Mudanças nos CRAs e LCAs preocupam e vêm em momento que agro aumentava capitalização, diz presidente do IBDA

Publicado em 22/02/2024 15:02 e atualizado em 22/02/2024 16:12
"Regra vai em sentido contrário do que se espera como política para um desenvolvimento maior do crédito privado ao agronegócio", acredita Renato Buranello

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As mudanças nas regras para emissões de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e de Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), anunciadas no início do mês pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), são preocupantes e vêm em um momento no qual o agronegócio aumentava capitalizações, afirma o advogado Renato Buranello, sócio do VBSO Advogados e presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA). Juntos, esses dois títulos somam atualmente em estoque mais de R$ 500 bilhões.

"Se por um lado as mudanças buscam dar melhor direcionamento, evitando extremos nas emissões de títulos a agentes que possam participar da cadeia, elas acabaram também limitando outras operações possíveis. O agro é um só independente de pequenas, médias e grandes empresas e atividades. Todas vão fomentar a cadeia como um todo", destaca o especialista.

Para CRA, as alterações aprovadas pelo CMN são imediatas e para LCA começam a valer a partir do mês de julho deste ano. As restrições terão impacto direto nas finanças das empresas atuantes no setor e, também, na quantidade de títulos incentivados disponíveis para os investidores, sejam pessoas físicas ou os veículos de investimento coletivos setoriais como os Fundos de Investimento Imobiliário (FII) ou Fundos de Investimento nas cadeias produtivas agroindustriais (FIAGRO).

"As modificações são preocupantes. Os últimos anos foram marcados por um aumento da capitalização dos FII e FIAGRO que investem em CRI e CRA, os chamados 'fundos de papel', que são fundos fechados geralmente com prazo indeterminado de duração. Estes fundos poderão ter sérios problemas para reinvestimento quando os atuais CRI e CRA que integram suas carteiras forem pagos, tendo em vista a severa restrição imposta pelo CMN a ambos os mercados e as próprias restrições da política de investimento de tais veículos", explica Buranello.

Dessa forma, as alterações representam um desestímulo ao financiamento privado. O especialista acredita ainda que o CMN teria outras alternativas para lidar com a questão. "Optou-se por promover mudanças, acompanhar a evolução do mercado e, depois disso, ver os efeitos que as novas regras vão causar e adaptá-las ou não. Então, o caminho destoou um pouco dos estímulos que vimos nos últimos tempos relacionados aos créditos para o setor e isso em um momento que ele precisa se desenvolver mais", afirma Buranello.

"Países desenvolvidos têm um mercado de capitais avançado e com espaço para toda a complexidade do agronegócio, esse setor que depende de diversas variáveis e que tem riscos, assim como existe também no mercado de capitais. Então, na minha visão, a regra vai em sentido contrário do que se espera como política para um desenvolvimento maior do crédito privado ao agronegócio", complementa o especialista.

Renato Buranello __ presidente do IBDA
Renato Buranello é sócio do VBSO Advogados e presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA)

Quais foram as mudanças no CRA e LCA?

O Conselho Monetário Nacional (CMN), através de reunião extraordinária, decidiu em 1º de fevereiro vedar a emissão de Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) com lastro em títulos de dívida emitidos por companhias abertas não relacionadas ao agronegócio e alterou regras e prazos de vencimento da Letra de Crédito de Agronegócio (LCA) (veja exemplos das mudanças, elaborados pela VBSO Advogados, no final da reportagem).

"As medidas adotadas têm o intuito de aumentar a eficiência da política pública no suporte aos setores do agronegócio e imobiliário, assegurando que os referidos instrumentos sejam lastreados em operações compatíveis com as finalidades que justificaram a sua criação e contribuindo para um mercado de crédito mais robusto", disse o CMN em nota divulgada pelo Banco Central (BC).

Além disso, o CMN vedou a emissão com lastro em direitos creditórios originados de operações entre partes relacionadas ou de operações financeiras cujos recursos sejam utilizados para reembolso de despesas. As medidas passam a valer para novas operações e não afetam CRAs e CRIs já distribuídos ou com registro requerido junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

No caso do LCA, o CMN vedou, a partir de 1º de julho de 2024, que os recursos captados por meio desse título sejam utilizados para a concessão de crédito rural que se beneficie de subvenção econômica da União. "A partir da entrada em vigor das novas regras, os recursos captados por meio de LCA somente poderão ser aplicados na contratação de crédito rural com taxas livremente pactuadas em condições de mercado", destaca a nota. Atualmente, esses títulos são a principal fonte dos desembolsos no Plano Safra 2023/24.

"Além da restrição em si, é negativo o tratamento regulatório diverso para o mesmo conceito legal de direito creditório do agronegócio em duas circunstâncias diferentes: o mesmo conceito legal é interpretado de um modo quando lastro de CRA e de outro, muito mais restritivo, quando lastro de LCA", critica Buranello. Também tiveram mudanças o Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) e lastros elegíveis nos prazos de vencimento da Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e da Letra Imobiliária Garantida (LIG).

