Na FOLHA: Trégua, ressaca ou virada?, por VINICIUS TORRES FREIRE

Publicado em 18/06/2014 03:45
País dos dias da Copa está calmo nas ruas, nos aeroportos, nos estádios e vazio na política...

NÃO HÁ TUMULTO em aeroporto. Em estádios ("arenas"). Na rua dos estádios. Na rua em geral.

As greves se desmancharam no ar, assim como a militância #nãovaitercopa, que jamais juntou muita gente no asfalto e enfim, não mais que de repente, refluiu como os rolezinhos.

A política politiqueira e partidária reduziu-se a algumas trocas de insultos, à pobreza geral de espírito envolvida na história da vaia à presidente da República e a bravatas e falações medíocres em lançamentos de candidaturas. Tais atitudes costumam causar ainda mais indiferença do que a de hábito entre os eleitores, com exceção daqueles viciados em política e mídia.

Tudo isso vira fumaça em horas ou dias. Lembram como tanto se falou do "golpe de mestre" de Eduardo Campos (PSB) ao receber o apoio de Marina Silva e sua Rede afogada?

O grosso dos brasileiros ainda não está prestando muita atenção à eleição, isso quando não estamos simplesmente nos recusando a fazê-lo. Vide a proporção ainda alta de "votos de protesto e/ou indiferença", cerca de um terço, na eleição presidencial, ou ainda mais que isso, como na eleição para o governo do Rio de Janeiro.

O que vem a ser esta calmaria? Trata-se de trégua, ressaca ou refluxo da irritação exacerbada até a primeira semana de junho? Certamente, óbvio, há o efeito "paz olímpica", na verdade da Copa, enquanto o time do Brasil continuar jogando. Mas o ruído de fundo da irritação não parece ter passado, embora tenha refluído das vias e manifestações públicas. Agressividades e violências, físicas e mesmo verbais, têm de resto incomodado o grosso do público desde o final do ano passado.

No universo paralelo e ora ainda mais distante da economia, dado o clima (mesmo ameno) de Copa, a deterioração continua, lenta e gradual, em ritmo menos estressado do que os de confiança.

Soube-se na terça feira que a atividade no setor de serviços continuou a minguar, segundo o indicador do IBGE. Em abril, a receita cresceu 6,2% em relação ao mesmo mês do ano passado (sem descontar inflação. Quer dizer, o setor pode ter chegado à estagnação. Ainda não se sabe bem como calcular o crescimento real desse indicador novo do IBGE). A receita havia crescido quase 10% no primeiro bimestre e 6,5% em maio.

O indicador mais atualizado, referente a junho, é apenas uma uma espécie de prévia, mas marcou o terceiro mês seguido de baixa. O Índice de Confiança do Empresário Industrial da Confederação Nacional da Indústria caiu de novo, passando o trimestre em um nível que indica falta de confiança, "pessimismo".

O Indicador Antecedente Composto da Economia para o Brasil, da FGV do Rio, uma espécie de prévia do que pode ter acontecido com a atividade econômica "real" em maio, baixou mais nesse mês, marcando também um trimestre inteiro de declínio, soube-se ontem.

O ânimo, portanto, pelo menos o que pode ser medido por pesquisas de opinião e atividade econômica, baixava até o início deste junho. As alternativas políticas, na rua ou nos partidos, não empolgam o eleitorado. Não parece de modo algum que vamos para as tormentas, mas a calmaria pode bem ser apenas irritação muda.

vinit@uol.com.br

 

ELIO GASPARI

O ódio ao PT e o ódio do PT

Se a ideia é empulhar a patuleia durante a cam-panha, será melhor que os candidatos evitem os estádios

Lula tem toda razão. Existe uma campanha de ódio contra o PT. Esqueceu-se de dizer que existe também uma campanha de ódio do PT. Uma expôs-se no insulto à doutora Dilma na abertura da Copa. Argumente-se que o grito foi típico da descortesia dos estádios.

O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, influente aliado do candidato Aécio Neves, endossou-o durante um evento do tucanato: "O povo mandou ela para o lugar que tinha que mandar". Essa é a campanha de ódio contra o PT. Ela pode ser identificada na generalização das acusações contra seus quadros e, sobretudo, na desqualificação de seus eleitores. Nesse ódio, pessoas chocadas pela proteção que Lula e o partido deram a corruptos misturam-se a demófobos que não gostam de ver "gente diferenciada" nos aeroportos ou matriculada nas universidades públicas graças ao sistema de cotas.

O ódio do PT é outro, velho. Lula diz que nunca se valeu de palavrões para desqualificar presidentes da República. Falso. Numa conversa com jornalistas, chamou o então presidente Itamar Franco de "filho da puta". O ódio petista expôs-se em situações como a hostilização ao ministro Joaquim Barbosa num bar de Brasília e na proliferação de acusações contra o candidato Aécio Neves na internet. Se a rede for usada como posto de observação, os dois ódios equivalem-se, e pouco há a fazer.

Lula antevê uma campanha eleitoral "violenta", pois a elite "está conseguindo despertar o ódio de classes". Manipulação astuciosa, recicla o ódio do PT, transformando-o no ódio ao PT. Pode-se admitir que a elite não gosta do PT, mas bem outra coisa é rotular como elite todo aquele que do PT não gosta. Paulo Roberto Costa, o ex-diretor da Petrobras que entesourou US$ 23 milhões em bancos suíços, certamente pertence à elite e no seu depoimento à CPI viu-se que gosta do PT e o PT gosta dele.

Essa estratégia já foi explicada pelo marqueteiro João Santana: trata-se de trabalhar com dois Lulas: ora há o "fortão", ora o "fraquinho". (Talvez as palavras originais tenham sido outras, mais próximas do dialeto dos estádios).

Quando Lula foi criticado porque tomou um vinho Romanée-Conti de R$ 1.600 durante a campanha de 2002, era a elite que negava ao "fraquinho" o acesso a um vinho do andar de cima, pago por Duda Mendonça. Anos depois, quando viajou pelo mundo em jatinhos de empreiteiras, era o "fortão" redesenhando a diplomacia brasileira.

É uma mistificação, mas contra ela só existe um remédio: vigiar a racionalidade da campanha, fugindo da empulhação.

Quem quiser odiar, que odeie, mas não fica bem a uma presidente da República dizer que investiu em educação recursos que, na realidade, destinaram-se a cobrir o custeio da máquina. Também fica feio a um candidato da oposição que até outro dia estava no ministério dizer que "não fico mais em um governo comandado por um bocado de raposa que já roubou o que tinha que roubar". Não viu enquanto lá estava?

Talvez a racionalidade seja um objetivo impossível. Afinal de contas, até hoje há americanos convencidos de que o companheiro Barack Obama é um socialista que nasceu no Quênia. Nesse caso, candidatos não devem ir a estádios.

Fonte: Folha de S. Paulo

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