"Assiste-se, nas universidades e no trabalho, ao ocaso das ideologias", Carlos Alberto Di Franco

Publicado em 23/10/2018 02:49
em O Estado de S. Paulo

Frequentemente a informação veiculada na mídia provoca um dissabor. Corrupção, violência, crise, trânsito caótico e péssima qualidade da educação e da saúde, pautas recorrentes nos cadernos de cidades, compõem um mosaico com pouca luz e muitas sombras. A sociedade desenhada no noticiário parece refém do vírus da morbidez. Crimes, aberrações e desvios de conduta desfilam na passarela da imprensa. A notícia positiva, tão verdadeira quanto a informação negativa, é uma surpresa, quase um fato inusitado.

Jornais, frequentemente dominados pelo noticiário enfadonho do País oficial e pautados pela síndrome do negativismo, não têm “olhos de ver”. Fatos que mereceriam manchetes sucumbem à força do declaratório. Reportagens brilhantes, iluminadoras de iniciativas que constroem o Brasil real, morrem na burocracia de um jornalismo que se distancia da vida e, consequentemente, dos seus leitores. O recurso ao negativismo sistemático esconde uma tentativa de ocultar algo que nos incomoda: nossa enorme incapacidade de flagrar a grandeza do cotidiano.

“Quando nada acontece”, dizia Guimarães Rosa, “há um milagre que não estamos vendo.” O jornalista de talento sabe descobrir a grande matéria que se esconde no aparente lusco-fusco do dia a dia. A mídia, argumentam os aguerridos defensores do jornalismo realidade, retrata a vida como ela é. Teria, contudo, o cotidiano do brasileiro médio nada além de tamanhas e tão frequentes manifestações de violência e de tristeza? Penso que não. 

 

A informação sobre a juventude, por exemplo, dá prioridade a um recorte da realidade, mas frequentemente sonega o outro lado, o luminoso e construtivo. O aumento dos casos de aids, da violência e a escalada das drogas castigam a juventude. A crise econômica, dramática e visível a olho nu, exacerba o clima de desesperança. 

Para muitos jovens os anos da adolescência serão os mais perigosos da vida. Desemprego, gravidez precoce, aborto, doenças sexualmente transmissíveis, aids e drogas compõem a trágica equação que ameaça destruir o sonho juvenil e escancarar as portas para uma explosão de violência.

Mas olhemos, caro leitor, o outro lado da realidade. Verdadeiro e factual, embora menos noticiado por uma mídia obcecada pela síndrome da informação sombria. 

A delinquência, na verdade, está longe de representar a maioria esmagadora da população estudantil. Denunciar o avanço da violência e a falência do Estado é um dever ético. Mas não é menos ético iluminar a cena de ações construtivas, de gestos de solidariedade, de magníficas ações de voluntariado, marca registrada de uma juventude generosa e trabalhadora que, sem alarde ou pirotecnia do marketing, colabora, e muito, na construção da cidadania.

A juventude, ao contrário do que fica pairando em algumas reportagens, não está tão à deriva assim. Há em andamento profundas e positivas mudanças comportamentais. 

O relacionamento descartável vai sendo substituído pelo sentido do compromisso. A juventude atual, não a desenhada por certa indústria cultural que vive isolada numa bolha ideológica e de costas para a realidade, manifesta uma procura de firmeza moral, de valores familiares, éticos e até mesmo religiosos. Deus, família, fidelidade, trabalho, realidades tidas como anacrônicas nas últimas décadas, são valores em alta. Não é uma opinião. É um fato. 

A família, não obstante sua crise evidente, é uma forte aspiração dos jovens. Ao contrário do que se pensa em certos ambientes politicamente corretos, os adolescentes atribuem importância decisiva ao ambiente familiar. Mesmo os jovens que convivem com a violência doméstica consideram importante a base familiar. A relação no lar é fundamental, ainda que haja conflito. Parece paradoxal, mas é assim. Eles acham melhor ter uma família danificada do que não ter ninguém. Em casa deixaram de rotular os pais de “caretas” para buscarem neles a figura do companheiro. Os jovens, em numerosas pesquisas, apontam a família tradicional como a instituição de maior ascendência em suas decisões.

