Carlos Lupi dá golpe e toma o controle do FAT
Acredito que já tenha ficado claro que não sou lá muito simpático ao petismo, não é mesmo? Mas acreditem: há coisa que só não é pior porque não se expande. É o caso do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Se ele fosse realmente uma liderança expressiva, seria a vanguarda do retrocesso no país. Por que isso agora? Faz tempo que ele tenta dar uma espécie de golpe no FAT, o Fundo de Amparo ao Trabalhador, que tem hoje um patrimônio de R$ 150 bilhões, com um orçamento em 2010 de R$ 43 bilhões. Essa montanha de dinheiro é gerida por um conselho, o Codefat, com 18 representações, divididos em três bancadas: seis governamentais, seis patronais e seis de trabalhadores. A cada dois anos, renova-se a Presidência, com um revezamento entre essas bancadas. A vice-presidência é sempre do governo. Atualmente, a Força Sindical comanda o Codefat. A eleição da nova presidência ocorre amanhã. Muito bem. E o que Lupi tem com isso?
Em 2008, com o surgimento de novas centrais sindicais, estimuladas pelo Ministério do Trabalho, o conselho resolveu aumentar a representação das bancas de quatro (era assim desde 1990) para seis. Junto com essa mudança, Lupi teve uma idéia genial: elaborou um decreto que transferia a presidência do FAT permanentemente para o ministro do Trabalho. Como a vice-presidência já é do governo, a gestão deixaria de ser tripartite. Lula, felizmente, recusou a proposta. O que este gigante do cartorialismo sindical tinham em mente?
Em 2010, dada a rotatividade entre as bancadas, o comando do Codefat será dos empregadores. Na lógica do rodízio que há também entre as entidades de um mesmo grupo, é a vez de a CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil) comandar o conselho.
A bancada patronal do Condefat era formada pelas seguintes entidades: CNI (Confederação Nacional da Indústria), Consif (Confederação Nacional do Sistema Financeiro), CNC (Confederação Nacional do Comércio) e CNA. Sob o patrocínio entusiasmado de Lupi - vocês sabem como ele adoraria estatizar até os empresários, não é? -, formaram-se no ano passado a CNS (Confederação Nacional de Serviços) e a CNTUR (Confederação Nacional de Turismo). A concessão de registro sindical à CNS, por exemplo, é de 8 de dezembro do ano passado. Ela só passou a integrar o conselho em janeiro.
Pois bem… Com seis meses de existência legal apenas, acreditem, a CNS decidiu, sempre com o estímulo de Lupi e sem o apoio da sua bancada, criar confusão e indicar um candidato para a presidência do FAT: Luigi Nessi. O nome da CNA, a quem cabe agora a presidência, é Fernando Antônio Rodrigues. Embora haja o rodízio, há um processo eleitoral. Lupi tenta agora convencer representantes da bancada do governo e dos trabalhadores a votarem contra o nome da CNA. Estão representados no FAT os do Trabalho, Fazenda, Previdência Social, Agricultura e Desenvolvimento Agrário e o BNDES. Pelos trabalhadores, falam a CUT, a Força Sindical, a UGP (União Geral de Trabalhadores), Nova Central Sindical de Trabalhadores, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil e CGTB (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil). Lupi tem dito por aí que a CNA não pode dirigir o FAT. Não pode por quê?
“Se o ministro levar adiante essa história e for bem-sucedido nesta espécie de golpe, as quatro confederações que tradicionalmente formam a bancada patronal vão renunciar [CNI, Consif, CNC e CNA], afirma a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da CNA. “Essas entidades não vão aceitar ser meros fantoches do governo e do ministro Lupi”, conclui.
Pergunto à senadora se Lula está metido nessa articulação. “Até onde sei, não”. Bem, lembro à senadora que ministros são a voz do presidente em suas respectivas pastas. Se Lula não quer que Lupi dê um golpe no Codefat, é só mandar que pare. Ele é o chefe do ministro. É ele quem manda.
Voltei
Pois bem, por 12 votos a quatro e duas abstenções, o candidato de Lupi, Luigi Nessi, foi eleito. Abstiveram os representantes dos ministérios da Agricultura e da Previdência. Os quatro outros votos do governo, dois das entidades empresariais inventadas por Lupi e a totalidade dos seis votos das centrais sindicais fecharam com Nessi, o representante da Confederação Nacional de Serviços, que só integrou o Codefat em abril. A entidade foi criada em dezembro do ano passado. Seu “patrono” oficial é Lupi. O outro voto empresarial foi da Confederação Nacional do Turismo, que entrou no conselho também em abril e que também foi inventada por… Lupi.
Segundo a regra de mandato rotativo, a indicação agora caberia à CNA, presidida pela senador Kátia Abreu (DEM-TO). Lupi decidiu que este era mais um motivo para dar o golpe.
As quatro entidades empresarias que integram o Codefat desde 1990 (CNI, CNC, CNA e Consif decidiram se retirar no conselho e emitiram uma nota de protesto em que acusam o governo de interferir na escolha. A presidente da CNA também divulgou uma nota de protesto (ver no próximo post).
INTERFERÊNCIDA INDEVIDA, PELEGUISMO, AGRESSÃO À DEMOCRACIA
Quatro entidades empresariais que integravam o Conselho do FAT desde a sua criação, em 1990, deixaram o órgão e emitiram uma nota de protesto. Dizem não reconhecer legitimidade no novo comando e afirmam que a interferência do Ministério do Trabalho agride o princípio democrático.
A senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, que foi a entidade diretamente golpeada, também protestou. Leiam as notas.
