Radicalismo matou o Código Florestal

Publicado em 27/04/2012 18:45
Por Pedro Grava Zanotelli.
Desmatamento zero na Amazônia. Aumento ou diminuição das áreas de preservação permanente – APP, de margens de rios, lagoas, nascentes etc. e reflorestamento onde houve desmatamento. Anistia ou não das multas para os que desmataram. Aumento das restrições em encostas e topos de morros. Intocabilidade da mata atlântica e do cerrado. Estes são os assuntos que alimentam a grande polêmica envolvendo ambientalistas, defensores do desenvolvimento sustentável, ruralistas, políticos e governantes. Se sobram argumentos a todos eles, nem sempre eles encontram amparo na lógica e na ponderação. Muitas vezes pecam por assumirem posições antagônicas de difícil conciliação. Foi isso o que dificultou a elaboração do projeto do novo Código Florestal e a sua aprovação no Congresso. 

Não pretendemos polemizar com nenhum deles, apenas emitir opinião sobre esses assuntos pelo que conhecemos e vivemos. Qual o sentido de desmatamento zero na Amazônia? É de não se cortar nenhuma árvore mais? Diz a proposta propagada pelo Greenpeace, com apoio de artistas, que seria somente em casos que envolvessem o interesse nacional. E quais seriam os casos de interesse nacional que justificariam a derrubada de matas? Estariam previstos em lei e o mapa físico do Brasil teria uma configuração redesenhada, com as atuais áreas de ocupação agropastoril e urbanas e uma vasta extensão verde intocável? A exploração econômica seria apenas de coleta, como a dos índios da época do descobrimento, porque os atuais bem que vendem as suas árvores aos madeireiros? O País teria que crescer e se desenvolver somente no espaço já explorado? No caso da mata atlântica e do serrado, onde estaríamos morando se não houvesse desmatamento? Onde irão morar e trabalhar os futuros habitantes das cidades nas próximas décadas, sem cortar “reservas”? 

No caso das APPs, matas ciliares que foram exterminadas quando da formação das pequenas propriedades, os sítios de agricultura e pecuária de subsistência, que alimentaram a maior parte da população quando esta era predominantemente rural, e que sobreviveram ao urbanismo, como continuarão existindo se tiverem que cortar os seus pastos, chiqueirões, roças e pomares, próximos de suas aguadas? A mesma situação das roças, pomares e vinhedos das encostas de morros, nos estados do Sul. Se tiverem que pagar multa e reflorestar onde a mata foi cortada há muito tempo, só haverá uma saída – abandoná-los e ir para a cidade. Imaginemos essas exigências na Europa, obrigando a Suíça a tirar suas vaquinhas das montanhas e Portugal a cortar os vinhedos do Porto.

Não que o propósito e as ideias estejam errados. Ninguém pode negar a necessidade e a urgência de medidas que preservem o nosso planeta e, consequentemente, a nossa própria vida. É preciso conter o desmatamento predador, estabelecer limites nas terras ribeirinhas para não permitir que grades de disco as desnudem, provocando assoreamentos e matando nascentes. Encostas e topos de morros, vulneráveis às chuvas, quando a camada de terra sobre as rochas perde sustentação, também precisam ser protegidos do desmatamento. Tudo isso é certo, o que não é certo é o radicalismo, que prejudica o entendimento e dificulta as medidas inovadoras. Há soluções eficazes para esses problemas. Para as matas, onde há madeiras de lei, a exploração pode ser feita pelo processo de manejo, que já faz parte do Código Florestal. O que é preciso é transformá-lo num procedimento de execução regular, como se faz na Noruega e outros países que o adotam há muito tempo. Nas APPs ribeirinhas, bem como nas encostas e topos de morros, hoje ocupados por agropecuária de subsistência, assistir os proprietários na regeneração sem inutilizar a sua propriedade. Existem técnicas de reflorestamento apropriadas. A USP tem muitos exemplos, como uma experiência pioneira e bem sucedida, feita em meados do século passado pelo ex-diretor do Horto Florestal de Bauru, engenheiro José Carlos Bolliger Nogueira, referida na publicação: “Reflorestamento misto com essências nativas: a mata ciliar”. Não seria mais racional ajudá-los a reflorestar? Antes de tentar impedir o desmate para expansão urbana, que é inevitável, reflorestar com as essências da área a ser ocupada, as áreas degradadas da mesma região. Sem o radicalismo dos que querem destruir tudo, pela ganância e egoísmo, e dos que querem impedir tudo, sem considerar as necessidades inescapáveis, será possível preservar o Planeta Azul.

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Fonte: Pedro Grava Zanotelli

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