Implicações do Código Florestal Sobre os Pequenos Produtores Rurais

Publicado em 14/11/2011 11:43 e atualizado em 16/11/2011 09:23
Por Ignez Vidigal Lopes e Daniela de Paula Rocha, Pesquisadoras do IBRE/FGV.
As propriedades ou posses até 4 (quatro) módulos fiscais abrangem um grupo muito diferenciado de produtores que incluem tanto o pequeno estabelecimento produtivo típico do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, quanto um contingente numeroso de produtores de subsistência, a maioria sobrevivendo em situação de pobreza absoluta. 

Estudos do IBRE da FGV, baseado nos micro-dados do último Censo Agropecuário do IBGE de 2006, revelam:

•    Dos 5,1 milhões de estabelecimentos rurais censitados, 4,5 milhões (88% do total) caem na categoria de pequenos (até 4 módulos) e ocupam 28% da área total ocupada pela agricultura no país (Tabela 1).

•     Médios produtores (entre 4 e 15 módulos) somam 238 mil produtores (4,6% do total) e grandes (acima de 15 módulos) representam menos de 100.000, isto é, 1, 78% do total de estabelecimentos rurais. Médios e grandes ocupam 72% da área.


•    Do total de 4,5 milhões, cerca de 3,2 milhões atende aos requisitos da agricultura familiar. Destes, o subgrupo dos pequenos estabelecimentos produtivos representa apenas 534 mil propriedades ou posses.  É o mais desenvolvido e integrado ao mercado (Tabela 2).

•    Ainda nesses 3,2 milhões, há 2,8 milhões de estabelecimentos, onde se pratica uma agricultura de semi-subsistência, muitos dos quais sobrevivem em níveis extremos de pobreza.

•     O estudo da Fundação Getulio Vargas também identificou um subgrupo de aproximadamente 1,3 milhão de pequenos agricultores que possuem menos de 4 módulos rurais, mas  não são incluídos na agricultura familiar para efeito do Pronaf, por não preencherem todas as condições previstas na Lei 11.326/2006. 


•    Com relação à renda da produção agropecuária os dados do Censo mostram uma forte disparidade entre os subgrupos componentes da agricultura familiar: os mais pobres (2,3 milhões de estabelecimentos) geram uma renda familiar média anual de R$ 4.346,00 e metade deles sobrevivem com renda menor que R$ 1.267,00/ano. Esse grupo representa uma população de quase dez milhões  de agricultores familiares que sobrevivem em situação de pobreza extrema.

•    O subgrupo mais produtivo gera um valor da produção anual médio de R$ 41.163,00, sendo que a metade deles atinge valor menor que R$ 25.680,00/ano. Trata-se da renda bruta familiar sem a dedução das despesas de plantio, o que sugere que também sobrevivam em condições de pobreza.


•    A sobrevivência do grupo mais pobre (2,8 milhões de estabelecimentos) tem forte dependência de outras fontes de renda: 45% da renda provêm de aposentadorias e pensões; 15% de trabalho fora do estabelecimento e apenas 25% da renda são provenientes da produção no estabelecimento;

•    Outro resultado da pesquisa da FGV foi mostrar a contribuição dos grupos de até 4 módulos fiscais (entre eles a agricultura familiar) para a produção da cesta básica (Tabela 4)


• Um subgrupo não delimitado no estudo da FGV e que merece também atenção  é o de propriedades ou posses muito pequenas, com área maior que 20 ha e menor (ou igual) a 50 hectares, localizadas em municípios onde o módulo fiscal mede entre  5 e  12 hectares. Embora pequenas (área menor que 50 ha) elas excedem o critério de 4 módulos ficais.

Conclusão:

Os dados da pesquisa do IBRE-FGV com os dados do Censo não deixam qualquer dúvida de que, quando se fala de pequena propriedade ou posse rural, na realidade se está falando de um conjunto muito numeroso e heterogêneo que, além da agricultura familiar, envolve numero expressivo de pequenos produtores que nela não se enquadram mas que têm participação até mais expressiva do que ela na cesta básica . Todos esses subgrupos devem ser considerados como frágeis e de interesse social, e entre eles sobressai um grupo numeroso de pobreza absoluta.
 

Pontos para reflexão sobre a realidade encontrada nos estudos da FGV:

•    Apesar de não ser o alvo principal do Código Florestal – o pequeno produtor é tão numeroso que corre o risco de se tornar o mais atingido: representa 88% contra 4,6% do médio e 1,78% do grande produtor (em relação ao total de 5,1 milhões de estabelecimentos).

•    O pior problema de uma negociação é desconhecer os números e não saber o que se está negociando. Corre-se o risco de “atirar no que se vê e matar o que não se vê”

•    A situação de pobreza extrema revelada no estudo abrange uma população de cerca de 10 milhões de pessoas (média de 3 pessoas por família rural), totalmente incapaz de suportar qualquer ônus adicional, muito menos a subtração da área da qual depende seu sustento, sem a contrapartida de uma compensação financeira.

•   Outra revelação do Censo é que existe um universo bem maior de pequenas propriedades (até 4 módulos), além do grupo enquadrado na agricultura familiar, e que esse grupo ampliado não pode ser excluído do tratamento diferenciado que sua situação de renda impõe ao Código Florestal.

•   Esse pequeno produtor que não se enquadra no Pronaf contribui com uma parcela bem mais expressiva para a cesta básica e necessita de tratamento diferenciado para ser capaz de cumprir com as exigências do Código sem o risco de diminuir sua participação em relação ao médio e grande produtores.

•    No caso de tratamento diferenciado, a pergunta é onde realizar o corte de forma adequada à realidade, sem deixar que questões políticas se sobreponham às necessidades, aos fatos e números?

•    Há riscos de que a regulamentação excessiva e burocrática – com a qual o pequeno produtor está pouco familiarizado, aliada à baixa capacidade operacional dos órgãos ambientais – torne inviável a atividade para o pequeno produtor, aumentando ainda mais a concentração dos meios de produção no setor.

Fonte: Fund. Getúlio Vargas

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