O presidente Lula foi formalmente convidado, no dia 11, para um
debate com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A resposta acaba
de ser transmitida ao repórter Otávio Cabral, da sucursal de VEJA em
Brasília, pelo ministro Franklin Martins, chefe da Secretaria de
Comunicação Social da Presidência da República. É a seguinte:
“O presidente Lula, quando deixar a Presidência e se tornar um
ex-presidente, aceitará debater com o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso”.
Se Lula estivesse apenas presidindo o processo sucessório, como
costumam fazer em países civilizados chefes de governo em fim de
mandato, o convite nem teria existido. Se tivesse apenas optado por uma
candidatura, sem se envolver ostensivamente na disputa, a recusa até
seria aceitável. Como os fatos informam que o presidente se enfiou até o
pescoço na campanha que antecipou ilegalmente, a rejeição do convite
deixa de fazer sentido.
Sem que ninguém lhe pedisse, Lula decidiu que a candidata seria Dilma
Rousseff, nomeou-se Primeiro Cabo Eleitoral, não desce do palanque há
seis meses, ataca o antecessor em todos os comícios e repete diariamente
que os brasileiros terão de escolher entre o governo FHC e o atual.
Garante que recebeu uma “herança maldita”. FHC garante que a afirmação é
falsa. Um debate entre ambos seria o caminho mais curto para chegar-se à
verdade. Fernando Henrique topou. Lula só quer debater em 2011.
A opção pelo monólogo ─ recomendada, aliás, por 10 em 10 militantes
governistas que se manifestaram nesta coluna ─ confirma a suspeita de
que foi descoberta a kriptonita do SuperLula. Chama-se FHC.
Nos quatro primeiros parágrafos do discurso de posse, Nelson
Jobim tratou de justificar a fama de gaúcho sabido com a evocação de
episódios protagonizados por Dom Pedro II, Zacharias de Goes e
Vasconcellos, Benjamin Constant e outras placas de ruas, praças ou
avenidas. No quinto, o novo ministro da Defesa encerrou a aula de
História com uma frase de Benjamin Disraeli, duas vezes
primeiro-ministro do império britânico no fim do século 19. “Never
complain, never explain, never apologise”, falou bonito o novo ministro
da Defesa.
Caridoso com os muitos monoglotas presentes, traduziu a citação:
“Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe”. Fez então uma
pausa, armou a carranca no rosto de glutão sem remorso e rugiu: “Aja ou
saia, faça ou vá embora!”. Como quem age faz alguma coisa, como quem
sai vai embora, uma das duas frases já estaria de bom tamanho. Jobim
deve ter embarcado na redundância para mostrar que não estava para
brincadeiras. Estava lá para liquidar o apagão aéreo que acabara de
festejar o primeiro aniversário. Os culpados que se cuidassem.
A ameaça causaria forte impressão mesmo se gaguejada por um vereador
de grotão. Produzida pela figura com mais de 110 quilos esparramados por
quase 2 metros, a trovoada no coração do poder provocou efeitos
tremendos. Andorinhas voaram de costas, urubus ficaram brancos de medo,
aviões de carreira enveredaram por loopings involuntários, helicópteros
flutuaram na estratosfera. Até que todos perceberam que o ultimato não
passaria do falatório.
Jobim não agiu, mas não saiu. Não fez, mas não foi embora. Fez que
conta que esqueceu o grande momento do discurso de posse. Até que o
apagão morreu de morte natural e o ministro resolveu começar a agir.
Acabou demonstrando que a lição de Disraeli nem sempre dá certo. Por ter
feito tudo errado, o que fez causou mais estragos que o que deixou de
fazer. A última do Jobim foi convencer o presidente Lula de que a compra
dos 36 caças franceses Rafale é um grande negócio para o Brasil.
Antes do Aerolula, a milhagem aérea do Primeiro Passageiro era
inferior à de uma abelha. Jobim só aprendeu, em viagens internacionais,
que não cabe na poltrona. Pois os dois se acharam qualificados para
decidir qual fábrica seria contemplada com uma fabulosa bolada extraída
dos bolsos dos pagadores de impostos. Acabaram por desmoralizar os
chefes da Aeronáutica e os técnicos incumbidos de produzir o relatório
que classificou os três concorrentes.
O documento recomendou a escolha dos caças suecos Gripen, que
custariam US$ 4,5 bilhões. A segunda opção foi o americano F-18,
fabricado pela Boeing (US$ 5,7 bilhões). Para desconforto dos
especialistas, e para alegria dos acionistas da Dassault, Lula e Jobim
preferiram o lanterninha Rafale. Os brasileiros vão desembolsar US$ 6,2
bilhões (ou R$ 11,4 bilhões) para que os pilotos da FAB voem nos caças
que não desejaram. A justificativa para o injustificável foi uma
misteriosa “parceria estratégica” com a França.