CONFEDERAÇÕES PATRONAIS DEIXAM O CODEFAT
A bancada dos empregadores representada no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT) manifesta total discordância em relação ao encaminhamento dado pelo Ministro do Trabalho e Emprego (MTE), Carlos Lupi, ao processo eletivo para a sucessão na presidência do órgão. Desrespeitou-se o princípio ético da imparcialidade e da não interferência no rodízio entre as bancadas, que orientaram o acordo existente entre os integrantes do Conselho desde a sua criação, em 1990.
Não reconhecemos legitimidade na escolha da Confederação Nacional de Serviços (CNS) por parte do Ministério do Trabalho e Emprego. Esta escolha cabe apenas aos integrantes da bancada dos empregadores, que indicou, por maioria absoluta, o representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senhor Fernando Antônio Rodrigues, para presidir o CODEFAT na próxima gestão. A decisão respeitou o acordo de alternância entre as Confederações, que sempre orientou a sucessão no comando do órgão.
A interferência nesse processo agride o princípio democrático que garantiu o equilíbrio e a harmonia na convivência entre as bancadas representadas no Conselho. A bancada dos empregadores está coesa na defesa de sua autonomia na escolha de quem vai representá-la. Considera inaceitável ser dirigida por uma Confederação criada este ano e cuja legitimidade está sendo questionada na justiça.
A situação financeira do CODEFAT é temerosa. Apesar de ter um patrimônio de R$ 158 bilhões, está previsto um déficit de R$ 8 bilhões no orçamento estimado para 2010. Para 2009, projeta-se um déficit de R$ 3,5 bilhões. Sabemos que os reflexos da crise financeira mundial no País são responsáveis pelo aumento nos gastos com seguro desemprego e abono salarial. Mas o risco existe e precisamos de governança para enfrentá-lo com eficiência e profissionalismo.
Por todos esses motivos, as Confederações patronais abaixo assinadas decidiram se retirar do Conselho, deixando a condição de membros do referido órgão.
Brasília, 28 de julho de 2009
Confederação Nacional da Indústria - CNI
Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo - CNC
Confederação Nacional do Sistema Financeiro - CONSIF
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil - CNA
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NOTA DA SENADORA KÁTIA ABREU
Mais que desrespeitosa e desleal, a ação do ministro do Trabalho Carlos Luppi no processo de escolha do presidente do CODEFAT foi um insulto ao sindicalismo brasileiro.
O ministro reencarnou o peleguismo e sua forma de condução certamente encurtará a distância que separa o Fundo de Amparo ao Trabalhador do fracasso econômico.
A CNA está de luto. O sindicalismo brasileiro está de luto. Ações como a do ministro do Trabalho nos dão a certeza que a democracia é um valor que nunca podemos considerar definitivamente adquirido.
A CNA não reconhece tributo em autoridades que se consideram proprietárias do Estado. Coragem, frontalidade e respeito são qualidades que deveriam ser obrigatórias para agentes públicos.
Brasília, 28 de julho de 2009
Senadora Kátia Abreu
Presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, CNA
ASSALTO AO FAT USOU MÉTODO BOLIVARIANO
quarta-feira, 29 de julho de 2009 | 5:37
Sugiro a vocês que não se descuidem do caso do FAT, sobre o qual escrevi três posts ontem. Sei que o assunto parece um tanto técnico e distante da política, mas não é assim. O fundo administra uma soma fabulosa de dinheiro — patrimônio de R$ 150 bilhões e R$ 43 bilhões de orçamento no ano que vem. Carlos Lupi, ministro do Trabalho, já havia tentado dar um golpe, redigindo um decreto que eliminava a presidência rotativa entre as três bancadas que compõem o conselho (governo, empregadores e trabalhadores). Lula não é bobo, e Lupi não conseguiu. Por esperto, o “companheiro dos companheiros” imaginava soluções mais originais.
Ontem, finalmente, Lupi conseguiu o que queria: eleger uma espécie de laranja para tomar conta do setor justamente no biênio em que a presidência caberia à bancada empresarial — no caso, à CNA (Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil). Já contei a história aqui. E como o ministro logrou o seu intento? Recorrendo ao que eu chamaria de “democracia bolivariana”.
Fico imaginando Lula a balançar a cabeça com uma ponta de sarcasmo quando Lupi lhe sugeriu o decreto. Poderia ter dito: “Companheiro, temos um modo melhor de tirar a presidência das mãos da CNA…” E qual é esse modo, operado com rigor por Lupi? “Ora, se você não pode vencer com o colégio eleitoral que tem, fraude, então, o colégio”. Ou ainda: “Se você não consegue ganhar segundo as regras do jogo, por que não mudar as regras do jogo de modo a assegurar a vitória”? Não foi assim, mudando ou ignorando a escrita, mas sempre com eleições, que Chávez já chegou a uma ditadura na Venezuela? Não é rigorosamente assim que seus homólogos fizeram ou estão fazendo no Equador, na Bolívia e na Nicarágua — em Honduras, Zelaya tentou, mas, até agora, felizmente, não deu certo.
Sim, fiquemos atentos: essa gente recorre à própria lei para jogar a lei no lixo. Um bobalhão poderia indagar: “Ué, não houve uma eleição no Codefat?” Houve, sim. E ela foi usada justamente para solapar a convivência democrática que havia no conselho desde a origem, em 1990. Alguém poderia objetar: “Quem fez isso foi o ministro, não o Lula”. Bobagem! Ministros são a voz e a vontade do presidente em suas respectivas áreas. Fazem o que ele manda. E Lula deixou claro que já estava com o saco cheio da democracia que vigia no FAT.
Deve ter pensado qualquer coisa iluminada como: “Com a minha popularidade, democracia pra quê?”
Assim, Lupi se tornou o Zelaya bem-sucedido do FAT. Parece usar até a mesma tintura no cabelo.