Confiram alguns dos melhores-piores melhores momentos da entrevista de Lula

Publicado em 19/02/2010 21:57

Quem fala mais que leiloeiro só pode chegar ao fim da discurseira com escoriações generalizadas


Na entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, publicada nesta sexta-feira, o presidente da República esforçou-se para controlar o recordista mundial de improviso em palanque. Mas quem fala mais que leiloeiro, mente tanto quando Dilma Rousseff e se considera o Estadista de Deus não chega ao fim da travessia de mais de duas páginas sem danos severos, escorregões constrangedores e escoriações generalizadas. Confiram alguns dos melhores-piores melhores momentos do falatório, seguidos de observações em negrito:

“Olha, somente quem não conhece a Dilma pode falar uma heresia dessas (a heresia é dizer que a candidata foi escolhida pela fidelidade ao presidente). Ninguém aceita ser vaca de presépio e muito menos eu iria escolher alguém para ser vaca de presépio”.
(Vaca de presépio, como sabem até as vacas de presépio, é gente que concorda com tudo o que o chefe diz, pensa ou imagina. Dilma Rousseff vai mais longe. Além de dizer amém a tudo que ouve do padrinho, além de elogiá-lo no começo, no meio e no fim de cada discurseira, a afilhada resumiu há semanas seu programa de governo: “Vamos seguir o caminho que o presidente Lula nos ensinou”. Na entrevista, o chefe ensinou aos adversários, de graça, a expressão que define com precisão a sucessora que escolheu. Dilma é uma tremenda vaca de presépio.)

“Quando aconteceram todos os problemas que levaram o companheiro José Dirceu a sair do governo (…)”
(”Depois do episódio do mensalão”, poderia ter resumido o entrevistado. Mas o herói brasileiro conhece e protege seu calcanhar de Aquiles. Entre as quase 2.700 palavras ditas por Lula, “mensalão” não aparece uma só vez.)

“Quem me conhece há mais tempo sabe que eu nunca gostei de um segundo mandato”.
(Pena que os entrevistadores não conheçam há mais tempo a metamorfose ambulante. Embora deteste um segundo mandato, Lula elegeu-se em 1975  presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, reelegeu-se em 1978, elegeu-se em 1980 presidente do PT e, graças a sucessivas reeleições, permaneceu no cargo até 1994. Virou presidente de honra do partido, posto que continua a acumular com a presidência da República.)

“Não penso em voltar à presidência”.
(”Presidência da República, certo?”, deveriam ter especificado os jornalistas. Quando formalizar a candidatura ao terceiro mandato em 2014, Lula vai alegar que, ao ouvir a pergunta, supôs que os entrevistadores se referissem à presidência do sindicato. Ou à presidência do PT.)

“O Collor foi eleito senador da República pelo voto livre e direto do povo de Alagoas. (…) Se eu encontrar o Jarbas Vasconcelos amanhã, vou cumprimentá-lo como cumprimentei o Collor. Não pense que vou agir diferente, porque quem está cumprimentando não é o Lula. É o presidente”.
(Na campanha eleitoral de 1989, Fernando Collor referiu-se a Lula como  “analfabeto”, “ignorante”, “desqualificado” e “farsante”. No horário gratuito da TV, apresentou ao país uma ex-namorada de Lula que o acusou de ter tentado “assassinar a filha com um aborto”. A declaração publicada pelo Estadãocontém três informações relevantes. Primeira: Lula não vê diferenças entre quem diz essas coisas e um oposicionista como o senador Jarbas Vasconcelos.  Segunda: quem é eleito pelo voto direto não tem prontuário. Terceira: Lula e o presidente da República não são a mesma pessoa.)

“O Sarney teve uma postura muito digna em todo esse episódio. Das acusações que vocês publicaram, nenhuma se sustenta juridicamente”.
(Numa só resposta, Lula aprovou o desempenho de José Sarney no Senado, absolveu o homem incomum de todas as acusações e ensinou que, até o julgamento em instância superior, a censura ao Estadão é muito justa. Chefe do Executivo por decisão das urnas, chefe do Legislativo por malandragem da base alugada e chefe do Judiciário por deferência de cinco ministros do Supremo Tribunal Federal, Lula exerceu durante a entrevista, ostensivamente e com muita animação, a presidência dos três Poderes.).

