Nottus: Inverno de 2025 impõe desafios e oportunidades para o setor de hortifruti
Estamos em pleno inverno com um cenário típico da estação, com temperaturas baixas e um padrão climático que se distancia dos extremos de ondas de calor de outros anos. Para o setor de hortifruti, esse quadro tende a favorecer cultivos sensíveis e reduzir perdas no campo. Mas ainda estamos no meio do percurso – e o desfecho dessa safra dependerá da atenção dos produtores às próximas janelas críticas de frio e geadas. A estação oferece trégua, mas também exige vigilância.
O agricultor deve ter uma lembrança bem diferente desta mesma época em 2024. Na ocasião, ondas de calor atípicas e chuvas severas comprometeram parte importante da produção, especialmente na Região Sul. Já 2022 e 2023 ficaram marcados por estiagens prolongadas no Sudeste, com impacto direto na produtividade de hortaliças e frutas. Neste ano, estamos diante de uma condição de “neutralidade climática”, sem a atuação dos fenômenos El Niño ou La Niña, o que favorece um inverno mais previsível, mas não isento de riscos. Essa neutralidade, apesar de parecer um cenário estável, aumenta a variabilidade climática e exige atenção constante dos produtores.
Até o início de julho, o frio mais intenso e as geadas se concentraram nas regiões Sul, onde os sistemas produtivos já estão adaptados a essas condições. Para as frutas de clima temperado, como maçã, uva, pêssego e ameixa, o acúmulo de horas de frio tem sido positivo, garantindo a quebra da dormência e a preparação para um novo ciclo produtivo. No caso de algumas hortaliças, as temperaturas mais baixas também favorecem o desenvolvimento, pois reduzem a incidência de pragas, chuvas excessivas e estresse térmico. Mas, nem todos os cultivos respondem da mesma forma: há espécies que têm seu ciclo de crescimento e maturação retardado, o que pode comprometer a oferta em determinados períodos e provocar desequilíbrios pontuais no abastecimento.
Essa dinâmica de produção é acompanhada por uma mudança no comportamento do consumidor. Em períodos de frio, observa-se uma retração natural na procura por alimentos frescos e crus — como saladas e frutas —, com preferência por refeições mais quentes e calóricas. Esse movimento impacta diretamente a demanda e exige que o setor esteja atento às oscilações de mercado para ajustar estratégias de comercialização.
A previsão indica que agosto vai começar com novas frentes frias que avançam pelo Sul do país, trazendo novamente chuvas e queda nas temperaturas. A tendência é que essas condições se estendam até setembro, o que aumenta o risco de geadas tardias — especialmente prejudiciais a pomares em fase de floração.
Se por um lado o Sul permanece sob risco de frio prolongado, o Sudeste deve experimentar um cenário mais equilibrado. Tradicionalmente mais seco durante o inverno, esse ano a região poderá contar com precipitações esparsas já entre agosto e setembro, o que reduz a necessidade de irrigação e o consumo de energia e favorece o desenvolvimento de hortaliças folhosas e raízes com menor custo.
Diante desse panorama, torna-se cada vez mais evidente que a produção de hortifruti no Brasil exige preparo técnico e adaptação contínua. As mudanças nos padrões climáticos e os eventos extremos recentes reforçam a importância do monitoramento meteorológico de alta precisão, do planejamento agronômico ajustado às novas realidades e da adoção de tecnologias voltadas à resiliência climática. Em tempos de neutralidade, os riscos não desaparecem, apenas mudam de forma e exigem decisões mais estratégicas.
Assim, os meses de inverno de 2025 podem, sim, trazer boas oportunidades para o setor, desde que os produtores estejam atentos às janelas ideais de plantio e colheita, às oscilações de mercado e às possibilidades de ganho de eficiência. Mais do que nunca, o conhecimento técnico é um importante aliado para atravessar com segurança uma estação que, embora mais previsível, continua desafiadora.
Paulo Etchichury é CEO da Nottus. Meteorologista, formado pela Universidade Federal de Pelotas, possui 40 anos de experiência em projetos e consultoria no setor. Atuou no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) como Assessor Especial do Ministério da Agricultura, e participou da criação e instalação do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) como Coordenador da Meteorologia Operacional. Além disso, foi sócio-fundador da Somar Meteorologia, onde atuou por 25 anos.
Alexandre Nascimento é Sócio-Diretor da Nottus. Bacharel e Mestre em Meteorologista, pelo IAG-USP e com MBA em Agronegócios pela Esalq-USP possui 30 anos de experiência no setor. Atua como consultor há duas décadas em diversos segmentos, como o do agro, energia e varejo. Foi o responsável técnico durante três anos pelo conteúdo veiculado nos telejornais da Rede Globo e durante alguns anos também veiculou boletins do tempo em rádios como CBN SP, RJ e BH, Transamérica, Nativa FM, além de escrever para jornais impressos como O Globo, Estadão e Jornal da Tarde. Palestrante.