EUA anunciam aproximação histórica de Cuba

Publicado em 17/12/2014 15:48
Obama anunciou a normalização das relações diplomáticas com a ilha dos irmãos Castro. Papa Francisco teve papel-chave na negociação entre os países, (em veja.com)

O governo dos Estados Unidos iniciou nesta quarta-feira uma aproximação histórica de Cuba, ao anunciar a normalização das relações diplomáticas plenas e o alívio de diversas sanções em vigor há mais de meio século, desde 1961, informou o presidente Barack Obama em um pronunciamento na Casa Branca. O presidente americano manteve na terça-feira uma longa conversa telefônica com o ditador cubano, Raúl Castro, disse a fonte, e ambos acordaram a abertura de embaixadas "nos próximos meses". Obama anunciou "fim de uma política obsoleta" em relação a Cuba e que "fracassou durante décadas".

Em um acordo costurado durante dezoito meses de negociações secretas hospedadas em grande parte no Canadá e encorajado pelo papa Francisco, que organizou uma reunião final no Vaticano, o presidente Obama e o ditador Raúl Castro de Cuba concordaram em deixar de para trás décadas de hostilidade para construir uma nova relação entre os EUA e a ilha comunista que fica a apenas noventa minutos da costa americana. Em seu pronunciamento, Obama agradeceu ao papa Francisco e ao Canadá.

Em Havana, em um pronunciamento lido ao vivo na TV estatal, Raúl Castro anunciou o reestabelecimento de relações diplomáticas com os EUA, "mas isso não quer dizer que o principal está resolvido" – ressaltou o ditador. "Propomos a adoção de medidas mútuas por parte dos dois países. Reconhecemos que temos profundas diferenças, como em questões de soberania e direitos humanos, mas queremos melhorar as relações. Os progressos já obtidos demonstram que é possível encontrar soluções para muitos problemas". Assim como Obama. Castro também agradeceu ao Canadá e ao Vaticano.

Os Estados Unidos vão aliviar as restrições bancárias sobre as remessas de dinheiro para Cuba, e de viagens. Havana se comprometeu a libertar 53 cubanos identificados como presos políticos por parte do governo dos Estados Unidos. Embora o embargo americano sobre Cuba permaneça em vigor, o governo sinalizou que gostaria de negociar com o Congresso o alívio das sanções.

Os republicanos reagiram com indignação à iniciativa da administração Obama para a normalizar as relações com Cuba. O senador Marco Rubio, filho de imigrantes cubanos e um provável candidato presidencial republicano, prometeu tentar inviabilizar a iniciativa da Casa Branca. "Satisfazer os irmãos Castro só irá motivar outros tiranos, de Caracas a Teerã e Pyongyang, para que eles possam tirar proveito da ingenuidade do presidente Barack Obama", disse Rubio.

Preso libertado – O funcionário terceirizado do governo americano Alan Gross chegou nesta quarta à base militar de Joint Andrews, no Estado de Maryland (EUA). Ele foi posto em liberdade por Cuba após passar cinco anos preso em Havana. Gross, um funcionário da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (Usaid, na sigla em inglês) de 65 anos, foi preso em Cuba em 3 de dezembro de 2009 e condenado a 15 anos de prisão por importar tecnologia proibida e tentar estabelecer um serviço clandestino de internet para judeus cubanos. Ele perdeu mais de 45 quilos na prisão e está com a saúde frágil. Gross iniciou uma greve de fome de nove dias em abril e disse a parentes que estava pensando em se matar se não fosse libertado.

Segundo o jornal The Washington Post, Gross foi solto em uma troca humanitária de prisioneiros. Os três cubanos libertados em troca de Gross fazem parte do chamado Cuban Five, um grupo enviado pelo então ditador de Cuba, Fidel Castro, para espionar no sul da Flórida. Eles foram condenados em 2001 em Miami sob as acusações de conspiração contra o governo americano.

 

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Os presidentes Barack Obama e Raúl Castro se pronunciam na tarde desta quarta-feira (17/12) a respeito dos acordos para o restabelecimento das relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba

Os presidentes Barack Obama e Raúl Castro se pronunciam na tarde desta quarta-feira (17/12) a respeito dos acordos para o restabelecimento das relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba   (Matt Dunham/AP)

Em pronunciamento nesta quarta-feira sobre mudanças na relação entre Estados Unidos e Cuba, o presidente Barack Obama citou algumas das medidas que serão tomadas para estreitar os laços com o inimigo de longa data. Entre elas está a abertura de uma embaixada americana na ilha, a revisão da designação do regime cubano como financiador do terrorismo, a redução das restrições a viagens e o maior acesso à tecnologia.

