mercadante, um dos mais importantes quadros do partido e recém-saído das urnas com mais de 10 milhões de votos, a maior votação entre todos os candidatos ao Senado Federal eleitos naquele ano no país.

- Você acha que vou entrar numa dividida dessas e começar a criar problemas para o presidente antes mesmo de o governo começar? - perguntei a Luiz Gushiken. Conhecido por suas posições ponderadas e uma amizade pessoal de longa data com Lula, desde que ambos eram dirigentes sindicais, Luiz Gushiken era a pessoa mais talhada para pôr um fim àquela história. Ele, por sua vez, parecia mais disposto a me convencer do contrário do que qualquer outra coisa. E insistia que eu estava errado. Segundo seu raciocínio, o fato de Mercadante ter recebido uma votação tão expressiva o obrigaria a permanecer no Senado.

Mesmo assim, reiterei o apelo para que ele demovesse Lula da idéia.

- Você está preocupado à toa - ele desconversou, sem dar a menor bola para minha aflição. - Deixa a coisa rolar...

(Da Livraria da Folha).

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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