Alguns, no entanto, defendem um modelo de família que não bate com esse anseio dos jovens. Respeito a divergência e convivo com o contraditório. Sem problema. Mas não duvido que é na família, na família tradicional, mais do que em qualquer outro quadro de convivência, que podem ser cultivados os valores, as virtudes e as competências que constituem o melhor fundamento da educação para a cidadania. E os jovens sabem disso.

No campo da afetividade, antes marcado pelo relacionamento descartável e pela falta de vínculos, vai-se impondo a cultura da fidelidade. O tema da sexualidade, puritanamente evitado pela geração que se formou na caricata moral dos tabus e das proibições, acabou explodindo, sem limites, na síndrome do relacionamento promíscuo e transitório. Agora, o rio está voltando ao seu leito. O frequente uso de alianças na mão direita, manifestação visível de compromisso afetivo, não é só modismo. Revela algo mais profundo. Os jovens estão apostando em relações duradouras. 

Assiste-se, na universidade e no ambiente de trabalho, ao ocaso das ideologias e ao surgimento de um forte profissionalismo. Ao contrário das utopias do passado, os jovens acreditam na excelência e no mérito como forma de fazer a verdadeira revolução. Eles defendem o pluralismo e o debate das ideias. O pensamento divergente é saudável. As pessoas querem um discurso diverso, não um local onde se pregue apenas uma corrente de pensamento. 

O mundo está mudando. Quem não perceber - na mídia e fora dela - essa virada comportamental perderá conexão com um importante segmento do mercado de consumo editorial.

*CARLOS ALBERTO DI FRANCO É JORNALISTA.

"Graças às instituições em pleno funcionamento, não haverá lugar no Brasil para radicalismos", por ALOISIO DE TOLEDO CÉSAR

Parece inacreditável que ainda exista em nosso país essa discussão inútil a respeito de esquerda ou direita, como se vê na disputa entre os candidatos presidenciais Jair Bolsonaro e Fernando Haddad. Os dois termos parecem ter-se originado durante a Primeira República Francesa, quando, no verão de 1789, a Assembleia Nacional se reuniu em Paris e dela participaram conservadores, opostos a qualquer mudança e a qualquer diminuição dos privilégios da nobreza; liberais, favoráveis a um governo representativo; e radicais, que preconizavam igualdade e liberdade.

O anfiteatro tinha a forma de ferradura, não por refletir a burrice de alguns, mas porque acomodaria melhor os conservadores, à direita do presidente, os radicais à esquerda e os liberais ao centro. Naquele momento mágico da Revolução Francesa, que influiu de forma perene no mundo ocidental, ganhou expressão a malcheirosa palavra ideologia, com a divisão entre nós e eles, esquerda e direita.

Hoje os direitistas proclamam, talvez com alguma razão, que nunca se viu um governo de esquerda dar certo, prosperar e melhorar economicamente a vida das pessoas, “porque a esquerda não sabe governar”. E argumentam que a própria China só deu certo e cresceu a partir do momento em que volveu à direita e adotou a economia de mercado, passando a pagar melhor ao funcionário que produzisse mais.

Já os esquerdistas parecem ter ficado escravos da pregação marxista, que chegou a convencer e a empolgar milhões de pessoas. Marx, aquele filósofo sonhador, fora seriamente contaminado pelas ideias de Engels, para quem o Estado tenderia a desaparecer e acabaria colocado num museu de antiguidades, ao lado da roda de fiar e do machado de bronze.

Marx sonhava e pregava que a violência na sociedade capitalista nasce da privação econômica e que, dando ao homem alimentos, roupas e abrigo suficientes, a necessidade de recorrer à força declinaria. Quando a sociedade sem classes tiver sido atingida, dizia aquele admirável sonhador, desapareceriam não apenas as diferenças de classe, mas também as diferenças nacionais. E finalmente o próprio Estado deixaria de existir. Assim como o capitalismo, as divergências criadas pela burguesia também desapareceriam, e todos os homens passariam a viver como irmãos.