“Eu acho que tem coisa que tem que investigar. E eu quero investigar. (…). Eu quero saber de algumas coisas que que eu não sei e que me pareceram muito estranhas ao longo de todo o processo”. 
(Foi assim mesmo, em dilmês perturbado, que Lula tentou explicar por que prometeu “passar a limpo” o caso do mensalão ─ que, neste trecho da entrevista, apelidou de “processo”. Ele não enxerga nada de errado, estranho ou criminoso na ação dos 40 bandidos de estimação denunciados pela Procuradoria Geral da República e a caminho do julgamento pelo STF. Prometeu descobrir tudo depois que deixar a presidência e virar detetive. O Filho do Brasil não matou ninguém de tristeza. A versão piorada do Inspetor Clouzot vai fazer o país sensato morrer de rir.)

“O Irã não é o Iraque e todos nós sabemos que a guerra do Iraque foi uma mentira montada em cima de um país que não tinha as armas químicas que diziam que ele tinha”.
(Releiam a frase e raciocinem comigo. Lula diz que o Iraque foi atacado sem motivos, já que não existiam as armas químicas que serviram de pretexto para a guerra. Certo? Também diz que o Irã não é o Iraque. Certo? Se o Irã não é o Iraque, então o projeto nuclear dos aiatolás existe de verdade, ao contrário das armas químicas. Certo? Se é assim, os leitores ficariam gratos aos entrevistadores se um deles perguntasse ao entrevistado por que, então, apoia o Irã. Ou ao menos avisasse a Lula que achar explicações para a aliança com uma teocracia dirigida por psicopatas complica a cabeça de qualquer um.)

“A Venezuela é uma democracia. (…) O Brasil é uma hiperdemocracia”.
(O que Lula chama de  “hiperdemocracia” é um país cujo governo, por não ter conseguido estabelecer o “controle social da mídia”, ainda não fecha emissoras de TV ou jornais independentes. “Democracia” é qualquer regime autoritário, despótico e tirano dirigido por um companheiro.)

Tão revelador quanto o que disse foi o que deixou de dizer. Pela  primeira vez neste século, o presidente despejou mais de 2.600 palavras sem mencionar em nenhum momento “Fernando Henrique Cardoso”,  “FHC” ou  “meu antecessor”. O SuperLula descobriu que é melhor ficar longe da kriptonita.


Nosso caçador de cretinices traduz para o dilmês a frase misteriosa da Mãe do PAC



Ainda em busca da transcrição em estado bruto do pronunciamento de Dilma Rousseff no congresso nacional do PT, o jornalista Celso Arnaldo conseguiu tempo para revisitar uma declaração especialmente misteriosa atribuída à Mãe do PAC. O implacável caçador de cretinices voltou da incursão com outro achado. Confiram:

Numa carta publicada na Folha de hoje, o “assessor especial” da Casa Civil, Oswaldo Buarim Jr., contesta manchete do jornal para amatéria sobre a entrevista da patroa.

Escreve ele:

─ Para correta informação dos leitores, reproduzimos a declaração da ministra com seu sentido completo: “O Estado terá, inexoravelmente, que reforçar seu segmento executor, para universalizar o saneamento”.

Agora, sim ─  faltava universalizar o saneamento.

Piorou um pouco. Mas,  entre os colaboradores do Augusto Nunes, talvez eu seja o único a ver essa frase com outros olhos. Embora ela não queira dizer rigorosamente nada que preste ─ e se preste a interpretações jocosas em torno da palavra “executor” ─ continuo achando que isso não é uma legítima Dilma. Está na cara que é texto ou caco de assessor, de subintelectual do PT. Falando, Dilma está longe desse status.

Até consigo ver essa frase na boca de um Marco Aurélio Garcia ou numa empolada tese de doutorado de ciências sociais. Pelo menos, ela tem sintaxe e ordem gramatical lógicas, não é redundante, não é pastosa, não se atropela a si mesma. Em suma: não é Dilma.

Dilma não tem a capacidade de dizer, nessa ordem, em menos de três horas, estas 13 palavras: “O Estado terá, inexoravelmente, que reforçar seu segmento executor, para universalizar o saneamento”

Querendo dizer isso, ela diria mais ou menos assim:
“Cês vejam que o Estado ele vai ter que ser mais executor nesse segmento da execução porque o saneamento ele precisa de atingir essa coisa que o presidente Lula sempre colocou que é o Brasil para 190 milhões de brasileiros”.

Celso Arnaldo não erra uma.


