Perda florestal global é menor do que se estimava, diz FAO

Publicado em 02/12/2011 09:10
O resultado mais positivo se deve à maior expansão das áreas florestais, segundo o levantamento feito com dados de satélites de alta resolução


A perda líquida da cobertura florestal global entre 1990 e 2005 foi um terço inferior ao que se estimava anteriormente, mas o desmatamento continua sendo uma ameaça ao meio ambiente e à segurança alimentar, disse na quarta-feira a agência da ONU para alimentação e agricultura (FAO), ao divulgar novos dados obtidos por satélites.

A redução líquida - ou seja, o desmatamento menos o replantio e a expansão natural das florestas - totalizou 72,9 milhões de hectares entre 1990 e 2005, cifra que é 32 por cento inferior aos 107,4 milhões de hectares anteriormente estimados, segundo a FAO.

O resultado mais positivo se deve à maior expansão das áreas florestais, segundo o levantamento feito com dados de satélites de alta resolução. As estimativas anteriores da FAO se baseavam em relatórios nacionais, baseados em diversas fontes.

Mas o novo trabalho mostra que o desmatamento continuou acelerado, e que o planeta perdeu em média 4,9 milhões de hectares de florestas por ano durante o período estudado, ou 10 hectares por minuto, disse a FAO.

"O desmatamento está privando milhões de pessoas de produtos e serviços florestais que são cruciais para a segurança alimentar, para o bem estar econômico e para a saúde ambiental", disse em nota Eduardo Rojas-Briales, diretor-assistente da FAO para o manejo florestal.

Os novos dados também mostram que a perda líquida de florestas se acelerou no final do período pesquisado, chegando a 6,4 milhões de hectares por ano entre 2000 e 2005, depois de ficar em 4,1 milhões de hectares por ano entre 1999 e 2000.

"As novas cifras baseadas nos satélites... oferecem uma informação mais precisa aos tomadores de decisões em todos os níveis, e salientam a necessidade de que países e organizações enfrentem e interrompam urgentemente a perda de valiosos ecossistemas florestais", disse Rojas-Briales.

A taxa mundial de desmatamento, motivada principalmente pela conversão de florestas tropicais em terras aráveis para a agropecuária, foi em média de 14,5 milhões de hectares por ano entre 1990 e 2005, algo compatível com estimativas anteriores, segundo a FAO, que tem sede em Roma.

A área florestal total do mundo era de 3,69 bilhões de hectares em 2005, ou 30 por cento das terras do globo. No período 1990-2005, a redução florestal foi mais acentuada nos trópicos, onde ficam quase metade das florestas do mundo. Nessa região, a perda líquida média foi de 6,9 milhões de hectares por ano, segundo o levantamento.

A conversão de florestas para outros usos não especificados se deu principalmente na América do Sul, seguida pela África.A Ásia foi a única região a registrar aumento líquido da área florestal, graças ao plantio intensivo de florestas na China e em outros países, superando o ritmo do desmatamento.


Pesquisador do Inpe diz que meta de dois graus é política, e não científica

Climatologista afirma que metas de reflorestamento talvez fossem mais efetivas


- THIAGO TEIXEIRA/AE
THIAGO TEIXEIRA/AE

Em entrevista ao Estado, o climatologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), José Marengo, diz que negociadores em Durban devem manter o foco da discussão na redução das emissões e que a meta de restringir o aumento de temperatura a 2º (em relação eo período pré-industrial) é política, e não científica. "Para alguns cientistas, é uma utopia", afirma. Leia a íntegra da conversa.

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) lançou na semana passada uma versão prelimimar de um relatório conectando eventos extremos a mudanças climáticas. Qual a importância desse estudo?

Eu sou um dos cientistas que assinam o capítulo 3 desse relatório, o único capítulo que fala especificamente sobre clima. Este é um relatório dedicado exclusivamente aos eventos extremos; estamos divulgando agora um sumário para os tomadores de decisão, que será apresentado na COP, em Durban, na África do Sul. O relatório científico deve ser publicado este ano. Os resultados mostram de fato que oes eventos extremos estão mudando e já se observam alguns extremos que poderiam ser mais frequentes no futuro, e em praticamente todo o mundo esses eventos já estão sendo atribuídos às mudanças climáticas, em parte também associadas ao efeito das atividades humanas. 

Existem eventos mais fáceis de conectar a mudanças climáticas do que outros?

Tudo depende muito dos estudos que vêm sendo desenvolvidos. Existem mais estudos sobre secas, sobre ondas de calor, ondas de frio, chuvas intensas. Isso em todo o mundo. Já conhecemos melhor o que acontece no presente e isso dá uma melhor base para o futuro. Agora, no caso de ciclones tropicais ou furacões, por exemplo, atualmente não existe um indicador de mudança climática. A única coisa que os modelos mostram é que no futuro talvez os números de furacões se mantenham ou até diminuam, mas pode ser que esses furacões em menor número sejam mais poderosos. 

Qual é o ponto principal desse relatório?

