Lula no centro do palco (e +): Constrangimento e melancolia

Publicado em 26/05/2011 16:25 e atualizado em 26/05/2011 18:23
Dos blogs Lauro Jardim e Reinaldo Azevedo

Lula no centro do palco 1

Constatação: Lula e o próprio Palácio do Planalto parecem que querem fazer crer que Dilma Rousseff não sabe governar sozinha.

Por Lauro Jardim

Na reunião de ontem com os senadores Lula dirigiu-se aos gritos (e, claro, muito palavrões) a Humberto Costa e a Romero Jucá.

Por Lauro Jardim

O Caso Palocci é mais um daqueles escândalos em que os políticos petistas dizem uma coisa em público e outra completamente diferente nos bastidores. Em público, alguns o defendem. Nos bastidores, todos falam mal de Palocci.

Por Lauro Jardim

Desde que estourou o Caso Palocci, Ricardo Berzoini teve tempo em seu twitter para várias mensagens – uma inclusive sobre o sanfoneiro Sivuca. Defender Palocci, no entanto, nem pensar. Justiça se faça: não está sendo hipócrita.

Por Lauro Jardim

A conversa entre os senadores do PT e Lula começa a ter efeito. Depois de os parlamentares reclamarem a Lula do tratamento recebido do Palácio do Planalto, Dilma Rousseff resolveu reunir-se amanhã com a bancada. Além de pedirem mais atenção a Dilma, os senadores cobrarão as nomeações de seus aliados e a liberação de verbas para obras nos estados.

Por Lauro Jardim

Ontem, Lula ressaltou aos senadores petistas acreditar na inocência de Antonio Palocci. Beleza. Ponderou, entretanto, que Palocci deveria reunir-se com a bancada para apresentar pessoalmente as explicações sobre a sua atuação como consultor. E foi além. Citou como exemplo o trabalho dos advogados, que só preparam a defesa de seus clientes depois de saberem exatamente do que estão tratando.

Por Lauro Jardim

Constrangimento e melancolia. Os fatos, a foto.

Vejam esta foto, de Ed Ferreira, da Agência Estado:

palocci-e-dilma

Aí estão os ministros Antonio Palocci e a presidente Dilma Rousseff numa solenidade de assinatura do termo de compromisso (ufa!) para a construção de creches. Se der tempo, ainda hoje lembro quantas ela prometeu em campanha… Adiante.

Fotos também são “discursos”, como gostam de dizer os estudantes de lingüística da USP, quando os esquerdopatas não os impedem de estudar. Palocci é a imagem do constrangimento. Acostumado a ser o gênio dos bastidores, trazido à ribalta, exibe esse ar vexado, de quem, no fim das contas, não tem explicações a dar porque o que se sabe é inexplicável.

Até outro dia, quem fazia a costura política era ele — formalmente, ainda tem essa função. Também era um notável pauteiro do jornalismo, com sua simpatia habitual. Usava habilmente a imprensa para desancar adversários internos (no PT e no governo), para deixar meio aparvalhada a oposição, para anunciar grandes horizontes. Era, para lembrar uma expressão de Fernando Pessoa, o mordomo invisível que administrava a casa, mas sempre muito presente. O que não se sabia é que cuidava do próprio futuro com ainda mais denodo. Agora, ele é alguém que precisa desesperadamente de uma explicação. Dá a impressão, inclusive, de ter engordado muito nos últimos dias. A tensão faz com que algumas pessoas comam demais.

Dilma está infeliz, nota-se. Está com o ar abatido. Tem administrado tudo muito mal: da crise que envolve Palocci à boataria sobre seu estado de saúde. Estes correm soltos, mas  de forma surda, já que aprendemos a ser decorosos e consideramos que saúde de chefe de estado é um problema privado.

Sendo assim, abriu-se um vácuo. E ninguém menos do que Luiz Inácio Apedeuta da Silva começou a ocupá-lo ontem no papel de condestável da República. Dilma é um fenêmeno que não tem como ser mito. Está murchando. Já murchou.

Por Reinaldo Azevedo

A Rainha Muda, a matemática homoafetiva, a idiotia politicamente correta e os cadáveres da imprensa

Um dos grandes dramas do Brasil hoje em dia é que os ignorantes patrulham os oportunistas. A presidente Dilma Rousseff suspendeu ontem o tal “kit anti-homofobia” que seria exibido nas escolas — se aquilo era “anti” alguma coisa, era anti-heterossexual; tratava-se de proselitismo gay. Escrevi aqui que Dilma pode ter feito por maus motivos o que deveria ter feito por bons. O que quis dizer com isso? O material era de uma impressionante vigarice intelectual, moral, técnica e matemática. Até aí, tudo bem para o Planalto! A Rainha Muda não havia movido uma palha!

