O que o papagaio tem a dizer sobre os preços de commodities? (por Otaviano Canuto, no Poder3600

Publicado em 14/10/2018 18:35
Economia é fácil de ensinar

“É fácil ensinar economia a um papagaio. Bastam duas palavras: oferta e demanda”.

Isso constava no livro-texto de introdução à economia do prêmio Nobel de economia Paul Samuelson que serviu a várias gerações de estudantes, inclusive a minha.

Teria aquele papagaio algo a nos contar acerca do que vem se passando no caso de preços de commodities? Enquanto preços agrícolas e de metais industriais –particularmente cobre– despencaram em média acima de 10% de junho para cá, preços de energia –especialmente petróleo– acumularam alta de quase 20% desde o início do ano. O preço do barril Brent é hoje o triplo do que era no início de 2016.

Pelo lado da demanda, fatores comuns a todas as commodities podem ser destacados. Primeiro, há forte convergência em torno da opinião de que o exuberante desempenho da economia norte-americana no primeiro semestre foi extraordinário e de que o crescimento econômico global provavelmente arrefecerá no futuro próximo.

Essa semana, durante os Encontros Anuais do FMI e do Banco Mundial em Bali, o Fundo mostrou um pequeno declínio em sua projeção global para o PIB, em relação à anterior feita em abril, de 3,9% para 3,7% em 2019-2020. À medida que fecham os “hiatos do produto” (as folgas em termos de capacidade de produzir acima dos PIBs efetivos) e a política monetária é crescentemente “normalizada”nas maiores economias avançadas, suas taxas de crescimento se aproximam do ritmo potencial máximo, o qual deverá estar bem abaixo das médias exibidas antes da crise financeira global de 10 anos atrás.

Embora os emergentes asiáticos mantenham perspectivas de forte crescimento no médio prazo, a projeção do FMI para mercados emergentes e países em desenvolvimento em conjunto foi reduzida em 0,2 e 0,4 pontos percentuais, respectivamente, em 2018 e 2019.

Como razões para tal, o relatório do FMI destaca os efeitos das medidas comerciais norte-americanas implementadas desde a projeção anterior em abril desse ano, atingindo a China e indiretamente outras economias emergentes na Ásia, assim como os impactos do reestabelecimento de sanções norte-americanas sobre o Irã a partir de novembro, a turbulência econômica na Turquia desde os refluxos de capital para emergentes a partir de maio e, finalmente, perspectivas de crescimento reduzidas para as grandes economias da América Latina (Argentina, Brasil e México).

Há também preocupação quanto ao grau de desaceleração no crescimento econômico chinês até que investimentos e vendas varejistas lá se estabilizem. Do mesmo modo, é difícil estimar até que ponto a guerra comercial entre EUA e China poderá afetar negativamente o crescimento global e commodities específicas. Demandas por cobre, petróleo e milho tendem a sofrer forte impacto na hipótese de acirramento e extensão do confronto comercial.

Tais fatores vêm se traduzindo em ondas de entusiasmo e temor afetando diferenciadamente os diversos tipos de commodities, conforme vão saindo notícias mais ou menos favoráveis com respeito ao crescimento chinês e às guerras comerciais. A incerteza e a volatilidade do ânimo se manifestam nos investidores mudando de posições “compradas” para “vendidas” e vice-versa com intensidade e frequência acima do normal.

Para explicar o comportamento divergente dos preços de energia –petróleo– para cima, o papagaio manda olhar para o lado da oferta. Aqueles potenciais fatores restritivos por nós aqui apontados em junho vêm se revelando efetivos e mais influentes que a perspectiva de demanda em desaceleração. Além de continuar a retração da produção na Venezuela e de entrarem em vigor em novembro as sanções dos EUA sobre o Irã, riscos elevados de desapontamento com a produção vêm sendo apontados na Nigéria, Líbia e Iraque.

