No Estadão: Distrital é voto direto para vereadores e deputados

Publicado em 18/07/2013 08:53
Por Roberto Macedo

Há tempos defendo o voto distrital para eleger esses parlamentares. É de longe muito melhor que o sistema usado no Brasil para eleger os tais "representantes" do povo. O difícil é aprová-lo, pois a decisão legal cabe a eleitos pelo sistema atual que temem pôr reeleições em risco.

A pressão, portanto, deve vir de fora para dentro do Congresso Nacional. Na sequência das manifestações de rua, o momento é oportuno para pautar o voto distrital nas discussões sobre a reforma política. Li várias análises desses movimentos e ressaltam que o cidadão carece de representatividade política. Ora, essa é a essência do voto distrital. Ele aproxima o eleitor dos candidatos e do eleito, que passa a representar todo o distrito e a ter de prestar conta do que faz, sem o que sua reeleição fica comprometida. E mais: o eleito também atua por aqueles que não o sufragaram.

Hoje o contato entre o eleitor e "seu" vereador ou deputado lembra um cometa que passa a cada quatro anos. Após a eleição muitos se esquecem do distante candidato em que votaram. No mesmo dia os eleitos se despedem para voltar quatro anos depois à cata de votos. E os que votaram em perdedores ficam ainda mais órfãos da representatividade.

Quanto aos eleitos, também como cometas desaparecem na escuridão em que exercem seus mandatos. Pergunto ao leitor: quem é o seu vereador ou deputado? Quando recorreu a ele? O que ele fez ou faz e quando prestou contas do seu trabalho?

Hoje o "representante" fica distante do "representado" e, dessa maneira, sem amarras para o que der e vier. Ou mesmo para quem vier e der. E soltos tanto no que não fazem como no que fazem. Ou aprontam. Há exceções, mas cada vez mais excepcionais.

Há outras vantagens do distrital. Elimina o que chamo de efeito Enéas-Tiririca, em que candidatos muito bem votados arrastam, com o voto na legenda, outros mal sufragados, ou mesmo indesejáveis. Aliás, puxadores de votos como esses nem mesmo seriam eleitos em distritos, pois o foram com votos minoritários em cada localidade, mas somados por todo o Estado. No distrital as campanhas individuais não seriam tão caras, pois Estados e municípios seriam divididos em distritos. Na eleição de deputados federais, por exemplo, o Estado de São Paulo teria 70 distritos, número que lhe cabe na Câmara. E na dimensão de um distrito seria menos difícil apurar irregularidades eleitorais, como o caixa 2 e a distribuição de cestas básicas em troca de votos.

Com o distrital também seria maior o número de eleitos que lutariam por reivindicações de seus eleitores, e não pelas de corporações e de outros interesses que atuam no espaço maior das eleições atuais. E em Brasília seria fortalecido o lobby distrital para obter mais recursos tributários para cidades e regiões, hoje excessivamente concentrados na União. Mais perto dos cidadãos carentes de serviços públicos, falta aos Estados e, principalmente, aos municípios uma representação mais efetiva no Congresso. A relutância da presidente Dilma Rousseff em dar às cidades parcela maior dos impostos foi um dos motivos das vaias que levou ao falar recentemente a prefeitos de todo o País reunidos em Brasília.

O distrital também limitaria o número de candidatos a um por partido, e a uma meia dúzia de viáveis, se tanto. Isso ao contrário do sistema atual, em que o eleitor escolhe um entre uma multidão de candidatos sobre os quais não dispõe de maiores informações, não sendo assim possível confrontá-los uns com os outros no embate eleitoral. Na eleição de 2010 havia 1.169 candidatos paulistas à Câmara dos Deputados. Como escolher um entre tantos?

Nesse contexto, ao optar por um candidato, pode-se eleger outro, até um indesejável da mesma legenda. Ademais, sem vínculo com os cidadãos do espaço bem mais limitado de um distrito, vale repetir que é comum um eleito pelo sistema atual privilegiar a representação de quem votou nele em todo o Estado ou município, como uma categoria profissional ou um grupo econômico.

Há parlamentares que se elegem com votação concentrada regionalmente em seus Estados ou municípios, o que lhes dá um traço de distritais. Mas se aceitarem um cargo no Executivo, que sobre eles exerce atração irresistível, seus lugares de origem perdem seu eleito, pois em geral o suplente tem outra origem geográfica. No distrital o substituto viria do próprio distrito.

Não tenho espaço nem assegurada a paciência do leitor para seguir com as vantagens do voto distrital. Ele não é uma panaceia, mas sofre de menos males que o sistema atual. Por serem tantas as suas vantagens, em particular a de permitir ao eleitor, no jogo da representação, a marcação dos candidatos e do eleito, estou convencido de que, se adequadamente difundidas, ganhariam suporte popular, até mesmo manifestações de rua e apoio nas redes sociais.

