Proteína artificial promete acabar com a mosca branca no feijoeiro

Publicado em 19/09/2017 11:45

Uma proteína artificial com ação inseticida poderá ser uma poderosa ferramenta de controle da mosca-branca, praga que ataca culturas como as de soja, algodão, feijão e tomate. Ferramentas da biotecnologia têm permitido que cientistas da Embrapa Hortaliças, de Brasília, DF,  desenvolvam uma proteína formulada a partir da associação de outras duas: uma tóxica e outra pertencente a um begomovírus, microrganismo transmitido pela própria mosca-branca.

A proteína artificial é obtida por meio da fusão da proteína da capa proteica (CP) do vírus – responsável por formar um envoltório que reveste o material genético desse microrganismo – com uma molécula tóxica isolada do veneno de aranhas. Essa molécula possui efeito letal e específico para insetos desde que atinja a hemolinfa (líquido que circula nos vasos dos animais invertebrados análogo ao sangue em animais vertebrados) e alcance o sistema nervoso central do inseto, causando paralisia.

Em linhas gerais, a hipótese é de que quando o inseto ingere a proteína de fusão, a CP transporte a molécula tóxica do sistema digestório para o sistema circulatório, e de lá para o sistema nervoso, local em que ocorre o bloqueio de neurotransmissores que causam espasmos no inseto-praga até causar sua morte.

A ingestão apenas da molécula tóxica pela mosca-branca não surte efeito porque, uma vez no trato digestivo, ela é excretada pelo inseto antes de atingir a hemolinfa. É exatamente nesse ponto que entra a CP do vírus para atuar como um cavalo de Troia e permitir que o veneno alcance seu destino.

No organismo do inseto, o vírus tem um ciclo circulatório e isso permite que ele transite do aparelho digestório para a hemolinfa. Logo, a proteína de fusão soma o efeito da molécula tóxica do veneno de aranha ao mecanismo de circulação do vírus dentro do inseto e, assim, promove uma pane no funcionamento do organismo da mosca-branca.

Para o biólogo Erich Nakasu, analista de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Hortaliças, o desafio maior da pesquisa não é sintetizar a proteína de fusão, mas garantir que a proteína tóxica seja produzida em conjunto com a capa proteica viral, e que se mantenha protegida dentro do corpo do inseto contra seus mecanismos naturais de defesa para, então, chegar ao sítio de ação em condição de expressar o efeito tóxico, provocando a morte do inseto.

“Há duas possibilidades delineadas para conseguir o efeito tóxico: desenvolver uma planta que expresse a proteína de fusão, sendo a fonte do produto tóxico, ou alimentar o inseto com uma dieta artificial”, enumera, ao destacar que o próximo passo será testar esse método de controle da praga em casas de vegetação sob condições controladas.

Ação específica - Como a proteína de fusão é formulada com base na proteína da capa do begomovírus, microrganismo transmitido exclusivamente pela mosca-branca, assume-se a especificidade da ação tóxica somente para este inseto-praga.

Dessa forma, a proteína de fusão surte efeito prejudicial somente para a mosca-branca e não compromete um inseto não alvo, preservando joaninhas, por exemplo, que são inimigos naturais da praga, e abelhas, importantes polinizadoras.

Na natureza, os animais que se alimentam de pragas geralmente produzem e injetam toxinas em suas presas. “A toxina específica que está sendo avaliada no projeto, extraída do veneno da aranha, tem ação específica e ocasiona danos somente em insetos. Em vertebrados, em geral, incluindo humanos, essa toxina não causa nenhuma consequência nociva ou efeito deletério”, explica o biólogo que também destaca que os experimentos seguem as normas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio) e que o laboratório possui certificação de qualidade.

Há uma tendência no meio científico de testar o uso de proteínas de fusão no controle de pragas, contudo, a aplicação desta metodologia em mosca-branca é inédita e, se os resultados forem positivos, pode ocorrer um grande avanço no manejo integrado desta praga que, atualmente, baseia-se principalmente no controle químico, o que pode ser prejudicial para a sustentabilidade da produção agrícola.

A perspectiva de sucesso da pesquisa deve-se principalmente à expertise da equipe de cientistas. Nakasu, em sua tese de doutorado, realizada na Newcastle University e na Durham University, no Reino Unido, trabalhou na avaliação de uma proteína de fusão originada a partir da combinação do veneno de determinada espécie de aranha com uma substância encontrada em flores da família Amaryllidaceae, mas na ocasião o alvo do controle eram pulgões. Ele também analisou o efeito dessa proteína de fusão na capacidade de memória e aprendizado de insetos benéficos e não alvos, como abelhas, concluindo que não há quaisquer complicações para esses insetos.

A mosca-branca - A mosca-branca é uma praga que não faz distinção de alimento e, devido ao alto grau de polifagia, mantê-la sob controle é uma tarefa que tem mobilizado esforços de diversas cadeias produtivas que se preocupam com o impacto negativo na produtividade. Grandes culturas como soja e algodão hospedam a praga e sentem os danos ocasionados pela sucção da seiva, contudo, eles são secundários diante dos prejuízos da ferrugem e do bicudo, principais pragas dessas culturas, respectivamente.

No caso do tomate, além de agir como um inseto sugador que compromete o desenvolvimento da planta e injeta toxinas capazes de estragar os frutos, a mosca-branca também transmite viroses que afetam a produtividade das lavouras e geram perdas de até 50%.

Algumas regiões produtoras adotaram o vazio sanitário, que prevê um período sem plantas vivas de tomate no campo, para tentar controlar o nível populacional da mosca-branca. Contudo, para garantir o sucesso no controle dessa praga, mais do que contar com políticas públicas implantadas por órgãos de defesa vegetal, é preciso propor aos agricultores um manejo racional a fim de manter a sustentabilidade de todo o sistema e, nesta parte, entra a pesquisa científica.

A mosca-branca é um inseto sugador de seiva e transmissor de vírus. Além de prejudicar o desenvolvimento normal da planta, o que naturalmente reduz a produção, no processo de alimentação, a mosca-branca injeta toxinas que, no caso do tomateiro, ocasionam o amadurecimento desuniforme e a isoporização dos frutos.

Quanto aos vírus, a praga pode transmitir para o tomate o begomovírus, o crinivírus ou, ainda, ambos, o que é chamado de mistura viral. Esta possibilidade preocupa a pesquisa, que já se questiona se a combinação pode interferir no manejo de outros vírus do tomateiro, como o tospovírus, transmitidos pelos tripes.

Com mecanismos que favorecem a adaptação em condições extremas, a mosca-branca apresenta alta taxa de fecundidade, além de ter como característica a partenogênese, ou seja, a fêmea é capaz de produzir clones que vão manter possíveis genes de resistência a produtos químicos, o que facilita o estabelecimento da população.

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Fonte:
Embrapa Hortaliças

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