Quando a bancada cristã ameaçou chamar Antonio Palocci para o palco, então a presidente se mexeu e descobriu, ora vejam!, que o tal kit era inadequado e entrava na seara das famílias. Desconheço país do mundo que exiba filmes em sala de aula que tenham o objetivo de alertar os alunos heterossexuais para a possibilidade de que eles podem estar perdendo a oportunidade de “ficar” com indivíduos do mesmo sexo. Isso, obviamente, é assédio moral. Mas não é ainda o limite. Abaixo do fundo do poço, há um alçapão.

Divulgados os vídeos — eu já havia publicado um deles aqui, sobre o rapaz que se chama “Bianca” —, assisti a outro, intitulado justamente “Probabilidades”. Escrevi um post a respeito. Conta a história de Leonardo, que descobriu que gostava de meninas e… meninos. Certo! Aí, relata o filme, “foi copiando a lição de probabilidade que Leonardo teve um estalo (…), gostando dos dois, a probabilidade de encontrar alguém por quem sentisse atração era quase 50% maior. Tinha duas vezes mais chance de encontrar alguém (…)!”Evidenciei o óbvio: trata-se de uma bobagem matemática dupla. Se Leonardo passou a se interessar por todos os bípedes sem pêlos e penas — os tais humanos —, e não apenas pelas fêmeas da espécie, dado que antes só fazia a sua coleta em 50% dos indivíduos, a probabilidade é 100% maior, não 50%; ele não tem duas vezes mais chance, mas uma — já que a primeira sempre esteve dada. 

É um troço elementar. Eu não sei se a economista Dilma Rousseff, ainda que destituída de seu falso doutorado, percebeu a falcatrua matemática ao ter vetado o vídeo. O que me causa espanto é que não vi o erro apontado nos sites dos grandes jornais — não havia uma miserável linha a respeito. E a razão é simples. O erro não foi percebido pelo MEC, o erro não foi percebido pelos especialistas, o erro não foi percebido pelos jornalistas. Uma vez denunciado, como foi aqui (este blog teve ontem 98.627 visitas, e vocês sabem como funciona a rede; os posts se multiplicam porque reproduzidos por outros páginas), fizeram de conta que nada tinha acontecido, que a bobagem não estava lá, que o material era bom pra chuchu e só foi vetado porque Dilma cedeu aos dinossauros cristãos para tentar salvar a pele de Palocci.

Sim, ela, o PT e mais um bando de gente — sobretudo um bando de gente! — está tentando salvar a pele de Palocci, mas não só por intermédio da suspensão do kit gayzista, não é mesmo? O fato de que tenha recorrido também a esse expediente é uma evidência a mais do desespero, mas não torna aceitável ou respeitável o material. É um lixo pedagógico! É um lixo didático! É um lixo matemático!

Setores da imprensa estão indignados! E daí que a matemática homoafetiva seja diferente daquela matemática habitualmente usada par tocar a vida, presente nas pontes, nos prédios, nas calculadores, nas contas em geral? Que se dane! A escola é o lugar em que a gente tem de aprender “cidadania” e “justiça social”!!! Porque esses são dois conceitos respeitáveis, sem dúvida, então eles podem substituir todo o resto.  O Ministério da Educação pode torrar alguns milhões oferecendo uma matemática troncha à patuléia — desde, obviamente, que se o faça por bons propósitos. A canalha considera que a causa da igualdade pode suportar uma língua errada, uma matemática errada, uma ciência errada.

Os alunos pobres podem, sim, ser ignorantes. O importante é que sejam “justos” e pratiquem a igualdade. Dilma suspendeu o material por oportunismo, sem dúvida, mas está sendo patrulhada pelos estúpidos. Ontem, um dos portais trazia a Natalie Lamour do Congresso, Jean Willys (PSOL-RJ), conclamando os gays a não votar mais na petista. O ex-BBB teve pouco mais de 16 mil votos e só está na Câmara porque Chico Alencar foi o seu Tiririca…

Politicamente incorreto
Alguns colunistas condenados ao oblívio pelos leitores — em razão da falta do que dizer — esforçam-se para voltar ao debate atacando “essas pessoas politicamente incorretas” que andam aí pela imprensa — um deles ficou a um passo de soletrar meu nome quando defendi a ação da PM contra os maconheiros que fechavam a Paulista, mas não o fez.

