Artigo de Reinaldo Azevedo sobre a expulsão de Geisy Arruda, aluna da Unibam (SP)

Publicado em 08/11/2009 19:57
GEISY É EXPULSA DA UNIBAN. BARBÁRIE FASCISTÓIDE! MULHERES DO BRASIL, UNAM-SE CONTRA O “DIREITO AO ESTUPRO”


 

A Uniban expulsou a aluna Geisy Arruda, aquela cujo vestido foi considerado excessivamente curto por um bando de rapazes que se comportaram como potenciais linchadores e estupradores e por um bando de moças dispostas a coonestar o linchamento e o estupro. Já escrevi vários textos sobre esse caso. Alertei que não estávamos só diante de uma irrupção irracional de violência. O que se viu naquela, digamos, “universidade” é sintoma de uma doença que corrói o ensino universitário brasileiro, que está no auge de sua expansão bárbara. Bárbara mesmo! Agora é o dinheiro público que financia a tomada de poder pelos hunos.

Pior: a universidade expulsa a aluna com anúncio em jornal, e seu representante legal concede uma entrevista que, na prática, transforma a vítima em responsável pelo mal que a afligiu. Mais do que isso: emite juízos de valor que poderiam justificar o estupro, que fazem da mulher mero objeto da “caçada” masculina e que põem em dúvida a reputação de Geisy. A vida dessa garota estará marcada por um bom tempo, quem sabe para sempre. Num país respeitável, receberia uma indenização milionária, e a Uniban encontraria o seu devido lugar na lata de lixo da educação moral. O conjunto da obra é estarrecedor.

Quando comecei a escrever sobre esse caso, alertei os leitores que não publicaria comentários que, direta ou indiretamente, buscassem no comportamento de Geisy a justificativa ou a explicação para o comportamento fascistóide daquela horda que aparece nos vídeos do Youtube. Alguns internautas ficaram revoltados comigo; houve quem me acusasse de estar aderindo à patrulha do politicamente correto etc. Expus os meus motivos. E a minha questão central era e é esta: a minha civilização é a da inviolabilidade do corpo. Sempre me pareceu que desviar o foco dos verdadeiros criminosos — aqueles que a ameaçaram e que a humilharam — poderia resultar na criminalização da vítima e na proteção a seus algozes. Dito e feito! Aqueles que me censuraram então talvez estejam um tanto surpresos com o desfecho da história. Eu não estou.

A AGRESSÃO IMPUNE A UM DIREITO INDIVIDUAL, UM ÚNICO QUE SEJA, REPRESENTA A AGRESSÃO A TODOS OS DIREITOS INDIVIDUAIS. Reconhecê-los, meus queridos, supõe banir das relações sociais a força física — aquelas manifestações de estupidez a que todos assistimos. Como queria Ayn Rand, a única razão de ser dos governos é proteger esses direitos da ação de grupos ou bandos. Os governos podem recorrer ao uso legítimo da força desde que seja como retaliação: contra as hordas e justamente para proteger os indivíduos.

Esse princípio constitui a melhor parte das sociedades democráticas. Não ignoro que ele está um tanto em baixa. Nos vinte anos da queda do Muro do Berlim — ainda falarei a respeito neste blog —, certos valores do liberalismo é que estão em crise. E voltou a ser influente em alguns círculos a tese da legitimidade da violência coletiva contra o indivíduo em nome de um suposto “bem comum”. Como se o “bem comum” fosse um dado da natureza — também da natureza humana — e não uma construção social, como qualquer outra, manipulável e manipulada por grupos de pressão. É justo que alguém indague neste ponto: “E os tais ‘direitos individuais’ de que você fala, Reinaldo? Também não são uma construção?” São, sim. Mas o meu princípio é também um pressuposto: a inviolabilidade do corpo — o “habeas corpus”. Sem ele, resta-nos a fúria dos bárbaros.

A minha indignação com o que se fez com aquela moça não é uma causa que abracei ao sabor da oportunidade. Ela mobiliza a minha crença mais profunda nos direitos individuais. Depois dos princípios, vamos um pouco às novas e horripilantes circunstâncias do caso.

