Gastança continua: Cidades contratam advogados para receber R$ 90 bi, e honorários abrem guerra judicial (O GLOBO)

Publicado em 13/07/2018 06:25
Sem preocupação com as contas, Câmara e Senado atendem a lobbies com projetos perdulários, (na Folha de S. Paulo, edição desta sexta-feira)

Bancas de advocacia espalhadas pelo país, grandes e pequenas, tentam receber uma fatia bilionária de recursos destinados à educação básica, uma ofensiva que ganhou a oposição da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Um parecer dela de 25 de maio, obtido pelo GLOBO, aponta a iniciativa como “gravíssima situação” e defende que o Ministério Público Federal (MPF) empreenda ações para barrar contratações desses escritórios de advocacia por prefeituras país afora para agilizar a liberação dos recursos federais.

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As bancas vêm sendo contratadas por municípios que têm direito a receber da União uma complementação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Ao todo, 3,8 mil cidades, em 19 estados, podem receber quase R$ 90 bilhões, dinheiro que corresponde a uma diferença de ressarcimentos do governo federal ao Fundef, o antecessor do Fundeb.

O MPF ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal em São Paulo em 1999, apontando uma retenção ilegal de recursos pela União. Em 2015, a ação chegou ao fim, sem possibilidades de recursos, com ganho de causa dos municípios.

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É nesse contexto que começou a ofensiva de escritórios de advocacia para representar as prefeituras e assegurar os repasses do Fundeb — convertidos em precatórios (requisição de pagamento para cobrar órgãos públicos após condenação) — a que passaram a ter direito. Os honorários cobrados seguem um padrão: 20% do total do dinheiro a ser depositado. Assim, as bancas tentam receber um montante que pode chegar a R$ 18 bilhões.

A ofensiva dos escritórios levou a uma contraofensiva dos órgãos de controle, como o MPF, que vêm sedimentando o entendimento de que o dinheiro do Fundeb deve ter uma destinação exclusiva à educação básica.

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Primeiro, em agosto de 2017, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que é inconstitucional destinar o dinheiro dos precatórios para pagamentos de honorários. Depois, no mês seguinte, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os recursos da complementação da União, no caso de quatro estados, devem estar vinculados a “ações de desenvolvimento e manutenção do ensino”. Em 7 de junho, uma decisão monocrática do ministro Edson Fachin, a respeito de um quinto estado, foi na mesma direção.

Como o dinheiro da educação é disputado  
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3.800 municípios obtiveram na Justiça o direito de receber da União quase R$ 90 bi referentes a uma diferença de ressarcimentos ao Fundef, antecessor do Fundeb
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Escritórios de advocacia se oferecem para representar as prefeituras e assegurar o repasses dos valores. Três escritórios têm mais de 400 prefeituras em suas carteiras de clientes, a maioria deles na região Nordeste. Um único escritório, se conseguir garantir a continuidade dos contratos, pode receber mais de R$ 1 bilhão
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O honorário padrão de 20% do total a ser depositado nos cofres das prefeituras poderia garantir às bancas R$ 18 bilhões  
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Órgãos de controle, como o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União entendem que o dinheiro do Fundeb se destina exclusivamente à educação básica e não pode pagar honorários advocatícios

TRÊS ESCRITÓRIOS, 400 CIDADES

Há ainda recomendações do MPF em cinco estados — Paraíba, Pernambuco, Bahia, Sergipe e Rondônia — contra a destinação do dinheiro a honorários advocatícios. Municípios nesses estados chegaram a efetivar a contratação de escritórios. O MPF também expediu orientações com aplicação geral, a partir de iniciativas de colegiados que funcionam no âmbito da Procuradoria-Geral da República (PGR). Existem ainda posições contrárias da Advocacia Geral da União (AGU), do Ministério da Transparência e Controladoria Geral da União (CGU), de MPs e tribunais de contas locais.

