QUANDO A DIREITA REAGE NAS UNIVERSIDADES (por Rodrigo Constantino)

Publicado em 02/01/2015 09:14
por Rodrigo Constantino, de veja.com

A opinião pública e o liberalismo

Popper

“Não é possível discutir racionalmente com alguém que prefere matar-nos a ser convencido pelos nossos argumentos.” (Sir Karl Popper)

Em 1954, Karl Popper proferiu uma conferência em Veneza, cujo tema era “a opinião pública à luz dos princípios do liberalismo”. Tal conferência encontra-se no livro Em Busca de um Mundo Melhor, de Popper. Aqui, pretendo fazer um breve resumo do que foi dito por este grande defensor da sociedade aberta.

Em primeiro lugar, Popper trata do mito da opinião pública, referindo-se ao mito clássico “vox populi, vox dei”, que atribui à voz do povo uma espécie de sabedoria divina, infalível. Ele lembra que o povo raras vezes fala uma só voz, devido à sua enorme pluralidade. Existem vários “homens comuns”, e mesmo o que eles decidem com unanimidade nem sempre é sábio. Contudo, Popper acredita existir um grão de verdade no mito, pois as pessoas simples são muitas vezes mais sábias do que os governantes, e, se não mais sabeis, “são freqüentemente guiadas por interesses melhores e mais generosos”.

A seguir, Popper levantou um conjunto de teses acerca dos fundamentos do liberalismo. O Estado seria um mal necessário, e seus poderes não podem ser multiplicados além da medida necessária. Mesmo num mundo com homens bons, ainda haveria homens mais fracos e mais fortes, e os mais fracos não teriam nenhum direito de ser tolerados pelos mais fortes sem um Estado que garantisse tal direito. Eles teriam que ser gratos pela bondade dos mais fortes em tolerá-los. Todos que consideram tal visão insatisfatória e crêem que qualquer um deve ter um direito de viver e uma reivindicação de ser protegido contra o poder dos fortes, reconhecerão a necessidade de um Estado que proteja o direito de todos. Entretanto, não é difícil mostrar que o próprio Estado é um perigo constante e nesse sentido um mal, mesmo que necessário. Afinal, para o Estado cumprir essa função necessária, ele deve ter mais poder do que qualquer indivíduo ou mesmo grupo de indivíduos. Tal concentração de poder sempre será perigosa para a liberdade.

Outro fundamento do liberalismo é a democracia. A diferença entre esta e um despotismo é, segundo Popper, que numa democracia é possível livrar-se do governo sem derramamento de sangue, enquanto num despotismo não. Como Popper defende para as ciências naturais o método de tentativa e erro, através da crítica racional, infere o mesmo para o modelo político, entendendo que através da democracia é, ao menos, viável derrubar um mau governante pacificamente. Mas Popper deixa claro que não devemos ser democratas porque a maioria sempre está certa, e sim porque as instituições democráticas, se enraizadas em tradições democráticas, “são de longe as menos nocivas que conhecemos”.

Popper atribui uma grande relevância às tradições também, pois meras instituições nunca são suficientes se não estão sustentadas por sólidas tradições. Instituições são sempre ambivalentes, podendo atuar segundo um propósito oposto ao que deveriam, caso não tenham o auxílio de uma tradição forte. O autor explica melhor: “Como todas as leis podem estabelecer apenas princípios universais, elas devem ser interpretadas para ser aplicadas; mas uma interpretação, por sua vez, precisa de certos princípios da prática cotidiana que só uma tradição viva pode desenvolver”. Popper considera que não há nada mais perigoso do que a destruição da moldura moral, que são justamente essas tradições mais importantes. Ela acaba levando a um niilismo cínico, “à desconsideração e dissolução de todos os valores humanos”.