Agora que o Carnaval passou, os responsáveis pela escolha precisam
deixar de conversa fiada e buscarem explicações mais convincentes para a
transação bilionária. O país que presta está exausto de eufemismos
espertos. A novilíngua da Era Lula já transformou ladroagem em “recursos
não-contabilizados” e fez dinheiro sujo virar “caixa 2″. Os dois
truques tentaram camuflar negociações suspeitíssimas entre os partidos
que hoje compõem a base parlamentar do Planalto. Para quem enxerga, é
uma base alugada. Para o governo, é uma parceria estratégica.
Durante o Carnaval, os brasileiros estão autorizados a vestir a
fantasia que quiserem. Todos podem transformar-se em arlequim, pirata,
pierrô, demônio, anjo, lorde inglês ou Nelson Jobim. Qualquer um tem o
direito de fazer de conta que é o que nunca foi e jamais será. Lula, por
exemplo, irrompeu em Goiás na sexta-feira fantasiado de Guardião da
Moral e do Dinheiro Público em Luta contra os Corruptos Inimigos da
Pátria. No País do Carnaval, talvez ganhe algum troféu na categoria
Originalidade. Num Brasil menos cafajeste, o concorrente seria
desqualificado por obscenidade.
A fantasia se inspira numa fantasia mais antiga: nos últimos sete
anos, Lula não enxergou nenhum caso de corrupção, não viu nenhum
corrupto. Descobriu só agora que existem bandidagens por perto, contou
na espantosa entrevista concedida a emissoras de rádio goianas.
“Obviamente que fico chocado quando vejo a denúncia de corrupção nesse
país”, disse sem ficar ruborizado o presidente que, desde julho de 2005,
preside um escândalo por mês. “Fico chocado quando vejo aquele vídeo do
Arruda recebendo o dinheiro”, continuou a figura que, confrontada há
dois meses com a performance da Turma do Panetone, ensinou que “imagens
não falam por si”.
“É uma coisa absurda a gente imaginar que em pleno século 21 isso
acontece neste país”, prosseguiu sem gaguejar. O que há com o Brasil,
estaria perguntando Nelson Rodrigues, que não interrompe aos gritos o
falatório, para berrar que muito mais absurdo é ouvir uma coisa dessas
declamada pelo Padroeiro dos Pecadores Companheiros? Como os repórteres
nem miaram, a discurseira seguiu seu curso: “Espero que o que aconteceu
com o Arruda sirva de exemplo para que isso não possa mais se repetir em
lugar nenhum. Por isso mandei para o Congresso projeto de lei
transformando o crime de corrupção em crime hediondo porque precisamos
ser mais duros com a corrupção e com os corruptos”. O que há com o
Brasil, estaria rugindo Nelson Rodrigues, que não reage com uma
gargalhada nacional ao espetáculo do cinismo?
Como pode falar em combate à corrupção quem finge não saber das
bandalheiras em que se meteram mensaleiros, sanguessugas, aloprados, os
compadres Roberto Teixeira e Paulo Okamotto, o “nosso Delúbio” e seus
quadrilheiros? Como pode posar de defensor dos usos e costumes o
presidente que se despediu com cartinhas meigas do estuprador de contas
bancárias Antônio Palocci e de José Dirceu, capitão do time do Planalto e
general da organização criminosa em julgamento no Supremo? Como pode
apresentar-se como guardião da moral e da ética o companheiro que
convive fraternalmente com Fernando Collor, Renan Calheiros e Romero
Jucá, e promoveu José Sarney a homem incomum?
Há pouco, entre uma e outra pedra fundamental, Lula inaugurou a tese
de que o mensalão não passou de uma trama forjada por inimigos da pátria
inconformados com a performance incomparável do operário que virou
presidente. Tudo somado, esse histórico informa que a promessa de
combater duramente a corrupção é mais que uma fantasia de Carnaval. É
também a prova de que o Brasil é governado por um presidente que, em vez
de cérebro, tem na cabeça um palanque.
Lula fez a opção preferencial pela amoralidade e incorporou a mentira
ao estilo de governo. É compreensível que tenha visto em Dilma Rousseff
a sucessora ideal.
A agenda do homem público José Roberto Arruda foi atropelada
pelo prontuário do delinquente José Roberto Arruda. Governador do
Distrito Federal desde 2006, já deveria estar no Rio nesta sexta-feira,
pronto para brilhar na Marquês de Sapucaí. Criminoso irrecuperável desde
o berçário, cancelou passagens aéreas e reservas no hotel para
hospedar-se involuntariamente na Polícia Federal. Em vez de desfrutar
das noites cariocas, vai pensar na vida durante as madrugadas na
cadeia.