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Em relação ao embargo, contudo, ainda não há mudanças concretas em vista, já que será preciso negociar com os congressistas. “O embargo que foi imposto há décadas está codificado em uma legislação. Eu espero que o Congresso se comprometa com um debate sério e honesto sobre a suspensão do embargo”, disse Obama.

O embargo a Cuba

O embargo americano dos EUA em relação a Cuba consiste em sanções diplomáticas, financeiras, comerciais e econômicas. As primeiras medidas foram implantadas em 1962 pelo então presidente John F. Kennedy, um ano após os países romperem as relações diplomáticas. As principais medidas consistem na proibição de empresas e bancos americanos de manterem relações comerciais ou financeiras com Cuba. As sanções foram convertidas em lei em 1992 e, em 1999, o presidente Bill Clinton ampliou o embargo e proibiu as filiais estrangeiras de companhias americanas de fazer comércio com a ilha.

No campo diplomático, os americanos precisavam de autorizações do governo dos EUA para poderem viajar a Cuba. Entre outras medidas comerciais, as sanções vetavam, por exemplo, a importação de quaisquer produtos que contivessem matéria-prima ou tecnologia cubana. Uma empresa francesa que fabrica geleia foi proibida de exportar para os EUA porque seu produto utilizava açúcar cubano. Os EUA também proibiram bancos americanos e estrangeiros de abrirem contas para pessoas físicas ou jurídicas cubanas. Na prática, a medida bloqueou totalmente o acesso legal de Havana às transações em dólar no comércio com outros países.

Mesmo com a vigência do embargo, o governo Obama adotou entre 2009 e 2011 algumas medidas para suavizar o bloqueio, como a liberação de visitas de americanos que tenham família em Cuba e a remessa de dinheiro de cubanos que vivem nos EUA para a ilha. A cooperação entre os dois países também vem sendo lenta mas paulatinamente ampliada, sobretudo em áreas como o combate ao narcotráfico, o crime transnacional e o tráfico de pessoas.

Reprovação da ONU – Em outubro, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas voltou a aprovar, pelo 23º ano consecutivo e com imensa maioria dos votos, uma resolução pelo fim do embargo imposto a Cuba pelos Estados Unidos. A resolução foi apoiada por 188 países, enquanto apenas EUA e Israel votaram contra, e outros três se abstiveram. Este foi o mesmo resultado registrado no ano passado.

Raúl Castro, que falou sobre as mudanças nas relações entre dois países no mesmo momento em que Obama falava, cobrou o fim do embargo, dizendo que o bloqueio econômico causa “enorme prejuízo ao nosso povo”. “Isso deve acabar”, afirmou.

Embaixada – O restabelecimento de relações diplomáticas com Cuba, rompidas desde janeiro de 1961, será acompanhado da abertura de uma embaixada americana em Havana. Visitas de funcionários de alto nível também farão parte do processo de normalização.

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As medidas preveem ainda que americanos com licença para viajar a Cuba estarão autorizados a importar até 400 dólares em produtos cubanos – o limite conjunto para tabaco e álcool ficará limitado a 100 dólares.

As remessas de americanos para cubanos a título de doação serão aumentadas de 500 para 2.000 dólares por trimestre (exceto para alguns integrantes do regime ou do Partido Comunista). O aumento nos valores também vale para doações a projetos humanitários.

Os Estados Unidos também vão rever a designação de Cuba como financiador do terrorismo. O secretário de Estado, John Kerry, deverá entregar um relatório ao presidente, dentro de seis meses, com as conclusões sobre a situação de Cuba em relação ao terror. A ilha foi incluída na lista em 1982.

Caio Blinder: Cuba (ainda) não libre, mas…

Os EUA também prometem iniciar esforços para aumentar o acesso dos cubanos às comunicações. “Cuba tem uma distribuição de internet de aproximadamente 5% - um das mais baixas do mundo. O custo das telecomunicações em Cuba são exorbitantemente elevados, enquanto os serviços oferecidos são extremamente limitados”, afirmou a Casa Branca, ao detalhar as medidas. A ideia é exportar equipamentos que melhorem o acesso e permitir a provedores que criem a infraestrutura necessária para melhorar as telecomunicações na ilha.

