"Zerar TEC de soja e milho não tem efeito com escassez mundial de produto", diz Liones Severo

Publicado em 19/10/2020 11:00

A suspensão da TEC (Tarifa Externa Comum) para a soja e o milho importados pelo Brasil de países de fora do Mercosul foi confirmada na última sexta-feira (16), porém, não deve ter qualquer efeito prático sobre os preços de ambos os produtos no país, conforme explica o analista e consultor de mercado, diretor do SIMConsult, Liones Severo, ao Notícias Agrícolas. "A escassez é no mundo todo", diz. 

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Segundo esclarece Severo, há uma crise global de falta de alimentos, em especial de soja e milho, que se intensificou com a pandemia do novo coronavírus e que deu diversos sinais de que momentos como este chegariam. "Se instalou uma crise que ninguém percebeu. O fechamento na China do mercado de aves vivas e exóticas, e outros animais silvestres, provocou um forte aumento no consumo de outras proteínas", afirma. 

O consultor explica ainda que "todas as situações como estas de lockdown provocam uma expansão do consumo de alimentos que é imensurável" e que a crise de escassez se instala, sempre, primeiro nos países produtores. "Trata-se de algo muito sério", complementa. 

Com a oferta ajustada no mundo todo, a soja e o milho importados chegariam ao Brasil com preços mais elevados do que os registrados atualmente no país. Para a oleaginosa, seriam valores entre R$ 170,00 e R$ 175,00 por saca, na equivalência com base nos portos brasileiros. No interior brasileiro, já se registra soja a até R$ 163,00 por saca. 

Além da pouca oferta disponível, o dólar alto frente ao real - ainda operando na casa dos R$ 5,60 e podendo ampliar sua valorização frente à moeda brasileira até o final deste ano - os prêmios altos e o encarecimento do frete e de operações portuárias também deverão elevar o preço dos produtos importados. 

A operação de colocar a soja no navio, nos EUA, por exemplo, que tradicionalmente vale de US$ 0,08 a US$ 0,16 por bushel passou a valer de US$ 0,90 a US$ 1,00/bushel. "Isso sem contar que a capacidade dos portos norte-americanos está esgotada até novembro pelas fortes compras chinesas. Essa soja ou milho teriam que vir dos portos da Costa Leste, o que faz com que logística - inclusive internamente nos EUA - fique ainda mais cara", explica Liones Severo. 

E o diretor do SIMConsult lembra ainda que os Estados Unidos já comprometeram mais de 70% da soja estimada para se exportada da safra 2020/21. De acordo com os últimos números do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), já foram comercializadas 43,235,3 milhões de toneladas de soja, contra pouco mais de 17,8 milhões no mesmo período do ano anterior, um aumento de 142% na comparação anual. 

No panorama o milho, Severo cita a questão dos prêmios. "A Ucrânia tem 200 cents de dólar de prêmio no milho, mesmo valor do Brasil. Na Argentina, são 170 cents, mas o produtor não quer vender por problemas com a moeda. Ou seja, o mesmo do Brasil e mais o frete", diz. "De qualquer forma, tanto soja, quanto o milho chegariam aqui com preços acima dos atuais do mercado brasileiro. 

E o consultor afirma: "O Brasil não tem mais milho, por isso os preços subiram e sobem tanto. O produtor não está segurando nestes preços. Então, não temos muita opção. O que temos visto são preços de resgate, porque os produtores já venderam toda a soja e o milho. O remédio para preços altos são preços ainda mais altos, que é forma que promove algum racionamento do consumo".

Para Severo, trata-se de um período longo de escassez, que poderia levar até três anos para se resolver, como já foi observado em outros momentos da história. Na última sexta-feira, a Bloomberg trouxe como uma de suas manchetes, o movimento que diversos países em todo mundo estão fazendo de estocar alimentos de todas as naturezas para evitar uma escassez ainda mais severa. 

A fome está crescendo, de acordo com dados de organizações internacionais - como a FAO, o braço de agricultura e alimentação da ONU (Organização das Nações Unidas) -, bem como a séria ameaça da insegurança alimentar global. Os números dispararam durante a pandemia. 

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De acordo com agência internacional de notícias, a Jordânia vem ampliando e trabalhando em seus estoques de trigo e o Egito vem aumentando suas importações em plena colheita, o que tradicionalmente não acontece no país africano. Desde abril, suas compras já aumentaram 50%. As mesmas estratégias passam por China, Taiwan, e outros países, incluindo o Brasil.

É importante lembrar que em setembro o Comitê-Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex) zerou a alíquota de importação de arroz pelo Brasil de fora do Mercosul para 400 mil toneladas até 31 de dezembro de 2020. 

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Por: Carla Mendes | Instagram @jornalistadasoja
Fonte: Notícias Agrícolas

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