Para os brasileiros honestos, a prisão de um corrupto da classe
executiva é mais animadora que qualquer samba-enredo. Pelo menos
não serão afrontados pelo sorriso do bandido no camarote, pago com
dinheiro público, assistindo à passagem da Beija-Flor, que escolheu o
50° aniversário de Brasília como tema do enredo para que o governo
pilantra pagasse a conta da festa.
É cedo, contudo, para festejar o fim da impunidade dos meliantes da
primeira classe. O primeiro pedido de habeas corpus foi rejeitado pelo
ministro Marco Aurélio de Mello. Mas outros virão. E mesmo o mais
delirante dos otimistas sabe que Arruda estará em liberdade antes da
Sexta-Feira Santa.
Em países civilizados, o chefe da Turma do Panetone aprenderia o que
acontece a quem rouba com a desfaçatez, a gula, e o cinismo documentados
pelos vídeos inverossímeis. Se fosse julgado por um tribunal americano,
por exemplo, Arruda só voltaria a brincar no Carnaval num clube da
terceira idade. Como isto aqui é o Brasil, expressões como “direito à
ampla defesa” e “devido processo legal” prevalecem sobre o dever
de impedir que criminosos exerçam o direito de ir e vir para
dedicar-se à obstrução da Justiça, ao sumiço de provas e à intimidação
de testemunhas.
É o que Arruda vinha fazendo desde a divulgação das gravações
cafajestes ─ e voltará a fazer depois da escala na cadeia, só que menos
ostensivamente. Foi preso não por corrupção, mas por ansiedade. Deveria
ter esperado que os vídeos caíssem no buraco negro da desmemória
brasileira para tentar subornar uma testemunha. Mesmo para os padrões do
Judiciário, foi demais.
Ironicamente, a primeira prisão de um governador corrupto, ao
escancarar a solidão de Arruda na paisagem absurdamente despovoada de
colegas de profissão, transformou-se numa prova contundente de que o
Brasil não prende ladrões com bons advogados e amigos
influentes. Larápios infestam os três Poderes, a procissão de escândalos
não para, falta espaço aos jornais para tantos patifes. Mas só Arruda
está na gaiola.
“A prisão do Arruda deve ser servir de exemplo”, disse Lula nesta
sexta-feira. “É um absurdo a gente constatar que, em pleno século 21,
isso ainda acontece no Brasil”. O Padroeiro dos Pecadores Companheiros
tem tanto compromisso com a seriedade quanto um vadio profissional com o
trabalho. Não lhe basta afrontar o país que presta com a absolvição
liminar dos cafajestes amigos, com a mão estendida a José Sarney, com o
tratamento de comparsas dispensado aos mensaleiros.
A declaração desta sexta-feira não rima com as anteriores. “As
imagens não falam por si”, resolveu Lula depois de confrontado com
gatunos enfiando montes de cédulas nos bolsos, nas meias e na
cueca. Como não conseguiu livrar do camburão outro patife de estimação, o
presidente faz de conta que a corrupção no Brasil foi inaugurada por
Arruda. Os cofres públicos nunca foram assaltados com tanta cupidez
quanto nos últimos sete anos. Lula não conseguiu enxergar nenhum ladrão.
Acaba de ver o primeiro. Parece ficção.
Uma peça de ficção tão obscena quanto a reação da companheirada que
topa qualquer safadeza porque os fins justificam os meios. ”Não vai
falar do Arruda?”, excitam-se as patrulhas petistas, como se homens de
bem pudessem ser indulgentes com um fora-da-lei só por não estar
homiziado no PT. Como são assim, os patrulheiros precisam acreditar que
todos sejam. Aqui se disse do governador do DF. desde o primeiro vídeo,
o que se diz agora: merece cadeia.
O rebanho dos devotos de Lula dividem o mundo em branco e preto. Quem
apoia o chefe está certo, mesmo que seja um Sarney. Quem não apoia
está, além de errado, vinculado a todos os não-companheiros. Fanáticos
não conseguem admitir a existência de gente simplesmente honesta, pronta
para exigir a punição de quem não é ─ pouco importa o nome do bandido,
pouco importa a filiação partidária.
Sem Arruda na rua, o Carnaval ficou mais animado. Ficaria muito
melhor se a população carcerária fosse engrossada também pelos 40
companheiros da organização criminosa sofisticada chefiada por José
Dirceu. Se fossem eternizadas em vídeo, as cenas que exibem
pais-da-pátria carregando malas da grife Marcos Valério, líderes da base
alugada dividindo o produto do roubo, quantias astronômicas pousando em
bancos na Suíca e outros lances pornográficos lembrariam, comparadas
à chanchada da Turma do Panetone, um épico hollyoodiano.