Exemplos de operações de CRI/CRA que passam a ser vedadas:

- CRI/CRA “corporativo” devido por ou com coobrigação de companhia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor agro ou imobiliário, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA “corporativo” devido por ou com coobrigação de instituição financeira, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA “corporativo” devido por ou com coobrigação de companhia fechada ou sociedade limitada que não seja parte relacionada de cia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor agro ou imobiliário, mas que conte com coobrigação desta última ou de instituição financeira, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA lastreado em financiamento bancário com destinação imobiliária concedido a companhia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor agro ou imobiliário, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA com lastro pulverizado caso haja coobrigação, subordinação, garantia fidejussória, obrigação de recompra de lastro ou qualquer outro mecanismo de retenção de riscos e benefícios relativos à carteira-lastro prestado por companhia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor agro ou imobiliário ou instituição financeira, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA com lastro pulverizado caso haja coobrigação, subordinação, garantia fidejussória, obrigação de recompra de lastro ou qualquer outro mecanismo de retenção de riscos e benefícios relativos à carteira-lastro prestado por instituição financeira, inclusive partes relacionadas;

- CRI/CRA com lastro em qualquer direito creditório (seja título de dívida ou não) que se caracterize como imobiliário ou do agronegócio em virtude de destinação por reembolso de despesas, por exemplo:

1. CRI com lastro em dívida destinada ao reembolso de aluguéis

Pagos;

2. o CRI com lastro em dívida destinada ao reembolso de despesas com aquisição, reforma ou ampliação de imóveis;

3. o CRA com lastro em dívida destinada ao reembolso de despesas com produtores rurais, seja diretamente ou por meio da aquisição de insumos para a produção de bens ou prestação de serviços a produtores rurais.

- CRI que tenha como lastro contrato de locação sob condição suspensiva celebrado com parte relacionada (locação “tampão”);

- CRI com lastro em contrato de compra e venda de imóvel com pagamento a prazo, ou promessa de compra e venda, ou em qualquer outro arranjo contratual celebrado entre partes relacionadas;

- CRA que tenha como lastro direito creditório oriundo de qualquer arranjo contratual celebrado entre partes relacionadas.

Exemplos de operações CRI/CRA que seguem permitidas:

- CRI/CRA “corporativo” devido por companhia fechada ou sociedade limitada que não seja parte relacionada de instituição financeira ou companhia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor imobiliário ou do agronegócio, inclusive partes relacionadas, e desde que a destinação (quando exigida) seja voltada a gastos futuros; tais títulos poderão inclusive ser destinados a investidores qualificados quando preenchidos os requisitos da Resolução CVM nº 60/21;

- CRI/CRA com lastro pulverizado com qualquer mecanismo de retenção de risco prestado por companhia fechada ou sociedade limitada que não seja parte relacionada de instituição financeira ou companhia aberta que não tenha mais que 2/3 de sua receita proveniente do setor imobiliário ou do agronegócio, inclusive partes relacionadas, e desde que os direitos creditórios não decorram de operações financeiras voltadas a reembolso de despesas;

- CRI/CRA com lastro pulverizado e sem qualquer mecanismo de retenção de risco, e desde que os direitos creditórios não decorram de operações financeiras voltadas a reembolso de despesas;

CRI lastreado em aluguéis, contratos de compra e venda de imóveis ou qualquer outro arranjo contratual que não seja celebrado entre partes relacionadas.

Cenários vigentes até 1º de fevereiro de 2024 e a partir de 2 de fevereiro de 2024 relativos às LCI, LCA e LIG:

COMO ERA

COMO FICARÁ

Financiamentos habitacionais contratados no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), garantidos por hipoteca ou por alienação fiduciária de bens imóveis

Financiamentos para a aquisição de imóveis residenciais ou não residenciais

Outros financiamentos imobiliários garantidos por hipoteca ou por alienação fiduciária de bens imóveis

Financiamentos para a construção de imóveis residenciais ou não residenciais

Empréstimos a pessoas naturais garantidos por hipoteca ou por alienação fiduciária de bens imóveis residenciais

Financiamentos a pessoas jurídicas para a produção de imóveis residenciais ou não residenciais

Outros empréstimos e financiamentos garantidos por hipoteca ou por alienação fiduciária de bens imóveis

Financiamentos para reforma ou ampliação de imóveis residenciais ou não residenciais

 

Financiamentos para aquisição de material para a construção, ampliação ou reforma de imóveis residenciais ou não residenciais

 

Empréstimos a pessoas naturais com garantia hipotecária ou com cláusula de alienação fiduciária de bens imóveis residenciais

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Por:
Jhonatas Simião | Instagram @jhonatassimiao
Fonte:
Notícias Agrícolas

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