Em maio, a procuradora-geral da República manifestou num parecer a mesma posição. “O MPF defende que, assim como as verbas do Fundef tinham aplicação vinculada a ações de educação, os valores agora repassados aos municípios em razão de sentença judicial devem ser igualmente utilizados exclusivamente para essa finalidade, sem a possibilidade de ser gasta parte da verba para pagamento de honorário advocatício”, escreveu Dodge no parecer.

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Nesse cenário, bancas de advocacia passaram a atuar em diferentes frentes para ver assegurada a prestação de serviços aos municípios. O GLOBO identificou que apenas três escritórios têm mais de 400 prefeituras em suas carteiras, a maioria na região Nordeste. Um único escritório, se conseguir garantir a continuidade dos contratos, pode receber mais de R$ 1 bilhão.

Uma iniciativa apontada como estratégica para a continuidade dos serviços advocatícios é um processo no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), movido pela Associação Paraibana da Advocacia Municipalista (Apam). A iniciativa visa a impedir que o MP expeça recomendações para que as prefeituras não contratem escritórios de advocacia sem licitação. O parecer de Dodge é dentro desse processo. O CNMP é presidido pela procuradora-geral da República. O conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, que ocupa o cargo por indicação do Senado, mais especificamente de Renan Calheiros (MDB-AL), deu liminar favorável aos advogados.

Em sessão no último dia 26, a maioria do CNMP derrubou a liminar em plenário. Ficaram vencidos Bandeira de Mello, relator do processo; o conselheiro Gustavo Rocha, indicado pela Câmara e integrante do primeiro escalão do governo de Michel Temer; e o conselheiro Leonardo Accioly da Silva, indicado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não houve exame do mérito, que será analisado em agosto, depois do recesso do Judiciário.

A posição de Dodge, contrária à destinação de fatia dos recursos da educação aos escritórios, está expressa no voto que ela levará a plenário em agosto. Ela decidiu “expor a gravíssima situação que consubstanciou um dos motivos determinantes para a atuação do MP da Paraíba no sentido de evitar as contratações ocorridas ao arrepio da legislação pertinente”.

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Responsável por ingressar com a ação no CNMP, o presidente da Associação Paraibana da Advocacia Municipalista, Marco Aurélio Villar, nega que o objetivo seja garantir a destinação de dinheiro do Fundeb para honorários.

— A discussão posta no conselho não teve início com o Fundeb, mas com recomendações do MP para que houvesse rescisão de contratos com escritórios. Não discutimos pagamento, só contratação. Se isso for discutido em plenário, vou suscitar questão de ordem e dizer que o pleito da Apam não diz respeito a isso.

O advogado critica a iniciativa de escritórios na busca por honorários dos caso do Fundeb:

— Eles pegaram o processo em fase final só para receber (honorários). Isso deve ser avaliado pelo Judiciário. Os municípios podem resolver essa questão do recebimento dos precatórios sozinhos.

"BRIGA LONGE DE ACABAR"

O processo no TCU que tratou da questão analisou a situação de municípios no Maranhão que contrataram escritórios para receber o dinheiro. Um único escritório, o João Azêdo e Brasileiro Sociedade de Advogados, sediado em Teresina, foi contratado por 105 municípios, como consta de relatório do tribunal. Outras cinco prefeituras contrataram mais dois escritórios. O montante envolvido é de R$ 7 bilhões. “Desse valor, R$ 1,4 bilhão seria então destinado ao pagamento dos honorários dos três escritórios contratados”, escreveram os auditores.

A iniciativa acabou barrada pelo TCU. Ao GLOBO, um dos sócios do escritório, João Ulisses Azêdo, afirma que apenas 20 dos 105 municípios chegaram a efetivar a contratação:

— A decisão de 2015 é consequência, na verdade, de 15 anos de trabalho. Posso certificar que esses R$ 90 bilhões não existem. E que esses R$ 7 bilhões do Maranhão são um número para impressionar o Judiciário. A AGU vem embargando as execuções de pagamentos, e essa briga está longe de acabar.