Seres abjetos
Como se a Uniban não tivesse percorrido já toda a trilha da abjeção, a direção da universidade resolveu dar um passo a mais. Não bastasse o anúncio em jornal, que sataniza a estudante,Décio Lencioni Machado, assessor jurídico da instituição, concedeu a seguinte entrevista à Folha:

FOLHA - Por que a decisão?
DÉCIO LENCIONI MACHADO -
Por meio dos depoimentos dos alunos, professores, funcionários e mesmo dela, constatou-se que a postura dela não era adequada há algum tempo. O foco não é o vestido. Tem menina que usa roupas até mais curtas. O foco é a postura, os gestos, o jeito de ela se portar. Ela tinha atitudes insinuantes.

FOLHA - Como assim?
MACHADO -
Ela extrapolava, rebolando na rampa, usando roupas que os colegas pudessem verificar suas partes íntimas. Isso tudo foi dito em vários depoimentos e culminou no que ocorreu no dia 22 de outubro. Foi o estopim de uma postura recorrente da aluna.

FOLHA - Por que o anúncio? Não acham que estão expondo a aluna?
MACHADO -
A exposição dela vem ocorrendo desde a semana seguinte a 22 de outubro. Ela se utilizou de todos os veículos de comunicação para divulgar [o que aconteceu] e vem declarando que, inclusive, tem interesse em ser atriz. Estamos querendo usar os mesmos veículos, não para expô-la, porque exposta ela já está, mas porque tenho compromisso com 60 mil alunos. Recebemos 4.000 e-mails de alunos, pais, pessoas da comunidade, se queixando da exposição da instituição, em especial do curso de turismo, porque as meninas estavam sendo chamadas de “putas”.

Voltei
Trata-se de uma das coisas mais asquerosas que li nos últimos tempos. Quando presos, os estupradores costumam dizer que as vítimas colaboraram — e, na verdade, provocaram o crime. Observem que, segundo ele, aquela estupidez foi a culminância de atos praticados por Geisy. Ela é mesmo a culpada. Em nome do “compromisso com 60 mil alunos”, ele inocenta os algozes da garota e entrega a sua reputação ao apedrejamento. É assim que o sr. Machado pretende educar a sua comunidade. Se há alunas sendo chamadas de “putas” — e “puta” foi o xingamento de que ela foi alvo naquele dia —, ele, então, pacifica a turba oferecendo a estudante em sacrifício.

Estamos de volta ao país de Ângela Diniz, que os mais jovens nem devem saber quem é. Vale uma pequena pesquisa sobre a “Pantera de Minas”, assassinada por seu namorado, que foi absolvido (o julgamento depois foi revisto). Acusação: Ângela se comportava como “puta”. Ficou famosa uma frase dita pelo advogado de Doca Street, o assassino: “Ela vivia mais na horizontal do que na vertical”. Esmagava-se a reputação da vítima para poder inocentar o seu algoz. É o que faz o tal advogado da Uniban — que, Santo Deus!, também ministra um curso de Direito.

Geisy é uma sem-ONG
Desde o primeiro dia, tenho chamado a atenção para o fato de que Geisy, infelizmente para ela, não se encaixa em nenhuma dessas minorias de plantão. Ela é, coitada!, uma sem-ONG. Mora na periferia de Diadema e trabalhava num mercadinho do bairro. A exemplo de outros milhões, buscava num curso universitário uma chance de ascensão social, e não se pode condená-la por isso. Estivesse ligada a qualquer desses “movimentos sociais” influentes, a Uniban estaria em maus lençóis. Mas ninguém vai quer se mobilizar por uma Geisy que é só uma pessoa comum. O onguismo das minorias não deixa de ser, desenvolverei isso em outro texto, num outro dia, justamente a negação do indivíduo e dos já citados direitos individuais. Como essa moça não carrega bandeira, “ela que se dane”, para lembrar frase emblemática dita por uma MULHER no dia em que Geisy era escorraçada da Uniban. Uniban? Mas o que são a Uniban e outras “unis” que andam por aí?

Eis o problema
Disse lá no alto: há o sintoma, e há a doença. A doença está na expansão de uma universidade sem vida universitária; de uma universidade que não consegue plasmar valores  que ao menos debatam e questionem o ambiente intelectualmente acanhado de onde provém a nova “clientela” — essa palavra é boa — que usa esse “serviço”. Ela chega ao terceiro grau em razão do farto financiamento público e do barateamento dos cursos — no sentido mais amplo, geral e irrestrito do “barateamento”.