Além disso, a liberdade de pensamento e livre discussão são valores últimos do liberalismo, que podem ser explicados por referência ao papel que desempenham na busca da verdade. Como a verdade não é manifesta, não cai do céu, tampouco é fácil de encontrar, é fundamental garantir tais princípios, para que a tenhamos a descoberta gradual de nossos próprios valores, através da tentativa e erro e da discussão crítica. O valor de uma discussão “depende amplamente da variedade das visões e opiniões que se enfrentam”, e o liberalismo põe sua esperança “não num consenso de convicções, mas na fertilização mútua das opiniões e em seu conseqüente desenvolvimento”. Nesse contexto é que a opinião pública pode representar um perigo para a liberdade. Pelo seu anonimato, a opinião pública “é um poder sem responsabilidade” e, por isso, especialmente perigosa. Ela pode tornar-se um poder despótico, e isso gera novamente a necessidade de proteção do indivíduo pelo Estado.

O resumo fica nas palavras do próprio autor: “A entidade vaga, mal compreendida, chamada ‘opinião pública’ é, com freqüência, mais esclarecida e sábia do que os governos; mas, sem as rédeas de uma forte tradição liberal, representa um perigo para a liberdade. A opinião pública jamais pode ser reconhecida como vox dei, como árbitro da verdade e da falsidade, mas às vezes é um juiz iluminado em questões de justiça e outros valores morais. É perigosa em questões de gosto. Infelizmente pode ser ‘elaborada’, ‘posta em cena’ e ‘planejada’. Podemos combater esses perigos apenas pelo fortalecimento das tradições do liberalismo; e qualquer um pode participar desse projeto.”

Texto presente em “Uma luz na escuridão”, minha coletânea de resenhas de 2008.

 

A sociedade aberta segundo Karl Popper

“O futuro depende de nós mesmos, e nós não dependemos de qualquer necessidade histórica.” (Karl Popper)

O filósofo Bertrand Russell definiu a obra-prima de Sir Karl Popper, A Sociedade Aberta e Seus Inimigos, como “um trabalho cuja importância é de primeira linha e que deve ser largamente lido por sua crítica de mestre aos inimigos da democracia, antigos e modernos”. O livro faz um ataque contundente a Platão, assim como uma análise mortal de Hegel e Marx. Creio que um dos grandes valores do livro é levar o debate político para a divisão entre coletivistas e individualistas, ao invés de esquerda e direita. Popper combate duramente os autoritários coletivistas, independente do espectro político. Seu foco é a transição da sociedade tribal, ou sociedade fechada, para uma sociedade aberta. Na primeira, há uma submissão às forças mágicas, enquanto a última “põe em liberdade as faculdades críticas do homem”.

Um dos maiores inimigos da sociedade aberta é ohistoricismo. Para Popper, “o futuro depende de nós mesmos, e nós não dependemos de qualquer necessidade histórica”. Os historicistas, ao contrário, acreditam ter descoberto leis históricas que permitem profecias sobre o curso dos acontecimentos históricos. Os homens não seriam donos do próprio destino, segundo esses pensadores. Esta postura alivia os homens do ônus de suas responsabilidades, pois não importa o que façam, o futuro já está definido. Como exemplo está a doutrina do “povo escolhido”, ou o determinismo econômico de Marx. A doutrina historicista costuma ser profética, conduzindo à rejeição da aplicabilidade da ciência e da razão aos problemas da vida social. Em última instância, é a doutrina do poder, da dominação e da submissão.

Como sinônimo desse modelo, temos o tribalismo, ou seja, “a ênfase sobre a suprema importância da tribo, sem a qual o indivíduo nada é em absoluto”. O coletivismo, seja ele de classe, raça, credo ou nação, fica acima do indivíduo, que nada significa. Esse tribalismo tem como traço marcante uma rigidez social, sendo a vida determinada por tabus sociais e religiosos. Cada um tem seu lugar definido, um lugar “natural”, que lhe foi destinado pelas forças que regem o mundo. A sociedade ideal de Platão, exposta em A República, atesta isso, defendendo a divisão entre castas. Popper diz: “Em combinação com a idéia historicista de um destino inexorável encontramos freqüentemente um elemento de misticismo”. Popper demonstra aberta hostilidade para com o historicismo, convicto de que ele é “fútil, senão pior do que isso”. Com base na tradição tribal coletivista, as instituições não deixam campo à responsabilidade pessoal. Essa sociedade mágica, tribal ou coletivista seria a sociedade fechada, enquanto uma sociedade aberta ou democrática seria aquela “em que os indivíduos são confrontados com decisões pessoais”. Platão, ao ir contra tudo isso segundo a leitura de Popper, foi tachado por este de “partidário do totalitarismo”. *