Esses argumentos foram bastante sedutores, a ponto de no princípio do século passado convencerem milhões de pessoas, em quase todos os países, principalmente a elite intelectual. Entre nós, essa embriaguez política ganhou feição própria e em determinado momento, com a renúncia de Jânio Quadros, levou à luta a classe trabalhadora, menos privilegiada. Operários e soldados, cabos e sargentos, passaram a exigir reformas de base, defendidas pelo presidente João Goulart e Leonel Brizola, com o erro grave (e fatal) de pregar até mesmo o desrespeito à disciplina nas Forças Armadas.

Realmente, de forma ostensiva e desafiadora cabos e sargentos passaram a divergir publicamente de seus oficiais e isso difundiu o medo de que o País mergulhasse de cabeça numa ditadura de esquerda. As forças conservadoras, chamadas de “direita”, despertaram bem assustadas e começaram a sugerir, quase como exigência, a intervenção das Forças Armadas, o que acabou sendo feito sem nenhuma delicadeza (ao contrário, havia tanques e canhões nas ruas).

Daí vieram dias sombrios, às vezes chamados de tempos de chumbo, com atos terroristas de jovens inconformados, estimulados por políticos, e repressão nada piedosa das forças militares que dirigiam o País. Após alguns anos de turbulência, militares de feição liberal passaram a discutir uma forma de devolver o poder aos civis, mas, naquela altura, jovens inconformados e de índole violenta cometeram o equívoco de jogar uma bomba no quartel do II Exército, em São Paulo, fazendo em pedaços um recruta de 18 anos que no momento estava de sentinela. O soldado se chamava Mário Kozel Filho, católico praticante, que talvez nem soubesse o que vinha a ser esquerda e direita, muito menos reformas de base.

O incidente levou a cúpula militar a concluir que seria desastroso devolver o País “a esses loucos” e por isso o domínio das Forças Armadas permaneceu ainda por vários anos. Agora, com o aparecimento político de Jair Bolsonaro, disputando a Presidência da República, todo esse passado de confronto entre civis e militares passou a ser relembrado, como se isso representasse “a direita” ou “o fascismo”.

Sempre houve um parentesco bem próximo entre as doutrinas totalitárias, ou seja, comunismo, fascismo e nazismo se amoldam bem no mesmo rótulo. Nessas doutrinas, o domínio da maioria por uma elite minoritária parece inconcebível, mas tem-se verificado repetidamente.

Na pirâmide social, torna-se absurdo que uma minoria permaneça no topo e a maioria resulte esmagada na base, muito mais ampla. Nossos vizinhos venezuelanos, por exemplo, estão feridos na base, enquanto a minoria totalitária de Nicolás Maduro parece governar com ódio do povo e, a exemplo do que ocorre em Cuba, subjuga e deixa anestesiada a maioria, que o detesta.

Graças às instituições em pleno funcionamento, com imprensa livre e independente, não haverá lugar em nosso país para radicalismos de esquerda ou de direita, nem para que o Brasil se transforme numa Venezuela. A nossa vocação e a nossa predestinação são para uma República de verdade, com liberdade de expressão e respeito aos contrários.

Ademais, ainda que os nossos governantes não tenham demonstrado a eficiência necessária para melhorar a qualidade de vida dos mais pobres, forçoso é concluir que a vontade da maioria tem prevalecido e as escolhas têm sido realizadas com liberdade.

*DESEMBARGADOR APOSENTADO DO TJSP, ALOÍSIO DE TOLEDO CÉSAR FOI SECRETÁRIO DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SP.

O esquerdismo como refúgio dos perdedores, por RODRIGO CONSTANTINO

No meu artigo sobre o filme “Venom”, da Marvel, constatei que muitas vezes o esquerdismo é uma espécie de válvula de escape para todo tipo de perdedor, para aquele que não conseguiu, de alguma forma, controlar seus instintos tribais, construir uma vida saudável e feliz, manter uma família decente e um bom emprego. Pretendo agora desenvolver um pouco mais o raciocínio com alguns exemplos.