Alguns bocós falam de boca cheia em “democratização” da universidade. Confunde-se “democratização” com vulgarização — que é mais ou menos como confundir “povo” com “vulgo”. Que “universidade” é essa incapaz de transmitir a seus alunos o princípio básico do respeito ao outro — ou, se quiserem, da reação proporcional àquilo que se julgou, então, “desrespeito” do outro? Ao jogar a reputação e o destino de Geisy na arena — aliás, a Uniban lembra mesmo uma arena romana —, que exemplo moral a direção da universidade dá aos alunos? O tal Machado parece não deixar muitas dúvidas de que ele está dando uma satisfação apenas à clientela. Agora já sabemos: na Uniban, ser “insinuante” e “rebolar”, se a turba se exaltar, pode resultar em expulsão. Ameaçar alguém com linchamento e estupro não dá em nada; ao contrário até: parece ser essa uma reação considerada legítima.

Os jornais noticiaram ontem que uma outra universidade, a Unip, estava dando pen drives de presente a alunos que falassem bem da instituição em questionários do MEC. Nem preciso demonstrar que tal prática frauda o resultado do levantamento. Os exemplos do, como chamarei?, laxismo que toma conta do setor são muitos. A própria Uniban anuncia que é possível cursar a graduação e a pós-graduação ao mesmo tempo. É uma revolução na noção do tempo: o “pós” acontece no “enquanto”. É a verdadeira revolta quântica da universidade.

E que se note: exceção feita às profissões que ponham a vida de terceiros em risco, pouco se me dá que essas coisas prosperem por aí. Se há quem queira comprar e quem queira vender — e se o mercado absorve esses profissionais —, virem-se. Garçom administrador de empresas é melhor do que garçom garçom? Não necessariamente — talvez faça bem à sua auto-estima, sei lá. Agora, quando dinheiro público entra na jogada — e o ProUni, por exemplo, é dinheiro público —, aí essas instituições têm de prestar contas do que fazem, sim. E a relação deixa de ser privada do comerciante com o cliente; aí passa a ser uma questão de estado. E o governo tem sido, obviamente, relapso com esse setor da economia. O país inventou uma universidade que não universaliza, mas amesquinha o espírito.

Para encerrar
Há dias, Lula voltou a se dizer melhor do que FHC e ironizou a formação intelectual daquele que considera o seu rival, lembrando que ele próprio não havia cursado universidade nenhuma. Como sempre, fazia a apologia da ignorância e da desnecessidade do ensino universitário, embora se dizendo o maior criador de universidades do planeta. É verdade!

Temos uma universidade que Lula, com efeito, não precisaria cursar. Temos uma universidade onde ele pode ensinar. Temos uma universidade onde ele é doutor honoris causa.

Encerro com uma questão geral e outra, vá lá, privada: a decisão da Uniban e a entrevista do seu representante jurídico são duas das mais graves agressões às mulheres em muitos anos. É como se dissessem: “Saibam se comportar, ou o linchamento e o estupro as aguardam”. Esta casa, em especial suas mulheres, declara o seu resoluto e irrestrito asco a essa gente. Mulá Omar, chefe do Taleban, para reitor da Uniban!


Agora é Dilma quem ataca a imprensa

 