Para Popper, a transição da sociedade fechada para a aberta “pode ser descrita como uma das mais profundas revoluções por que passou a humanidade”. O comércio seria um dos maiores perigos para a sociedade fechada, forçando sua abertura. Por isso vemos tanta hostilidade ainda hoje, por parte dos coletivistas, em relação ao comércio global. A queda da sociedade fechada gera tensões, criadas pelo esforço que a vida em uma sociedade aberta continuamente exige, através da necessidade de ser racional, de cuidar de nós mesmos e de aceitar responsabilidades. A comunidade tribal é o refúgio dos receosos, o lugar de segurança contra os “inimigos hostis”, o desconhecido. Seria o análogo a uma família para uma criança, que sabe qual papel deve desempenhar, já que lhe é imposto.

Na Guerra do Peloponeso, entre Esparta e Atenas, Popper encontra o berço dessa transição, com os espartanos representando a vida tribal e os atenienses esboçando uma abertura ao indivíduo livre e racional. Entre os princípios da política espartana estavam a proteção contra as influências estrangeiras que pudessem pôr em perigo a rigidez dos tabus tribais, a independência do comércio externo, o anti-universalismo de não se misturar com os inferiores e a dominação dos vizinhos. Em Atenas, ao contrário, vários pensadores já defendiam os pilares básicos da sociedade aberta, com uma nova fé na razão, na liberdade e na fraternidade dos homens. Para Popper, esta é a única possível fé da sociedade aberta. Seus principais inimigos são justamente os misantropos e os detratores da razão humana. Aqueles que sonham com uma unidade, beleza e perfeição, com um coletivismo utópico, demonstram um sintoma do espírito de grupo do tribalismo. “Nunca podemos retornar à alegada inocência e beleza da sociedade fechada”, afirma Popper. O sonho de um céu não pode ser realizado na terra.

Quando começamos a confiar em nossa razão, a usar nossos poderes de crítica, “não poderemos retornar a um estado de submissão implícita à magia tribal”. O paraíso está perdido para aqueles que experimentaram da Árvore do Conhecimento. Uma tentativa de regressar à Idade de Ouro leva à Inquisição, à Polícia Secreta e a um banditismo romantizado. Popper diz: “Não há mais volta possível a um estado harmonioso da natureza; se voltarmos, então deveremos refazer o caminho integral – devemos retornar às bestas”. Para permanecermos humanos, só existe o caminho da sociedade aberta. Popper conclui: “Devemos marchar para o desconhecido, o incerto e o inseguro, utilizando a razão de que pudermos dispor para planejar tanto a segurança como a liberdade”.