Como os estoques globais de petróleo estão curtos, a possibilidade de choques negativos adicionais de oferta deslocarem o preço do barril Brent para bem acima dos US$ 80 só poderia ser evitada mediante rápida resposta compensatória via ampliação de oferta por Arábia Saudita e Rússia ou por EUA e Canadá.

No entanto, baixos investimentos em extração no período entre a queda súbita de preços em meados de 2014 e o final de 2016, quando membros e não-membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) firmaram um novo acordo de reduzir sua produção conjunta, tornam provável a ocorrência de algum período de preços mais altos antes de alguma resposta de oferta a tais novos choques negativos. No curto prazo, aumentos rápidos de produção de petróleo de xisto nos EUA se defrontariam com gargalos de escassez de mão de obra e infraestrutura de transporte já em níveis muito elevados de ocupação.

A economia brasileira tende a ser afetada por tais tendências diferenciadas de preços de commodities conforme a composição de sua pauta de exportação e importação. A intensidade da desaceleração de investimentos e crescimento na China afetará, por exemplo, preços de minério de ferro exportados pelo país. Embora tenha ocorrido menor ritmo de expansão mundial de capacidade de oferta nos últimos tempos, estoques disponíveis continuam altos e tem-se ampliado fortemente a reutilização de sucata na China. Analistas projetam uma queda na expansão da demanda ainda mais acentuada que aquela no lado da oferta. Tendência de baixa no preço, diria o papagaio.

Já no caso de soja, tudo vai depender dos desdobramentos da guerra comercial entre EUA e China. Uma boa aposta é a de que haverá expansão na produção e nas exportações brasileiras e argentinas, por conta de mudança nas fontes de suprimento da demanda chinesa, com o resultado em termos de preços dependendo do que venha a ocorrer entre a produção dos EUA e seus clientes não-chineses. No entanto, o preço da soja caiu em mais de 14% entre fevereiro e agosto, depois das tarifas retaliatórias da China sobre a soja dos EUA, com recuperação parcial mais recentemente. Enquanto isso, o preço do trigo sofreu aumentos acima de 22% no mesmo período por causa de condições climáticas afetando a produção na Rússia e na Europa ocidental.

Os preços do petróleo e seu movimento divergente de alta afetam negativamente a economia brasileira, ao menos no curto prazo, por esta ser importadora líquida de petróleo e derivados. Combinada com a desvalorização cambial real dos últimos meses, tal alta internacional de preços constituiu choque de oferta fortemente negativo. Caso persista a mudança para cima de patamar nos preços, por outro lado, a maturação de investimentos em extração do pré-sal nos anos à frente e a consequente alteração de status de importador para exportador líquido deverão mudar os termos de tal relação entre o Brasil e o petróleo.

De qualquer modo, o papagaio torce por moderação na guerra comercial entre EUA e China, assim como por uma aterrissagem suave da economia chinesa em seu atual processo de “re-balanceamento” de seu crescimento.

*As opiniões expressas neste texto são do autor, não necessariamente do Banco Mundial. (Otaviano Canuto, 61 anos, é diretor-executivo do Banco Mundial. Foi vice-presidente do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento e diretor-executivo do FMI. Trabalhou no Ministério da Fazenda e foi professor na USP e na Unicamp).

Não deixem o Brasil quebrar, por ADRIANA FERNANDES, no ESTADÃO

Bastou menos de uma semana de campanha, no segundo turno das eleições, para ficar claro que os acenos reformistas dos dois candidatos ao Palácio do Planalto – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) – não são firmes. Ao contrário.

Quem esperava ações na direção da reforma da Previdência imediatamente após o resultado das urnas pode ir revendo o seu ponto de vista. É plausível afirmar que em alguns pontos do debate da proposta de reforma da Previdência houve até mesmo um retrocesso.