PGR CRITÍCIA ESCRITÓRIOS E OAB FAZ DEFESA

A procuradora da República Niedja Kaspary, que integra o grupo de trabalho de educação da Procuradoria-Geral da República (PGR) que monitora os repasses do Fundeb, não tem dúvidas: a iniciativa dos escritórios de advocacia não tem respaldo legal.

— Escritórios estão enriquecendo com dinheiro público. E eles vão até o final. É muito dinheiro, e no Brasil inteiro — diz.

Para Niedja, a atuação do Ministério Público Federal é no sentido de garantir que todo o dinheiro seja gasto exclusivamente na educação básica.

— Se o município contratar um escritório de advocacia, que pague os honorários com recursos próprios — afirma.

Em outra frente, o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, diz ao GLOBO que a instituição é “intransigente na defesa das prerrogativas e dos honorários da advocacia, tanto em causas simples como nas mais complexas”.

— É grave ofensa à advocacia e ao direito constitucional à remuneração pelo trabalho qualquer medida que vise a criminalizar o serviço efetivamente prestado por advogados que atuam, há mais de uma década, em favor de municípios em ações individuais sobre o Fundef. Graças ao trabalho desses profissionais, a população carente será beneficiada — defendeu.

Segundo Lamachia, muitos municípios optaram por contratar advogados para executar os títulos, o que demanda pagamento de honorários.

— A verba líquida que entra nos cofres dos municípios é vinculada à educação. Mas essa vinculação não atinge os honorários advocatícios e, portanto, não impede que sejam destacados nos precatórios e pagos a quem viabilizou o recebimento dos créditos — sustenta o presidente nacional da OAB.

O GLOBO tentou saber a posição do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) sobre os repasses do Fundeb aos municípios e sobre a atuação dos escritórios de advocacia. O FNDE é vinculado ao Ministério da Educação e responsável por fazer as complementações da União ao Fundeb. A reportagem enviou as perguntas à assessoria do FNDE no início da tarde da última quinta-feira, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.

Pilhagem do erário, EDITORIAL DA FOLHA

Enquanto o governo Michel Temer (MDB) chega aos estertores, deputados e senadores atacam os despojos do Orçamento.

Desprovidos de senso de responsabilidade e contando com omissão ou ajuda do Executivo, os parlamentares põem em risco a tênue recuperação da economia para prestar vassalagem a grupos de interesse e abastecer suas sinecuras.

Nos últimos dias, em meio à Copa do Mundo e às vésperas das campanhas, avançou todo tipo de projeto destinado a reduzir receitas e elevar despesas —sem que as Excelências se dignem a esclarecer como as contas deste e dos próximos anos serão fechadas.

Não se pense que grandes prioridades nacionais movem as votações. Na terça-feira (10), por exemplo, o Senado aprovou texto que restabelece benefícios fiscais para o setor de refrigerantes, ao custo de R$ 1,8 bilhão por ano.

Espantoso é que os tais benefícios foram eliminados, por decreto presidencial, para compensar parte das concessões perdulárias negociadas durante a paralisação dos caminhoneiros, em maio.

Foi também sob o impacto do movimento paredista que a Câmara aprovou um marco regulatório para o transporte rodoviário, nome pomposo para subsídios tributários de R$ 9 bilhões anuais.

A desfaçatez dos deputados atinge o ápice, porém, na manobra contra a regra que impede a nomeação de políticos e seus parentes para cargos nos conselhos de administração de empresas estatais.  

Há desatinos mais caros em tramitação, infelizmente. No caso mais absurdo, uma comissão mista do Congresso aprovou proposta que determina repasses anuais de R$ 39 bilhões da União aos estados, como contrapartida de uma desoneração de exportações promovida há mais de duas décadas.

Convém dar perspectiva às cifras. Estima-se que o Tesouro Nacional vá dispor, neste 2018, de uma receita de R$ 1,2 trilhão. Os gastos já previstos, entretanto, superam esse montante em R$ 159 bilhões —sem contar os encargos de uma divida pública em alta galopante.