 * Platão, em A República, traça o que seria o Estado ideal, ainda que não exeqüível na prática. Há um claro viés coletivista, colocando os indivíduos como nada mais que instrumentos para a felicidade da “República”. Caberia aos sábios determinar as regras, aniquilando as escolhas individuais. Normalmente, o coletivista parte do pressuposto que ele estará sempre do lado legislador, criando as regras e decidindo o rumo da felicidade alheia. Temos passagens bastante autoritárias no livro: “Deixaremos ao cuidado dos magistrados regular o número dos casamentos, de forma que o número dos cidadãos seja sempre, mais ou menos, o mesmo, suprindo os claros abertos pelas guerras, enfermidades e vários acidentes, a fim de que a República nunca se torne nem demasiado grande nem demasiado pequena”. Ou ainda: “Os filhos bem nascidos serão levados ao berço comum e confiados a amas de leite que terão habitações à parte em um bairro da cidade. Quanto às crianças enfermiças e às que sofrerem qualquer deformidade, serão levadas, como convém, a paradeiro desconhecido e secreto”. O ataque contra a liberdade individual não acaba por aí: “As mulheres gerarão filhos desde os vinte até os quarenta anos; os homens logo depois de passado o primeiro fogo de juventude, até os cinqüenta e cinco”. Platão foi muito além, defendendo o fim das propriedades dos guerreiros, e deixando todas as decisões importantes para os poucos sábios. Essa outra passagem deixa claro que a República estaria muito acima, em grau de importância, dos indivíduos: “Assim, em nossa República, quando ocorrer algo de bom ou de mau a um cidadão, todos dirão a um tempo meus negócios vão bem ou meus negócios vão mal”. Tamanho coletivismo iria influenciar a Utopia de Thomas More, assim como Cidade do Sol, de Tommaso Campanella. Tais idéias, quando tentadas na prática, resultaram no infeliz experimento soviético.

Texto presente em “Uma luz na escuridão”, minha coletânea de resenhas de 2008.

A libertação do homem segundo Michael Oakeshott

“A vida não examinada não vale a pena ser vivida.” (Sócrates)

Um dos grandes filósofos ingleses que enriqueceram o debate de idéias no século XX foi Michael Oakeshott, que demonstrou interesse por diversos assuntos, como política, história, educação e religião. Sua obra sobre filosofia política, On Human Conduct, parte da premissa de que a ação humana é um exercício de inteligência em atividades de escolha, mostrando semelhança em vários aspectos com a obra-prima de Mises, Human Action. Aqui o foco será seu texto sobre a educação liberal, A Place of Learning, onde ele mostra que o homem é aquilo que aprende ser, através da própria reflexão num ambiente favorável ao aprendizado.

A mente é a atividade inteligente pela qual o homem pode compreender e explicar processos, é a autora não apenas do mundo inteligível onde os homens vivem, mas também de sua relação autoconsciente com este mundo. O homem é livre para buscar este autoconhecimento, sendo responsável por seus pensamentos e ações. A possibilidade de ser inteligente abre espaço para a possibilidade de ser estúpido, e talvez isso afaste tantos dessa busca pelo conhecimento, levando-os à crença de algum determinismo qualquer como fuga.

Mas os homens não podem alegar que suas palavras são colocadas em sua boca por algum deus ou que não passam de descargas elétricas do seu cérebro: elas têm significados pelos quais cada um é responsável por julgar se faz ou não sentido. A simples tentativa de fuga expõe sua impossibilidade, já que somente a mente pode se arrepender por ter que pensar. A liberdade de pensamento exige a responsabilidade pelo que se pensa.

Para Oakeshott, o que distingue um ser humano, o que constitui um ser humano são seus pensamentos, crenças, dúvidas, sua compreensão da própria ignorância, seus desejos, preferências, escolhas, sentimentos, emoções e propósitos, assim como a expressão deles através de suas ações. A condição necessária para tudo isso é que o homem deve aprender tais coisas. Ele diz: “O preço da atividade inteligente que constitui o ser humano é aprender”. E este aprendizado necessário é algo que cada um de nós deve e só pode fazer por conta própria.

O aprender humano é bem diferente do processo natural de adaptação de organismos como reação ao meio-ambiente e às circunstâncias. Não é um aprender passivo, mas um compromisso autoconsciente. Não é uma reação induzida pela pressão externa, mas uma tarefa auto-imposta inspirada pela noção da própria ignorância e de quanto há para aprender. É um desejo pela compreensão. Para um ser humano, então, aprender é um compromisso por toda a vida, e o mundo onde ele habita é o local de aprendizado.