Por Ana Flor, na Folha:
A ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) saiu em defesa ontem do presidente Lula, atacando a imprensa e a oposição. Dilma afirmou que existe uma “oposição quase midiática” no país e acusou segmentos da imprensa de “partidarização”.
Na semana passada, o governo Lula foi alvo de críticas do ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso. O cantor Caetano Veloso foi também a público dizer que Lula é “analfabeto e grosseiro”.
Ao falar a prefeitos e vice-prefeitos do PT ontem em São Paulo, Dilma disse que as alianças que o PT está construindo devem ser “uma das explicações para o crescente isolamento de setores políticos, basicamente a oposição, que se vê sem projeto, sem discurso e cada vez mais sem base social”.
Dilma disse ainda que há a “substituição da oposição partidária pela oposição quase midiática”. Ela voltou a classificar a oposição de “patética”, como fez no dia anterior, além de chamá-la de “desconexa” e vítima de um “excesso de vaidade”.
Ao se referir ao PT, disse que “nós somos de fato os grandes democratas do Brasil”.
Numa tentativa de municiar os prefeitos para defenderem o projeto petista na campanha do próximo ano, Dilma falou que o governo tem derrubado “dogmas” da oposição. Como exemplo, falou da crença de que “o povo é politicamente atrasado [e] precisa de formadores de opinião o orientando” -uma resposta às críticas de Caetano.
Dilma foi recebida por centenas de prefeitos e vice-prefeitos do PT em Guarulhos. Além de gritos de “Urgente, Dilma presidente” da plateia, os palestrantes brincavam, ao começar suas falas, dizendo “bom Dilma” -ao invés de “bom dia”.
A ministra subiu o tom dos ataques menos de uma semana depois de FHC criticar, em artigos para jornais, o “lulismo” que comandaria o grupo hoje no poder no país.
Em seu discurso, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, chamou o ex-presidente de “Fracassando Henrique Cardoso”.
Há poucas semanas, também em São Paulo, Lula criticou a imprensa, afirmando que o povo pensa por si e “não precisa de intermediários”. A fala de Dilma, muito aplaudida pela plateia petista, foi na mesma linha. Segundo ela, é “arrogância atribuir nossa popularidade como uma miopia” do povo. Aqui


Ranking da liberdade de imprensa indica retrocesso na América Latina

 

Por Daniel Bramatti, no Estadão:
Quase todos os países da América Latina perderam posições, entre 2002 e 2009, no ranking mundial da liberdade de imprensa elaborado pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF). Relatórios de outras entidades, como a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, serão divulgados em breve e também devem mostrar a multiplicação de ameaças à livre expressão na região.

Fechamento de emissoras de rádio e televisão, projetos de lei para restringir a ação de meios de comunicação, censura, agressões e até assassinatos de jornalistas marcam o panorama da imprensa em países que, apesar do caráter formal de sua democracia, ainda convivem com arbitrariedades quando o que está em jogo é a livre circulação de informações.

Dos países latino-americanos, somente o Haiti subiu no ranking da Repórteres Sem Fronteiras entre o primeiro e o mais recente levantamento feito pela organização. Para atribuir a posição de cada país, a entidade leva em conta episódios de violência contra jornalistas (como ameaças, detenções, agressões físicas e assassinatos) e órgãos de imprensa (censura, assédio governamental, pressões econômicas). São levados em conta não apenas abusos atribuídos a agentes do Estado, mas também a milícias armadas, organizações clandestinas e grupos de pressão.

Segundo Benoît Hervieu, responsável pelo escritório das Américas da RSF, uma variação de até 10 posições no ranking pode não ser significativa - às vezes um país perde posições não porque ficou pior, mas porque outros melhoraram. Ainda assim, o cenário é de deterioração generalizada: 16 dos 20 países tiveram quedas superiores a 10 posições (veja quadro).

Cinco dos sete maiores tombos no ranking ocorreram em países marcados pela influência de Hugo Chávez, presidente da Venezuela, país que caiu 47 posições desde 2002. Aqui


Aliados dos Kirchner voltam a bloquear jornais

 

Por Ariel Palácios, no Estadão:
Mais de 300 integrantes do sindicato dos caminhoneiros, o principal aliado sindical da presidente Cristina Kirchner e do seu marido, o ex-presidente Néstor Kirchner, bloquearam ontem de madrugada o acesso às gráficas do La Nación e do Clarín. O cerco às gráficas dos dois principais jornais argentinos durou quatro horas. A polícia nada fez e a Casa Rosada se limitou a convocar “paz social”.

A Associação de Editores de Jornais de Buenos Aires (Adeba) afirmou que o bloqueio é o maior ataque à circulação de jornais desde o fim da ditadura militar, em 1983. A entidade emitiu um comunicado no meio da madrugada para anunciar o “estado de máximo alerta” perante o “insólito ataque”.

O sindicato citou questões trabalhistas para justificar a obstrução das gráficas. Analistas políticos afirmam, porém, que por trás do bloqueio está o casal Kirchner, que mantém duro confronto com a imprensa.