Antes das eleições no primeiro turno, o time econômico de Bolsonaro, sob a batuta de Paulo Guedes, emitia sinais de que já na transição trabalharia pela reforma, inclusive aproveitando algumas partes da proposta do governo Michel Temer. Investidores, analistas e operadores do mercado passaram a acreditar que as contas públicas estariam “salva” e a confiança retornaria.

No campo adversário, Haddad emitia sinais também de que faria uma reforma mais ampla – além daquela prevista no programa do PT, que cita mudanças no regime próprio da Previdência dos servidores públicos. Em debate, chegou a falar na fixação de uma idade mínima para o acesso à aposentadoria no País.

Só que não.

Nada disso foi reforçado nos últimos dias. Bolsonaro falou em uma reforma tocada vagarosamente. “Não é como muitos querem. Não adianta querer botar remendo novo em calça velha”, disse. Na quarta-feira, falou em “botar” uma idade de 61 anos. Na quinta, o candidato do PSL disse não ter fechado questão em torno da idade mínima. “Pode mudar. No primeiro ano, a gente pode fazer um plano 62-57 anos”, afirmou.

Haddad, por outro lado, voltou a focar na aposentadoria dos servidores, deixando claro que mudanças nas regras do INSS não estão em pauta, contrariando grupo de economistas do PT que defendem a urgência de uma reforma ampla já no início de um eventual governo.

Os dois candidatos resolveram focar em mudanças da reforma, no futuro, na direção do modelo capitalização, regime incompatível com o quadro de déficits crônico das contas públicas, pois exigiria um custo gigantesco para bancar o benefício dos que já se aposentaram ou vão se aposentar. Um custo crescente, que em 2040 chegaria a R$ 310 bilhões. Está claro que os planos para capitalização servem de subterfúgio para não fazer a reforma logo, já exigiria mais estudos.

Ainda na terça-feira, o Estadão/Broadcast alertava que as resistências à reforma seriam grandes nas duas candidaturas. Um dia depois, o ministro da Casa Civil em um eventual governo de Bolsonaro, o deputado Onyx Lorenzoni, descartou trabalhar para aprovar o texto do governo Temer e jogou para frente um possível debate sobre a ideia da capitalização para a Previdência.

O mercado reclamou do pessimismo em torno da proposta e prometeu relevar as declarações de Onyx. A resistência não durou muito. A ficha começou a cair dias depois com as próprias declarações do candidato. O mau humor se instalou.

A polarização a que chegamos já mostrou que não dá para pensar no futuro com um olhar do passado. O eleito não terá vida fácil. Os apoiadores de hoje serão os críticos de amanhã.

Não é porque o mercado financeiro apoiou o programa bolsonarista que a reforma vai sair logo. Tem de combinar com a “política”. Sempre ela.

A “renovação” do Congresso não é garantia de que as reformas vão avançar. A ordem do dia da nova legislatura deve ser dominada pelas pautas que elegeram os novos congressistas, sobretudo a segurança.

O que pode acontecer? Uma deterioração rápida da crise fiscal. Assim, a reforma da Previdência virá a fórceps, com maior custo para todos, como ocorreu em outros países.

É por isso que as novas projeções da dívida pública brasileira caminham – assustadoramente – para a marca de 100% do PIB. Já se prevê que a dívida pública poderá chegar a 98% em 2023. Detalhe: no primeiro ano do sucessor do presidente que será eleito no próximo dia 28.

Se o futuro presidente (Bolsonaro ou Haddad) não fizer um ajuste rápido, chega-se fácil aos 90% do PIB. As consequências serão ainda mais dramáticas do que as que vivemos hoje.

Aos dois candidatados, o que se pode pedir no momento é: não deixem o Brasil quebrar.

*É JORNALISTA DO BROADCAST.

Muita confusão à vista (por JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS)

No primeiro turno das eleições ocorreu a polarização que se vislumbrou, com uma avalanche de votos úteis dados a Bolsonaro. A renovação do Congresso foi inesperadamente elevada.