Enquanto o escândalo do mensalão se arrasta no Supremo Tribunal
Federal, os quadrilheiros desmascarados em 2005 saboreiam a liberdade
imerecida. Alguns estão de volta à direção do PT e cuidam da campanha de
Dilma Rousseff. São aplaudidos pelas mesmas matilhas que pedem a forca
para o governador que, perto da turma do mensalão, fica com cara de
punguista aprendiz.
Os colegas de Arruda deveriam estar numa cela. Estão no palanque.
Perto das 8 da noite desta quarta-feira, no intervalo de uma
reunião no Instituto Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente ouviu a
pergunta já no primeiro minuto da conversa por telefone:
─ Posso dizer que o senhor aceita debater publicamente com o
presidente Lula?
─ Pode, claro.
─ Alguma pré-condição?
─ Nenhuma. Mas é bom deixar claro que não propus nenhum desafio. Não
estou desafiando ninguém. Estou apenas aceitando um convite.
─ Vou dar a notícia amanhã.
─ Pode dar. Debate é sempre saudável. Aceito pelo Brasil.
No mesmo dia em que Fernando Henrique Cardoso topou o convite, o
deputado Ricardo Berzoini entoou a cantilena que obriga o presidente a
aceitá-lo também. “Vamos, sim, fazer a comparação entre os oito anos de
Lula e os oito anos de FHC”, recitou. “O eleitor precisa ser lembrado de
como foi um governo e o outro”.
O eleitor merece saber se Lula recebeu uma herança maldita e
reconstruiu o país, como repete há pelo menos seis anos, ou se resolveu
valer-se de mentiras e fantasias para desqualificar o legado do
antecessor que acabou com a inflação, consolidou a democracia
constitucional e fixou diretrizes econômicas que, em sua essência,
vigoram até hoje. É assunto sério demais para ser tratado por
intermediários, muito menos por moleques de recado. É coisa para gente
grande. Os eleitores merecem ver em ação os dois protagonistas ─ só
eles, e sem figurantes por perto.
O debate se tornou inevitável no momento em que o presidente decidiu
que a eleição tem de ser plebiscitária. FHC já topou. Lula não poderá
furtar-se ao duelo que provocou.
Telmo Heinen Formosa - GO
Caro Augusto, você tem total razão. Quem detém a maioria da opinião 'do público' nem sempre é a opinião publicada. As coisas no Brasil não são decididas pelas pessoas que leem os jornais mas pelas pessoas que fazem outros usos deles...
Augusto Mumbach Goiânia - GO
Caros amigos. Sinto decepcioná-los. Mas o nosso presidente ganharia o debate sim. Não são vocês, pessoas instruídas, que vão avaliar o debate, pelo menos não com um volume capaz de fazer diferença. Não podemos esquecer que moramos em um país onde os programas de televisão mais assistidos são Gugu e Faustão. As músicas mais ouvidas são do tipo rebolation, cachorra e ordinária. As revistas mais lidas só tem fotos. Um país que fica parado desde uma semana antes do natal até pelo menos 2 semanas após o carnaval. Onde a preguiça (receber bolsas daquilo e disso e processar as empresas que empregam) é mais lucrativa que o trabalho, pois empregar e produzir está virando crime. Fernando Henrique tem todos esses engarranchos pelo caminho. Lula não! No nosso patropi Lula vence o debate...
Angelo Miquelão Filho Apucarana - PR
Diz a sabedoria popular; "quem fala demais, acaba por dar bom dia a cavalo".
Um debate entre Lula e Fernando Henrique, seria até uma covardia, o presidente Lula seria derrotado aos 5 minutos do primeiro tempo (ele sempre compara tudo com futebol mesmo). Mas no futebol todos ganham, e ganham muito bem, não é presidente Lula?Adoniran Antunes de Oliveira Campo Mourão - PR
Taí. O lula tanto fez, tanto falou mal do FHC,que estava quietinho no seu canto,tanto disse da herança maldita, e tomou o troco. Lula, se voce for homem,com moral(acredito que nao saiba o que é isto)aceite o debate. O HOMEM FHC ficou de saco cheio com tua tagarelice e te desafiou.Vamos Lula, aceite,vamos discutir o governo dele e teu, vamos ver a verdade.Nao acredito que aceites mesmo porque sois um covarde,mentiroso, do mesmo jaez que tua candidata.E olha Lula, eu votei uma vez em ti,e mandarei decapitar meu dedo,(aquele que apertou na urna teu ;maldito nome)mas se arrependimento matasse, eu estaria mortinho da silva.Como é,mostre pelo menos uma vez na vida,coragem.Meu consolo é de que na hora do debate eleitoral pela tv,tua candidata de meio neuronio,vai se borrar toda,porque é burra de dar dó.