Liberdades – Apesar das mudanças, Obama ressaltou que “não tem ilusões sobre a continuidade das barreiras à liberdade impostas a vários cubanos”. “O governo dos Estados Unidos acredita que nenhum cubano deveria ser submetido a prisão ou espancamento simplesmente devido a suas crenças. Os trabalhadores cubanos devem ser livres para formar associações”.

Raúl Castro reconheceu em seu discurso a existência de “profundas diferenças” com o governo americano, “em questões de soberania e direitos humanos”, mas disse que quer melhorar as relações.

Obama também afirmou que não é do interesse dos EUA ou do povo cubano levar o regime ao colapso. “Os cubanos dizem ‘não é fácil’, mas hoje os Estados Unidos querem ser um parceiro para tornar a vida dos cubanos um pouco mais fácil, mais livre, mais próspera”.

 

Cuba (ainda) não libre, mas… (por Caio Blinder, correspondenete de Veja em N. York)

Barack e Raúl no funeral de Mandela em dezembro de 2013

Barack e Raúl no funeral de Mandela em dezembro de 2013

Com a libertação do ativista humanitário Alan Gross das masmorras cubanas, agora é possível restaurar as relações diplomáticas entre os EUA e Cuba. As negociações para a normalização das relações bilaterais agora serão agilizadas. Obviamente, eu não gosto da ditadura cubana. Não gosto daquele regime castrista retrógado, paparicado na América Latina. No entanto, a política americana para a ilha caribenha é retrógada e contraproducente, resquício da Guerra Fria.

O isolamento diplomático e o embargo econômico em vigor há mais de meio século servem de oxigênio para os octogenários irmãos Castro, que já sobreviveram a dez presidentes americanos. Em um evento histórico, Barack Obama e o ditador Raúl Castro tiveram um conversa telefônica de 45 minutos na terça-feira. Tal tipo de diálogo não acontecia desde a Revolução Cubana no remoto ano de 1959 e as negociações em curso foram mediadas pelo Canadá (cujo primeiro-ministro é conservador) e o Vaticano. Aliás, o presidente americano tem 53 anos e as primeiras sanções contra o castrismo foram adotadas dois anos antes do seu nascimento.

Obama espera ter um pouco de vigor político e relevância com sua iniciativa para normalizar as relações com Cuba. Na praxe americana, um presidente no final do segundo mandato arrisca jogadas no cenário internacional. E é jogada de alto risco para a Casa Branca. Obama não era louco de orquestrar esta aproximação com Havana antes das eleições no Congresso de novembro. Mesmo democratas são críticos de sua política externa confusa e da sofreguidão para costurar um acordo nuclear com o Irã. O lobby anticastrista já foi mais poderoso no Congresso e na Flórida. No entanto, ainda tem muito peso.

A gritaria bipartidária contra o lance de Obama já começou e apenas não é maior devido ao espírito natalino, com os distintos parlamentares já fora de Washington para o recesso de fim de ano. O risco óbvio nesta normalização é se apenas a ditadura cubana faturar muito. Raúl Castro quer transformar Cuba em uma China Chica do Caribe, com reformas econômicas e manutenção do sufoco político, mandando o mundo calar a boca e não se meter nos assuntos internos do país. Será um revés para Obama se o relaxamento do embargo econômico não trouxer nada de afrouxamento político (algo remoto).

E sobre o relaxamento do embargo, a Casa Branca pode atuar apenas nas suas bordas. Mudanças substanciais dependem de aprovação do Congresso, que a partir de janeiro terá maioria republicana na Câmara e no Senado. Este Congresso não promete ser muito camarada com Obama nesta questão de política externa.

Pessoalmente, eu acho um erro. O status quo da política americana para Cuba é tão geriátrico como os irmãos que mandam na ilha. Se os EUA têm plenas relações com o excecrável e geriátrico regime da Arábia Saudita (aliado estratégico), não faz sentido alienar a ilha a 130 quilômetros da Flórida, tão perto dos EUA e ainda tão longe da liberdade.

 

 

 

 

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Fonte:
veja.com

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