Pois é… O que se entende por politicamente incorreto? Saber matemática? Apontar a picaretagem teórica dos vídeos homoafetivos do MEC? Acusar o estado de estar invadindo a esfera privada das famílias? Demonstrar o primarismo do roteiro, do texto e dos conceitos das FÁBULAS ESTATAIS que querem levar às crianças e aos adolescentes? Denunciar um verdadeiro trabalho de molestamento da maioria sob o pretexto de proteger a minoria?

Uma imprensa que se conforma com o fato de que o MEC exiba em sala de aula um filme oficial com um erro grotesco de conceito matemático, mas supostamente aceitável porque ancorado na correção política, é uma IMPRENSA MORTA! Parou de cumprir a sua função e está se comportando como militante política. Uma imprensa que propaga uma mentira estúpida — como a afirmação de que o suposto desmatamento no Mato Grosso teria sido provocado pelos debates sobre o novo Código Florestal — é igualmente uma IMPRENSA MORTA. Perdeu o seu compromisso com a verdade.

Não me preocupa — e acho que isso explica, em parte ao menos, o sucesso do blog — se minha opinião é politicamente correta ou incorreta; não preciso pedir licença a nenhum aiatolá para escrever. Já defendi algumas vezes, por exemplo, a união civil de homossexuais. Eu me oponho, aí sim, a que o Supremo ignore a Constituição para realizar esse propósito. Eu me oponho a que o Estado assuma o lugar das famílias. Eu me oponho a que se violem a lógica e a matemática para fazer “justiça”. Eu me oponho a que as aulas de “igualdade” tomem o lugar da aritmética e da língua portuguesa. Isso não é ser politicamente incorreto. Isso é não ser politicamente estúpido.

Dilma vetou o filme para salvar o couro de Palocci? É só mais uma manifestação da República dos Companheiros. A sua decisão, comprometida pelo oportunismo, não torna aceitável a porcaria que Fernando Haddad preparou para ser exibida nas escolas. Aplaudo a decisão em si. E censuro a Rainha Muda por ter deixado essa estupidez ir tão longe.

Por Reinaldo Azevedo.

Desconstruindo Dilma. Ou: um espectro ronda o Palácio do Planalto: O Barba!

Caros, um daqueles textos longos que, acredito, amarra algumas questões que estão soltas por aí e responde a algumas indagações. Avaliem.
*
Lula já é o candidato do PT à Presidência em 2014. Mas como se chegou a isso tão rapidamente? Vamos ver.

“Asseguro que o ministro Palocci está dando todas as explicações necessárias. Espero que esta questão não seja politizada (…). Quero reiterar que o ministro Palocci dará todas as explicações para os órgãos de controle, inclusive para o Ministério Público será dado nos próximos dias.”

A fala é da presidente Dilma Rousseff nesta quinta. Pois é. Como é que uma presidente da República espera que o seu milionário ministro da Fazenda, cujo patrimônio cresceu 19 vezes em quatro anos (multiplicou-se 20 vezes, só para não confundir a matemática homoafetiva de Fernando Haddad..), não seja uma questão política? Como se despolitiza um assunto desses? Os verbos também vão se acotovelando, coitados, tentando encontrar a sua melhor expressão: ora Palocci “está dando” as explicações necessárias, ora “dará”…

Perguntem ao caseiro Francenildo se ele consegue ou não explicar seu patrimônio. Se não explicou por bem, como se viu, teve de explicar por mal, certo? Segundo a Caixa Econômica Federal, a ordem para quebrar seu sigilo bancário partiu do gabinete de Palocci.

O Brasil inteiro ficou sabendo quem depositou dinheiro na conta de Francenildo, que era só um cidadão comum, um, como dizer?, homem privado. Mas é um segredo guardado a cada vez menos chaves quem depositou dinheiro na conta de Palocci quando ele era deputado, assessor de candidata e depois de presidente eleita. Um homem público! Só nos meses de novembro e dezembro do ano passado, Dilma já formando o governo, seu agora ministro da Casa Silva recebeu 333,33 vezes o que foi depositado na conta de Francenildo. O Siafi se interessou pelo caseiro, mas não pelo dono da casa; ficou curioso sobre a conta do “cavalgado”, mas não do “cavalcante”…

Palocci “está dando” e “dará” todas as explicações porque, de fato, as ditas-cujas precisam ser inventadas.

