Rugas do Tempo, por Osvaldo Piccinin

Publicado em 11/09/2014 10:52
Osvaldo Piccinin, engenheiro agrônomo, formado pela USP-Esalq, em 1973. Natural de Ibaté, é empresário e agricultor e mora em Campo Grande/MS.

Gosto de apreciar o entardecer, assim como permanecer horas a fio vendo a chuva cair. Não me incomoda o zunido do vento forte na minha janela. “Para mim o vento que assovia é cantina de ninar”!  Também aprecio muito ver o raiar do dia, principalmente, quando estou no Pantanal, nagevando nas águas turvas do Rio Paraguai.  

Nestas horas não tenho dúvida da existência de Deus.  Sinto sua onipotência em cada movimento da natureza. Até mesmo quando ela se apresenta de forma devastadora. “Tudo está no seu lugar - graças a Deus”!

Tive muita pressa de fazer dez anos, quinze, dezoito, vinte e outros mais. Hoje, se eu pudesse, seguraria os ponteiros do relógio para retardar sua toada.

O tempo nasceu para passar e cumpre religiosamente sua missão. “É como amar uma estrela que foge ao romper da aurora”! Ele simplesmente passa!

Algum sábio, provavelmente dois deles, um ansioso e o outro, quiçá, vaidoso, inventaram respectivamente, o relógio e o espelho. Estes dois utensílios fazem parte de nosso cotidiano e nos perseguem por toda vida. Somos seus reféns. A rotina diária é sempre a mesma. Acordamos, conferimos a hora, a nossa aparência e vamos à luta. 

Checamos se apareceu mais uma nova ruga no velho rosto, mais um cabelo branco entre tantos. No início até nos damos ao luxo de arrancá-los, mas logo em seguida aparecem tantos e tantos, que desistimos. Só a pintura dará jeito!

É imperceptível no nosso dia a dia, só nos damos conta que o tempo passou quando olhamos para as fotos antigas, para nossos filhos e netos ou para parentes e amigos em ocasiões especiais. Gozado que sempre achamos que os outros envelheceram, não nós.

Cismamos da mão que minha velha mãe gostaria de ganhar de presente uma plástica de rejuvenescimento. Seu rostinho miúdo e enrugadinho aos oitenta e cinco anos, não deixa nenhuma dúvida que o tempo deixou suas marcas. 

Claro que ela se negou a aceitar nosso presente nos dizendo com convicção, não se importar com suas rugas.  Elas são testemunhas, de uma vida, de dedicação à família. Cada vinco de sua face, carrega um pedacinho de sua história que, como filhos, nos enchem de orgulho. 

Quando a questionei o porquê dela não aceitar, tive uma resposta simples, mas sábia e verdadeira. Disse-me: - é bobagem tirar as rugas, porque por dentro vou continuar parecendo eu mesma, não tem como mudar! “Na realidade o tempo não lhe sossega por dentro, da mesma forma que lhe desgasta por fora”!

Ela está certa, afinal cada ruga de seu rosto é um tijolinho que ajudou construir sua longa e bonita história de vida, por vezes - muito sofrida. Com rugas ou sem rugas o mais importante é a certeza do nosso dever cumprido. 

Sinto inveja daquelas pessoas que chegam aos oitenta anos com saúde e lucidez. Principalmente, quando criaram e deram uma boa educação aos filhos e deixaram um legado de bons de exemplos. Se ainda conheceram todos os netos e não presenciaram nenhum falecimento de entes queridos, aí, sim, é uma dádiva!

Se eu tiver a graça de ser um desses, premiados, octogenários - arrumarei minha malinha discretamente e aguardarei o “homem” me chamar, pois creio que nossa cortina se abrirá numa outra dimensão, no cenário na eternidade.

“Afinal não conheço ninguém que ficou para semente. O tempo é o bem mais precioso que existe. Podemos ganhar mais dinheiro, mas nunca mais tempo”. Ele simplesmente passa!

E VIVA AS RUGAS DO TEMPO!

osvaldo.piccinin@agroamazonia.com.br

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Fonte: Osvaldo Piccinin

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