Todo aumento de despesa ou perda de arrecadação, portanto, resulta em endividamento adicional ou corte de outras dotações orçamentárias. O ajuste fica ainda mais difícil se for mantida a programação de reajustes salariais a servidores. 

A pilhagem do erário em curso, por sinal, não tem merecido mais que um silêncio covarde, oportunista ou cúmplice da maioria dos ditos presidenciáveis, candidatos a gerir a ruína nos próximos anos.

Autodestruição do país continua, por VINICIUS TORRES FREIRE (na Folha)

Congresso quebra ainda mais o governo; elites e candidatos a presidente se omitem

Enquanto o Congresso acabava de quebrar mais um pedaço do governo, os candidatos a presidente da República falida discutiam alianças e negociavam minutos de TV para a campanha eleitoral.

Nesta semana, parlamentares do PSDB ao PT, passando pelos ainda mais notórios MDB, DEM e centrão, arrebentaram as contas públicasem mais dezenas de bilhões, entre outros votos infames. 

Os candidatos mais relevantes não apareceram para condenar a ruína extra, não articularam resistência ao esbulho, não se valeram da ocasião para reafirmar programas de mudança.

Nenhuma surpresa maior aí. Quase como de hábito, ainda mais em votações pré-eleitorais, não há debate nacional algum, mesmo entre as elites, dos votos dos partidos e das decisões parlamentares, seus arranjos clientelísticos em grande escala. Tratar dessa rotina destrutiva parece ingenuidade juvenil, tolinha.

Neste momento, porém, a omissão dos ditos presidenciáveis ressalta o irrealismo fantástico e suicida do que restou da conversa política sobre o que fazer dos problemas do país, a começar pelo colapso fiscal iminente (isto é, o governo não ter como pagar as contas básicas a partir de 2019).

Como os candidatos ao governo pretendem administrar a massa falida? Acreditam em mágica ou, no caso de alguns tipos, imaginam que sempre restará o que saquear?

Assim como fizera na temporada pré-férias de 2017, que deu ênfase ao perdão de dívidas de impostos de ruralistas e de tantas outras empresas, o Congresso arrebentou as contas públicas e fez favor a clientes, a casta burocrática e empresários entre eles.

Liberaram reajuste e contratação de servidores. Deram desconto de imposto para fábricas de refrigerante da Zona Franca de Manaus e perdão de dívida para micro e pequenas empresas. Anistiaram crimes e infrações do caminhonaço. Violentaram a ainda infante Lei de Responsabilidade das Estatais a fim de permitir a contratação de dirigentes partidários e seus parentes para a direção de empresas públicas.

Onde está o protesto gritante de Geraldo Alckmin (PSDB) e de Henrique Meirelles (MDB), coroinhas ou pastores do ajuste fiscal? Onde está Rodrigo Maia (DEM), candidato e presidente da Câmara, onde observa déficit e dívida públicos explodir debaixo do seu nariz? O indignado Ciro Gomes (PDT)? Marina Silva (Rede), bom dia?

A esquerda, por sua vez, está entretida em dizer disparates econômicos, pedir a bênção de Lula na cadeia e, no caso do PT, de solapar a candidatura de Ciro Gomes. Quanto ao governo de Michel Temer, está morto, embora sobrevivam as acusações de roubança, como no Ministério do Trabalho ou no INSS.

Quanto ao governo de Michel Temer, está morto, embora sobrevivam as acusações de roubança, como no Ministério do Trabalho ou no INSS.

Um grande movimento de empresários gritou “pênalti” para os pontapés parlamentares? Não. Vários deles estão no Congresso cavando boquinhas, assim como tentaram tirar casquinha do caminhonaço.

Deram então um tiro no pé e enfiaram um sorvete na testa, pois levaram um tabelamento de frete nas fuças.