Imagine o típico esquerdista romântico, metido a intelectual culto, refinado, quase um “gentleman”. Com tal postura, ele se sente superior a muita gente, aos “broncos endinheirados”, que tiveram sucesso profissional, mas não demonstram a mesma cultura. No fundo, um traço do ressentimento que assola esse tipo de gente. O “intelectual” é um prato cheio para esquerdistas: é uma forma de ele aplacar sua angústia diante dos ricos.

Conheço uns tipos assim, fracassados profissionalmente, que despejam seu rancor no “mercado”, preferindo alimentar uma narrativa de que o mundo é injusto, que o “sistema” não é exatamente meritocrático, em vez de procurar entender onde foi que errou e como poderia se reerguer. Lá está o esquerdismo como fuga para seus próprios fracassos.

E é ainda pior quando esses fracassos não são apenas financeiros. Quando o casamento é um engodo, um poço de infelicidade e lamentações, e só não terminou por falta de coragem de um dos dois, qualquer vestígio de felicidade genuína em outro casal desperta revolta interior. O marido que trai e perdeu o respeito pela esposa, a esposa infeliz que se sente aprisionada numa masmorra, essas coisas podem produzir um sentimento de inveja, que transborda para um esquerdismo feminista que passa a detonar a própria instituição da família e do casamento.

Quando os filhos dão errado, eis outro fator que costuma levar muita gente ao esquerdismo. Filhos perdidos, drogados, sem estrutura familiar, sem valores morais decentes, enquanto os filhos dos vizinhos se mostram centrados, trabalhadores, corretos e com uma vida digna, normal: os pais dos primeiros deixam a fúria cozinhar um sentimento de revolta contra a vida, e lá está a necessidade de fuga, seja pelo niilismo, seja pelo relativismo: ninguém é melhor do que ninguém!

Para educar direito os filhos, é preciso agir como um verdadeiro pai, firme, resoluto, com a energia necessária para efetivamente impor limites. Mas o pai que quer “ser amado” acima de tudo costuma sempre passar panos quentes nos problemas, enxergar a realidade de forma distorcida, dourar a pílula. Aí, quando os filhos saem dos trilhos e se perdem na vida, resta bancar a vítima, acusar a vida de injusta e acreditar que tudo foi mero acaso, eximindo-se de qualquer responsabilidade pelo fracasso da prole.

O raio, quando cai várias vezes no mesmo lugar, foi por acaso? O esquerdista escolhe acreditar que sim. Ele encara seu fracasso profissional ou familiar como fruto do azar. Ele não seria um esquerdista se não pensasse assim. Coloca-se como vítima, nunca como agente responsável. Adora Rousseau, isso sim, não por acaso: o filósofo da vaidade, que amava a Humanidade como abstração, abandonou todos os filhos e depois foi ensinar ao mundo como educar crianças.

Um conservador prioriza a família, o entorno, o casamento e os filhos. Sabe que a melhor contribuição que pode dar ao mundo é formar bons filhos, independentes e responsáveis, com freios e limites, civilizados. Um esquerdista romântico flerta com teses abstratas, fala muito em “justiça social”, e prefere bancar a vítima enquanto sua própria família desmorona ao seu lado. Um esquerdista desses jamais vai compreender essa mensagem de Jonah Goldberg em The Suicide of the West:

Famílias saudáveis ​​e que funcionam bem são a fonte primária do sucesso social. Famílias pouco saudáveis ​​e disfuncionais são a principal causa do declínio da sociedade. A família é a instituição que nos converte dos bárbaros naturais em, com esperança, cidadãos decentes. É a família que literalmente nos civiliza. Antes de nascermos em uma comunidade, uma fé, uma classe ou uma nação, nascemos em uma família, e como essa família nos forma determina em grande parte quem somos.

O esquerdista prefere salvar sua vaidade a salvar a própria família. E depois fica repetindo como o mundo é injusto e como precisamos do estado para cuidar dos que ficaram para trás, enquanto destila veneno contra os bem-sucedidos, tanto financeiramente como do ponto de vista familiar. O esquerdismo é o refúgio de todo perdedor, incapaz de olhar no espelho para encontrar o verdadeiro culpado por sua desgraça auto-infligida. É a capela dos losers!

Rodrigo Constantino

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Fonte:
Estadão/Gazeta do Povo

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