Como sabem os leitores, nunca cheguei a ser um admirador entusiasmado dos eloqüentes silêncios de Dilma. Sempre me pareceu, como atestam os arquivos, que ela não falava porque não tinha o que dizer, de sorte que o mutismo se confundia com profundidade. João Santana captou um certo fastio com o estilo Lula, aquela parolagem sem fim, os auto-elogios sem medida nem decoro, o chute, a improvisação… Mais: se, nele, aquela bobajada toda pegava bem porque, afinal, protegido pelo preconceito que nutrem os bem-pensantes (”ele é do povo; tem direito de ser ignorante”), a “presidenta” teria de percorrer outra trilha. Não teria as mesmas licenças nem os mesmos benefícios.

E se criou, então, a imagem da “rainha encastelada”, vivendo uma intensa vida interior, severa nos hábitos, implacável na cobrança, técnica nas escolhas, econômica nas falas, decorosa no trato das coisas da política. Os súditos poderiam até brigar e se desentender por isso ou por aquilo, mas sempre sabendo que uma soberana zelava por eles. A construção funcionou por algum tempo. Mas começou a trincar.

O primeiro elemento que passou a exigir de Dilma que fizesse o que ela não sabe porque nunca fez — POLÍTICA — foi a inflação. Mas também esta não era, e não é, um problema em si. É fator da equação macroeconômica para a qual os petistas, hoje, não tem resposta. Um político já teria buscado alguma forma de interlocução com a tal sociedade. Dilma está quieta e garante: “O governo será implacável com a inflação”. Certo. Sabemos. Mas é só isso?

A crise na infraetrutura e as dificuldades que o país atravessa para realizar as obras para a Copa do Mundo de 2014 também passaram a exigir da “governanta” uma palavra de orientação, de confiança, de segurança. Nada!  A suposta “superministra” do governo Lula, no comando do Executivo, parece aparvalhada, mesmerizada pelo gigantismo e pela ineficiência da máquina pública, tomada pelos companheiros. A melhor idéia que o conseguiu ter o governo foi relaxar os mecanismos de vigilância e apuração de eventuais irregularidades nas obras públicas. Vale dizer: responde-se à incompetência liberando-se as forças produtivas da lambança.

Esses dois elementos, que caracterizam a incapacidade de um governo de demonstrar liderança, lançaram a suspeita, bastante fundada, de que Dilma era mais fama do que proveito. De fato, amplos setores da imprensa deixaram-se encantar por duas escolhas iniciais da presidente, bastante óbvias, que pareciam acenar com uma nova aurora: mudou um tanto a pusilânime posição do governo brasileiro em relação ao Irã e resolveu congelar o projeto “franklinstein” de controle da mídia. Era, como se nota, pouco para segurar por muito tempo a reputação.

Veio, então, a voragem que colheu Palocci, o primeiro-ministro do governo, e se descobriu o óbvio: sem liderança política, e Dilma não a tem, nada feito! Os desastres protagonizados pelo governo e pelo PT na votação do Código Florestal evidenciaram um governo sem eixo. Como emblema do desacerto, há a declaração de Candido Vaccarezza, segundo quem a presidente considerava a emenda patrocinada pelo aliado PMDB, partido do vice-presidente, “uma vergonha”. Isso dito por uma presidente reclusa, frágil o bastante para suportar os rigores do ar-condicionado do Palácio do Planalto.

Sem líder, com líder
Evidenciava-se um governo sem liderança política. Aquele que podia fazer as vezes de governante terreno — Palocci —  está ocupado demais tentando se defender para conseguir defender a gestão. É um pato manco. Se é assim, então é hora de tirar do banco aquele que Gilberto Carvalho chama “o nosso [deles] Pelé”. Lula, que transitava no palco das celebridades e dos conferencistas milionários, reassumiu a política — e justamente numa costura com os caciques do PMDB, os mesmos que haviam aplicado uma surra no governo na votação do Código Florestal.

Nas conversas com Dilma e com Palocci, comportou-se como porta-voz das reivindicações dos peemedebistas; fez a enfática defesa do chefe da Casa Civil; tentou lançar o grito de guerra contra as oposições (nesse particular, sem muito sucesso até agora) e, sim, aconselhou que se deixasse pra lá agora essa história de kit gay. Mais um pouco, poderia dizer: “Há certos absurdos nestepaiz que eu só eu posso perpetrar porque gozo da inimputabilidade”.

Lula reassumiu perante o PT, o PMDB, a opinião pública e boa parte da administração, que lhe é fiel, o papel de presidente de fato. É, quando menos, o condestável da República. Reassume o lugar na política que sempre considerou seu — daí a sua irritação quando a imprensa insistia em apontar contradições entre o seu estilo e o de Dilma, entre as suas escolhas e as dela. “Como essa gente não reconhece que sigo sendo o chefe?”