O que se chama de “elite”, por falta de palavra mais adequada e publicável, se dedica à degradação do país e, no fim das contas, à autodestruição. Que outro nome dar à mazorca da Justiça, no domingo de Lula e no tumulto do Supremo, ao apoio quase geral ao caminhonaço, à depredação parlamentar do Tesouro Nacional nesta semana? (Vinicius Torres Freire // Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Novos ataques ao Tesouro, EDITORIAL DO ESTADÃO

Populismo, oportunismo e irresponsabilidade estão criando no Congresso uma herança desastrosa para o próximo governo e, pior, para os brasileiros, principalmente os mais pobres

Populismo, oportunismo e irresponsabilidade estão criando no Congresso Nacional uma herança desastrosa para o próximo governo e, pior que isso, para os brasileiros, principalmente para os mais pobres e mais vulneráveis ao desemprego e à inflação. Travas de segurança montadas pela equipe econômica foram excluídas da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) recém-aprovada no Parlamento. A vedação de reajuste salarial para os servidores em 2019 foi excluída do texto final. Ao mesmo tempo foi afrouxada a proibição de abertura de novos postos na administração federal. O Executivo ainda poderá encontrar meios de conter a gastança, quando preparar o projeto de Orçamento para apresentação ao Legislativo no fim de agosto. Mas trabalharia em condições muito melhores se as limitações incluídas na proposta inicial da LDO tivessem sido mantidas. Além disso, as pressões para uma programação financeira mais permissiva serão previsivelmente muito fortes, num ambiente dominado pela campanha eleitoral.

Os esforços para esburacar os cofres do governo central têm sido, e continuam sendo, uma das características mais notáveis da atividade legislativa, desde o segundo semestre do ano passado. O projeto de reoneração fiscal da folha de salários de cinco dezenas de setores foi deformado no Congresso, com redução significativa da receita prevista pelo governo. Projetos de refinanciamento de devedores do Fisco foram igualmente desfigurados. Benefícios do Refis foram concedidos de forma injustificável a devedores do Funrural. Empresas participantes do Simples e excluídas do refinanciamento por inadimplência foram readmitidas. Vantagens para transportadoras foram aprovadas na Câmara, numa espécie de carona na Medida Provisória (MP) sobre a criação da tabela dos fretes.

Tudo isso custará dezenas de bilhões de reais ao Tesouro Nacional nos próximos anos, num movimento exatamente oposto ao necessário num país em condições fiscais assustadoramente ruins. Mas a drenagem de recursos do Tesouro deve continuar, se isso depender da maior e mais influente coalização do Parlamento brasileiro, o grupo da gastança. Tramita na Câmara, entre outras joias do planejamento político-financeiro, um projeto de novas normas para criação de municípios. Não há cálculos oficiais de quantos poderão ser criados, mas a hipótese de 300 novos municípios tem sido indicada em Brasília.

Se isso ocorrer, o desdobramento de administrações municipais produzirá duplicação de funções, implicará a contratação de mais pessoal para postos públicos e imporá novos custos ao Tesouro Nacional. Muitas cidades, assim como boa parte dos Estados, já dependem de transferências federais para sobreviver. Diante do risco de um número maior nessas condições, membros da equipe econômica têm manifestado o temor de mais encargos para o governo central.

Enquanto políticos esburacam os cofres da União ou entram na fila, outros se esforçam para comprometer a qualidade da administração. Uma emenda ao projeto da lei geral das agências de regulação reabre a possibilidade de indicações políticas para diretorias e para os conselhos de administração de empresas estatais. A Lei 13.303, de 2016, havia limitado essa possibilidade, proibindo a nomeação de dirigentes partidários e de familiares.

A aprovação dessa lei foi um avanço no rumo da profissionalização das estatais. A emenda ao projeto de lei das agências, apresentada pelo deputado José Carlos Araújo (PR-BA), foi incorporada ao texto pelo relator Danilo Forte (PSDB-CE) e aprovada por votação simbólica. Se o texto for mantido na Câmara dos Deputados, a decisão final caberá ao Senado. Com a volta à politização das nomeações, excelentes oportunidades poderão surgir para novas Operações Lava Jato.

Todos esses fatos são péssimas notícias para qualquer candidato sério à Presidência da Republica. Para os populistas pode estar sendo preparado um banquete, alegre para alguns, caríssimo para os demais. Se a conta for tão pesada como se pode prever, sempre se poderá recorrer ao Fundo Monetário Internacional.