Uma grande parte da conduta humana é direcionada à exploração de recursos no planeta para a satisfação de desejos e necessidades. Esse aprendizado é individual, sempre. Não é uma abstração chamada “Homem” que pode realizar a cura de uma doença, por exemplo, mas algum médico individual que aprendeu com alguns professores a tarefa em questão. Oakeshott afirma que não há algo como “aprendizado social” ou “compreensão coletiva”. São indivíduos que aprendem. Como disse Hayek, o “conhecimento existe apenas como conhecimento de indivíduos”.

Oakeshott reconhece a importância deste tipo de aprendizado prático, mas está muito mais preocupado com outro tipo, qual seja, as aventuras no autoconhecimento humano. A isso ele chama de “educação liberal”, pois está liberada da distração dos negócios que buscam a satisfação das demandas imediatas. Sua compreensão da liberdade decorre da visão de que o homem não está condenado à “dança macabra das necessidades e satisfações”. A vida não se resume a “obter e gastar”. Não estamos presos intelectualmente ao aqui e agora.

Eis onde entra o fundamental papel da cultura, segundo Oakeshott. O autoconhecimento humano seria inseparável do aprendizado na participação daquilo chamado “cultura”, ou seja, uma continuação de sentimentos, percepções, idéias, compromissos, atitudes etc. Não faz sentido, para o filósofo, falar em homem “culturalmente condicionado”, já que o homem é sua cultura, e aquilo que ele é ele teve que aprender a ser. O aprendizado liberal é aprender a responder aos convites das grandes aventuras intelectuais nas quais os seres humanos expuseram suas várias compreensões do mundo e de si mesmos.

A cultura não seria, então, uma miscelânea de crenças, percepções e idéias, mas pode ser reconhecida como uma variedade distinta de línguas de compreensão. Oakeshott faz uma analogia com vozes, como se cada componente cultural desses fosse uma expressão diferente de uma compreensão de mundo, um idioma diferente, e a cultura seria a união dessas vozes, como numa conversação.

Existem constantes ameaças a esta educação liberal. Uma delas vem da “socialização” do aprendizado. Trata-se de uma doutrina que, porque o aqui e agora está cada vez mais uniforme do que já foi, defende que a educação deve reconhecer e promover essa uniformidade. Para Oakeshott, esta á uma das mais insidiosas de todas as corrupções, pois ataca o cerne do aprendizado liberal. O mundo moderno estaria repleto de acontecimentos, mas não muitas experiências memoráveis. Seria um fluxo contínuo de trivialidades sedutoras que não invocam reflexão, mas participação instantânea. As pessoas pulam de uma conformidade da moda para outra, de um guru do momento para o próximo. Há a repetição de slogans e “pontos de vista” embalados de forma profética, mas sem embasamento. Os ouvidos estão cheios de sons na Babel atual, convidando às reações instintivas.

É importante lembrar que Oakeshott escreveu esse artigo em 1975, época em que as universidades estavam vivendo uma grande transformação neste sentido de busca pelo interesse imediato, pela necessidade da profissão, mesmo em sua London School of Economics, na qual era professor. Mas o alerta continua válido, talvez mais que nunca. Essas circunstâncias são hostis à educação liberal, aquela que desamarra o indivíduo das necessidades urgentes do aqui e agora, levando-o a escutar a conversa na qual os seres humanos desde sempre buscam se compreender enquanto humanos.

A busca pelo conhecimento prático é crucial para reduzir o desconforto dos homens na natureza. Os ganhos materiais advindos do avanço no conhecimento humano são fantásticos, e devem ser comemorados, sem dúvida. O progresso da medicina, por exemplo, permitiu que a expectativa de vida dobrasse em poucos séculos. Mas não podemos deixar de lado a questão essencial: qual vida?

Os seres humanos não são máquinas que processam alimentos com o único objetivo de sobreviver e procriar. Somos capazes de muito mais que isso. Oakeshott tentou nos lembrar justamente disso, combatendo o materialismo excessivo da modernidade. A libertação do homem vem através desta busca pelo autoconhecimento. Sem isso, somos apenas símios repetindo gestos de forma automática. Oakeshott reforça, então, a lição socrática exposta na epígrafe. Devemos sempre examinar qual vida desejamos viver.