O relatório foi preparado a pedido da ONU e outros organismos que trabalham com desastres naturais no mundo todo. Eles pediram que se preparasse um documento o mais rápido possível, pois não se poderia esperar até 2014 para isso. Precisavam de um relatório que mostrasse que um evento climático não á uma coisa isolada, mas que pode ter impactos na distribuição de água, nos ecossistemas. Foi algo para ser uma base para alertar os governos sobre o que está acontecendo, pra que os governantes tomem atitudes em relação a isso, medidas de adaptação, antes que seja trade. Pensar em estratégias de mitigação para que os impactos que ainda vão acontecer sejam o menor possível. Todo mundo está exposto a algum tipo de extremos, embora o globo seja atingido de forma diferente. 

Diferente como?

O relatório final tem mapas que provam que todo mundo vai sofrer com os impactos dos eventos extremos. O que acontece é que alguns países têm maior capacidade de adaptação do que outros. No caso da América do Sul, por exemplo: a Amazônia e o Nordeste poderão sofrer com secas enquanto o sudeste da AS pode ser afetado por chuvas intensas e enchentes no futuro. Coisa parecida acontece com a Europa. A Europa mediterrânea está sendo afetada por secas e ondas de calor mais intensas. Os impactos aparecem, agora a diferença é que haverá países que poderão se adaptar melhor que outros. Nesse sentido, os países mais vulneráveis e pobres, no sudeste da Ásia, na América do Sul e na África, são os que mais sentirão. 

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) divulgou recentemente um documento em que diz que é possível manter a meta de elevação da temperatura do planeta em 2ºC (com relação aos níveis do período pré-industrial). Qual sua opinião a respeito da meta de dois graus?

Essa agenda de 2ºC é uma agenda mais política do que científica. Você não pode mandar na natureza e dizer: olha, não pode aquecer mais de 2 graus. Particularmente acho muito difícil e muito complicado, e tenho conversado com alguns colegas também que têm a mesma opinião. Estabelecer uma meta de 2ºC sem base científica é perigoso, e modela o que estamos fazendo agora, medidas de adaptação caras....Particularmente acho muito difícil que a temperatura suba apenas 2ºC, acredito em um pouco mais. Teríamos de ter algo muito ambicioso, fechar muitas indústrias, mudar completamente a matriz energética, e isso não é algo que se faça de um dia para o outro. Pode levar décadas e tem um custo muito elevado. Os países pobres e em desenvolvimento dificilmente vão conseguir limitar suas atividades para emitir o necessário para atingir essa meta. Porque não é uma meta que saiu de um estudo científico, foi algo definido nos ambientes políticos. 

Mas para o público em geral ela parece uma meta científica....

Cientificamente falando, o aquecimento é um processo natural, com contribuição humana. Se reduzirmos as emissões a zero o aquecimento pode continuar. Essa meta de 2ºC muitos cientistas consideram uma utopia. Gostariam que acontecesse, mas acham difícil... 

Mas os negociadores não tomam decisões com base em pareceres de cientistas? 

Em teoria, sim. Há comissões na Câmara e no Senado, participamos das audiências públicas. Os governos têm suas equipes de cientistas fazendo pesquisa, mas o que acontece muitas vezes é que esses pesquisadores não concordam entre eles. As ciências são consideradas, mas as negociações se dão em âmbito político. 

Na sua opinião, essa linha de negociação - da restringir a temperatura - está correta? Existe outro tipo de negociação para a questão climática?

Normalmente, uma negociação é baseada em um número. Então, se a temperatura aumentar 2ºC, os impactos não seriam tão altos, e com 4ºC eles seriam imensos. Então se chegou a essa agenda política dos 2ºC, mas a raiz de todo o problema é a emissão de gases-estufa. Nós teríamos de assegurar que todos os países se comprometessem a dimunuir as emissões. E não ficar pensando em 2ºC, porque é um número tão irreal que pode até fazer com que as pessoas desistam de tomar iniciativas, já que é algo muito difícil de alcançar. A ideia é pensar não tanto em um certo teto para o aquecimento, mas em reduzir o possível as emissões, por meio de redução de desmatamento e de poluição. Isso deveria ser configurado como um parâmetro, mas na prática é mais fácil falar em um número... Dois graus é um número politicamente mais fácil de discutir, é uma boa meta política, mas é uma meta muito difícil de alcançar. Para mim seria melhor que todos se comprometessem com a redução de emissões, ou estabelecer milhões de hectares de reflorestamento em nível mundial. Isso poderia ter um resultado melhor no sentido de absorver os GEEs que vêm sendo lançados na atmosfera há décadas. 

O senhor está falando em metas de recuperação florestal? Acha que elas seriam mais fáceis de alcançar? 

Exatamente, de preferência com espécies nativas de cada país. Quanto a serem mais fáceis de alcançar, talvez sim, com um programa de grande escala em todo o mundo, poderia ser. As ONGs e os governos podem ajudar.

Há quem creia que não deveríamos discutir emissões, mas sim o barateamento das tecnologias verdes. O senhor concorda?

Em parte, sim. Mas para poder aplicar essa lógica, primeiro é preciso fazer o que estamos fazendo: confirmar as informações sobre o aquecimento e fazer modelagens de como o clima estará daqui a 50, 100 anos. Isso nos dá, de certa forma, a base para poder pensar nas soluções, e não somente nos problemas.

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Fonte:
O Estado de S. Paulo

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