Saldo comercial com commodities esconde rombo na indústria

Publicado em 02/05/2010 20:54
Segmento de média e alta tecnologia tem déficit de 13,6 bilhões de janeiro a março
O saldo da balança comercial está no azul, mas esconde um "rombo" nas trocas da indústria brasileira com o exterior. Só nos primeiros três meses deste ano, os fabricantes de produtos mais sofisticados – como eletrônicos, remédios, químicos, carros ou máquinas – amargaram um déficit recorde de US$ 13,6 bilhões.

O déficit é 42% mais alto que o do primeiro trimestre de 2009, revela o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O valor supera os US$ 12,7 bilhões de todo o ano de 2006, apenas quatro anos atrás. A conta não inclui itens que passam por poucos processos industriais, como alimentos, combustíveis ou celulose.

Influenciados pelas commodities, os produtos acima reduzem quase pela metade o déficit total da indústria. Ainda assim, o saldo negativo chegou a US$ 7,1 bilhão no primeiro trimestre, acima dos US$ 2,7 bilhões de igual período em 2009.

"A indústria brasileira está perdendo espaço no mundo", disse o economista do Iedi, Rogério Cesar Souza. Para o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o déficit é resultado de fatores conjunturais (crescimento e real forte) e estruturais. "O investimento em tecnologia é baixo."

Com uma alta de até 7% prevista para o Produto Interno Bruto (PIB) este ano, o Brasil está ávido por importados, que ficaram mais baratos graças ao real forte. As famílias brasileiras consomem mais carros, eletrônicos e cosméticos. Boa parte desses produtos é feita no País, mas precisa de insumos importados.

Explosão. Dados do Ministério do Desenvolvimento apontam uma explosão nas importações das grandes empresas. No primeiro trimestre, as compras externas cresceram 82% na LG, 70% na Dell, 111% na Roche e 80% na Caterpillar. Nas montadoras, a alta chega a 43% na Fiat, 56% na Volks, 49% na Ford, 128% na Peugeot e 252% na Renault.

As importações da Philips aumentaram 436% no primeiro trimestre em relação a igual período de 2009. O diretor industrial para América Latina, Julio Pacini, atribui a alta ao mercado aquecido por causa da Copa do Mundo e às mudanças de tecnologia.

As TVs com telas de cristal líquido (LCD) estão substituindo os aparelhos com tubo. O problema é que o tubo é feito no País, enquanto as LCDs são importadas. A Philips é a primeira a montar TVs de LCD no Brasil, o que permite usar plástico, metais, placas e embalagens nacionais. Mas não resolve a questão, porque as telas respondem pela maior parte do valor do produto.

As importações da Samsung subiram 111% no primeiro trimestre. Segundo o vice-presidente da Samsung, Benjamin Sicsú, a empresa ganhou participação em celulares, começou a vender máquinas fotográficas, desativou a fábrica de tubos televisivos e está importando LCDs.

Troca de fornecedores. O coordenador do grupo de indústria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), David Kupfer, avalia que as empresas estão substituindo insumos nacionais por importados para aproveitar o câmbio valorizado. "A indústria desenvolveu uma grande flexibilidade de fornecimento. Quando compensa, importa."

Outro fator que piora o déficit da indústria é o desejo das pessoas por produtos importados – um sonho que se torna mais palpável com o aumento da renda e do crédito. As importações da Caoa, que traz para o País os carros da Hyundai, cresceram 137% no primeiro trimestre.

Segundo a assessoria de imprensa da Mercedes-Benz, as vendas de carros importados com preço médio de R$ 400 mil cresceram muito. A empresa vendeu 80% mais caminhões e ônibus, que são feitos no País, mas utilizam peças importadas. As importações da Mercedes avançaram 69% no trimestre.

Para o chefe do departamento de pesquisa econômica do BNDES, Fernando Puga, há um forte ciclo de investimentos em curso, o que é um sinal positivo da indústria, apesar do déficit na balança. "Quem está em má situação financeira, não compra uma casa", compara. Ele avalia que esses investimentos vão gerar uma maior oferta de produtos e ajudar a "conter as importações".

O déficit da indústria de alta e média tecnologia vem crescendo consistentemente. Saiu de US$ 15,2 bilhões em 2000 para US$ 51,9 bilhões em 2008 e US$ 44,8 bilhões em 2009 – um pequeno recuo por causa da crise. 

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Fonte:
O Estado de S. Paulo

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