Para especialistas no setor leiteiro, mais Estados precisam criar medidas que desestimulem importação de lácteos

Publicado em 05/04/2024 12:33 e atualizado em 05/04/2024 18:09
Um dos mais importantes entre os citados é São Paulo, já que é um centro que concentra consumo, tradings e indústrias

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Mesmo com o Governo Federal já tendo tomado um conjunto de medidas para tentar amparar a cadeia leiteira, que passa por uma severa crise desde o ano passado, com a enxurrada de entrada de leite importado no país e a perda de competitividade do produto nacional, agora os Estados, individualmente se mobilizam para criar leis para desestimular a importação de lácteos em uma tentativa de trazer efeitos mais imediatos. Atualmente, Minas Gerais, Goiás Pernambuco e Alagoas já regionalizam medidas que alteram a taxação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS).

Segundo informações contidas no Boletim do Leite do Cepea de janeiro deste ano, dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Governo Federal mostram que as compras externas somaram 2,25 bilhões de litros em equivalente leite em 2023, volume 68,8% maior que o adquirido em 2022.

O primeiro a tomar a iniciativa foi Minas Gerais, que no dia 18 de março reuniu agentes do setor e autoridades em Belo Horizonte no movimento Minas Grita pelo Leite. Como resultado, o governador do Estado, Romeu Zema, anunciou, nesta segunda-feira (18/3), durante o Minas Grita pelo Leite, que o Governo do Estado vai retirar as empresas importadoras de leite em pó do Regime Especial de Tributação.

minas grita mais leite março 2024
Minas Grita Pelo Leite

Essas empresas, especificamente, passam a pagar o ICMS, de 18%, no momento da comercialização dos produtos importados. No ano passado, segundo informações do Governo de Minas Gerais, as importações mineiras de leite em pó somaram US$ 62,6 milhões. E, neste ano, as compras continuam crescentes. No primeiro bimestre deste ano, as importações já alcançaram US$ 12,7 milhões, representando 20,3% do valor de 2023.

Goiás seguiu a trilha, e no dia 25 de março, o governador Ronaldo Caiado anunciou que o Estado vai retirar benefícios fiscais de laticínios que importam leite e derivados de outros países. Na sequência, o governo de Pernambuco publicou no Diário Oficial do Estado no dia 28 um decreto que determina a concessão de benefícios fiscais nas operações com leite e seus derivados para a indústria local, que favorece a Bacia Leiteira do Estado. O governador de Alagoas, Paulo Dantas, assinou no dia 1º de abril duas Instruções Normativas que beneficiam o setor produtivo leiteiro estadual: uma que regulamenta o Programa de Desenvolvimento da Indústria Leiteira de Alagoas, e outra  que suspende os benefícios fiscais para Importação de Leite e Derivados.

EFEITOS PRÁTICOS

Segundo o presidente da comissão técnica de leite do Sistema Faemg Senar (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais) e vice-presidente da comissão de leite da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Jonadan Ma, a expectativa é que estas medidas em âmbito estadual tenham efeitos imediatos, sem depender de “noventenas”, que são os períodos em que alguns decretos levam para passar a vigorar, o que não é o caso destas medidas já adotadas pelos quatro Estados citados acima. 

“Sem dúvida, os importadores do Estado ou aqueles que utilizam, atacadista ou varejista, ele perde essa desoneração do ICMS. O efeito tem uma grande agilidade para ser sentida na prática no curto prazo já dentro deste mês de abril a gente deve ter uma diferença grande”, apontou Ma.

O  presidente da comissão técnica de leite do Sistema Faemg Senar afirma que espera que outros Estados, como Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e, principalmente, São Paulo, adotem medidas semelhantes, já que são os principais importadores.

“É um grito que cada estado está dando, porque não é que as medidas federais não tenham sido suficientes, mas o Governo Federal poderia ter contemplado todo o país, sem ter conflito tributário de um lugar para outro. Nós não somos contra as importações, que são parte de qualquer economia livre e democrática. O que não podemos suportar é a importação desenfreada de um produto de importância nutricional e social. O leite é um assunto de Estado. Não queremos de maneira alguma que o consumidor tenha aumento no custo de vida. Pelo contrário. Queremos que ele tenha preço acessível e de qualidade, que favoreça a continuidade do consumo e da produção, que se retroalimentam.”, diz Jonadan Ma. 