Mas sei também o quanto é difícil difundir a ideia a ponto de convencer uma maioria capaz de levar o Congresso a aprová-la. Assim, não se pode sair por aí defendendo o voto distrital apenas com referência a esse nome. É preciso transmitir seu significado de forma clara. E na arte da comunicação é útil a associação de uma novidade a algo já bem conhecido e incorporado à vida das pessoas a quem a mensagem é levada.

É por isto que recorro a mensagens como a do título deste artigo. Insisto: é preciso difundir o voto distrital como eleição direta de vereadores e deputados. O distrito é apenas o espaço ou o campo da disputa. O brasileiro sabe o que é eleição direta e tem pendor por ela.

Aliás, há 30 anos nascia o movimento Diretas-Já. Ele teve papel importante na redemocratização do País. Mas a eleição de vereadores e deputados carece de efetiva democratização.

Diretas neles. E já. É o caminho a seguir.

Roberto Macedo, economista (UFMG, USP, Harvard), professor associado à FAAP, consultor econômico e de ensino superior. 

Reforma política e trapaça

Editorial de O Estado de S.Paulo

Com o respeito que lhe é devido por ter na vida real a honesta profissão que não raros de seus colegas de Congresso Nacional enxovalham com sua conduta, registre-se o equívoco do deputado Tiririca ao lançar o bordão "pior do que está não fica". A mais recente prova de que, na política, tudo sempre pode ficar pior está nas gelatinosas movimentações dos partidos para apresentar em 90 dias um projeto de reforma política. Se o trabalho da comissão criada para esse fim for aprovado, o texto será submetido a referendo nas eleições de 2014. Os indícios apontam para o retrocesso.

A se consumar, deixará saudade de algumas das regras atuais, que a presidente Dilma Rousseff tentou alterar estabanadamente - primeiro, com a desatinada ideia de convocar uma Assembleia Constituinte exclusiva sem a participação do Legislativo; depois, mediante um plebiscito irrealista em que o eleitor seria chamado às pressas a se servir de um bufê de propostas de duvidosa digestão, entrando em vigor as mais consumidas já no pleito do ano que vem. A Constituinte caiu por sua clamorosa ilegalidade. O plebiscito, por ter sido rejeitado pelo PMDB, valendo-se da avaliação da Justiça Eleitoral de que seriam necessários pelo menos 70 dias para realizá-lo, a contar da definição dos seus quesitos.

Ficou patente, de todo modo, que Dilma quis apenas mostrar-se antenada com a voz das ruas. Não estava. Embora os políticos e a corrupção se destacassem entre os variados alvos das jornadas de junho - motivadas principalmente pelo custo do transporte público e a percepção do descalabro dos serviços públicos em geral -, apenas uma parcela mínima dos manifestantes incluiu a reforma política no seu embornal de demandas. Só que o oportunismo da presidente produziu outras consequências, além de aumentar o seu desgate. No PT, assistiu-se à patética disputa entre os deputados Henrique Fontana, do Rio Grande do Sul, e Cândido Vaccarezza, de São Paulo, por uma vaga na citada comissão dos 90 dias, impedindo que o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, a instalasse na semana passada. Ficou para agosto.

Alves deu ao paulista a coordenadoria do colegiado. Amuado, o gaúcho foi-se embora. Como Henry Kissinger disse certa vez, as brigas por posições às vezes são inversamente proporcionais à sua efetiva importância. Para o PT, importante continua sendo o plebiscito, ainda que para vigorar só em 2016, mediante decreto legislativo. A sua primeira versão teve o mesmo destino dos lances de suposta esperteza de Dilma: foi rebarbada até pelos companheiros de viagem do petismo no Congresso, quando se deram conta de que o texto continha, camufladas, propostas de adoção do financiamento público das campanhas - a enganadora resposta petista ao escândalo do mensalão - e o polêmico voto em lista fechada para deputados e vereadores.

O rol dos quesitos, por sinal, discrepa das "sugestões" arroladas por Dilma na sua mensagem em favor do plebiscito. No fundo, tanto faz. É improvável que o PT consiga reunir as 171 assinaturas necessárias para a inclusão de sua proposta de decreto na pauta da Câmara. Já o que a cúpula do PMDB prepara é de levar a sério - e recear. O partido fala pela base aliada muito mais do que o seu rival no governo - ainda mais nestes tempos de queda da popularidade de sua titular. E o principal projeto peemedebista é um insulto ao clamor por transparência. Os seus caciques querem acabar com as doações diretas aos candidatos por pessoas físicas e jurídicas. Os interessados em patrocinar campanhas depositariam as suas contribuições na conta das respectivas siglas, que as distribuiriam entre os seus candidatos.

É uma trapaça. Antes da transferência, financiadores, partidos e candidatos terão se acertado sobre o destino da bolada. A armação convém ao doador, porque o seu nome não aparece; ao partido, porque é praticamente impossível rastrear o percurso do dinheiro que fez escala nos seus cofres; e ao candidato, porque dele não se poderá dizer, se eleito, que está a soldo de terceiros. Só o eleitor ficará no escuro. Isso já existe. Chama-se "doação oculta", contestada pelo Ministério Público. Só falta instituí-la, desmentindo o iludido Tiririca.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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