Que podemos esperar para este segundo turno?

O PT vai tentar migrar para o centro, operando uma transformação instantânea, que começou na vestimenta do candidato e passa pela busca de apoio de vários líderes, tarefa a ser realizada por Jaques Wagner, especialmente.

Mais que isso, parte de seu programa será apagada, o que se iniciou com a negação da necessidade de uma Constituinte. Além disso, ao invés de rejeitar a existência de qualquer problema na Previdência, temos agora uma vaga menção a alguma reforma. Mas quem vai acreditar nisso, considerando que o responsável pelo programa registrado no TSE foi o próprio Fernando Haddad?

Na essência, sua proposta é ainda uma repetição de tudo que deu errado no passado, girando em torno de uma proposta para o uso da política fiscal e creditícia (aparentemente acrescida agora pelo programa de limpeza da inadimplência de alguns milhões de eleitores, do candidato Ciro Gomes) para relançar a economia e fazer o “ajuste” via crescimento.

A chance de este plano dar certo é, a meu juízo, próxima de zero.

Além disso, o partido tem uma longa história de não cumprir acordos, dada sua vocação hegemônica.

Bolsonaro vai reafirmar seu discurso. Não precisa atrair o centro, porque isso já ocorreu com seus eleitores. Precisa apenas do simbólico apoio de alguns líderes e, mais importante, não cometer nenhum erro, que o resto cai por gravidade. Sua vitória é altamente provável.

Vai continuar escondendo seu vice-presidente e seu programa econômico, que parece carregado de contradições, como a estimativa furada do valor de privatizações, a redução da carga tributária, sem CPMF, entre outras. Além disso, manifestações do candidato falam de empresas estratégicas que não poderão ser privatizadas, como a Eletrobrás, e de uma indefinida reforma da Previdência. Está mesmo nebuloso e confuso.

Ademais, um grande problema é a inexperiência e o improviso. Nem o candidato nem o ministro forte jamais chegaram perto do executivo e não têm noção de sua complexidade e das dificuldades de mudar coisas para enfrentar a gravidade da situação, especialmente fiscal. Montar e operar equipes nessas circunstâncias será uma tarefa hercúlea. O mesmo vale para o legislativo, onde muita gente nova, cheia de votos e de amor para dar, vai querer exercer poder. Aqui também a falta de experiência será a marca.

Muita confusão à vista.

Enquanto isso, o mercado faz festa, pois não ganhando o PT tudo estará resolvido. Simples assim.

Acredite quem quiser.

* * * * * * * * *

Para quem acompanha de perto o mercado de capitais o anúncio do acordo feito, em 1.º de outubro, entre a Qualicorp e seu CEO e maior acionista foi um choque. Pelo contrato, a companhia transferiu R$ 150 milhões para que ele continuasse na empresa por mais alguns anos e que mantivesse sua posição de 15% das ações durante esse período.

O susto explica-se: transações com partes relacionadas compõe um dos itens mais delicados na questão de governança das empresas abertas, especialmente pelos impactos negativos que podem ter sobre acionistas minoritários. E o acordo acima mencionado foi elaborado sem o conhecimento destes. 

Após a forte reação do mercado (a ação caiu 30% no primeiro pregão após o anúncio), a companhia anunciou, entre outras coisas, a criação de um Comitê de Governança e uma mudança no estatuto social para tornar obrigatória a submissão de novas operações com partes relacionadas a Assembleia Geral.

Embora as mudanças sejam louváveis, dois fatos permanecem: decisões relevantes foram tomadas sem o conhecimento dos minoritários e a saída de substancial quantia para o bolso do principal gestor e acionista reduziu o valor da empresa.

Esses dois eventos são inaceitáveis do ponto de vista das boas práticas de um mercado de capitais relevante para todos e para o País.

*ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIADOS.

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Fonte:
Poder360/Estadão

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

0 comentário