A ação coincide com a realização em Buenos Aires da assembleia da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), que avalia as pressões recentes sofridas pelos jornalistas e empresas de mídia na região.

“Aqui, depois da tempestade não virá a bonança, mas a inundação”, disse Marcos Aguinis, filósofo, psiquiatra e ex-ministro da Cultura argentino.

Ontem, durante o painel da SIP “Os novos mecanismos de censura sutil”, Aguinis, autor do best-seller O atroz encanto de ser argentino, disse que “não há nada de sutileza no que está ocorrendo”. “São atitudes hostis com a imprensa. Os jornalistas são acusados com nome e sobrenome desde a tribuna do palácio presidencial, algo que nunca havia ocorrido desde a volta da democracia”, afirmou.

Outra participante do painel, a jornalista María O”Donnell, autora de livros sobre corrupção no governo Kirchner, disse que a publicidade oficial é uma das formas de pressionar os meios de comunicação. “É ilustrativo que a publicidade oficial na Argentina cresceu de US$ 11 milhões em 2003 para US$ 261 milhões em 2009″, disse.

Julio Blanck, editor do Clarín, afirmou que suspeita da existência de uma rede de espionagem contra os jornalistas críticos ao governo Kirchner. Ele sustentou, ainda, que o “sarampo anti-imprensa que afeta os Kirchner é parte de um amplo mecanismo para tentar ficar no poder mais quatro anos”.


Carlos Guilherme Mota e o aviltante pobrismo de Lula

 

Por Gabriel Manzano Filho, no Estadão:
O que se vê no Brasil, hoje, é um “superpresidencialismo desbussolado e pitoresco”, em que se produz “a montagem de um novo bloco de poder”. Talvez não seja um subperonismo, como alertou no domingo passado, em artigo no Estado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso - mas algo pior. “Porque o populismo de Perón politizava, enquanto o pobrismo do Brasil avilta.”

A comparação é do historiador Carlos Guilherme Mota, professor titular de História Contemporânea da USP (aposentado) e de História da Cultura na Universidade Mackenzie, para quem Lula pratica “uma forma cordial, mas matreira, de evitar a implantação de uma moderna sociedade civil”. Respondendo ao “para onde vamos” de FHC, Mota diz que “há um fenômeno novo, estimulante, de uma nova esquerda liberal, republicana, socializante”, aparecendo nos EUA, na União Europeia, no Chile e até no Brasil, com figuras como Barack Obama, Michelle Bachelet, Segolène Royal.

O ex-presidente FHC acertou ao dizer que o governo Lula conduz o Brasil para um subperonismo?

Não sei se o termo é esse, mas concordo que se trata da crise mais grave desde os anos 80. Prefiro definir o cenário como um superpresidencialismo desbussolado e pitoresco. A nação assiste, bestificada, à montagem de um novo bloco de poder. O tratamento dado ao segmento social que o governo entende por povo tem algo em comum com o dos descamisados de Evita e de Perón, mas é pior.

No que é pior?

Porque o populismo de Perón politizava e o pobrismo daqui avilta. O assistencialismo brasileiro é deprimente, pois trata esses condenados da terra como fracassados. E as condições de melhoria social - tão sonhada e ensinada por figuras como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro ou Florestan Fernandes - são pífias. Aqui o capitalismo andou para um lado e a política social andou para outro. Basta ver que o governo não consegue encaminhar a questão dos sem-terra, por exemplo. Mas há, de fato, uma semelhança até física de um certo tipo de “neossindicalista” brasileiro de hoje com aqueles pelegos dos tempos de Getúlio Vargas, Perón, Ademar de Barros…

Como Perón nos anos 50 e nos 70, Lula tem uma enorme aprovação para si e para seu governo.

Ele consegue isso porque põe em marcha uma mobilização autoritária em que aplica, magistral e perversamente, a velha metodologia da conciliação. O autoritarismo popular ao qual FHC se referiu, praticado por Lula, é uma forma cordial, mas matreira, de se evitar a implantação democrática de uma moderna sociedade civil. Com valores e regras respeitados, que valorize a formação da cidadania.

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Fonte: Blog Reinaldo Azevedo (Veja)

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