"Alguma esperança, pelo menos", por VINICIUS TORRES FREIRE (na FOLHA)

Publicado em 27/05/2016 07:54
O Brasil já melhorou (REINALDO AZEVEDO)...

A esperança de dias menos sofridos na economia cresce muito devagarzinho desde dezembro, mas parece crescer de modo inequívoco, indicam as pesquisas.

Na realidade, a economia afunda para seus piores resultados em uma década ou décadas.

Ainda assim, as estimativas são de que a coisa pare de piorar em algum momento do segundo semestre –é o que esperam os maiores bancos do país, por exemplo. Note-se que tal previsão vinha desde o início do ano, com ou sem Dilma Rousseff. Isso quanto ao ritmo geral da economia –o desemprego deve crescer por meses ainda.

A novidade de maio foi o salto mais animado das expectativas de consumidores e empresários, provocado pela esperança de que a troca de governo deixe a crise para trás, segundo os economistas responsáveis pelas pesquisas de opinião que medem a confiança.

O Índice de Confiança do Comércio da FGV subiu para o melhor nível desde junho de 2015. A expectativa quanto ao futuro não é pessimista pela primeira vez desde dezembro de 2013, registra parte do Índice de Confiança do Consumidor da FGV. O Índice de Confiança do Empresário Industrial, da CNI, não era tão alto desde o início de 2015.

No entanto, ainda teremos o dissabor de verificar que continuamos nas profundas nesta quarta (1º), quando sai o PIB do primeiro trimestre. São números velhuscos, é verdade. Porém os indicadores e indícios mais recentes a respeito de crédito e salários não negam o desastre.

O ritmo de redução do crédito bancário ainda acelera –o total de dinheiro emprestado caiu 6,1% em um ano, até abril. O total de rendimentos do trabalho cai um pouco mais devagar, mas baixa 4,1%. O consumo de varejo desce de mãos dadas com crédito e rendimentos.

O governo não tem nem terá como fazer que os bancos estatais compensem a retranca dos bancos privados ou tapem com empréstimos o buraco deixado pela baixa enorme nos salários.

O governo fez tal coisa em 2008 e 2009 (quando os salários despencaram); deu relativamente certo. Fez tal coisa loucamente em 2013, quando os bancos privados se retraíram, embora nem crise desatada houvesse. Em meados de 2013, o crédito nos bancos privados encolhia um pouco; nos públicos, crescia a 21% ao ano, uma demência de divergência.

O governo enfim apenas conseguiu produzir inflação, distorções e um aumento brutal do endividamento, motivos importantes da presente desgraça.

O que se pode esperar, então (estamos falando aqui só de curtíssimo prazo, até o fim do ano)? O crédito não vai bulir muito no mundo real. A esperança, no entanto, é que, com a confiança em alta, aumente a procura de crédito.

Mas isso tudo é muito pouco e pode se quebrar, caso se instale outro tumulto radical na política e/ou os povos dos mercados achem que a política econômica de Michel Temer esteja sem rumo. Assim, a esperança iria pelo ralo.

Para manter a animação tímida de sobreviventes de furacão e terremotos, vista em maio, seria preciso que o governo demonstrasse capacidade de dar rumo de médio e longo prazos à economia e, assim, de baixar logo e muito as taxas de juros.

Tropeços do governo e novos jorros de imundície política podem nublar de novo o ambiente.

O Brasil já melhorou (REINALDO AZEVEDO)

Qualquer pessoa que tenha lido com um mínimo de atenção a transcrição dos diálogos de Sérgio Machado com Romero Jucá, Renan Calheiros e José Sarney sabe que não há neles absolutamente nada de politicamente relevante.

Se há outros com conteúdo bombástico, não sei. É bom que tenham vindo a público. Demonstram que há ao menos o risco de o Brasil dar certo... Os únicos a encontrar um sentido transcendente –isto é, que vai além da conversa mole– nos diálogos foram os petistas e os colunistas do Velho Regime. Vamos ver.

Um jurista de muitas lentes ou um rábula de porta de cadeia sabem que não há neles crime nenhum. De ninguém. Era forçoso que Jucá fosse apeado do Planejamento, mas não porque tenha atentado contra a Lava Jato ou a saúde das instituições. Aquele papo é incompatível com o cargo que ocupa. Falta de decoro ou de vergonha não é crime.

Síntese da conversa do ex-ministro com Machado: ameaçado, anteviu que tudo se resolveria quando Michel Temer fosse presidente. Tanto o interlocutor não acreditava, notem, que estava gravando o bate-papo para fabricar uma prova ou um instrumento de chantagem.

E com Renan? O presidente do Senado acha necessário disciplinar as delações premiadas. Eu também. Provavelmente, queremos disciplinas distintas. Nos dois casos, onde está o crime? E José Sarney? A conversa é ainda mais estratosférica. O ex-senador promete tornar o interlocutor imune a Sergio Moro. Como? Ninguém faz a menor ideia. Nem o lírico de Saraminda.

