Ibama condiciona exploração da Foz do Amazonas a novos estudos que devem demorar; Petrobras desmobiliza operações
Por Lisandra Paraguassu e Marta Nogueira
BRASÍLIA (Reuters) - A decisão do Ibama de negar a licença para exploração de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas praticamente enterra as possibilidades da Petrobras de perfurações na região, mesmo para testes, a menos que um estudo mais amplo que pode demorar anos mude as avaliações no futuro, segundo fontes com conhecimento do assunto.
A negativa explicita um embate, dentro e fora do governo, entre os que frisam os riscos ambientais e populacionais de uma eventual exploração petrolífera e os que apontam potenciais e imprescindíveis reservas de petróleo na região, enquanto o país busca uma transição energética e um papel protagônico no mundo no debate da emergência climática.
A decisão tomada na quarta-feira pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, acompanhou o parecer técnico do órgão, que rejeitou o pedido de licença da Petrobras para prospecção na região, que integra a chamada Margem Equatorial brasileira, com potenciais reservas do litoral do Rio Grande do Norte ao Amapá, mas situadas em áreas ambientalmente sensíveis.
O único recurso que a Petrobras pode apresentar no momento é para o próprio Agostinho. Com isso, segundo disseram à Reuters fontes da área ambiental, obviamente haveria pouca chance de sucesso para a empresa.
Uma mudança na posição do órgão teria que passar por uma guinada política drástica envolvendo troca na direção do órgão e certamente levaria a impactos políticos que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderia não estar disposto a pagar, como um pedido de demissão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Com reputação na área, ela é hoje o principal trunfo de Lula no discurso ambiental do Brasil para o exterior.
A Petrobras afirmou em comunicado nesta quinta-feira que "continuará buscando essa licença e exercerá seu direito de pedir reconsideração em âmbito administrativo", após o Ibama ter apontado dados insuficientes e incorretos no primeiro pedido, como o tempo de resposta no caso de derramamento de óleo e outras questões.
A empresa disse ainda entender que "atendeu rigorosamente todos os requisitos do processo de licenciamento".
NOVOS ESTUDOS
Mesmo com esse recurso da Petrobras, o entendimento é que uma nova decisão não será tomada antes que o governo tenha um estudo amplo sobre os impactos de exploração petrolífera em toda a área da Foz do Amazonas.
O despacho do Ibama amarra uma futura decisão sobre qualquer exploração na região à realização de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), um estudo que abrange toda a região de possível exploração a ser tocado pelos Ministérios do Meio Ambiente e das Minas e Energia, que mede os impactos socioambientais.
Apesar de não ser uma exigência para o licenciamento ambiental em si, está previsto em uma portaria de 2012 para áreas consideradas sensíveis, e o Ibama pode considerá-lo necessário para áreas mais sensíveis.
Em seu despacho, Agostinho corrobora o entendimento da área técnica sobre a necessidade de retomar os AAAS para essa e outras áreas para embasar as decisões.
De acordo com uma fonte do Ministério do Meio Ambiente, sem o estudo, que o ministério deve começar, não serão tomadas novas decisões sobre exploração de possíveis poços na margem equatorial.
A Petrobras estava mobilizada desde o ano passado para realizar um simulado de emergência na Foz do Amazonas, o que considerava o último passo para obter a licença de perfuração.
A exploração da Margem Equatorial é uma das apostas da empresa para ampliar a produção de petróleo do país, uma vez que as grandes reservas do pré-sal devem declinar no futuro.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou anteriormente que a Margem Equatorial é uma "nova fronteira". Pelo plano de negócios da estatal, há quase 3 bilhões de dólares em investimentos na zona previstos até 2027.
Para um ex-diretor da Petrobras, a negativa do Ibama é uma "grande irresponsabilidade". Ele disse que os blocos na Foz do Amazonas foram ofertados em leilão do governo 2013, e seria responsabilidade do Ministério de Meio Ambiente realizar o estudo AAAS.
"O contrato de concessão reza prazo definido para a execução da fase de exploração, que se não realizada leva à perda do bloco e extinção do contrato", disse.
A fonte, que falou na condição de anonimato, citou que a empresa tem parecer do próprio Ibama apontando que a AAAS não é pré-requisito para a emissão de licenças de perfuração.
Em documento apresentado pela Petrobras em reunião com o instituto em março, e visto pela Reuters, há a informação de que o Ibama reconheceu "que não há instrumentos jurídicos para justificar a recomendação de não emissão de licenças ambientais de perfuração exploratória até que seja realizada uma avaliação ambiental estratégica como a AAAS" -- não estava imediatamente claro de quando seria essa avaliação do Ibama.
A Petrobras havia sugerido que a AAAS fosse considerada para a fase de produção, quando a indústria se instala e opera na região, com os prazos estabelecidos no contrato de concessão de 30 anos. Neste momento, já haveria certeza sobre o potencial de desenvolvimento da área, segundo o documento.
Apenas duas AAAS foram feitas no Brasil até hoje, uma na Bacia de Sergipe e outra na de Solimões, segundo o professor Luis Enrique Sánchez, escola politécnica da USP, que atua na área de gestão ambiental.
Ele explicou que tal avaliação tem várias etapas até a aprovação pelos ministérios, o que deve levar mais de um ano.
Em meio à expectativa da demora na liberação da área, a Petrobras afirmou que a sonda e os demais recursos mobilizados na região do Bloco da Foz do Amazonas serão direcionados nos próximos dias para atividades da companhia nas Bacias da região Sudeste.
SEM SAÍDA LEGAL
Legalmente, não há nada que a empresa possa fazer, de acordo com fontes ouvidas pela Reuters e especialistas. Uma ação judicial não reverteria o caso porque não existe direito à licença ambiental. Conceder ou não é uma atribuição legal do Ibama.
"A decisão está tomada. Podem haver reações, mas o que a Petrobras pode fazer é um recurso ao próprio Ibama, que vai ser decidido pelo presidente, mas a decisão é final", disse a ex-presidente do Ibama, Suely Araujo.
Segundo ela, "ninguém vai à Justiça por licença ambiental porque não é um direito adquirido, é uma análise técnica".
"Nenhum escritório de advocacia vai fazer isso. Não é porque a empresa adquiriu os lotes que ela tem direito à licença para exploração", completou.
Nos leilões de blocos exploratórios no Brasil, as empresas adquirem áreas sem garantia de que terão as licenças ambientais para explorá-las de fato. Há um debate se o governo não deveria sozinho desenvolver estudos, verificar as vulnerabilidades ambientais antes dos leilões, mas nenhuma mudança caminhou neste sentido.
(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier)
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