Lula recusa o convite para o debate que FHC aceitou



O presidente Lula foi formalmente convidado, no dia 11, para um debate com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A resposta acaba de ser transmitida ao repórter Otávio Cabral, da sucursal de VEJA em Brasília, pelo ministro Franklin Martins, chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. É a seguinte:

“O presidente Lula, quando deixar a Presidência e se tornar um ex-presidente, aceitará debater com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso”.

Se Lula estivesse apenas presidindo o processo sucessório, como costumam fazer em países civilizados chefes de governo em fim de mandato, o convite nem teria existido. Se tivesse apenas optado por uma candidatura, sem se envolver ostensivamente na disputa, a recusa até seria aceitável. Como os fatos informam que o presidente se enfiou até o pescoço na campanha que antecipou ilegalmente, a rejeição do convite deixa de fazer sentido.

Sem que ninguém lhe pedisse, Lula decidiu que a candidata seria Dilma Rousseff, nomeou-se Primeiro Cabo Eleitoral, não desce do palanque há seis meses, ataca o antecessor em todos os comícios e repete diariamente que os brasileiros terão de escolher entre o governo FHC e o atual. Garante que recebeu uma “herança maldita”. FHC garante que a afirmação é falsa. Um debate entre ambos seria o caminho mais curto para chegar-se à verdade. Fernando Henrique topou. Lula só quer debater em 2011.

A opção pelo monólogo ─ recomendada, aliás, por 10 em 10 militantes governistas que se manifestaram nesta coluna ─ confirma a suspeita de que foi descoberta a kriptonita do SuperLula. Chama-se FHC.


Agora que o Carnaval passou, é hora de esclarecer um grande negócio muito mal explicado

Nos quatro primeiros parágrafos do discurso de posse, Nelson Jobim tratou de justificar a fama de gaúcho sabido com a evocação de episódios protagonizados por Dom Pedro II, Zacharias de Goes e Vasconcellos, Benjamin Constant e outras placas de ruas, praças ou avenidas. No quinto, o novo ministro da Defesa encerrou a aula de História com uma frase de Benjamin Disraeli, duas vezes primeiro-ministro do império britânico no fim do século 19. “Never complain, never explain, never apologise”, falou bonito o novo ministro da Defesa.

Caridoso com os muitos monoglotas presentes, traduziu a citação: “Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe”. Fez então uma pausa, armou a carranca no rosto de glutão sem remorso e rugiu:  “Aja ou saia, faça ou vá embora!”. Como quem age faz alguma coisa, como quem sai vai embora, uma das duas frases já estaria de bom tamanho. Jobim deve ter embarcado na  redundância para mostrar que não estava para brincadeiras. Estava lá para liquidar o apagão aéreo que acabara de festejar o primeiro aniversário. Os culpados que se cuidassem.

A ameaça causaria forte impressão mesmo se gaguejada por um vereador de grotão. Produzida pela figura com mais de 110 quilos esparramados por quase 2 metros, a trovoada no  coração do poder provocou efeitos tremendos. Andorinhas voaram de costas, urubus ficaram brancos de medo, aviões de carreira enveredaram por loopings involuntários, helicópteros flutuaram na estratosfera. Até que todos perceberam que o ultimato não passaria do falatório.

Jobim não agiu, mas não saiu. Não fez, mas não foi embora. Fez que conta que esqueceu o grande momento do discurso de posse. Até que o  apagão morreu de morte natural e o ministro resolveu começar a agir. Acabou demonstrando que a lição de Disraeli nem sempre dá certo. Por ter feito tudo errado, o que fez causou mais estragos que o que deixou de fazer. A última do Jobim foi convencer o presidente Lula de que a compra dos 36 caças franceses Rafale é um grande negócio para o Brasil.

Antes do Aerolula, a milhagem aérea do Primeiro Passageiro era inferior à de uma abelha. Jobim só aprendeu, em viagens internacionais, que não cabe na poltrona. Pois os dois se acharam qualificados para decidir qual fábrica seria contemplada com uma fabulosa bolada extraída dos bolsos dos pagadores de impostos. Acabaram por desmoralizar os chefes da Aeronáutica e os técnicos incumbidos de produzir o relatório que classificou os três concorrentes.

O documento recomendou a escolha dos caças suecos Gripen, que custariam US$ 4,5 bilhões. A segunda opção foi o americano F-18, fabricado pela Boeing (US$ 5,7 bilhões). Para desconforto dos especialistas, e para alegria dos acionistas da Dassault, Lula e Jobim preferiram o lanterninha Rafale. Os brasileiros vão desembolsar US$ 6,2 bilhões (ou R$ 11,4 bilhões) para que os pilotos da FAB voem nos caças que não desejaram. A justificativa para o injustificável foi uma misteriosa  “parceria estratégica” com a França.