Texto presente em “Uma luz na escuridão”, minha coletânea de resenhas de 2008.

 

 

O Natal do Sakamoto e o fascínio da esquerda pela abstração

O marxismo é o ópio dos intelectuais. Com essa sacada, Raymond Aron resumiu muito do que significa ser de esquerda, usando inclusive as armas da própria, pois Marx dizia, repetindo Louis Blanc, que a religião era o ópio do povo. O esquerdista tende a gostar de uma visão extremamente abstrata das coisas, enquanto o liberal e o conservador costumam adotar uma visão mais prática e realista.

Flavio Morgenstern escreveu um belo ensaio para o Instituto Liberal sobre isso, com base no suposto Natal de Sakamoto, aquele que ganha centenas de milhares de reais do governo para defender… o governo. Usa como gancho o espanto de um típico esquerdista com as declarações de uma tia pobre, que não aguenta mais tanto imposto e criminalidade, e demanda penas mais severas para os bandidos. Um horror na visão “esclarecida” dos “ungidos” de esquerda.

Como pode alguém se mostrar mais indignado com as “cantadas” que as mulheres recebem nas ruas do que com quase 60 mil pessoas assassinadas todo ano nesse país? Por que a nossa esquerda adota como causas principais questões que parecem tão distantes da realidade do “povão”, aquele que ela jura defender? São perguntas pertinentes, pois o contraste é chocante. A esquerda elitista parece viver numa bolha. Flavio diz:

Tal se dá porque a esquerda, mesmo tendo seu cerne em um livro de economia (lido por todos, exceto por economistas), trabalha com o imaginário coletivo: são de esquerda os críticos literários, os ficcionistas, os psicólogos, analistas da linguagem e sociólogos que trabalham com o próprio mecanismo com o qual interpretamos o mundo.

A direita (liberal ou conservadora) é técnica: domina a economia, o Direito, as relações internacionais – todavia, sem conseguir comunicar o que pensa, por que pensa, com quais objetivos e através de quais meios pretende atingi-los, é vista até por apolíticos pelos signos de interpretação da esquerda, que a ela atribui racismo, intolerância, xenofobia, machismo, homofobia. Mesmo seus próprios defeitos, como intolerância à diversidade e o uso do Estado para impedir a liberdade das pessoas, ou defeitos de inimigos da direita, sobretudo o nazismo.

[...]

Não há um único comentário sobre uma experiência concreta dessas pessoas cometendo injustiça alguma ou ferindo alguém, mas cita-se frases desproporcionais em um ambiente familiar como se significassem que todo o país virou o Partido Nazista.

Todavia, o problema da esquerda é exatamente o oposto: fala maviosamente sobre “justiça social”, edulcora seus métodos para se vender como “preocupada com os pobres”, canta com voz melíflua a respeito de “direitos humanos”… mas, em toda história mundial, é a campeã número 1 (contando até teocracias esquisitas e reinados bárbaros da Antiguidade) de mortes, injustiça, escravização, censura e destruição de direitos básicos do homem.

Nas ceias de Natal que geraram indignação entre os leitores progressistas de Sakamoto, não há ninguém indignado porque um parente foi assassinado num país com 56 mil homicídios em um ano. Não há um único muxoxo contra sermos obrigados a gastar mais para financiar quem ceifa nossas vidas e de nossos entes queridos pelo Estado do que para a educação de crianças inocentes.

Pelo contrário: quem expressa tais sentimentos na mesa de Natal, ainda que de forma desajeitada, é tratado como alguém capaz de provocar “terror e pânico”. A única indignação permitida é contra assoviar para uma mulher, não enfiar uma arma em sua cabeça e atirar. Ou ser contra o Bolsa Família.

O autor segue dissecando as razões por trás dessa postura estranha adotada por tantos esquerdistas, especialmente os da nossa elite. Suas prioridades são bastante insensíveis quando lembramos do quanto o povo brasileiro sofre com coisas básicas. Sua pauta é produzida por gente deslocada da realidade, por adultos que parecem crianças mimadas.