Eleição 2012
E há, finalmente, o calendário a jogar a seu favor. As disputas municiais já estão na praça. O PT precisa de alguém que fale por ele, que estabeleça aquela luta habitual entre o bem e o mal, que faça o jogo do “nós” (o povo) contra “eles” (as elites). Quem? Dilma? Não! Ela não o fará porque não é de seu estilo e porque, está cada vez mais claro, a saúde não permite.

Gosto de lembrar algumas coisas que escrevi não para provar que eu estava certo, mas para evidenciar aos leitores que este blog tem balizas. Leiam trecho de um artig de 1º de março, que poderia ser escrito hoje porque o que se lê agora estava escrito desde sempre. Volto depois para encerrar.

Já escrevi aqui algumas vezes: Dilma vai precisar de mais contato com as massas. Não acredito que João Santana vá abrir mão da fantasia da “Soberana” que decide acima das paixões. Parte considerável da imprensa se apaixonou por essa construção, um misto, assim, de Elizabeth II com René Descartes. Ocorre que o PT precisa, como sabemos, de uma sociedade algo mobilizada - e, se Dilma não construir essa liderança popular, Lula vai ocupar o vácuo. A questão, no entanto, não está só no longo prazo. No curto e no médio, será preciso dialogar mais com a sociedade.

O governo já decidiu aumentar o valor do Bolsa Família. Isso tem um apelo importante para parte considerável do eleitorado petista, mas é pouco. Analistas os mais sensatos desconfiam que a situação fiscal do governo é pior do que parece e que a inflação vai incomodar por um bom tempo. E isso num cenário de crescimento menor. O corte no Orçamento, ainda que não se cumpra na dimensão desejada pelo governo, acena para um tempo de euforia menor. Será preciso, pois, aumentar a interlocução, estar mais presente, mobilizar mais os brasileiros.

Lula fazia isso com os pés nas costas, vociferando contra seus inimigos imaginários, internos e externos. Aquela performance, não tem jeito, Dilma não conseguiria reproduzir ou mesmo imitar sem que parecesse ridícula. Não dá para imaginá-la suarenta, sobre um palanque, olhos injetados, fazendo poesia sobre a mãe que nasceu analfabeta… Boa parte do discurso lulista, aliás, era, de fato, de um ridículo atroz, mas a inimputabilidade que conquistou lhe permitiu ir adiante. Permitiu, inclusive, que metesse a economia nessa razoável encalacrada - o que fez, segundo tanto se anunciou, em parceria com Dilma Rousseff.

Dilma cortou, sim, os gastos sociais e as obras do PAC - ao menos em relação ao que ia no Orçamento -, mas gente muito boa desconfia da eficácia da ação para desacelerar a economia e conter a inflação, o que deve chamar ao debate o Banco Central, que talvez tenha de controlar pela via monetária o que o governo não conseguirá fazer pela via fiscal. A razão é simples: a porrada de R$ 50 bilhões agora só esconde a continuada irresponsabilidade dos dois últimos anos. O que a estabilidade econômica ensinou - inclusive aos seis primeiros anos de governo Lula - é que disciplina fiscal é obra continuada.

Mais: o corte se dá sobre um estoque fabuloso de promessas. O Minha Casa, Minha Vida levou um facão de 40%. Atenção! Dilma tem ainda 2,8 milhões de casas para entregar até 2014. É claro que ela não vai cumprir a promessa. Também garantiu a construção de 5 mil creches. Não! Ela não vai conseguir. As UPAs eram mil; ela já deixou por 500, que também não serão feitas.

Uma coisa é não cumprir promessas - e Lula as descumpriu às pencas - num cenário de inflação baixa, juros moderados e crescimento de 7%; outra, um tantinho diferente, é descumpri-las com juros altos, pressão inflacionária e crescimento de 4%, 4,5% - sim, é um bom crescimento. Mas a euforia mesmo começa ali pelos 6%…

Dilma tem de encontrar um modo, adequado a seu perfil mais tímido, de cair nos braços do povo, de mobilizá-lo. O período da euforia acabou. Se estruturada, a oposição estaria com uma baita agenda pela frente, dada de bandeja pela bagunça fiscal de 2009 e 2010. Mas esse terreno ainda parece uma vasta solidão. Dilma precisa cair nos braços do povo porque um espectro ronda o governo.

Alguns dos auxiliares da presidente o chamam de “O Barba”.

Encerro
Dilma é aquela que foi sem nunca ter sido.

Por Reinaldo Azevedo

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Fonte:
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