O pesquisador da Embrapa, Paulo Martins, detalha que quem, no final, acaba pagando o imposto, é o consumidor. A empresa paga imposto, e no caso do ICMS, o impacto é muito forte. “Na medida em que nós temos evidências de que houve uma redução no preço dos insumos de quem produz leite na Argentina, é natural que a gente tenha perdido competitividade. Essa atitude tomada pelos governos estaduais é importante para que a gente tenha benefícios no curto prazo”, salienta Martins.

Ele ainda detalha que o Estado de São Paulo precisa aderir, pelo motivo de que é o principal Estado consumidor de lácteos no Brasil, além de que as operações de importação são feitas em grande quantidade no local e os principais traders estão em São Paulo.

VIZINHANÇA

O diretor técnico da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Bruno Lucchi, anunciou que a entidade está elaborando um estudo para a aplicação de direitos antidumping à Argentina, com o objetivo de proteger o setor lácteo nacional. “Nós sabemos das dificuldades dos produtores, então precisamos ter estratégias e atuar em conjunto para alcançar o sucesso dos pleitos. A reunião de hoje mostra justamente isso, a atuação coordenada do setor em todo país”.

Paulo Martins aponta que nos Estados do Nordeste está acontecendo a maior entrada de produtos nos supermercados vindos da Argentina e do Uruguai por serem Estados importadores de derivados lácteos. “Quem tem fábrica lá está com dificuldade de colocar produto na gôndola. Com leis estaduais assim, cada empresa que compra leite vai pensar duas vezes entre comprar o produto importado e comprar localmente. Com isso, estamos retomando a oportunidade de termos diferentes canais de distribuição”. 

O pesquisador da Embrapa explica que há uma diferença entre eficiência e competitividade. Quando um estado não dá isenção tributária para um produto importado, ele reduz a competitividade deste produto importado. “Quando fomenta a eficiência, você dá oportunidade a quem produz aqui. O Estado tem que estar mais presente protegendo quem está produzindo. Melhorar não só a eficiência do produtor, mas da cadeia toda”, disse.

O OLHAR DO PRODUTOR

Geovando Pereira, que é produtor de leite em Orizona, Goiás, e presidente da CoopGoiás, acha que estas leis em âmbito estadual para tentar diminuir o ímpeto de importação de lácteos, seja de laticínios, agroindústrias ou outras indústrias, como de alimentos ou medicamentos, por exemplo, pode ajudar a diminuir um pouco a importação, apesar de não proibir, por ser livre mercado. “Tirando os incentivos, esse leite importado chega mais caro do que o leite produzido aqui. Desde julho pra cá, começou a entrar uma enxurrada de leite importado. 

Essas são medidas conjunturais que os Estados estão tomando para tentar equilibrar o mercado, conforme explica Pereira. Para ele, o Governo do Estado tirando estes incentivos, as indústrias terão que se reestruturar. 

“O setor produtivo vê com bons olhos. Quanto mais estados aderirem, mais peso terá. São Paulo principalmente, pois tem muitas indústrias e muitas tradings que importam diretamente. Tudo isso é importante. Os estados do Sul também, já que tem muitos produtores da agricultura familiar, e é importante protegê-los”, destacou o produtor. 

Pereira pontua ainda que houve muita saída de produtores pela queda dos preços, justamente num momento de entressafra, chegando no final do ano com o leite a um preço baixo. O pequeno produtor, segundo ele, foi aquele que mais sofreu com isso, porque não conseguia ter renda, e os grandes, como têm uma estrutura maior, conseguiam ainda se manter por um tempo. “A saída desses produtores vai gerar um buraco lá na frente”.
 

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Por:
Letícia Guimarães
Fonte:
Notícias Agrícolas

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