Editorial da Folha: Dilma mudando

Publicado em 07/11/2014 05:35
Se eleitorado dividido ao meio recomenda moderação ao novo governo, estado crítico da economia obriga a adotar orientação diversa da atual (Folha de S. Paulo)

As manifestações em favor do impeachment e até da deposição da presidente Dilma Rousseff, embora toleráveis em respeito à liberdade de expressão, não passam de desvario político. Restringem-se a grupelhos isolados, em mais uma evidência de que o respeito às regras do jogo democrático se enraizou solidamente no Brasil.

Como costuma acontecer com governantes vitoriosos por margem estreita de votos, tudo indica que a presidente reeleita tenderá à moderação. Cabe aqui a conhecida analogia entre o poder e o violino, instrumento que se usa tomar com a mão esquerda, mas se toca com a direita.

Que quase metade do eleitorado tenha condenado sua administração já seria motivo bastante para fazê-la esquecer os arroubos da campanha. Mas há razões mais prementes, traduzidas na notória deterioração da economia.

No afã de sustentar a bonança que beneficiou o segundo mandato de seu antecessor, a presidente meteu os pés pelas mãos. Adotou um intervencionismo errático que gerou distorções, afugentou investimentos e solapou a confiança empresarial. Colheu inflação alta (média anual estimada de 6,2% no quadriênio) e crescimento raquítico (de 1,6%).

É hora de mudar, como apregoaram todos os candidatos. Passo decisivo será a indicação, para a chefia da futura equipe econômica, de um nome que imponha respeito ao mercado, anunciada para a segunda metade deste mês.

Ontem mesmo a mandatária disse em entrevista que é preciso "apertar o controle da inflação" e que "sempre haverá gastos para cortar", dando indícios de uma lucidez que vinha lhe faltando durante o primeiro mandato.

No flanco político, os problemas não serão menores. O governo terá de se haver com sua imensa base parlamentar, sempre sequiosa por cargos e verbas, sempre disposta a chantageá-lo quando as dificuldades aumentam.

Nesse capítulo, a melhor política será o rigor republicano que a presidente encetou no início do primeiro governo, para depois abandonar. Uma real disposição de contribuir para esclarecer e punir as gravíssimas evidências de corrupção na Petrobras emitiria a mensagem correta, ainda que ao preço de atingir as entranhas do próprio governo.

Quanto à oposição, derrotada mas fortalecida nas urnas, espera-se que evite tanto a leniência que a desfigurou nos últimos anos, como a tentação de enveredar por uma diretriz de "quanto pior, melhor". Afinal, competirá a ela fiscalizar e criticar a implantação de um programa de governo que, ironicamente, será em grande parte o seu.

VINICIUS TORRES FREIRE

Dilma cedeu. Quanto?

Juros sobem, dólar desliza para cima, combustíveis são reajustados; o ajuste começou

O "AJUSTE" TÃO vilipendiado na campanha eleitoral do governismo começou, ratificado de resto pela presidente reeleita, em entrevista de ontem.

A taxa de juros aumentou e aumentará mais, ao passo dos reajustes de preços regulados pelos governos e pela alta do dólar, que tendia mesmo a subir e talvez suba um tanto mais porque o Banco Central dá indícios de que não vai segurar o preço da moeda americana como o fazia desde agosto de 2013. Os combustíveis sobem hoje. A seguir, vamos saber o tamanho do reajuste do preço da eletricidade.

A próxima dúvida a ser esclarecida é a respeito do ritmo do acerto das contas da economia, dos gastos do governo aos impostos. A seguinte, sobre o efeito político de um segundo ano de estagnação econômica e do provável, ainda que parcial, desmentido das promessas de campanha da presidente reeleita.

O corte de gastos provavelmente deve ser progressivo, como tem afirmado o governo. Mas deve sê-lo mais por precisão do que por boniteza. Quer dizer, como é muito difícil reduzir despesas, dados o orçamento engessado e compromissos inevitáveis, no curto prazo, o aumento da poupança do governo deve, na melhor das hipóteses, ser suave. Certas revisões de gastos insinuadas pela presidente, como despesas com seguro-desemprego e pensões, são trabalhosas.

Quanto a impostos, há gente graúda no governo a dizer que não haverá aumentos. A afirmação é, no entanto, capciosa.

Primeiro, porque o governo pode restabelecer alíquotas antigas de impostos existentes (Cide, IPI) e dizer, assim, que não houve aumento de tributos, apenas a reversão de uma desoneração excepcional. Segundo, porque não se sabe ainda quem será a gente graúda e com comando econômico a partir de janeiro.

Lembre-se mais uma vez que, quanto mais lento o conserto das contas do governo, a princípio por mais tempo as taxas de juros permanecerão em alta ou altas. Não é um equilíbrio social e economicamente mais justo, por mais que "cortar gastos" pareça um atentado à inclusão social, ou lugar-comum parecido e equivocado.

Os impactos mais cotidianos de três anos de lerdeza econômica e um de estagnação começam a aparecer por quase toda parte. Ontem, soube-se, por exemplo, que os brasileiros estão colocando menos dinheiro nas cadernetas de poupança, uma aplicação financeira sabidamente popular. Trata-se de um sintoma.

Todas as vezes em que a economia brasileira embica para um ciclo menor de crescimento, o saldo acumulado das captações da poupança embica para baixo também, em ladeira abrupta, como acontece desde o terceiro trimestre do ano passado (feita a conta com o acumulado de 12 meses). Não se trata de indício de coisa pior, nada assim, mas de um sinal de que está sobrando menos dinheiro e/ou de que parte das sobras dos salários vai para aplicações a juros maiores.

É um sintoma de que as coisas não vão bem, daqueles facilmente perceptíveis pelo cidadão comum. Assim como é visível que o consumo desacelera, que os salários crescem mais devagar. Tudo embica para baixo em sincronia. A ladeira vai ficar mais íngreme agora, que o "ajuste" começou, seja lá qual for o seu tamanho.

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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1 comentário

  • Guilherme Frederico Lamb Assis - SP

    Desvairo uma ova, se for comprovado o envolvimento de Dilma no PTrolão impeachment é o minimo que se deve fazer!

    PTista não esta acima da lei, por mais que alguns jornalistas insistam nessa teoria. Por enquanto só indio é livre para cometer crime no Brasil segundo a lei.

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