Lula, um preso como outro qualquer (no ESTADÃO)

Ao negar o pedido dos advogados de Lula para que ele pudesse gravar vídeos, dar entrevistas à imprensa e promover atos políticos dentro da prisão, sob a justificativa de que é pré-candidato à Presidência da República, a juíza Carolina Lebbos, da 12.ª Vara de Execuções Penais, nada mais fez do que cumprir as leis em vigor. Os argumentos apresentados pela defesa de Lula “não possuem o condão de mitigar as regras de cumprimento da pena”, disse ela em seu despacho. Como Lula cumpre pena por corrupção passiva e lavagem de dinheiro e a Lei da Ficha Limpa é clara, proibindo condenado em segunda instância de disputar eleição, a decisão da magistrada era esperada. Ela não surpreendeu nem o ex-presidente, que cumpre pena de 12 anos e um mês na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, nem a cúpula do PT.

Esse revés de Lula, contudo, não significa que ele e o PT tenham sido frustrados em suas expectativas. Ao contrário, a decisão da titular da 12.ª Vara de Execuções Penais de Curitiba lhes forneceu mais um argumento para reforçar a narrativa de que o ex-presidente é um preso político e que vem sendo perseguido por procuradores da República e juízes federais. Também deu aos seus advogados o pretexto para impetrar mais recursos nos tribunais superiores. E como esses recursos certamente pecarão por falta de substrato jurídico, a exemplo do que já ocorreu no pedido de habeas corpus apresentado por três deputados petistas no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, já que são poucas as questões de direito que restam ser discutidas, o não acolhimento de todos eles é quase certo. No fundo, é o que Lula almeja para, fazendo-se de vítima, continuar ocupando o noticiário dos jornais e televisões, até que possa lançar, na hora escolhida, um candidato de sua confiança.

Desde que se convenceram de que os advogados de Lula não têm como impedir o Tribunal Superior Eleitoral de declará-lo inelegível, essa é a estratégia das lideranças petistas: introduzir fatores de perturbação que esvaziem a campanha eleitoral e ofusquem debates responsáveis entre os demais candidatos, relegando para segundo plano os problemas institucionais que podem advir dessa atitude antidemocrática.

E assim, com o indisfarçável objetivo de deslegitimar a eleição presidencial, o PT tenta judicializar ao máximo o processo sucessório. Em outras palavras, causar os maiores problemas políticos possíveis, mediante a banalização do direito constitucional à ampla defesa e a utilização despropositada das dezenas de recursos judiciais previstos pela legislação processual cível e penal. Trata-se de expediente matreiro para tentar exaurir, desde já, a autoridade do candidato – que não será petista – que sair vitorioso nas urnas, em outubro.

Foi por esse motivo que, expressando a indignação do Poder Judiciário contra essa estratégia, a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Laurita Vaz, não mediu palavras quando negou 143 petições padronizadas de habeas corpus e protocoladas por volta do mesmo horário, ainda que com assinaturas diferentes, em favor de Lula. Sobrecarregar a já pesada rotina de trabalho dos tribunais com o objetivo de convertê-los em simples balcão de reivindicações ideológicas ou de manifestações políticas e partidárias é desprezar a missão constitucional da Justiça, disse ela. Abusar do direito de petição é afrontar o Estado de Direito, concluiu.

Os despachos da presidente do STJ e da titular da 12.ª Vara de Execuções Penais de Curitiba não se limitaram a desmontar a estratégia com base na qual o PT vem tentando desmoralizar o processo sucessório. Também ajudaram a deixar claro que Lula é apenas um preso comum, razão pela qual suas possibilidades legais de comunicação com o mundo exterior têm de sofrer, por respeito ao princípio da isonomia, as mesmas restrições aplicadas aos demais integrantes da população carcerária. É um preso como outro qualquer.

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Fonte:
Folha de S. Paulo/Estadão

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