E tudo precisa se encaixar em suas explanações abstratas, que simplificam o mundo de forma maniqueísta, que retiram a complexidade da vida. Opressores e oprimidos, eis o que basta. O que gera interpretações bizarras de acontecimentos do cotidiano. Flavio provoca o leitor:

Tal chave de entendimento está em quase todos os bordões da esquerda mundial, mas não dá conta de absolutamente nada da realidade complexa – se há um negro gay com uma arma apontada para um rico heterossexual, quem é o opressor e o oprimido na situação? E com uma jovem loira e rica com os peitos de fora contra a Igreja, diante de um pobre velhinho religioso rezando em paz?

É com esse tipo de narrativa de heróis e bandidos facilmente identificáveis que muitas pessoas inteligentíssimas ainda creem no mistifório de “correção de injustiças pelo Estado e pela conscientização” da esquerda. Tais narrativas são insuficientes para se conhecer o mundo.

Há um conforto em ver o mundo dessa forma tão simplista e abstrata. Afinal, exige muito mais trabalho e coragem ao se reconhecer que não podemos enquadrar situações complexas em nossas regras abstratas e infantis. Sim, infantis. Lembro que minha filha, quando menor, queria sempre saber, logo no começo dos filmes, quem era o “bonzinho” e quem era o “malvado”, e se o “bonzinho” venceria no final. A esquerda age assim até hoje. Flavio conclui com um convite esperançoso:

Fica um convite para os racionais que ainda creem no planejamento reformador, no centralismo burocrático e no progressismo seletivo da esquerda: conheçam o capitalismo, e saibam o que é de fato a direita liberal ou conservadora. Do contrário, seu destino é apenas a indignação modelo Sara Winter: uma loira, rica, magra, famosa e que alguns consideram atraente, protestando e jurando a si mesma que é uma “minoria” vítima de injustiças.

Rodrigo Constantino

 

QUANDO A DIREITA REAGE NAS UNIVERSIDADES…

Há algo novo no ar. Sinto ventos de mudança. A esquerda radical está perplexa, não sabe como reagir. Por décadas reinou absoluta nas universidades, com seus diretórios dominados, o monopólio da palavra, dos protestos e da organização de eventos. Agora não entende mais nada e cai em histeria diante de um fenômeno novo: a reação da direita!

Vejam o que alguns alunos fizeram na UFF, antro de esquerdistas em Niterói. Pertencem ao grupo Liberalismo Conservador, e se juntaram para fazer uma arrecadação voluntária e mandar imprimir diversos adesivos. Colaram tais adesivos em cima de mensagens pichadas pelos comunistas. espalhado por cima de símbolos como a foice e o martelo comunista e o logotipo do PSOL. É fantástico! Sem falar que agora, ao menos, os brucutus terão escutado o nome Mises, completa novidade para eles. Trata-se do grande economista austríaco Ludwig von Mises, cujos livros representam o melhor antídoto existente contra a praga comunista.

Esses alunos estão de parabéns pela louvável iniciativa. Que outros sigam o exemplo Brasil afora. E notem a diferença já na largada: enquanto os comunistas picham as paredes e estragam o patrimônio das universidades, os liberais colam adesivos apenas, que podem ser retirados sem dano ou estrago à propriedade. Questão de princípios e valores já no básico.

Nesse outro caso, alunos da UFSC, outro antro de marxistas, retiraram a bandeira vermelha e hastearam a bandeira do Brasil no mastro, e em seguida cantaram o hino nacional, enfrentando a cambada de comunistas que amam mais greves do que trabalho. Emocionante.

A esquerda jurássica tem motivo para ficar exaltada e histérica, em polvorosa. Nunca antes da história deste país se viu tal clima crescente de reação espontânea a essa hegemonia marxista nas universidades, que ninguém aguenta mais!

(por Rodrigo Constantino)

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Blog Rodrigo Constantino (VEJA)

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