Brasil é o país de maior interesse da China; câmbio é o desafio

Publicado em 09/01/2017 08:22
Potencial de importação de commodities da Ásia vai muito além da China. Novos desafios incluem olhar para demais países da região, como os demais países do Sudeste asiático, além de um trabalho de imagem do Brasil para os compradores. Produtor brasileiro está no centro da competitividade e cadeias têm de organizar para incrementar suas exportações. Relações políticas e financeiras entre China, EUA e Brasil devem se intensificar cada vez mais. Atenção ao efeito Trump.
Confira a entrevista de Marcos Jank - Especialista em Agronegócio

A Ásia representa quase metade das exportações do Brasil - sendo que 25% são destinadas para a China. O especialista em agronegócio Marcos Jank está há dois anos no continente para acompanhar os novos negócios juntamente à BRF, observando os desafios de acesso do mercado e os muitos países que ainda são fechados para o produto brasileiro.

Ele acredita que, para todo o setor do agronegócio, nove entre dez produtos têm na Ásia um interesse em potencial. Quanto às commodities básicas, a Ásia não impõe barreiras, mas outros produtos, como a carne, ainda encontram as barreiras de países como a Indonésia e a Índia. Outro desafio também é a realização de um trabalho de imagem por parte do Brasil.

Jank aponta que é um erro pensar que a Ásia se resume à China. A China tem uma grande população agrícola, o que a torna ainda muito fechada para alguns produtos. "Temos que olhar outros países na região. A Índia é a China do futuro, há muitas oportunidades nos próximos anos", diz Jank.

Para ele, as relações com a China também têm que ser organizadas. A soja entra facilmente, o que causou uma revolução no Centro Oeste brasileiro, mas as exportações deveriam ser diversificadas e agregar valor. Uma relação mais equilibrada com a China também faria com que essas exportações beneficiassem a todos.

"O Brasil tem que se preparar para entender a Ásia", atesta Jank. Ele diz que as entidades do agronegócio têm que estar presentes no continente. Mercados como os Estados Unidos, a Austrália, a Nova Zelândia, a União Europeia e o Chile já atuam na Ásia com presença institucional e o Brasil, basicamente, vende commodities. "Tem que estar presente e participar do processo de formação de políticas públicas".

O ano de 2017, na opinião do especialista, será um ano difícil, com a desglobalização do mundo puxada pelo Brexit e pela eleição de Donald Trump. "Mas estamos vendendo commodities e o mundo em desenvolvimento precisa disso. Temos que olhar para fora e desenvolver melhores relacionamentos. É preciso ir mais longe e estar presente em países que representam o futuro", aconselha. Ele acredita que a desglobalização "não é boa para ninguém", relembrando os anos 30, mas que, "dentro dessa conjuntura, tem que ver quais são nossas oportunidades para estar crescendo. Nos últimos 15 anos a gente não fez acordo com ninguém, agora tem chance de desenvolver acordos bilaterais com outros países".

Ele também diz que os produtores brasileiros e, principalmente, as cadeias produtivas como um todo, tem que ganhar produtividade, adicionar valor aos produtos e aumentar sua presença física nos países de destino, se internacionalizando mais. A política interna, para ele, deve acompanhar negativamente a economia, juntamente com os cenários dos Estados Unidos e da União Europeia, "por isso tem que olhar para outras geografias", conclui.

Interesses chineses no Brasil, por Marcos Jank

Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio

A China sabe o que quer do Brasil. E nós, o que queremos dela?

Num mundo em desglobalização, precisamos saber quais são os interesses de nossos grandes parceiros, com quem e como vamos jogar.

Nesse contexto, a China é hoje o país com maior dependência e vontade de incrementar as relações com o Brasil. Para entender os seus mais recentes movimentos no país, vale ler o relatório "Investimentos Chineses no Brasil 2014-2015", publicado em novembro pelo Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC).

A internacionalização das empresas chinesas é evidente, com vultosas aquisições nos setores de tecnologia, energia, agronegócio, financeiro, imobiliário, automotivo, eletrônico e de entretenimento. China e Hong Kong já investem globalmente mais de US$ 250 bilhões por ano, ou cerca de 20% do total mundial.

No caso do Brasil, o interesse estratégico chinês de longo prazo concentra-se basicamente em três áreas: energia, agronegócio e infraestrutura. No início, a China tentou investir direto em recursos naturais –terras agrícolas e minérios–, mas a estratégia não deu certo em razão das crescentes restrições impostas pelo governo brasileiro.

Mas em 2014 começa uma nova fase, na qual a China passa a se interessar não mais pela produção primária, mas pelo controle das cadeias de suprimento das principais commodities que ela demanda, a chamada "originação". Na área de genética vegetal e defensivos, a ChemChina adquire a gigante suíça Syngenta, com grande presença no Brasil. Na área de grãos, açúcar e terminais portuários, a estatal COFCO compra a Nidera e a Noble Agri. Recentemente, o grupo privado Shanghai Pengxin adquire a Fiagril, empresa mato-grossense de insumos, grãos e logística.

Recentemente, surgem oportunidades para adquirir empresas-chave em setores afetados pela crise econômica e/ou por políticas regulatórias equivocadas. O caso mais notório é o da geração e transmissão de energia elétrica, com a aquisição da Cesp, de Furnas, da Eletronorte e da Duke Energy pelas estatais chinesas State Grid e China Three Gorges (CTG).

Não resta dúvida de que a Operação Lava Jato vai gerar grandes oportunidades para os chineses adquirirem empresas de construção civil e infraestrutura no Brasil.

São imensos os interesses chineses no Brasil, e hoje há muitas oportunidades para parcerias e aquisições. Mas erra quem pensa que esses interesses são comandados por uma estrutura hierárquica única e uniforme.

No excelente livro "The Political Economy of China-Latin America Relations in The New Millenium", recém-lançado nos Estados Unidos, Margaret Myers e Carol Wise utilizam a teoria agente-principal para explicar o funcionamento do modelo de investimento. A China tem um único ator, que são os princípios e objetivos definidos pelo Partido e pelo governo. Mas a execução das diretrizes fica a cargo de múltiplos agentes –as companhias chinesas estatais e privadas–, que atuam com diferentes motivações e interesses, de forma competitiva e descoordenada. A isso se somam as imensas diferenças linguísticas, culturais e de identidade entre a China e a América Latina.

A expressão "negócio da China" tem sido usada sempre que alguém obtém grande vantagem em um acordo. O termo remonta aos lucros fabulosos que os comerciantes europeus obtinham com a venda de especiarias chinesas há mais de cinco séculos. Mas hoje a situação se inverteu e é o mundo que está oferecendo grandes "negócios para a China".

Em suma, a China sabe o que quer do Brasil, agora e daqui a 50 anos. E nós, o que queremos dela? Vamos reduzir o nosso imediatismo doentio e olhar o longo prazo? Vamos nos organizar direito, com o governo e o setor privado refletindo e atuando em conjunto? (por MARCOS jANK)

Por: João Batista Olivi e Izadora Pimenta
Fonte: Notícias Agrícolas

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