Brasil gira em falso sobre uso de sanções

Publicado em 17/03/2010 08:51
O Brasil está longe do consenso na decisão final sobre a retaliação aos EUA por conta dos subsídios que o país paga a seus produtores de algodão. A desarmonia é mais evidente no que se refere à propriedade intelectual, quando o ineditismo da medida atravanca o caminho da promessa à prática.

Apesar da publicação das duas listas de alvos possíveis das sanções, a cacofonia de pedidos e resistências internas que marcou a elaboração de ambas volta a aparecer na discussão sobre sua aplicação.

Há divergências entre o Itamaraty e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior sobre como aplicar as sanções, se de fato elas devem ser a plena força e sobre como dividir custos e benefícios da decisão -tanto os políticos como os econômicos.

Crescem também as dissonâncias entre setores envolvidos na retaliação, sobretudo os agrícolas e o farmacêutico.

Ao quadro se soma a percepção, do lado brasileiro, de que os EUA tentam minar a discussão por dentro, fazendo ofertas de vantagens e/ou pressões pontuais por setor, na expectativa de que eles passem a pressionar contra as sanções .

Após sete anos, a Organização Mundial do Comércio deu ao Brasil em setembro o direito de aplicar sanções contra os EUA em duas frentes. A primeira é a dos bens. A segunda, inédita, é a retaliação cruzada, que permite medidas em outro setor que não o que originou a disputa. O país escolheu o mais sensível deles para os americanos: propriedade intelectual.

O problema é que nem o Brasil nem seu antagonista sabem como lidar com essa nova carta. Os EUA, por ora, pagam para ver se é blefe. E o Brasil, mesmo tendo um trunfo, pode acabar o jogo com o morto na mão.

Existe consenso razoável de que a retaliação em bens, calculada em US$ 591 milhões para os próximos 12 meses, será efetivada. A dúvida paira sobre a retaliação cruzada, que soma US$ 238 milhões.

Aí, à primeira vista, os focos são direitos de autor sobre produtos audiovisuais (filmes, essencialmente) e em patentes de medicamentos. Ambos deixariam de ser pagos no período de aplicação das sanções.

Mas se há um ponto de convergência entre os brasileiros é que os americanos só ouvem a palavra "genéricos". A ameaça à bilheteria de produções hollywoodianas não recebeu mais do que muxoxos dos EUA e o eco de que querem negociar. Na frente interna, foi vista como impopular (o país afinal abraçou a bandeira do combate à pirataria) e pouco eficaz.

Já o foco nas farmacêuticas, o trunfo, esbarra no custo. As sanções são por período limitado, e quebrar a patente de um genérico para produzi-lo no país por um ou dois anos somente não seduz a indústria.

A saída seria a importação de um determinado medicamento genérico de outro país que já quebrou a patente -a Índia, por exemplo. Ainda assim, discute-se se inserir um terceiro governo na história não abriria um flanco para questionamentos dos EUA na própria OMC.

Do lado brasileiro, há quem ache que a mera possibilidade é suficiente para pressionar os americanos. Há quem acredite, contudo, que Washington só levará Brasília a sério se a ameaça virar fato. E há ainda os que apostam que o governo Obama preferirá pagar a conta, para não empenhar seu caro capital político ao mexer com um programa de subsídios -e um lobby agrícola- enraizado no Congresso norte-americano.

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Fonte:
Folha de São Paulo

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