Alta do dólar faz preço da soja disparar no Brasil, mas trava as vendas

Publicado em 23/09/2015 16:02

A disparada do dólar frente ao real e o momento de elevada especulação, principalmente sobre a cena política e econômica do país, travaram as vendas de soja no Brasil. Apesar de preços recordes, se aproximando dos R$ 90,00 por saca para o produto disponível nos portos, os negócios pararam quando o produtor passou a enxergar a soja como um atrativo e importante ativo financeiro, apostando em valores ainda mais altos estimulados pelo contínuo avanço esperado também para a moeda norte-americana. Para a oleaginosa da nova temporada, o cenário é semelhante, ainda mais que já cerca de 30% da safra 2015/16 já comercializada. 

Veja como fecharam os mercado internacional e interno na sessão desta quarta:

>> Soja fecha com leve alta na Bolsa de Chicago e melhores preços do ano no mercado brasileiro nesta 4ª

Nesta quarta-feira (23), o dólar renovou sua máxima histórica e bateu em R$ 4,14 e as notícias negativas que poderiam elevar ainda mais esse patamar continuam chegando. O foco dos investidores segue sobre o desalinho entre Presidência da República e equipe e o Congresso Nacional. Os atritos e divergências políticas ainda superam as tentativas de encontrar medidas efetivas para tirar a economia nacional da atual situação de emergência e têm cada vez menos credibilidade entre os investidores. Assim, uma depreciação ainda maior do real, portanto, parece ser inevitável. 

"A cada dia que passa, o mercado vê com mais desconfiança nosso país, e essa desconfiança deve afetar nosso grau de investimento, o que deve fazer o dólar avançar ainda mais. Um governo sem credibilidade não pode tirar o Brasil desta situação, é necessário e fundamental uma mudança urgente antes que as coisas piorem ainda mais", diz o consultor de mercado Márcio Genciano, da MGS Rural. 

A maior parte da safra 2014/15 já foi comercializada e a opção do produtor brasileiro, que está bem capitalizado nesse momento, opta por utilizar o restante de oferta - pouco menos de 10% - que ainda possui para especular no mercado frente à essa perspectiva de um dólar ainda mais alto. Da safra 2015/16, aproximadamente 30% do total esperado para ser colhido já foram vendidos e agora o foco do sojicultor está em alinhar os seus custos de produção e garantir um bom plantio. Afinal, uma produtividade alta também será um diferencial nesta temporada. 

Para Genciano, a postura do produtor é correta para o momento. "Com a perspectiva que ainda temos sobre o dólar não é recomendável a venda. Podemos ter preços ainda melhores. A orientação para os produtores é que, daqui para frente, será pura especulação, e por isso ele deve estar preparado para para perder R$ 1,00 ou ganhar R$ 1,00", diz. 

Já há executivos do mercado financeiro afirmando que a divisa poderia chegar a R$ 5,00 caso nada seja feito. Entre os fatores que poderiam viabiilzar este cenário estão a perspectiva de que as agências de risco Fitch e Moody's possam rebaixar o grau de investimento do Brasil e a não aprovação pelo Congresso Nacional da volta da CPMF proposta pelo governo federal. 

Diante desse momento marcado por incertezas e hipóteses, as mesas de câmbio trabalham com dólar a R$ 6,00 em negócios de hedge para julho/2016. Assim, a empresa que buscar uma proteção cambial para julho do próximo ano terá que trabalhar com uma taxa próxima desse valor mais um spread cobrado pelo banco. A análise é do consultor de mercado Carlos Cogo. Ainda segundo o consultor explica em nota, esse cálculo leva em conta "a curva de juros futuros, os preços do FRA de cupom (tipo de derivativo cambial) e o dólar para outubro (o mais líquido)". 

E é este cenário que travou as vendas de soja no Brasil, mesmo com um mercado que ainda conta com a marcante presença dos compradores - que mantém sua demanda bastante aquecida, como relatou o consultor de mercado Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting. "O mercado é extremamente comprador, mas os vendedores sumiram. Ninguém está entregando a pouca oferta disponível que ainda possui, os produtores estão apostando na soja como um ativo financeiro", diz.

E o impacto do dólar não se limita apenas à formação dos preços da soja para exportação. As cotações praticadas no mercado interno brasileiro também são atrativas e contam ainda com uma ajuda da demanda interna aquecida - típico desse momento do ano quando há uma demanda pelo grão - e também poderiam trazer preços bons para o produtor brasileiro, como alertam os produtores. Em boa parte das praças de comercialização, os valores passam dos R$ 70,00 e, descontando os custos de frete para os portos, liquidam melhor do que na exportação, ainda como explicam os analistas.

Outro lado

Em meio à euforia combinada com a incerteza no mercado da soja, o economista chefe da Farsul (Federação de Agricultura dos Rio Grande do Sul), Antônio da Luz,  afirma que o produtor tem que estar preparado e com seu planejamento pronto ao contar com uma variável tão volátil - e sobre a qual não se tem controle -  como a taxa cambial na formação do preço da soja que ainda tem a comercializar. "Se nossas incertezas se dão sobre a continuidade continuidade do mandato da presidente da República, imagina as outras incertezas que temos a respeito da nossa economia", diz. 

O economista afirma ainda que, apesar do patamar elevado do dólar, os preços se mantêm pressionados na Bolsa de Chicago, o que torna a sensibilidade do mercado brasileiro ainda maior. "Temos que ter consciência que esse preço que estamos recebendo não é um preço que reflete a soja e sim o câmbio, e o câmbio está em um ambiente político e institucional que nenhum brasileiro pode dizer o que vai acontecer até abril do ano que vem, quando estivermos colhendo", diz. 

Assim, Luz volta a reiterar que o momento é de alerta. "O custo da soja variou da safra 2014/15 para 2015/16 19%, isto está consolidado e não tem mais volta. Agora, o preço da soja que já passou dos R$ 80,00 no porto do Rio Grande do Sul, este tem volta, e depende da taxa de câmbio", lembra. 

No link abaixo, veja a íntegra da entrevista de Antônio da Luz ao Notícias Agrícolas

>> Preço da soja em dólar recua 26% em um ano e Farsul alerta para os cuidados com a negociação da próxima safra

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Por: Carla Mendes
Fonte: Notícias Agrícolas

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