Agora que o Carnaval passou, os responsáveis pela escolha precisam deixar de conversa fiada e buscarem explicações mais convincentes para a transação bilionária. O país que presta está exausto de eufemismos espertos. A novilíngua da Era Lula já transformou ladroagem em “recursos não-contabilizados” e fez dinheiro sujo virar “caixa 2″. Os dois truques tentaram camuflar negociações suspeitíssimas entre os partidos que hoje compõem a base parlamentar do Planalto. Para quem enxerga, é uma base alugada. Para o governo, é uma parceria estratégica.


O carnaval em que o Padroeiro dos Pecadores vestiu a fantasia de Inimigo dos Corruptos


lularruda

Durante o Carnaval, os brasileiros estão autorizados a vestir a fantasia que quiserem. Todos podem transformar-se em arlequim, pirata, pierrô, demônio, anjo, lorde inglês ou Nelson Jobim. Qualquer um tem o direito de fazer de conta que é o que nunca foi e jamais será. Lula, por exemplo, irrompeu em Goiás na sexta-feira fantasiado de Guardião da Moral e do Dinheiro Público em Luta contra os Corruptos Inimigos da Pátria. No País do Carnaval, talvez ganhe algum troféu na categoria Originalidade.  Num Brasil menos cafajeste, o concorrente seria desqualificado por obscenidade.

A fantasia se inspira numa fantasia mais antiga: nos últimos sete anos, Lula não enxergou nenhum caso de corrupção, não viu nenhum corrupto. Descobriu só agora que existem bandidagens por perto,  contou na espantosa entrevista concedida a emissoras de rádio goianas. “Obviamente que fico chocado quando vejo a denúncia de corrupção nesse país”, disse sem ficar ruborizado o presidente que, desde julho de 2005, preside um escândalo por mês. “Fico chocado quando vejo aquele vídeo do Arruda recebendo o dinheiro”, continuou a figura que, confrontada há dois meses com a performance da  Turma do Panetone, ensinou que “imagens não falam por si”.

“É uma coisa absurda a gente imaginar que em pleno século 21 isso acontece neste país”, prosseguiu sem gaguejar. O que há com o Brasil, estaria perguntando Nelson Rodrigues, que não interrompe aos gritos o falatório, para berrar que muito mais absurdo é ouvir uma coisa dessas declamada pelo Padroeiro dos Pecadores Companheiros? Como os repórteres nem miaram, a discurseira seguiu seu curso: “Espero que o que aconteceu com o Arruda sirva de exemplo para que isso não possa mais se repetir em lugar nenhum. Por isso mandei para o Congresso projeto de lei transformando o crime de corrupção em crime hediondo porque precisamos ser mais duros com a corrupção e com os corruptos”. O que há com o Brasil, estaria rugindo Nelson Rodrigues, que não reage com uma gargalhada nacional ao espetáculo do cinismo?

Como pode falar em combate à corrupção quem finge não saber das bandalheiras em que se meteram mensaleiros, sanguessugas, aloprados, os compadres Roberto Teixeira e Paulo Okamotto, o “nosso Delúbio” e seus quadrilheiros? Como pode posar de defensor dos usos e costumes o presidente que se despediu com cartinhas meigas do estuprador de contas bancárias Antônio Palocci e de José Dirceu, capitão do time do Planalto e general da  organização criminosa em julgamento no Supremo? Como pode apresentar-se como guardião da moral e da ética o companheiro que convive fraternalmente com Fernando Collor, Renan Calheiros e Romero Jucá, e promoveu José Sarney a homem incomum?

Há pouco, entre uma e outra pedra fundamental, Lula inaugurou a tese de que o mensalão não passou de uma trama forjada por inimigos da pátria inconformados com a performance incomparável do operário que virou presidente. Tudo somado, esse histórico informa que a promessa de combater duramente a corrupção é mais que uma fantasia de Carnaval. É também a prova de que o Brasil é governado por um presidente que, em vez de cérebro, tem na cabeça um palanque.

Lula fez a opção preferencial pela amoralidade e incorporou a mentira ao estilo de governo. É compreensível que tenha visto em Dilma Rousseff a sucessora ideal.

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Fonte:
Blog Augusto Nunes (VEJA)

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