Soja, ONGs, RTRS: WWF acusada de "Green-Washing"

Publicado em 12/07/2011 11:28
Por Daniel Coelho Barbosa, analista internacional do agronegócio.
No dia 22 de Junho a TV alemã ARD exibiu o documentário "O Pacto com o Panda - Aquilo que a WWF não Diz" de autoria do reconhecido Wilfried Huismann, vencedor do prêmio Grimme, uma das maiores honras do cinema alemão, por três vezes nos últimos anos. Desde então uma onda de protestos e manisfestações contrárias assolam o World Wildlife Fund (WWF), criticando a atuação da entidade.

O filme exibido na TV ARD em Junho acusando a WWF relata, entre outras denúncias, a proximidade desta ONG com as empresas de biotecnologia. Como consequência, a  WWF, um dos principais membros da mesa redonda sobre a soja sustentável RTRS,  viu-se às voltas com uma avalanche de críticas em torno da própria integridade.

No programa foram apresentadas irregularidades grosseiras em projetos da WWF, como nos projetos dos orangotangos na Indonésia ou dos tigres na Índia. A alegação principal é que a entidade se aproxima de maneira questionável das indústrias ligadas ao agronegócio, como a biotecnologia, traindo os verdadeiros princípios conservacionistas - razão pela qual foi fundada.
    
Em relacao à soja, o documentário aponta a incompatibilidade entre a postura oficial da WWF e os resultados da RTRS, um padrão criado para produzir soja de maneira  responsável. A WWF desde o começo foi incentivadora desta mesa redonda em torno das discussões sobre a produção da soja e até hoje demonstra grande empenho para que a RTRS se consolide como padrão mundial para este grão.

Em entrevista à TV alemã, Huismann qualifica a política da WWF como "máquina de ganhar dinhero às custas do Green-Washing". A expressão "Green-Washing" é sinônimo de "ecologia de araque" e sugere falsidade dos preceitos aliada à atitude enganosa.

SER OU NÃO SER A FAVOR DOS OGM? O DILEMA DA WWF

Publicamente a WWF declara-se preocupada com os transgênicos como dita o  "Documento de Posicionamento sobre OGM" disponível online. Porém existem fortes contradições entre estes receios e declarações do alto escalão da própria WWF.  

Enquanto isso, o padrão do sistema de certificação da RTRS, uma iniciativa da própria WWF,  aceita a soja OGM.
 
Existe uma dificuldade forte da opinião pública em vários países para compreender o seguinte: Como é que a ONG pode num momento condenar e no outro aprovar a soja transgênica? Quais as razões para esta exceção? Wilfried Huismann, o diretor do filme, sugere no documentário que a razão do conflito se devam aos interesses financeiros envolvidos.

Ainda que este seja um aspecto teoricamente alheio ao foco da ONG, do ponto de vista comercial é natural que exista uma segmentação no mercado da soja entre transgênicos e não-transgênicos. Sob o ponto de vista moral, o problema é que a WWF num momento se diz preocupada com a questão dos transgênicos e no momento seguinte tolera e justifica os mesmos transgênicos no seu padrão de soja res-pon-sá-vel.

VICE-PRESIDENTE DA WWF INTERNATIONAL ADVOGA PELO GMO

Nos discursos de Jason Clay, vice-presidente da WWF International, a soja transgênica é colocada como "a unica solução" para conseguirmos alimentar o mundo em 2050. O filme veiculado no canal de TV ARD, uma das emissoras de maior prestígio da Alemanha, mostra trechos de uma palestra de Clay aonde ele argumenta a respeito. Como se não fosse o bastante, o narrador ainda entrevista um alto funcionário da WWF na Argentina dizendo a mesma coisa.

Apoiar os transgênicos publicamente dificilmente será um argumento a favor da WWF. Hoje a organização arrecada algo em torno de U$500 milhões de dólares anualmente de pessoas por todo o planeta preocupadas com a conservação das espécies.
 
A WWF, que está há 50 anos no ramo, tem plena consciência que assumir a postura de Jason Clay perante o mundo, além de significar um prejuízo sério na própria imagem, pode acarretar uma diminuição drástica no volume das doações.

A WWF RESPONDE AS ACUSACÕES

Em entrevista com a TV Suiça NZZ, Hans-Peter Fricker, o representante da WWF local, tentou explicar as declarações de Jason Clay e do representante da WWF na Argentina, que também aprova os OGM, da seguinte maneira: "é muito triste que estas pessoas não sigam as diretivas internas da WWF... no filme ele (o colega argentino) expressa suas próprias opiniões e não a postura da rede WWF." E Fricker continua, "sabemos que Jason Clay defende outra opinião. Ele acredita que os transgênicos são necessários para acabar com a fome do mundo. Mas esta definitivamente não é a posição da WWF". A credibilidade desta afirmação é posta em xeque pelas palavras claras em outros países.

Confrontado novamente com o caso onde a postura da WWF é semelhante na Argentina, o representante da WWF insistiu que o colega argentino, ao defender a soja OGM, está expressando apenas "opiniões próprias".     

Os transgênicos são necessários para acabar com a fome no mundo? Esta é a mensagem da WWF International, uma organização fundada com o intuito de preservar a riqueza da biodiversidade. O que será que os leva a pensar assim?  

Diga-se passagem, como seria se um porta-voz de uma multinacional ou de qualquer entidade viesse a a público para dizer "é lamentável o que nosso vice-presidente diz - nao acreditem nele, nós defendemos outra opinião". Quanto tempo esta pessoa seguiria no seu lugar? Na WWF isto parece absolutamente normal.

Preocupada com as consequências, a WWF imediatamente se concentrou em rebater as críticas recebidas no programa de TV. A reação do público foi imediata com uma redução expressiva no numero de doadores na Alemanha segundo a entrevista de Fricker à NZZ.

E A WWF DO BRASIL?

Bem, já se sabe que dentro da rede da rede WWF, Jason Clay tem uma opnião concordante  com a do amigo argentino. A WWF do Brasil até agora ainda não disse que discorda do sr. Clay.

Para disspar dúvidas seria recomendável que a pessoa responsável na WWF brasileira, proporcionando transparência, elucidasse a postura do seu empregador em relação ao tema.

Pelo que se viu até agora a WWF, seja por uma postura teoricamente "isolada", opiniões pessoais ou mesmo silêncio em torno do tema, parece concordar, ainda que o sr. Fricke afirme o contrário, com a produção de transgênicos nos 3 maiores países produtores de soja no mundo. Pura coincidência?

A  WWF-Brasil fica com a opção de se expressar dizendo se apoia ou não a WWF International. Por uma simples questão de verdadeira responsabilidade.

INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES

Trailer do documentário "O Pacto com o Panda" e entrevista com Wilfried Huismann na TV alemã (legendado em inglês):

https://www.youtube.com/watch?v=pTfmyneFiBI

Entrevistas com Jason Clay (inglês):

1) Aqui a partir do minuto 22  https://vimeo.com/6757505 . Filme de 2009.

2) Depois neste filme de 2010 https://vimeo.com/10776368 a partir do minuto 13. O mesmo discurso.

"O Pacto com o Panda" na TV ARD (original em alemão - "The Silence of the Panda" na versão em inglês):
https://www.ardmediathek.de/ard/servlet/content/3517136?documentId=7495082

Entrevista da WWF com a TV Suica NZZ (em alemão):
https://www.nzz.ch/nachrichten/wirtschaft/aktuell/niemand_beim_wwf_will_ein_feigenblatt_sein_1.11087668.html

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Fonte:
Daniel Coelho Barbosa

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