Nesta mesma Folha, li que um emissário de Temer esteve com procuradores para desfazer a boataria de que, se presidente, o então vice iria frear a Lava Jato. Referindo-se às gravações e ao encontro, os petistas gritaram: "Conspiração! Dilma foi vítima de um golpe!".

Segundo os petralhas, os ditos "golpistas" tramavam contra a ora Afastada tanto quando manifestavam o desejo de frear a operação como quando diziam que esta é intocável. Cobrar raciocínio lógico de esquerdistas é perda de tempo. Seu negócio é ganhar um debate mesmo sem ter razão. Entendem que dialética é a arte de fazer a mentira brotar da verdade e a verdade, da mentira. Em qualquer dos casos, trapaça.

E por que os vazamentos me levaram a pensar que até há o risco, ainda que não assim tão grande, de o Brasil dar certo? Pense comigo, leitor amigo. Já vieram a público gravações com Lula, Dilma, Jaques Wagner, Jucá, Renan e Sarney. Estamos falando de uma presidente da República, dois ex-presidentes, um ministro de Estado e dois dos mais poderosos senadores. Os membros dessa plêiade pertencem aos maiores partidos do Brasil. Todos impotentes. O Brasil já melhorou!

Todos estavam empenhados em dar um jeito na Lava Jato. E, no entanto, o que cada um deles pôde fazer, além de nada? A suposição de que as falas de Jucá, Renan e Sarney evidenciam a natureza golpista da deposição de Dilma é só um atestado de má-fé e de vigarice intelectual.

Elas não fabricaram o crime de responsabilidade cometida pela Afastada nem orientaram o voto de deputados e senadores. Não são nem causa nem consequência do fato jurídico e do fato político.

De resto, eu tenho o direito de dizer ao telefone que já acertei o conteúdo da próxima encíclica com o papa Francisco. Agora é só torcer para ninguém divulgar a minha conversa.

Hora de mudar de assunto.

Debater as prioridades (editorial da FOLHA) 

O governo de Michel Temer (PMDB) passou em seu primeiro teste parlamentar ao obter permissão do Congresso para incorrer em deficit recorde de R$ 170,5 bilhões (2,8% do PIB) neste ano.

A vitória, importante por mostrar capacidade de articulação, tem o efeito positivo de evitar a paralisia da máquina pública, o que seria desastroso para o presidente interino. As batalhas mais difíceis, porém, ainda estão por vir.

A mudança da meta escancara a calamidade deixada pela administração petista. Projetava-se inicialmente um saldo positivo de R$ 24 bilhões. Pouco antes de ser afastada, Dilma Rousseff já encaminhara projeto de revisão para um deficit de R$ 96 bilhões -o que também se mostrou errado ao contar com estimativas otimistas de receitas.

Alterações de dezenas de bilhões de reais em poucos meses ou semanas atestam o quanto o país voava às cegas. Daqui para a frente, em tese haverá busca por maior previsibilidade; a crer no ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não haverá nova modificação neste ano.

Deu-se com isso o primeiro passo na longa caminhada de reconstrução das contas públicas. Em vez de cortes emergenciais e aumentos de impostos para tapar buracos de curto prazo, o governo pretende fazer o Estado caber dentro do Orçamento de forma sustentável.

O ponto de partida está na proposta de alterar a Constituição e fixar um teto para o aumento das despesas públicas. Isso tornará inevitável o fundamental debate sobre as prioridades do Estado brasileiro a longo prazo.

Para que o teto funcione, serão necessárias mudanças em temas que até agora se mostraram tabu: Previdência e vinculações de receitas, que resultaram em contínuo aumento das despesas sociais, sobretudo com saúde e educação.

Até por causa do tamanho do problema, não há bala de prata. Será um processo longo e penoso de convencimento da sociedade de que é preciso fazer escolhas. Se o país quiser expandir os aportes em serviços essenciais, deverá estancar o aumento de outras rubricas.

Critérios mais restritivos para despesas de pessoal e reavaliação de subsídios para os que menos precisam são parte da solução.

Por fim, tudo indica que algum aumento de impostos será inescapável. O governo Temer acerta ao deixar essa discussão para um segundo momento. Será desejável caminhar para uma estrutura tributária mais progressiva, com maior prevalência sobre rendimentos do trabalho e do capital, e menos da produção e do consumo.

É uma agenda bastante difícil até para um governo eleito, que dirá para um interino. Depois de anos de populismo e interdição do debate, todavia, o país já ganhará muito se aumentar a discussão sobre prioridades e conseguir algum controle sobre os gastos públicos.

 

O ambiente para Temer não mudou (CLÓVIS ROSSI)

Algo me diz que o presidente interino, Michel Temer, errou no tempo verbal em uma das frases que pronunciou na terça-feira, 24.

Disse Temer, para demonstrar que é um presidente forte (ainda que interino): "Fui secretário de Segurança Pública duas vezes em São Paulo e tratava com bandidos.

  Pedro Ladeira/Folhapress  
Brasilia, DF, Brasil, 25/05/2016: Presidente interino Michel Temer acompanhado do ministro Jose Serra (MRE) durante cerimonia de apresentacao de credenciais de embaixadores, no palacio do planalto. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress
O presidente interino, Michel Temer, durante cerimônia com embaixadores no Palácio do Planalto

Tratava, não, cara pálida. Trata ainda, a julgar pelo currículo (ou folha corrida?) do líder do governo na Câmara, o deputado André Moura (PSC-CE): réu em três ações penais no STF, investigado em três inquéritos —um deles sobre tentativa de homicídio— e condenado por improbidade administrativa.

Longe de mim concordar com a sabedoria popular que diz que "todo político é ladrão". Mas meu prestígio junto à família e aos amigos sempre fica profundamente ferido quando tento defender a tese —o que, aliás, faço sempre— de que toda generalização é injusta e, portanto, nem todo político é ladrão.

O problema é que os políticos não me ajudam: podem não ser os bandidos com os quais Temer tratava como secretário de Segurança Pública, mas uma fatia importante deles cai, facilmente, na categoria de criminosos de colarinho branco. Afinal, 60% dos congressistas têm algum tipo de acusação/suspeita pairando sobre seus colarinhos, conforme dados da Transparência Internacional.

Em sendo assim, qual a surpresa com a gravação em que o senador Romero Jucá, efêmero ministro do Planejamento de Temer, aparece defendendo a decapitação de Dilma Rousseff como a melhor forma de parar a Lava Jato?

Afinal, como escreveu para o site da Folha esse excelente repórter/analista que é Igor Gielow, "os diálogos com [Sérgio] Machado, revelados pela Folhanesta segunda (23), são estarrecedores, como de resto são praticamente todas as conversas entre políticos sem a presença ostensiva de um gravador".

Pois é. O apodrecimento do mundo político, que já apontei na colunapublicada no dia em que a Câmara aprovou o encaminhamento do impeachment ao Senado, faz com que a Operação Lava Jato paire como um fantasma tanto sobre a base política do governo anterior como sobre a atual —de resto, parecida.

O que surpreende é menos o estarrecedor diálogo de Jucá com Machado e mais o fato de que a Lava Jato continue firme e forte apesar de contrariar interesses poderosos.

Contraria o PT, como ficou claro pelo fato de que vários de seus quadros estão envolvidos na lama, como contraria o PMDB, o novo/velho partido de governo, de que a gravação com Jucá é uma evidência definitiva e cristalina.

E, claro, contraria o empresariado, do qual ilustres representantes foram para a cadeia.

Jucá poderia ser tomado como símbolo desse mundo político apodrecido: foi líder em sucessivos governos dos últimos 20 anos. Ser líder significa que é considerado um modelo tanto por seus pares (deputados e/ou senadores) como pelos presidentes que o indicaram.

Se o modelo é esse que Jucá escancarou nas gravações, algo só pode estar podre no mundo político. A saída de Jucá do Planejamento não saneia o sistema.

O novo homem-bomba (BERNARDO MELLO FRANCO)

Sérgio Machado, o novo delator da praça, é um exemplar típico do "homo brasiliensis". Filho de político, dono de uma emissora de TV, não teve dificuldade para comprar a entrada no Congresso.

Começou no PMDB, elegeu-se deputado e senador pelo PSDB e voltou ao partido de origem para disputar o governo do Ceará, em 2002. Derrotado nas urnas, recorreu à proteção de amigos para continuar no poder.

Assim que o PT chegou ao Planalto, o senador Renan Calheiros o indicou para presidir a Transpetro, a subsidiária de transportes da Petrobras. Machado chefiou a estatal por 12 anos. Só caiu em fevereiro de 2015, depois de sucessivas licenças para tentar escapar do foco da Lava Jato.

A tática da submersão não deu certo. Os procuradores continuaram a cercá-lo, acumulando indícios de corrupção. Quando a prisão se tornou iminente, o peemedebista resolveu virar delator. Pôs um gravador no bolso e saiu à caça de frases que comprometessem os padrinhos.

Sua primeira gravação derrubou o senador Romero Jucá do Ministério do Planejamento. Nesta quarta (25), surgiram novas fitas envolvendo Renan e o ex-presidente José Sarney. Investigadores dizem que é só o começo. Machado teria produzido mais provas contra políticos de diferentes partidos.

Embora o principal alvo seja o PMDB de Michel Temer, PSDB e PT não têm muito o que comemorar. Na conversa com Jucá, Machado afirma que o tucano Aécio Neves será "o primeiro a ser comido" pela Lava Jato.

Em outra gravação entregue ao Ministério Público, Sarney diz ao ex-presidente da Transpetro que Dilma Rousseff estaria "envolvida diretamente" num pedido de doações à Odebrecht. Não é possível saber a que campanha ele se refere.

O novo homem-bomba conhece os segredos de mais gente em Brasília. O ex-senador Delcídio do Amaral disse que sua delação vai "parecer a Disney" perto do que Machado ainda tem a revelar. Pelo clima de tensão na capital, ele pode estar certo. 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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